AGU 15 anos

Força de trabalho da Advocacia da União é mal distribuída

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25 de fevereiro de 2008, 0h00

Abstraindo do movimento grevista, que, embora fundado em razões idôneas, compromete o bom andamento dos serviços da advocacia pública federal, com sérios prejuízos para a União e para os próprios membros da AGU, com reflexos na perda de posições importantes na direção do órgão, há pessoas aplicadas à idéia-mor de edificação do conceito institucional da Advocacia de Estado, a ser instrumentalizada com a aprovação da nova Lei Orgânica da AGU.

Se a nova Lei Orgânica estivesse vigendo, entende-se que a greve poderia ser dispensada, por desnecessária, já que a norma consagra as garantias e prerrogativas de exercício das funções essenciais à Justiça, mormente as autonomias administrativa e financeira e a iniciativa das leis de interesse corporativo, como já ocorre no âmbito do Ministério Público e do Judiciário, cujas aspirações, incluindo as de índole remuneratória, são encaminhadas diretamente à presidência da República e recebem tratamento diferenciado.

A conquista de melhor remuneração, posta pelo movimento grevista como corolário do esforço de uma gama de entidades associativas, no sentir de muitos membros da advocatura federal poderia ser atingida de modo mais rápido e eficaz se os esforços conjuntos dessas entidades fossem direcionados, num primeiro plano, para a estruturação institucional da AGU, inserta no anteprojeto de Lei Complementar em gestação nas esferas do Poder Executivo, especialmente em face da autonomia para propor as dotações orçamentárias e as leis de interesse corporativo.

A colimação dos resultados desejados pelos membros da instituição, mormente os de natureza remuneratória, seria mero consectário da conquista das garantias de autonomia, obviamente, se os esforços se conjugarem, quiçá, através de uma única representação classista, e não, por mais de uma dezena de entidades com propósitos invariavelmente distintos e, às vezes divergentes, como ocorre hoje.

O desiderato de muitos membros da AGU, que acaba de completar quinze anos como instituição, é que a instituição ultrapasse rápido esta fase de “adolescência”, ingresse logo na idade madura e se capacite para a desincumbência do elevado mister constitucional a ela reservado.

A proposta legislativa em gestação, a que me refiro, tem por fundamento a defesa dos interesses maiores do Estado Brasileiro, que são permanentes e, não apenas os dos governos de plantão, que sabidamente vislumbram na Advocacia da União um mecanismo à sua disposição, para o fim de viabilizar as políticas transitórias.

O que se tem por propósito, é que a AGU continue prestando assessoria jurídica ao governo, porém, orientada pelos princípios constitucionais que a situam, juntamente com o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia em geral, no Capítulo das Funções Essenciais à Justiça, comprometida com a defesa dos interessas maiores do Estado.

Assim, operando como Advocacia de Governo, mas, com muito maior abrangência, inspirando suas ações como Advocacia de Estado.

Conquanto a proposta da nova Lei Orgânica da AGU tenha sido enriquecida com muitas emendas, subscritas por membros da instituição, associações, sindicatos e outras entidades, inclusive a Ordem dos Advogados do Brasil — secção do Distrito Federal — que valorizou sobremodo o anteprojeto, tomo a liberdade de realçar alguns pontos, considerados substanciais, que, não sendo assimilados, implicarão a perda da indispensável consistência e efetividade.

Refiro-me à unificação das carreiras finalísticas da AGU de Advogado da União, de Procurador da Fazenda Nacional, de Procurador Federal e de Procurador do Banco Central, convolando-as na carreira de Procurador da União, bem como, à unificação estrutural da Procuradoria-Geral da União, da Consultoria-Geral da União, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Procuradoria-Geral Federal e da Procuradoria do Banco Central sob a égide da Procuradoria-Geral da União, visando a racionalizar o uso de escassos recursos materiais e humanos, bem como, favorecer a obtenção de resultados mais eficientes na defesa do interesse público.

A unificação das carreiras é juridicamente viável e se inspira na fórmula utilizada quando da unificação das carreiras de Assistente Jurídico e de Advogado da União, objeto da Medida Provisória 43/02 (convertida na Lei 10.549, de 13 de novembro de 2002), julgada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 2.713, assim ementado:

“………

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 11 E PARÁGRAFOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 43, DE 25.06.2002, CONVERTIDA NA LEI Nº 10.549, DE 13.11.2002. TRANSFORMAÇÃO DE CARGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO EM CARGOS DE ADVOGADO DA UNIÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 131, CAPUT; 62, § 1º, II; 37, II E 131, § 2º, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.


Preliminar de ilegitimidade ativa “ad causam” afastada por tratar-se a Associação requerente de uma entidade representativa de uma categoria cujas atribuições receberam um tratamento constitucional específico, elevadas à qualidade de essenciais à Justiça. Precedentes: ADI 159, Rel. Min. Octávio Gallotti e ADI 809, Rel. Min. Marco Aurélio.

