Ordem repetida

Salvatore Cacciola tenta revogar um dos mandados de prisão

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11 de fevereiro de 2008, 19h24

O ex-banqueiro Salvatore Cacciola está pedindo ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região que revogue um dos mandados de prisão contra ele. Cacciola pediu Habeas Corpus contra a prisão determinada pelo juiz da 2ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, Alexandre Liboneti de Abreu.

No pedido, o advogado de Cacciola, Carlos Ely Eluf, alega que o ex-banqueiro está sofrendo constrangimento ilegal. Segundo ele, a ordem de prender caracteriza execução provisória da pena o que, segundo o defensor, não está sendo admitido pelos tribunais brasileiros.

O ex-banqueiro está preso em Mônaco desde 15 de setembro do ano passado. Segundo Eluf, a ordem de prender partiu da 6ªVara Criminal do Rio, que já condenou Cacciola a 13 anos de prisão por crimes contra o sistema financeiro. O advogado explica que, mesmo sabendo desse decreto de prisão, a 2ª Vara Federal, onde tramita outro processo contra Cacciola, expediu novo mandado de prisão.

Para Eluf, esse decreto “é evasivo e sem qualquer fundamentação fatídica ou legal”. Ele ressalta que Cacciola nunca esteve foragido. Partiu do Brasil para Itália e contou à Justiça brasileira seu paradeiro, diz o advogado. Eluf entende que não há qualquer motivo para que esse decreto de prisão seja mantido. Cacciola não ameaça a ordem social nem a ordem econômica, diz.

“Não é admissível interpretar o simples fato do paciente residir fora do distrito da suposta culpa como fundamento idôneo para, por si só, demandar a custódia cautelar”, diz a defesa de Cacciola. Para o advogado Carlos Eluf, o mandado de prisão contra o ex-banqueiro tem “motivação política”.

Banco Marka

Cacciola foi condenado a 13 anos de prisão pela 6ª Vara Criminal Federal do Rio, em 2005, por crimes contra o sistema financeiro, na desvalorização cambial de 1999. O caso aguarda julgamento no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio e Espírito Santo). O ex-dono do banco Marka foi detido em 15 de setembro, quando passeava por Montecarlo, em Mônaco.

Com muitas dívidas assumidas em dólar — quando o real sofreu uma maxidesvalorização e o Banco Central elevou o teto da cotação do Dólar de R$ 1,22 a R$ 1,32 — Cacciola teria pedido ajuda ao então presidente do Banco Central, Francisco Lopes, que vendeu dólares por um preço mais barato do que o do mercado. A operação teria causado prejuízo de R$ 1,5 bilhão aos cofres públicos.

Em outra acusação, o ex-dono do Banco Marka foi condenado por emprestar, em 1991, Cr$ 16 milhões (valor da época) ao amigo João Simões Affonso. O empréstimo foi pago ao próprio banqueiro, a sua mulher, ao pai e aos filhos. Esse tipo de transferência é vedado e punido, com reclusão de dois a seis anos e multa, pelo artigo 17 da Lei 7.492/86, que define os crimes contra o sistema financeiro nacional.


Leia o pedido de HC

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO, DOUTOR JOAQUIM ANTÔNIO CASTRO AGUIAR.

RÉU PRESO

O advogado CARLOS ELY ELUF, brasileiro, casado, inscrito na Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil sob o nº 23.437, com endereço profissional na Avenida São Valério, nº 73, Cidade Jardim, São Paulo, Capital, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 5º, incisos LXVIII, e 108, inciso I, alínea “d”, da Constituição Federal e artigos 647 e 648, inciso I, do Código de Processo Penal, impetrar

ORDEM DE HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR

em favor de SALVATORE ALBERTO CACCIOLA, brasileiro naturalizado, separado judicialmente, economista, contra ato do Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 2ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, Doutor Alexandre Libonati de Abreu, que determinou a expedição de mandado de prisão preventiva em desfavor do Paciente, nos autos do Processo nº 99.0047916-5, para garantia da aplicação da lei penal, bem como pelos relevantes fatos e motivos a seguir expostos.

Requer, ainda, seja oficiada a autoridade coatora para dar as respectivas informações e do processamento aguarda prosseguimento.

Por fim, requer a inclusão do nome deste subscritor, na contracapa destes autos, visando o recebimento de intimações, despachos e data para o julgamento deste writ, via Imprensa Oficial, pois, eventualmente, poder-se-á realizar a respectiva sustentação oral. Tal solicitação é perfeitamente cabível, garantindo, assim, a ampla defesa do Paciente.

RAZÕES DA IMPETRAÇÃO

Excelentíssimo Desembargador Federal Presidente,

Nobre Desembargador federal Relator,


Cultos Desembargadores Federais Julgadores,

Dignos Juízes Federais Convocados,

Douto Procurador Regional da República.

1. O Paciente está sofrendo flagrante constrangimento ilegal, estando recolhido ao cárcere no exterior (Principado de Mônaco), após o cumprimento, por parte da INTERPOL, no dia 15 de setembro de 2007, de mandado de prisão proveniente do MM. Juízo da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, que o expediu ordem de custódia do Paciente, para garantia da aplicação da lei penal até o fim da instrução processual naqueles autos. Arbitrariamente, sabendo da efetiva prisão do ora Paciente, a ilustre autoridade ora apontada coatora também decretou a prisão preventiva para garantia da aplicação da lei penal. Contra esta decisão monocrática, o Paciente procura amparo nesse Egrégio Tribunal Regional Federal.

