Planos econômicos

Não há direito adquirido em relação a regime legal monetário

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19 de fevereiro de 2008, 18h10

A recente decisão proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 608-8 se reveste da maior importância pelos reflexos que terá na jurisprudência dos demais tribunais, pacificando definitivamente a matéria litigiosa decorrente dos planos econômicos, que congestionou os tribunais durante mais de 15 anos.

O acórdão se refere ao Plano Collor II e considera constitucionais as normas legais que estabeleceram o fator de deflação, do mesmo modo que anteriormente o Supremo Tribunal Federal já tinha adotado o mesmo princípio em relação ao Plano Collor I, na Súmula 725. Deve ser lembrado que também o plenário da Corte Suprema reconheceu a legitimidade da aplicação da tablita em casos anteriores, como o Plano Bresser (RE 141.190).

Na realidade, em todas essas decisões ficou prevalecendo o entendimento de acordo com o qual não há direito adquirido em relação ao regime legal monetário, cujas normas são aplicáveis de imediato, ressalvando-se os casos de falta de razoabilidade ou de proporcionalidade dos textos legislativos. Esta última ressalva tem sido feita pelo ministro Gilmar Mendes, tendo, por outro lado, o ministro Marco Aurélio invocado o princípio da vedação da retroatividade mínima e o ministro Carlos Britto a proibição de medidas que importem em retrocesso social. O tribunal consolidou, pois, a sua posição, não se tendo considerado os planos econômicos como contrários à proporcionalidade e razoabilidade.

Algumas distinções que foram feitas no passado parecem ultrapassadas. Assim, discutia-se a mudança de indexador da correção monetária, sem que houvesse mudança de moeda, devia ser considerada como decorrente de lei de direito monetário ou poderia ser examinada como simples situação contratual, ensejando a manutenção da incidência do direito anterior, ou seja, a ultra-atividade do texto legal já revogado que continuaria a ser aplicado após a alteração do mesmo. Essa visão, mais acadêmica do que realista, não mais prevalece, reconhecendo-se que a mutação de indexador incide de imediato, inclusive em relação aos contratos firmados anteriormente.

Por outro lado, admitiu-se, no passado, uma distinção entre o regime dos contratos, sobre os quais incidiria desde logo a tablita, e o dos títulos de crédito, no tocante aos quais se mantinha a aplicação da lei anterior. Essa diferenciação de regime legal, que não tem qualquer fundamento, desapareceu com a equiparação de ambas as situações, como se verifica pela ementa do acórdão da ADI 608.

Verificamos assim, que, identificando-se com a melhor doutrina nacional e estrangeira, a jurisprudência do STF admite a soberania monetária do Estado, sem a qual o governo não teria condições de fazer a política monetária e de garantir a estabilidade da moeda, que é uma das suas funções básicas. Poder-se-ia até dizer que, num país em desenvolvimento, o respeito à imutabilidade da legislação monetária anterior impediria o desenvolvimento nacional e, em certas circunstâncias, poderia condenar-nos a viver sempre num regime inflacionário. Mas, por outro lado, essa soberania não pode significar uma ditadura e deve ser exercida tendo em consideração os direitos individuais e o equilíbrio que deve ser mantido entre os interesse públicos e os do indivíduo e da sociedade, aplicando-se pois os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Mas outra causa de relevância do recente acórdão decorre do fato de ter sido proferido já na composição atual do STF, contando com a manifestação favorável da maioria absoluta dos ministros.

Há, pois, atualmente, um conjunto de decisões que não mais deixam dúvida quanto à constitucionalidade da tablita e dos planos econômicos em geral, que não enseja mais dúvidas, colocando-se a Suprema Corte numa posição distinta.

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