Presente, de igual modo, o requisito da pertinência temática, porquanto claramente perceptível a direta repercussão da norma impugnada no campo de interesse dos associados representados pela autora, dada a previsão de ampliação do Quadro a que pertencem e dos efeitos daí decorrentes.

Não encontra guarida, na doutrina e na jurisprudência, a pretensão da requerente de violação ao art. 131, caput da Carta Magna, uma vez que os preceitos impugnados não afrontam a reserva de lei complementar exigida no disciplinamento da organização e do funcionamento da Advocacia-Geral da União. Precedente: ADI 449, Rel. Min. Carlos Velloso.

Rejeição, ademais, da alegação de violação ao princípio do concurso público (CF, artigos 37, II e 131, parágrafo 2º). É que a análise do regime normativo das carreiras da AGU em exame apontam para uma racionalização, no âmbito da AGU, do desempenho de seu papel constitucional por meio de uma completa identidade substancial entre os cargos em exame, verificada a compatibilidade funcional e remuneratória, além da equivalência dos requisitos exigidos em concurso. Precedente: ADI 1.591, Relator ministro Octávio Gallotti.

Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

………………..”

Coerente com o entendimento do Excelso Pretório, a medida unificatória proposta não resultará alteração das remunerações, que já são idênticas para as atuais carreiras de Advogado da União, de Procurador da Fazenda Nacional e de Procurador Federal e do Banco Central e assim continuará sendo na carreira transformada.

Também não afetará as prerrogativas dos atuais membros das carreiras a serem extintas, porque as atribuições por eles desempenhadas são substancialmente compatíveis, uma vez que os seus titulares são responsáveis pela representação judicial da União, de suas autarquias e de suas fundações.

Vide, a propósito, o artigo 21, da Lei 9.028, de 12 de abril de 1995, que dispõe sobre o exercício das atribuições institucionais da Advocacia-Geral da União, na redação dada pela MP 2.180-35, de 24 de agosto de 2001, a saber:

“Aos titulares dos cargos de Advogado da União, de Procurador da Fazenda Nacional e de Assistente Jurídico das respectivas carreiras da Advocacia-Geral da União incumbe representá-la judicial e extrajudicialmente, bem como executar as atividades de assessoramento jurídico ao Poder Executivo, conforme dispuser ato normativo do Advogado-Geral da União”.

Por outro lado, a atuação unificada de procuratórios jurídicos vem sendo implantada com ganhos de eficiência em Unidades da Federação, a exemplo do Distrito Federal, onde os Procuradores da Fazenda Distrital e Procuradores autárquicos tiveram os respectivos cargos transformados em Procuradores do Distrito Federal, o mesmo ocorrendo no Estado de São Paulo.

A disposição do parágrafo 3º, do artigo 131, da Constituição, que reserva à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a representação da União na execução da dívida ativa de natureza tributária, não constitui óbice para a unificação das carreiras da AGU.

A interpretação inteligente do texto constitucional, dado que seria despropositado reservar atribuições a um órgão específico, integrante de uma instituição maior, criada por preceito constitucional, leva ao entendimento de que o constituinte indicou que a execução da dívida ativa da união deve ser patrocinada por procuradoria pública, ou seja, não privada.

Corrobora tal entendimento o fato de ser a Procuradoria-Geral Federal capacitada à ativação e execução da dívida ativa das autarquias e fundações públicas federais, constituindo matéria já pacificada.

Ademais disso, é assente o entendimento de que, em matéria de direito, o que importa não é o nomem iuris, mas, a substância nele contida, ou por ele representada.

Outrossim, o dispositivo do parágrafo 3º, do artigo 131, exige que a norma constitucional seja complementada por lei, que, é o que se propõe fazer com a unificação das carreiras jurídicas da AGU, aliás, em compasso com a atual conjuntura arrecadatória do país, introduzida com a unificação das Receitas Tributárias e Previdenciárias, já consumada.

A propósito da chamada Super Receita, é sabido que está a demandar a estruturação de eficientes instrumentos de atuação, posto que, segundo noticiado na Imprensa, os mais de R$ 600 bilhões de receita inscrita no Serviço da Dívida Ativa da União requerem muitos outros procuradores para efetivar a sua execução, sem olvidar a possibilidade de que, trilhões de reais poderão ser arrecadados, se houver esforço conjunto, concentrado em um único órgão de Governo, o que se imagina possa ser obtido com a atuação unificada de todos os membros da AGU, e não de um só segmento – a PGFN, como é hoje.


Ora, sendo a Advocacia da União integrada por quase 10 mil advogados em suas várias carreiras, tecnicamente aparelhados para desempenhar as funções da advocatura onde e como ditar o interesse maior do Estado, não se justifica continuar segregando, por meras nomenclaturas, profissionais portadores de idêntica formação técnica e igual aptidão para o desempenho do elevado mister institucional que lhes reserva a Constituição.

Para se ter idéia de como essa excepcional força de trabalho é mal distribuída, além de dispendiosa e subutilizada, basta mencionar, que, em Brasília e nas capitais e principais cidades dos Estados, coexistem estruturas múltiplas da Procuradoria da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Consultoria-Geral da União AGU e, várias especializadas da Procuradoria Federal, imbuídas de funções inteiramente similares, cujas tarefas poderiam ser realizadas com evidente economia de recursos humanos e materiais, com certeza obtendo resultados infinitamente melhores, se articulados em uma estrutura única e coesa.

