Lista de problemas

OAB diz que chefe do MP paulista tem de voltar para escola

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15 de fevereiro de 2008, 12h45

O Conselho Federal da OAB reagiu à manifestação do procurador-geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Pinho, que chamou de fascista a lista de inimigos da advocacia da seccional paulista da Ordem. “Se o procurador-geral pode dizer bobagens como essa, é porque o país vive a plenitude democrática — e a OAB tem tudo a ver com isso”, disparou o presidente nacional da entidade, Cezar Britto.

Na quarta-feira (13/2), durante ato de desagravo a três promotores acusados por advogados de invadir, ao lado de policias, um escritório de advocacia, em Piracicaba (SP), Rodrigo Pinho disse que a OAB atua de forma fascista ao organizar e divulgar uma lista de “inimigos dos advogados”. Para o procurador-geral de Justiça a lista é uma tentativa de intimidação ao Ministério Público. Foi a primeira vez que o MP paulista faz um ato de desagravo a membros da instituição. Os fatos que geraram o desagravo aconteceram em 2005.

Rodrigo Pinho e o presidente da seccional paulista Luiz Flávio Borges D’Urso se encontraram frente a frente em evento no Tribunal de Justiça Militar, em São Paulo, nesta sexta-feira (15/2). D’Urso falou primeiro e declarou publicamente o seu descontentamento e irritação com as declarações do procurador-geral. Por sua vez, Pinho disse que respeita a Ordem dos Advogados do Brasil, mas que a lista de desafetos foi uma criação “nos moldes da ditadura militar”.

Em nota oficial, o presidente da OAB nacional, Cezar Britto, lembrou das lutas da instituição desde o Estado Novo, passando pela ditadura de 64, contra a censura e o arbítrio e em prol da Anistia e das Diretas Já. E disse que Pinho mostra que “desconhece a história contemporânea de seu próprio país — e isso já o fragiliza para o exercício de função da magnitude da que exerce”.

O conselheiro federal da OAB por São Paulo Alberto Zacharias Toron afirmou que a lista é um mecanismo de defesa da classe, um cadastro de pessoas que desrespeitam e maltratam os advogados. “Fascista é o MP que apoiou a ditadura”, alfinetou.

Os nomes dos promotores desagravados pelo MP-SP — Ricardo José Gasques de Almeida Silvares, Fernando Pereira Vianna Neto e Turíbio Barros de Andrade — não constam da lista dos inimigos da Ordem disponível no site da OAB-SP, mas o Ministério Público garante que eles já estiveram lá. Na época da invasão ao escritório em Piracicaba, a OAB enviou ofício ao Conselho Nacional de Justiça e ao Conselho Nacional do Ministério Público pedindo providências em relação às acusações e a instauração de inquérito contra os promotores.

O presidente da seccional fluminense da OAB, Wadih Damous, também se manifestou sobre o episódio. Para ele, a declaração foi infeliz. “Taxar de fascista esse comportamento institucional da OAB de São Paulo é que pode ser considerado de fascista”, retrucou. Damous afirmou ainda que determinados membros do Ministério Público praticam “arbitrariedades e ilegalidades contra a advocacia, chancelam operações policiais, algumas delas ao arrepio da lei como os episódios de invasão de escritórios de advocacia”.

O desagravo

A sessão solene de desagravo foi proposta pelo procurador de Justiça José de Arruda Silveira Filho em favor dos promotores de Justiça do Gaerco (Grupo de Atuação Especial Regional para Prevenção e Repressão ao Crime Organizado) de Campinas Ricardo Gasques e Fernando Pereira Vianna Neto e ao promotor de Justiça de Minas Gerais Turíbio Barros de Andrade.

Pinho destacou que a atuação dos Grupos de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado em São Paulo demonstra o acerto do modelo de ação. “Pessoas da sociedade que não costumavam freqüentar o banco dos réus passaram a fazê-lo, e isso incomoda a muitos.” E observou que o Ministério Público “sabe punir erros eventualmente ocorridos, mas também sabe prestigiar os colegas que se sobressaem no trabalho”.

Leia a nota de Cezar Britto

Ao chamar a OAB de “instituição que atua de forma fascista”, o procurador-geral de São Paulo mostrou, acima de tudo, que desconhece a história contemporânea de seu próprio país — e isso já o fragiliza para o exercício de função da magnitude da que exerce.

Se hoje ele pode dizer bobagens como essa, é porque o país vive a plenitude democrática — e a OAB tem tudo a ver com isso. Basta consultar os compêndios escolares.

A OAB é a instituição que mais se notabilizou, ao longo dos últimos 78 anos, na luta contra sucessivos regimes fascistas que infelicitaram este país.

Estava na linha de frente contra a ditadura do Estado Novo (1937-1945), assim como foi a voz da sociedade civil na luta contra o regime militar pós-64, denunciando tortura a presos políticos e lutando pela redemocratização do país.

Diretas já, Constituinte, fim da censura — em cada uma dessas lutas cívicas, a OAB esteve presente e correu todos os riscos. A ela associam-se nomes como Sobral Pinto, Raimundo Faoro, Evandro Lins e Silva, Barbosa Lima Sobrinho, entre outros que hoje pertencem à História — disciplina que o procurador-geral parece não ter estudado muito.

Se o procurador-geral se sente agravado por algum ato da OAB, dispõe da instância judiciária para as devidas reclamações — direito pelo qual a OAB lutou, durante décadas, ao enfrentar regimes fascistas. Justiça e insulto são coisas incompatíveis — e isso também se aprende na escola.

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