PRELIMINARMENTE

I) Da Prioridade na tramitação do processo devido à idade do Paciente – Lei nº 10.741/2003.

2. Antes de passarmos à análise dos fatos que geraram este recurso, importante verificarmos prima facie a prioridade que deve ser dada na tramitação deste writ uma vez que o Paciente, possui idade superior a 60 (sessenta) anos, conforme documentação acostada, razão pela qual, requeremos lhe sejam outorgados os benefícios que o ESTATUTO DO IDOSO (Lei nº 10.741/2003) prevê em seu artigo 71, § 1º:

“Art. 71. É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer instância.

§ 1o O interessado na obtenção da prioridade a que alude este artigo, fazendo prova de sua idade, requererá o benefício à autoridade judiciária competente para decidir o feito, que determinará as providências a serem cumpridas, anotando-se essa circunstância em local visível nos autos do processo”.

3. Isto posto, requer este impetrante a Vossa Excelência, em sede de preliminar, que seja determinada a imediata aplicação do dispositivo legal supramencionado, inclusive anotando-se sua eficácia em local visível na contracapa destes autos processuais, por se tratar de feito em curso sob este abrigo legal, outorgando-se ainda, prioridade ao julgamento da vertente impetração.


DOS FATOS

4. O Paciente era gestor do Banco Marka e no ano de 1999, após uma crise financeira mundial causada por problemas ocorridos na Rússia, que gerou inúmeros prejuízos para a economia brasileira, o Banco Central do Brasil - BACEN teve que intervir naquela instituição para evitar estragos piores ou abalo no sistema de mercado.

5. O Banco Marka possuía à época patrimônio líquido aplicado em contratos de venda no mercado futuro de dólar suficiente para honrar seus compromissos, mas com a brusca desestabilização da economia e aumento avassalador do dólar norte-americano, em duas semanas, houve a necessidade de uma ajuda financeira por parte do BACEN em relação ao Banco gerido pelo Paciente.

6. Após a efetivação de tal ajuda, acusaram o Paciente, indevidamente, de se beneficiar de informações em tese privilegiadas junto ao Banco Central do Brasil, fato esse que não corresponde com a verdade, pois diga-se de passagem, o Banco gerido pelo Paciente sofreu abalo financeiro por apostar no real ao invés do dólar. Outrossim, informações privilegiadas beneficiam os vencedores e, no caso não foi o que ocorreu, pois se assim o fosse os investimentos em dólar norte-americano, e não na moeda corrente brasileira, beneficiariam o Banco Marka.

7. Alegou-se que houve prejuízos para os cofres públicos com tais transações, culminando com malsinada denúncia ministerial contra o Paciente e demais co-réus por gestão temerária de instituição financeira (crime genérico), peculato e tráfico de influência.

8. No ano de 2000 o Ministério Público Federal pediu a prisão preventiva do Paciente que, posteriormente, foi posto em liberdade por r. decisão dessa Corte Suprema. Ato contínuo, não havendo impedimento legal para o retorno do Paciente para a sua pátria natal e residência na Itália, já que é italiano, para lá retornou, tudo isso ocorrendo sem que naquela oportunidade sequer tivesse ocorrido denúncia ministerial contra o mesmo.

9. Outrossim, atendeu a todos os pedidos do Judiciário brasileiro, sendo ouvido sempre por Carta Rogatória endereçada à Itália onde sempre prestou esclarecimentos para os magistrados federais do Rio de Janeiro.

10. Passados cinco anos a MM. Juíza Federal da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, para conveniência da instrução processual (já encerrada naqueles autos), e subsidiariamente para a garantia da aplicação da lei, decretou a prisão preventiva do Paciente novamente isto ocorreu no ano de 2005.

11. Após a efetiva prisão do Paciente, a ilustre autoridade ora apontada coatora também decretou a prisão preventiva do Paciente para garantia da aplicação da lei penal brasileira (decisão esta ora combatida), arbitrariamente, pois sequer se encerrou a instrução criminal até o momento nos autos daquele processo.


12. Inconformado com tal decisão, o Paciente busca amparo nesse Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região, uma vez que está sofrendo grave constrangimento ilegal com a segregação de sua liberdade por mais tempo do que determina a legislação vigente do país.

DO DIREITO

I) Da inequívoca ausência de justa causa para a decretação e manutenção da prisão preventiva do paciente.

13. Analisando a decisão do Meritíssimo Juiz da 2ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, é clara a ausência dos requisitos legais necessários, previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal, para fundamentar aquela medida. Fere-se de forma basilar o princípio constitucional da presunção de inocência, consubstanciado no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal.

14. É cediço, nobres Desembargadores, que se exige concreta motivação para que seja decretada a prisão preventiva de qualquer indivíduo com base em fatos que efetivamente justifiquem a excepcionalidade da medida, atendendo-se aos termos do quanto determina o Estatuto Processual Penal brasileiro e a jurisprudência dominante. Isto jamais ocorreu no caso vertente, uma vez que o decreto de prisão preventiva foi demasiadamente evasivo e sem qualquer fundamentação fática ou legal.

15. Juízos de mera probabilidade, como é o caso dos autos, não podem servir de motivação à decretação da prisão preventiva, devendo, portanto, ser prontamente afastado por essa Egrégia Corte com a determinação de imediata expedição de alvará de soltura.