Para o sustento dessas estruturas múltiplas (que são contadas às centenas, quando poderiam ser reduzidas a poucas dezenas, com ganhos de produtividade), a despeito de se dedicarem a atividades sobrepostas, a União despende recursos (sempre escassos) com prédios, instalações, equipamentos, cargos comissionados, funções gratificadas, pessoal de apoio, material de expediente, energia elétrica, telefone, veículos etc

Cargos comissionados, que, a rigor, nem deveriam existir no Sistema da AGU, dado que a atividade advocatícia é por essência independente, sem qualquer subordinação no campo da técnica, carecendo tão-somente de uma estrutura de coordenação, remunerada por meio de funções gratificadas, a exemplo do Ministério Público.

Neste passo, anoto, por evidente, que a unificação das carreiras contrariará interesses de grupos enquistados em entidades associativas, os quais, mesmo não se orientando pelo receio de perder o desfrute de algumas prebendas — o que seria inevitável com a unificação -, embora imbuídos das melhores intenções têm se portado, equivocadamente, como defensores da manutenção de segmentos fracionários na AGU, em franca assintonia com os interesses maiores, de índole institucional, da advocacia de Estado.

Para se entender a magnitude do equívoco da defesa da segregação das carreiras, basta atinar para o enorme potencial representado por quase 10 mil advogados, integrantes da elite do funcionalismo federal, que, dispersos em entidades associativas segmentadas, desperdiçam a oportunidade de se organizaram em uma associação única, com alto poder aquisitivo, comparável ao das maiores corporações de governo, que, dentre outros benefícios, possuem planos de previdência complementar, clubes de sociais e de serviços, inclusive voltados para o aprimoramento profissional (sempre desejável) e outros, que somente se materializam com esforço concentrado, sob uma única orientação classista.

O Ministério Público e o Judiciário não atuam fracionariamente e, certamente por isso, além da inequívoca qualidade de seus membros, desfrutam de status incontrastável e possuem enorme poder político.

Ora, se a proposta é estruturar a AGU como instituição comprometida com as elevadas atribuições da advocacia de Estado, estima-se que as forças que puderem interferir nos trâmites do anteprojeto de Lei Orgânica da AGU, não se devem curvar aos interesses equivocados, ditados por motivação corporativa segmentária, que, por equívoco obstruem a fixação e instrumentalização de mecanismos institucionais que verdadeiramente interessam ao país.

Esta situação desarrazoada afronta os mais comezinhos princípios da Administração, que, por preceito constitucional há de se orientar, sempre, pelo interesse público que exige a busca incessante da economia e da eficiência.

Note-se que a proposta de unificação das carreiras, traz em seu bojo a idéia de agrupamento das estruturas de gerenciamento da Advocacia da União, o que, além de propiciar economia da ordem estimada de dezenas de milhões de reais por ano, que pode ser revertida em benefício do aprimoramento dos serviços e dos profissionais da AGU, ensejará o fortalecimento do sentimento de equipe, favorecendo a convivência, a permuta diuturna de experiências e a uniformização das teses, enfim, contribuirá para a maior eficiência dos trabalhos, a bem do interesse do Estado.

Sobre as eventuais controvérsias, que, vierem a surgir entre os órgãos da Administração direta, fundacional e autárquica, estes últimos referenciados em face da autonomia administrativa que é da sua inerência, tem-se que a unificação das carreiras não ocasionará qualquer prejuízo para o seu patrocínio, tanto porque os novéis Procuradores da União (ou nomenclatura equivalente), onde quer que estejam exercendo suas atribuições, estarão representando, sempre, os interesses maiores do Estado, que são abrangentes de todos esses órgãos da administração direta e indireta, como, de resto, porque, na nova estrutura da Lei Orgânica, constante do anteprojeto em perspectiva, há a previsão de que esses órgãos estarão impedidos de litigar entre si sem previamente submeterem suas controvérsias jurídicas à intervenção arbitral da Câmara de Conciliação da AGU.

A obrigatoriedade de prévia submissão das controvérsias à Câmara de Conciliação, constitui medida de fundamental importância, por carecer de sentido litigarem entre si partes do mesmo arcabouço de governo, cuja autonomia, conquanto reconhecida, corresponde a uma mera abstração jurídica, fixada em termos positivos por conveniências da Administração Pública, a qual, embora distribua as competências por centros dispersos em atividades específicas, em última análise é uma só, constituindo um único organismo.

Enfim, realçando que esta é uma oportunidade histórica, em que os atuais governantes podem se projetar perante a nação brasileira com todas as honras que se devem tributar aos Estadistas, tomo a liberdade de oferecer estas observações à discussão da comunidade jurídica, por acreditar, que, afinal, preponderarão as idéias comprometidas com a edificação institucional da Advocacia da União e a valorização dos seus membros.

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