Livre para julgar

Juíza do caso dos bacharéis rejeita pedido de suspeição da OAB

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28 de fevereiro de 2008, 22h42

A juíza Maria Amélia Almeida Senos de Carvalho, da 23ª Vara Federal do Rio de Janeiro, disse que não é suspeita para julgar os casos que interessem à seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil. Ela rejeitou pedido de suspeição foi feito pelo presidente da OAB do Rio, Wadih Damous. A entidade queria excluir a juíza de todos os processos que envolvam a OAB. A juíza é autora da liminar — já derrubada — que autorizou seis bacharéis a exercer a advocacia sem passar pelo Exame de Ordem.

O pedido de afastamento da juíza tinha como base ação proposta por ela contra a seccional da OAB em 2002. Maria Amélia pedia indenização por danos morais sob a alegação de ter sido “humilhada e ofendida” pela classe dos advogados. O processo da juíza Maria Amélia contra a OAB corre na 8ª Vara Federal do Rio de Janeiro.

Segundo a juíza, o pedido de suspeição no caso dos bacharéis foi feito depois do depoimento de Damous no processo dos bacharéis. Em nenhum momento, ele questionou a legitimidade dela para julgar o caso. Por isso, para Maria Amélia, o pedido é intempestivo e tosco. “Interposição de exceção de suspeição após prolação de decisão liminar (ocorrida em 14/12/2007) é tosco instrumento de burla ao princípio do juiz natural e ao contraditório”, argumentou.

A juíza não aceitou o argumento de que a entidade só se lembrou do processo por ela movida no dia 16 de janeiro. “Custa-nos crer que a OAB/RJ, apenas nesse momento, se lembre da existência da ação movida por esta magistrada uma vez que a própria autarquia promoveu, salvo engano ainda em 2006, ato de desagravo a alguns de seus membros”, anotou.

Maria Amélia diz que entre 2004 e 2007 julgou 11 processos contra a OAB do Rio solicitando a revisão da correção do Exame de Ordem. Em nenhum deles, ela deu razão aos bacharéis. “Naqueles casos entendi que não caberia ao Poder Judiciário a tarefa de revisão de prova, o que proporcionou as sentenças extintivas. Caso houvesse sentimento de inimizade em relação à OAB/RJ ou seus sucessivos presidentes, ele se refletiria igualmente naquelas demandas, pouco importando a causa de pedir”, afirma.

A juíza disse ainda que, se aceitasse o argumento da Ordem, não poderia julgar nenhum processo envolvendo a União. “Sou autora ainda de pelo menos três demandas em curso nesta Justiça Federal em face daquele Ente Público”, explica.

Argumentos da OAB

No pedido, a OAB afirma que a partir do momento que a juíza recorreu à Justiça contra a entidade “não tem a isenção exigida por lei para julgar qualquer processo judicial que envolva interesses da OAB do Rio de Janeiro”.

Em 2006, as desavenças entre a juíza e a OAB-RJ deram motivo a nota de desagravo da entidade por suposto abuso de autoridade contra o então presidente da seccional fluminense, Octávio Gomes, e o ex-presidente da Comissão de Prerrogativas, Mário Antonio Dantas de Oliveira Couto. Segundo a OAB, a juíza se recusou a expedir alvará para que fossem levantados os valores a receber de um advogado do Rio de Janeiro.

A juíza concedeu liminar que permitiu a seis bacharéis advogarem sem passar pelo Exame da Ordem. No dia 17 de janeiro, o desembargador Raldênio Bonifácio Costa, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, suspendeu a decisão no Mandado de Segurança.

Leia decisão

2008.51.01.011962-8 11003 – EXCEÇÕES

AUTOR: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL — SEÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO E OUTRO

ADVOGADO: RONALDO EDUARDO CRAMER VEIGA E OUTRO

REU: SÍLVIO GOMES NOGUEIRA E OUTROS

ADVOGADO: JOSÉ FELÍCIO GONCALVES E SOUSA

23ª Vara Federal do Rio de Janeiro — MARIA AMÉLIA ALMEIDA SENOS DE CARVALHO

Juiz — Decisão: MARIA AMÉLIA ALMEIDA SENOS DE CARVALHO

Objetos: FISCALIZAÇÃO/EXERCÍCIO PROFISSIONAL

DECISÃO

Vistos, etc…

OAB/RJ e seu Presidente interpõem a presente Exceção de Suspeição em face desta Juíza Titular, por dependência ao Mandado de Segurança no. 2007.5101027448-4 impetrado por SILVIO GOMES NOGUEIRA e outros postulando o reconhecimento da suspeição e redistribuição do feito.

Como fundamento da suspeição suscitada, alega que no dia 16/01/2008, descobriu (sic) que esta Magistrada move ação de danos morais por ofensa à honra em face da excipiente ajuizada desde 29/07/2002.

Decido.

O art. 135 do CPC traz hipóteses numerus clausus de suspeição da parcialidade dos magistrados, a saber:

Art. 135 Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do Juiz, quando:

I — amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes;

II — alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até terceiro grau;

III — herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes;

IV — receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio;

V — interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.

