Condições degradantes

Homem diz ter sido torturado após reclamar de trabalho escravo

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19 de fevereiro de 2008, 14h08

Reportagem da Repórter Brasil informa que mais de 60 cicatrizes recentes de ferro quente marcam o corpo de um trabalhador de cerca de 30 anos. Ele acusou o proprietário de uma fazenda de Paragominas, no Leste do Pará, de manter trabalho escravo no local.

O trabalhador conta que foi torturado pelo patrão e mais dois capangas quando reclamou das más condições de alimentação e do salário atrasado. Contou, ainda, que fugiu da fazenda no início de janeiro e, depois de dezenas de quilômetros a pé e de muitas caronas, conseguiu contar sua história à Superintendência do Trabalho e Emprego (SRTE) do Pará.

De acordo com a reportagem, na última terça-feira, a fiscalização rural da SRTE esteve na fazenda denunciada e comprovou parte das informações passadas pelo trabalhador. Foram encontradas 35 pessoas em situação análoga à escravidão, que dormiam em um curral abandonado, junto com esterco de boi, e eram alimentadas com restos de carne: pulmões e tetas de vaca.

A propriedade, que fica a 75 km de Paragominas, chama-se Bonsucesso e pertence a Gilberto Andrade. O fazendeiro já está na Lista Suja do trabalho escravo por manter 18 pessoas em condições semelhantes no município de Centro Novo do Maranhão (MA). Essa lista, publicada desde 2003 pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) traz uma relação de pessoas e empresas flagradas nessa situação.

“Fezes de animais estavam misturadas com roupas. Nesse período de chuvas ainda é muito pior, pois se mistura a água com esterco. Além do cheiro horrível, há problemas infecto-contagiosos. O curral não servia mais ao gado, mas servia aos empregados”, relatou o auditor fiscal Raimundo Barbosa da Silva, que liderou a operação na fazenda.

De acordo com ele, as provas recolhidas na fazenda são coerentes com o relato de tortura feito pelo trabalhador fugitivo, cujo nome permanece em sigilo. Os trabalhadores resgatados confirmaram que ele deixou o alojamento para ir reclamar dos salários e nunca mais apareceu. Além disso, informaram que nessa época não havia cicatrizes em seu corpo.

Nenhum dos 35 libertados em Paragominas tinha carteira assinada. A maior parte deles havia chegado em dezembro para fazer a limpeza do pasto para o gado, mas ainda não havia recebido salário. Em uma cantina mantida pela fazenda, eram vendidos fumo, sabonetes e equipamentos de proteção individual que, pela lei, devem ser fornecidos gratuitamente pelo empregador. Todo o gasto dos trabalhadores estava anotado em um caderno.

“Como não havia pagamento de salário, ainda não havia desconto [no salário]. Mas, pela nossa experiência, sabemos que essas anotações seriam usadas para cobrar do trabalhador”, explicou o auditor.

A rescisão do contrato com os peões custou R$ 45 mil ao fazendeiro Gilberto Andrade. De acordo com o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Francisco Cruz, que acompanhou a fiscalização, o órgão ajuizará Ação Civil Pública para pedir indenização por danos morais coletivos. Além disso, o fazendeiro também poderá responder na Justiça comum por outros crimes, caso seja comprovado que participou da tortura contada pelo trabalhador.

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