16. A propósito da necessidade de fundamentação da decisão que decreta a prisão preventiva, por sua precisão, há de ser trazida à colação a lição de Julio Fabbrini Mirabete[1]:

“Exige a lei que a autoridade judiciária, ao decretar ou denegar a prisão preventiva, esclareça em seu despacho se estão presentes os pressupostos da medida e qual o fundamento que o autoriza. Determina, aliás, a Constituição Federal, que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente (art. 5º, LXI). Trata-se de medida cautelar de privação de liberdade que exige uma exposição fundada em dados concretos que motivem sua adoção, não bastando que o magistrado se refira genericamente nos autos, ou transcreva simplesmente os dizeres da lei. Exige-se uma fundamentação que não diga respeito a meras suposições. Caso tal ocorra, haverá constrangimento ilegal, ensejador de pedido de Habeas Corpus (…)”.


17. Note-se, cultos Julgadores, que nos autos do processo originário, o Meritíssimo Juízo designou interrogatório do Paciente para dezembro do ano recém terminado (fls. 1074) e determinou sua citação por meio de Carta Rogatória expedida para a República da Itália (fls. 1380/1404).

18. Às fls. 1531/1532, o ilustre representante do Ministério Público Federal, com fundamento no artigo 312 do Código de Processo Penal, sob o argumento de aplicação da lei penal, requereu a prisão preventiva do Paciente, ora combatida.

19. Após analisar os autos, o culto Magistrado Federal Substituto, Doutor Rodolfo Kronemberg Hartmann, em acertada decisão, indeferiu o aludido pedido ministerial.

20. Ato contínuo o Parquet interpôs recurso, que culminou com a retratação formulada pelo nobre Juiz Federal, Doutor Alexandre Libonati de Abreu (que não foi o prolator da primeira decisão), autorizando a expedição do mandado de prisão requerido naquele momento. Desta decisão esta defesa já recorreu!

21. Sustenta o ilustre representante do Ministério Público Federal, ora apoiado pelo MM. Juiz Federal, Doutor Alexandre Libonati de Abreu (autoridade coatora), a necessidade da decretação de prisão preventiva do Paciente para que se garanta a aplicação da lei penal, conforme determina o artigo 312 do Código de Processo Penal.

22. O culto Juiz Federal, Doutor Rodolfo Kronemberg Hartmann, em brilhante decisão proferida anteriormente, reconheceu que:

“(…) Não obstante ser notório que o Acusado encontra-se preso em Mônaco, tal circunstância, por si só, não caracteriza fuga, como pretende o MPF. Data máxima vênia, não assiste razão ao MPF, ao menos por ora, eis que não constam elementos concretos nestes autos que comprovem a fuga do Acusado para furtar-se da aplicação da lei penal, em relação aos fatos a ele imputados na denúncia. Ao contrário, verifico que o Acusado forneceu endereço certo para ser citado e regularizou sua representação processual, conforme se depreende nas peças, respectivamente, acostadas às fls. 878/880 e 1050. Assim, este Juízo designou interrogatório do Acusado para dezembro do corrente ano (fl. 1074) e determinou sua citação pelo MLAT (fls. 1380/1404). Ante o exposto, indefiro o pedido de prisão preventiva formulado pelo Ministério Público Federal (…)”.

23. Analisemos a situação do Paciente e os fatos que acompanham o entendimento do digno Magistrado citado acima.


24. Como bem salientou em sua r. decisão o Meritíssimo Juiz, não existem provas nos autos que dêem suporte para a alegação de fuga do Paciente.

25. No entender de Francisco de Assis Toledo, ao comentar sobre o princípio da legalidade, aquele constitui “uma real limitação ao poder estatal de interferir na esfera das liberdades individuais”. Este deve atender a requisitos no plano fático, no sentido de assegurar a dignidade da pessoa humana e a preservação de valores de uma sociedade livre.

26. Na própria 2ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, de onde foi proferida a decisão ora guerreada, existe outro processo no qual o Paciente é testemunha de defesa de um dos acusados. Naquele processo, registrado sob o número 2000.51.01.512416-0, cuja presidência do feito é do próprio Meritíssimo Juiz Federal, Doutor Alexandre Libonati de Abreu, aguarda-se o retorno de Carta Rogatória expedida para a República da Itália com o fim específico de ouvir o Paciente em declarações (testemunha de defesa).

27. Este fato também é de conhecimento do Ministério Público Federal, que assim como o culto Magistrado possui o conhecimento de que a aludida Carta Rogatória foi cumprida. Ou seja, o endereço fornecido é certo e o Paciente prestou, efetivamente, declarações perante o Judiciário italiano (compareceu no ato processual).

28. Cai por terra, neste instante, a alegação de que o Paciente, Salvatore Alberto Cacciola, se esquiva da aplicação da lei brasileira!

29. Outro fato importante, Excelências, é que o Paciente é trabalhador, homem sabidamente exemplar pai de família, possui bons antecedentes, réu primário, possui residência fixa e não teve nenhum tipo de problemas judiciais desde o aparecimento do escândalo do Banco Marka.

30. Deixou o país após autorização da Egrégia Corte Suprema quando do julgamento do HC nº 80.288 e isto ocorreu anteriormente a qualquer denúncia ministerial. Portanto, não é foragido! Simplesmente retornou para a sua pátria de origem, pois não existia ordem de prisão (suspensa por aquela r. decisão) e muito menos denúncia ministerial quando a fase era de mero inquérito policial quando ocorreram estes fatos descritos na peça acusatória.