Parágrafo único Poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo.

Em primeiro lugar, cumpre recordar que a decisão liminar dos autos do Mandado de Segurança no. 2007.51.01.027448-4 somente foi prolatada após oitiva da autoridade impetrada, o Presidente da OAB/RJ, que ao prestar informações em nenhum momento suscitou suspeição desta magistrada.

Assim sendo, considerando que a apontada causa da suspeição data de 2002, antes de mais nada ela é intempestiva. Ou o vício existe ab initio ou ele simplesmente não existe. Interposição de exceção de suspeição após prolação de decisão liminar (ocorrida em 14/12/2007) é tosco instrumento de burla ao princípio do juiz natural e ao contraditório.

Nesse sentido, veja-se:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA — SERVENTIA JUDICIAL OFICIALIZADA — INCORPORAÇÃO AOS VENCIMENTOS DE CUSTAS E EMOLUMENTOS — DIREITO ADQUIRIDO — ARGÜIÇÃO DE IMPEDIMENTO — INTEMPESTIVIDADE — LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO — ADMISSÃO APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO.

A argüição de suspeição ou impedimento deve ser argüida na primeira oportunidade em que couber à parte interessada falar nos autos, dentro do prazo de 15 (quinze) dias contados do fato que a ocasionou e será autuada em autos apartados, a teor do disposto no art. 138, § 1º c/c 305 e 312 do Estatuto Processual Civil. (STJ, 1a. Turma, ROMS 11.230/TO, Rel. Min.Garcia Vieira, DJ DATA:01/07/2002 PÁGINA:213 RJADCOAS VOL.:00038 PÁGINA:47)

Tampouco socorre à excipiente a alegação de que apenas no dia 16/01/2008 a entidade tenha descoberto a pretensa causa da suspeição. Custa-nos crer que a OAB/RJ, apenas nesse momento, se lembre da existência da ação movida por esta magistrada uma vez que a própria autarquia promoveu, salvo engano ainda em 2006, ato de desagravo a alguns de seus membros em que mencionava a própria ação e os fatos que a ensejaram.

No tocante às hipóteses legais de suspeição, nenhuma se faz presente.

Entre 2004 e 2007 foram apurados cerca de 11 processos, notadamente Mandados de Segurança, impetrados contra ato do Presidente da OAB/RJ, tendo por objeto revisão da correção do exame de ordem, sujeitos à minha jurisdição e por mim sentenciados com extinção do feito (doc. Anexos). Naqueles casos entendi que não caberia ao Poder Judiciário a tarefa de revisão de prova, o que proporcionou as sentenças extintivas. Caso houvesse sentimento de inimizade em relação à OAB/RJ ou seus sucessivos presidentes, ele se refletiria igualmente naquelas demandas, pouco importando a causa de pedir.

Note-se: a) em nenhuma daquelas ações em que a decisão lhe foi favorável a OAB/RJ suscitou minha suspeição; b) o objeto daqueles feitos e do writ em apenso é completamente diverso do relativo à ação proposta por esta magistrada em face da OAB/RJ; c) nenhum proveito esta magistrada poderia tirar do julgamento de ações versando sobre exame de ordem; d) a causa de pedir daquelas ações (erro na correção da prova) difere profundamente da causa de pedir do writ em anexo (inconstitucionalidade da exigência do exame de ordem por não ser da órbita de competência constitucional da autarquia).

Cumpre registrar que foi distribuída à 23ª Vara Federal a ação ordinária no. 2001.51.01.021509-0 proposta por juíza estadual em face da OAB/RJ buscando indenização por dano moral, em que era inclusive representada por meu advogado. Em vista da natureza da demanda, semelhante à por mim proposta, entendi, fulcrada no parágrafo único do art. 135 do CPC, dar-me por suspeita, o que só atesta meu dever de responsabilidade e minha capacidade de isenção e distinção de temas (dec. Anexo). A ação por fim foi sentenciada por Juiz Substituto.

A admitir o argumento da OAB/RJ, esta magistrada federal deveria igualmente se dar por suspeita em toda e qualquer ação proposta em face da União Federal, não importando seu objeto, uma vez que sou autora ainda de pelo menos 3 demandas em curso nesta Justiça Federal em face daquele Ente Público (andamentos em anexo).

Por fim, a suspeição, quando existente, determina o afastamento do magistrado do andamento do feito e não redistribuição de processo.

Isto posto, considerando que este Juízo não nutre em relação à impetrante qualquer sentimento de inimizade; considerando que este Juízo mantém intacta sua imparcialidade; considerando que nenhum fato ou ato judicial foi descrito na exceção apto a demonstrar a existência de tais sentimentos por parte do Juízo, REJEITO A SUSPEIÇÃO.

Traslade a Secretaria do Juízo para esta exceção cópia das informações e da decisão liminar..

Traslade igualmente cópia desta decisão para os autos do Mandado de Segurança em apenso.

Em seguida, remetam-se os autos ao Eg. TRF da 2a. Região conforme art. 313 do CPC.

Maria Amélia Almeida Senos de Carvalho

23ª Vara Federal do Rio de Janeiro

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