31. Logo, não havia impedimento legal para sua viagem e permanência em seu País natal, no caso a Itália.

32. Em relação à situação que ora se apresenta, em recente parecer outorgado para alguns periódicos da imprensa nacional, em setembro de 2007, o culto Ministro Marco Aurélio, do Egrégio Supremo Tribunal Federal, com seu notável senso de juridicidade e independência que norteiam sua ilibada pessoa, manifestou-se no seguinte sentido:


“Enquanto a culpa não está formada, mediante um título do qual não caiba mais recurso, o acusado tem o direito – que eu aponto como natural – que é o direito de fugir para evitar uma glosa que seria preciptada”.

33. Há nessas circunstâncias, no entender do Ministro, não é fato suficiente para a manutenção de uma prisão preventiva:

“É preciso um dado concreto quanto à periculosidade, quanto à tentativa de influenciar para obstaculizar a aplicação da lei penal, mas sempre com um dado concreto”.

34. Nada mais certo, justo e coerente que este corajoso e irretocável parecer daquele culto Ministro, atuante naquela Egrégia Corte.

35. Quando o Paciente deixou o país em 1999, o caso em tela sequer possuía denúncia ministerial. Ademais, é público e notório que este Paciente, como todos sabem, uma vez que essa notícia foi alardeada por todos os órgãos de imprensa, inclusive pela Rede Globo de Televisão, é domiciliado atualmente na Itália, mais precisamente no endereço: Hotel 47 – Forty Seven – Albergo in Roma – Via Petroselli n° 47, – 00186 – Roma, razão pela qual não é crível que os eméritos representantes ministeriais, diante do vasto conhecimento deste fato, desconheçam que o Paciente há anos resida na Itália.

36. O que pretende buscar neste caso o Ministério Público Federal? A inadmissível execução provisória da pena, ou seja, cumprimento desta antes mesmo da decisão final dos Egrégios Tribunais?

37. O culto Ministro Marco Aurélio, nas mesmas matérias jornalísticas, rechaça com veemência tal possibilidade:

“Mas eu mesmo sustento que a sentença condenatória ainda sujeita a reforma não enseja a execução da pena, a prisão”.

38. Este corajoso e brilhante posicionamento, do culto Ministro Marco Aurélio, acompanha o que determina a Carta Magna em relação ao princípio constitucional da presunção de inocência, que está sendo violado as escancaras em relação ao ora Paciente neste caso.

39. O artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal determina que:

ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.


40. Por este princípio não se admite a manutenção de alguém no cárcere sem que tenham se esgotado todos os recursos cabíveis.

41. O artigo 11, item 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem garante que todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

42. Importante trazermos à colação a esclarecedora decisão do culto Ministro Celso de Mello, do Egrégio Supremo Tribunal Federal, acerca do tema:

“A submissão de uma pessoa à jurisdição penal do Estado coloca em evidência a relação de polaridade conflitante que se estabelece entre a pretensão punitiva do Poder Público e o resguardo à intangibilidade do jus libertatis titularizado pelo réu. A persecução penal rege-se, enquanto atividade estatal juridicamente vinculada, por padrões normativos, que, consagrados pela Constituição e pelas leis, traduzem limitações significativas ao poder do Estado. Por isso mesmo, o processo penal só pode ser concebido – e assim deve ser visto – como instrumento de salvaguarda da liberdade do réu. O processo penal condenatório não é um instrumento de arbítrio do Estado. Ele representa, antes, um poderoso meio de contenção e de delimitação dos poderes de que dispõem os órgãos incumbidos da persecução penal. Ao delinear um círculo de proteção em torno da pessoa do réu – que jamais se presume culpado -, até que sobrevenha irrecorrível sentença que, condicionada por parâmetros ético-jurídicos, impõe ao órgão acusador o ônus integral da prova, ao mesmo tempo em que faculta ao acusado que jamais necessita demonstrar a sua inocência o direito de defender-se e de questionar, criticamente, sob a égide do contraditório, todos os elementos probatórios produzidos pelo MP. A própria exigência de processo judicial representa poderoso fator de inibição do arbítrio estatal e de restrição ao poder de coersão do Estado. A cláusula nulla poena sine judicio exprime, no plano do processo penal condenatório, a fórmula de salvaguarda da liberdade individual”. (STF – 1ª T. - HC 73.338/RJ – Rel. Min. Celso de Mello – RTJ 161/264).

43. O Paciente sequer foi citado neste caso, nobres Julgadores! Logo, não possui condenação definitiva! Não fugiu do Brasil! Reside na Itália (local do seu nascimento), e quando deixou este país, pois não havia impedimento legal algum para isso, forneceu às autoridades judiciais o endereço onde reside e compareceu em todos os atos processuais em que foi solicitado por Carta Rogatória.

44. Em recente decisão a Egrégia Corte Suprema, por meio de sua Colenda 2ª Turma, à unanimidade, quando do julgamento do habeas 84.029/SP, em 26 de junho do corrente ano, acompanhando o culto Ministro Relator, Gilmar Mendes (atualmente Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal) na seguinte decisão que se assemelha em muito com o presente caso:


“(...) o Plenário deste Tribunal discutiu amplamente a possibilidade de reconhecimento do direito de recorrer em liberdade desde o início do julgamento da RCL nº 2.391/PR, Rel. Min. Marco Aurélio. (...) o entendimento que estava a se firmar, inclusive com o meu voto, pressupunha que eventual custódia cautelar, após a sentença condenatória e sem o trânsito em julgado, somente poderia ser implementada se devidamente fundamentada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. Também considero que não se pode conceber como compatível com o princípio constitucional da não-culpabilidade qualquer antecipação de cumprimento da pena. (...) o cerceamento preventivo da liberdade não pode constituir um castigo àquele ou àquela que sequer possui uma condenação definitiva contra si. (...) uma execução antecipada em matéria penal configuraria grave atentado contra a própria idéia de dignidade da pessoa humana. Caso se entenda, como enfaticamente destacam a doutrina e a jurisprudência, que o princípio da dignidade humana não permite que o ser humano se convole em objeto da ação estatal, não há como compatibilizar semelhante idéia com a execução penal antecipada. (...) o recolhimento à prisão, quando não há uma definitiva sentença condenatória, determinada por lei, sem qualquer necessidade de fundamentação, tal como disposto no art. 9º, da Lei nº 9.304, de 1995, afronta, a um só tempo, os postulados da presunção de inocência, da dignidade humana e da proporcionalidade. Justamente porque não se trata de uma custódia cautelar, tal como prevista no art. 312, do Código de Processo Penal, que pode efetivar-se a qualquer tempo, desde que presentes os motivos dela ensejadores, o recolhimento à prisão por força legal, tal como previsto para ações praticadas por organizações criminosas, afigura-se-me uma antecipação da pena não autorizada pelo texto constitucional. (...) o recolhimento à prisão quando ainda cabe recurso da sentença ou acórdão condenatório há que ser embasado em decisão judicial devidamente fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal”. (STF – HC 84.029/SP – DJ 06.09.2007 – Min. Rel. Gilmar Mendes) (grifo nosso)

45. Na opinião do Ministro Cezar Peluso, quando expressou seu voto na mesma Reclamação nº 2.391/PR:

Além de infringir princípios básicos de justiça – porque uma eventual reforma da decisão, em que o réu tenha sido preso, não encontra nenhuma medida no campo jurídico capaz de restaurar o estado anterior, pois se trata de privação de liberdade, e sequer a indenização de ordem pecuniária, prevista na Constituição, por erro na prisão compensa a perda da liberdade, que é o bem supremo do cidadão – é absolutamente incompatível – e aqui invoco o princípio da proporcionalidade – com o que sucede na área civil, onde uma sentença de caráter condenatório que sirva de título executivo sem o seu trânsito em julgado, não acarreta execução definitiva, por resguardo de conseqüências de ordem puramente patrimonial que podem ser revertidas. Noutras palavras: teríamos, num caso em que está em jogo a liberdade física, admitido uma execução provisória de sentença condenatória, quando o sistema não admite na área civil”. (STF – RCL nº 2.391/PR – Rel. Min. Marco Aurélio, voto proferido pelo Ministro Cezar Peluso, na sessão da Primeira Turma de 09.09.2003).

46. Como podemos verificar, nobres Julgadores, as r. decisões trazidas à colação se encaixam perfeitamente no caso do Paciente. Atentem-se que o ilustre Magistrado autor do despacho ora guerreado não especificou quaisquer elementos que seriam suficientes para autorizar a constrição provisória da liberdade, como determinam os artigos 312 do Código de Processo Penal e 93, inciso IX, da Carta Política de 1988.


47. Aliás, ao contrário, acatando um pedido ministerial sem fundamentação alguma, determinou a prisão do Recorrente!

48. A aludida decisão que determinou a custódia preventiva do Paciente é nula de pleno direito, já que viola claramente o disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.

49. O que faz o Paciente para agredir a ordem pública ou a ordem econômica? Impede ele, de que maneira, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal?

50. O saudoso professor Mirabete[2] preleciona que:

”O Juiz deve medir e pesar os elementos colhidos para verificar se são suficientes para a decretação da prisão preventiva, que é medida de exceção quanto ao sistema de liberdades individuais”.

51. Primeiramente, senhores Desembargadores, no que se refere aos pressupostos atinentes à ordem pública e econômica, esclareça-se que a simples repercussão do fato, por maior que seja, não se constitui legalmente em motivo suficiente para a decretação da custódia, vez que, se torna justificável apenas se o acusado é dotado de periculosidade, na perseverança da prática delituosa, o que, absolutamente, não se aplica ao caso dos autos. O Paciente é, comprovadamente, pessoa de conduta pacífica, com domicílio fixo e certo, sem qualquer antecedente criminal, honesto trabalhador, pai de família.

52. Logo, não resta caracterizado o requisito ensejador de decretação e manutenção de prisão preventiva em comento, pois o Paciente não oferece e jamais ofereceu perigo à ordem pública. Ademais:

“Ordem Pública entende-se a situação e o Estado de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas precípuas atribuições e os cidadãos as respeitam e acatam”. (JCAT 72/494).

53. Ensina Fernando da Costa Tourinho Filho[3] que a ordem pública:


“é a paz, a tranqüilidade do meio social. Assim, se o indiciado estiver cometendo novas infrações sem que se consiga surpreendê-lo em estado de flagrância, se estiver fazendo apologia de crime, ou incitando ao crime, reunindo em quadrilha ou bando, haverá perturbação da ordem pública”.

54. Ora, no caso concreto, não há nos autos, nem em qualquer outra parte, nenhum elemento que possa indicar que em liberdade, o Paciente praticará qualquer ato que implique em risco para a paz social, ou que gere a intranqüilidade do meio social, nem que ele irá delinqüir, praticando qualquer crime, da mesma natureza daqueles pelos quais já se encontra denunciado, tampouco a digna autoridade coatora faz menção a isso.

55. Em relação à ordem econômica, a liberdade do Paciente não prejudicará a livre concorrência ou a livre iniciativa, tampouco dominará mercado relevante de bens ou serviços. Logo, eventual justificativa neste sentido também deverá ser afastada!

56. No que diz respeito a outro pressuposto que viabilizaria a decretação da prisão preventiva, qual seja, a conveniência da instrução criminal, também não restou devidamente demonstrada, sequer em tese, sua existência pelo Meritíssimo Juiz Federal da 2ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, em sua equivocada decisão.

57. Em nenhum momento o Paciente ameaçou, sequer entrou em contato com testemunhas, ou as afugentou, não esboçou qualquer reação no sentido de ocultar ou eliminar provas documentais, até porque, sequer foi citado nos autos originais.

58. Como já salientado, Excelências, o Paciente está sendo privado de sua liberdade antes da sentença condenatória irrecorrível, como assegura o preceito constitucional! Está cumprindo pena sem que tenha sido devidamente julgado!

59. O artigo 11, item 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem garante que todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

60. O culto Magistrado Substituto, em brilhante decisão já trazida à colação, demonstrou claramente que inexistem fatos concretos que autorizem a custódia preventiva do Paciente. Logo, imperioso se faz respeitar os princípios constitucionais do devido processo legal e o da presunção de inocência.

61. Por derradeiro, cabe discorrer sobre o pressuposto da decretação de prisão preventiva pela possibilidade de aplicação da lei penal.


62. Não é admissível, cultos Julgadores, interpretar o simples fato do Paciente residir fora do distrito da suposta culpa, como fundamento idôneo para, por si só, demandar a custódia cautelar do mesmo antes do trânsito em julgado de eventual sentença penal condenatória.

63. Nesse mesmo sentido já se posicionou o Egrégio Supremo Tribunal no RHC nº 89.550/SP, 2ª Turma, unânime, DJ 27.04.2004, de relatoria do Ministro Eros Grau; e no RHC nº 86.822/MS, julgado em 06.02.2007, e de relatoria do Ministro Gilmar Mendes.

64. Quando do julgamento do HC nº 84.029/SP, citado acima, o ilustre Ministro Relator, Gilmar Mendes, votou pela concessão da ordem para que fosse assegurado ao Paciente o direito (constitucional) de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado definitivo da condenação criminal.

65. O Ministro Relator foi acompanhado, ainda, pelos nobres Ministros Eros Grau e Joaquim Barbosa, que assim se manifestaram, respectivamente:

Com relação à questão da execução antecipada da pena, expressão na qual as palavras dizem tudo (porque, se é antecipada, é porque é fora de lugar e de hora), quero apenas lembrar que temos um HC 84.078 afetado ao Pleno já há muitos meses. E aqui mesmo, na Turma, recentemente, quero fazer menção ao RHC 89.550, do qual fui relator”. (STF – HC nº 84.029/SP – DJ 06.09.2007 – Min. Rel. Gilmar Mendesvoto proferido pelo Ministro Eros Grau)

“Senhor Presidente, acompanho o eminente Relator sobre dois fundamentos: o primeiro, a ausência de cautelaridade; o segundo, em razão da circunstância de que o Ministério Público quedou inerte; só a defesa recorreu e há o risco de configurar-se a reformatio in pejus”. (STF – HC nº 84.029/SP – DJ 06.09.2007 – Min. Rel. Gilmar Mendesvoto proferido pelo Ministro Joaquim Barbosa) (destaque do eminente Ministro que proferiu o voto)

66. Aliás, como já dito, o simples fato do Paciente residir noutro País, sua pátria natal, (fora do distrito da culpa) não é aceito como fundamentação para a ilegal manutenção do pedido de prisão preventiva. Esse próprio Tribunal Regional Federal da 2ª Região, já decidiu neste sentido:


O fato de não residir no distrito da culpa por si só não indica a intenção do paciente de se subtrair aos efeitos de eventual condenação, sendo esse motivo insuficiente para a decretação da prisão preventiva”. (TRF 2ª Região; RT 761/726)

67. O extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, hoje seção criminal do Egrégio Tribunal de Justiça Paulista, entende o seguinte em relação a réu com residência no exterior:

Ainda que o agente possua endereços fora do País, esta circunstância, por si só, não autoriza a decretação de sua prisão preventiva, ao argumento de conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação futura da Lei Penal, vez que, se assim fosse, todo e qualquer cidadão que more no estrangeiro teria, na hipótese de responder a processo-crime no Brasil, que ser preso cautelarmente, devendo existir, em conjugação com este fato, outros elementos que permitam o prognóstico de que o réu vai realmente frustrar a aplicação da Lei Substantiva”. (TACRIM-SP; RJDTACRIM 31/388) (grifo nosso)

68. A liberdade, nobres Julgadores, é o direito mais sagrado que possui o ser humano.

69. O direito natural de fuga (que não é o caso do Paciente, já que este não fugiu) vem sendo admitido pelos nossos Tribunais. Aliás, o instinto humano é de liberdade e a presunção juris tantum é de procura incessante por essa.

70. No caso do Paciente, assim como nos casos de “PC Farias”, “Jorgina de Freitas”, entre outros que buscavam o abrigo internacional (no caso do Paciente o retorno para sua residência) isso fica evidente; em relação à sua propalada fuga e esta atitude não pode e não deve ser interpretada de outra forma a não ser como a de preservação do instinto natural das pessoas.

71. A Suprema Corte assim decidiu quando do julgamento do habeas corpus 73.491/PR:

Se de um lado a fuga não pode ser considerada como fator negativo, tendo em vista consubstanciar direito natural, de outro não menos correto é que a prática delituosa a partir dela torna incontroversa a falta da indispensável ressocialização”. (STF – HC 73.491/PR – Rel. Min. Marco Aurélio – 2ª T. – v.u. - DJ de 07.06.1996 – p. 19.827)


72. O ilustre Magistrado, em despacho ora guerrado utiliza como pilar de sustentação de seus argumentos permissivos para a decretação de prisão do Recorrente a seguinte decisão Superior:

“(...) seguindo orientação jurisprudencial do Colendo Superior Tribunal de Justiça, restando comprovado nos autos que o paciente se evadiu para escapar à aplicação da lei penal, ainda que devido a condenação definitiva imposta em outro processo, motivo há, suficiente, para concluir que resta ameaçada a aplicação da lei penal, em caso de nova condenação na ação penal que ora lhe é movida. (HC 39254)”. (grifos nossos)

73. Ora, condenação definitiva neste caso não existe (o Paciente sequer foi citado). Condenação definitiva em outro processo?

74. Nos processos que se encontram em trâmite no Poder Judiciário Criminal deste país, em nenhum deles existe sentença penal condenatória definitiva! O processo da 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro possui sentença condenatória sim, porém o recurso de apelação tempestivo apresentado pela defesa, de relatoria do Excelentíssimo Juiz Federal Convocado nessa Corte, Doutor Guilherme Calmon Nogueira da Gama, sequer foi julgado!

75. Logo, impõe-se o afastamento de mais esta premissa utilizada.

76. Do mesmo modo não se admite a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, as jurisprudências das nossas Cortes Superiores não discrepam desse entendimento. Condena-se e não se permitem antecipações ao cumprimento das penas, conforme se pretende impor ao Paciente, que não possui sentença condenatória definitiva, caso se ratifique a determinação de sua custódia preventiva. Vejamos:

HABEAS CORPUS: Questão pendente de decisão do Plenário, no qual já conta com diversos votos favoráveis à tese da impetração: inadmissibilidade da execução provisória da pena privativa de liberdade. Deferimento da liminar da liberdade provisória do paciente”. (STF – HC QO nº 83584 - deferido liminarmente, v.u. – 1ª T. – j. 16.12.2003 – Min. Sepúlveda Pertence)

PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 157, § 2º I E II, DO CÓDIGO PENAL. EXECUÇÃO DA PENA. ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO-ESGOTAMENTO DAINSTÂNCIA ORDINÁRIA. REGIME PRISIONAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS TOTALMENTE FAVORÁVEIS. SEMI-ABERTO. I – Somente após o esgotamento da instância ordinária é permitida a execução provisória da pena, haja vista que os recursos de natureza extraordinária não possuem efeito suspensivo. (Precedentes do STF e desta Corte)”. (STJ – HC 79635 / SP; 5ª T.; DJ 10.09.2007, p. 283; v.u.; Ministro FELIX FISCHER)


“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA QUE GARANTIU AO RÉU O DIREITO DE AGUARDAR O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO EM LIBERDADE. AUSÊNCIA DE RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL IMINENTE RECONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA.

1. A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, revendo jurisprudência anterior, alterou seu entendimento, concluindo que, tendo a sentença, expressamente, subordinado o início da execução ao seu trânsito em julgado e não recorrendo o Ministério Público, apenas a defesa, a expedição de mandado de prisão pelo Tribunal a quo configura reformatio in pejus.

2. Ordem concedida para reconhecer o direito do paciente de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação”. (STJ – HC 75696 / MG; V.U.; 5ª T.; DJ 21.05.2007 p. 604; Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA)

“PENAL. HABEAS CORPUS. NÃO-EXAURIMENTO DAS VIAS RECURSAIS ORDINÁRIAS. PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EXISTENTE. ORDEM CONCEDIDA.

1. A pendência do julgamento de embargos infringentes, opostos com o objetivo de fazer prevalecer voto vencido confirmatório da absolvição, obsta a execução provisória da pena. Precedentes.

2. Ordem concedida para que os pacientes aguardem o exaurimento das vias recursais ordinárias em liberdade”. (STJ – HC 63540 / RJ; v.u.; 5ª T.; DJ 26.02.2007 p. 624; Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA)

77. Como se verifica nas jurisprudências acima elencadas, a custódia do Paciente é absoluta exceção.

78. É curial a inexistência de sentença condenatória definitiva para o Paciente, que justifique a manutenção de sua prisão.

79. Diante dos esclarecedores e incontestes fatos, conclui-se que a decretação de prisão preventiva do Paciente, bem como sua manutenção, constitui manifesto equívoco, tendo sido, inclusive, arbitrária e indevida, vez que está demonstrado e comprovado neste writ que nenhum dos pressupostos de admissibilidade previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal foram alcançados.


80. Ademais, a prisão preventiva, em nossa sistemática processual penal, somente é admitida em casos excepcionalíssimos, como bem asseveraram os nobres Ministros da Egrégia Corte Suprema em decisão concessiva de medida liminar em habeas corpus. Vejamos:

O instituto da prisão preventiva coloca-se no campo da absoluta excepcionalidade. O certo, o constitucional, é aguardar-se a formação da culpa após haver o acusado exercido, em toda a plenitude, o direito de defesa. Impossível é esquecer que ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença condenatória’ (inc. LXVII do art. 5º da CF). É essa óptica que deve estar presente toda vez que enfrentado requerimento do Ministério Público visando a prender-se este ou aquele acusado. (…) A prova material dos crimes descritos na denúncia e indícios suficientes de autoria não são capazes, por si só, de levarem à extravagante prisão preventiva, sob pena de ter-se, a realidade, autêntica execução de pena ainda não imposta. O artigo 312 do CPP exige mais, e o faz remetendo sempre à consideração das circunstâncias do caso concreto que se possa partir para elaboração de peça judicial que sirva a todo e qualquer processo (…)”. (STF – HC – Rel. Marco Aurélio – j. 14/06/2000 – Revista Síntese 3/141)

“A privação cautelar da liberdade individual – por revestir-se de caráter excepcional – somente deve ser aplicada em situação de absoluta necessidade. A prisão preventiva, para legitimar-se em face do sistema jurídico, impõe a satisfação dos pressupostos a que se refere o artigo 312 do CPP (prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria) – que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras de imprescindibilidade da adoção, pelo Estado, dessa extraordinária medida cautelar, de privação da liberdade indicado ou do Réu. Precedentes. A prisão preventiva não pode – e não deve – ser utilizada, pelo poder público, como instrumento de punição antecipada daquela a quem se imputou a prática do delito, pois o sistema jurídico brasileiro, incompatível, com punições sem processo e inconciliável com condenação sem defesa prévia”. (STF – 1ª T. – HC 74.666 – Rel. Celso de Mello – j. 26.11.1996 – DJU 11.10.02, p. 34)

81. No mesmo sentido, assim se manifestou o nobre Ministro do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, Doutor Anselmo Santiago:

“Processual Penal – Recurso em Habeas Corpus Prisão Preventiva – ausência de fundamentação. Decreto de prisão preventiva que não indica as razões pelas quais se faz necessária a medida, torna ilegal e enseja concessão do Habeas Corpus sem prejuízo da correspondente ação penal. Recurso provido”. (STJ – RHC 3258-8 – Rel. Anselmo Santiago).


82. Excelências, o Paciente sequer foi citado até o presente momento. Se o Estado sequer foi capaz de comprovar sua efetiva culpabilidade, inaceitável o arbítrio ora imposto!

83. Onde estão as provas concretas produzidas por meio do devido processo legal, conforme determina a Carta Política de 1988 e acobertadas pela ampla defesa?

84. Se a ação ainda não se iniciou, temos que tais provas são inexistentes! Logo, a decretação de prisão do Paciente, bem como a sua manutenção no ambiente nefasto do cárcere são inadmissíveis!

85. A ilustre autoridade coatora, senhores Julgadores, está prejulgando o feito!

86. Para o eminente Desembargador Paranaense, Doutor Oto Luiz Spomholz:

Em um Estado Democrático de Direito não se admite a prisão preventiva como meio de punição, pois prevalece o princípio da liberdade (CF, art. 5º, LXI e LXV), compatível com o princípio constitucional da presunção de inocência. A prisão preventiva tem natureza processual e não deve ser confundida com prisão – pena”. (TJPR – 1ª Câmara Criminal – j. 28/02/02 – Revista Síntese 14/67)

87. O Paciente está recolhido ao cárcere, no Principado de Mônaco, há mais de quatro meses! Intolerável e inaceitável, Excelências! Flagrante o excesso de prazo, como veremos a seguir.

88. Estabelece o artigo 8º da Lei nº 9.034/95, que o prazo para encerramento da instrução criminal será de 81 (oitenta e um) dias, quando o Paciente estiver preso, e de 120 (cento e vinte) dias, quando solto.

A) Do devido processo legal

89. Há que se verificar, Excelências, ab ovo, o flagrante desrespeito ao ordenamento processual pátrio e à Carta Política de 1988, com a equivocada decisão monocrática de decretação da prisão do Paciente.

90. Como é cediço, o devido processo legal (due process of law) constitui princípio que rege o Direito Processual pátrio.


91. Para que se busque a efetivação do direito, o que se consegue por intermédio do devido processo legal, é preciso aplicar as normas e os princípios consagrados no ordenamento jurídico aos fatos alegados. Logo, necessário se faz determinar com precisão os eventos relevantes à causa, na busca de uma melhor avaliação da forma e extensão que estes produzem no mundo jurídico em relação às partes.

92. Tudo isso se faz para a busca constante da verdade real.

93. O compromisso do julgador é com a lei e com a Justiça. Nessa busca do equilíbrio entre as diversas correntes de pensamento, em que vários princípios constitucionais são simultaneamente invocados, buscará o magistrado descobrir a verdade real, aplicando o direito ao caso sub judice, como a sociedade efetivamente aspira a que o faça, usando dos poderes e da autoridade que lhe são outorgados pelo Estado.

94. No caso em tela, verifica-se que o Paciente está preso preventivamente a mais tempo do que determina a lei. Há o expresso descumprimento do prazo legal para o encerramento da instrução criminal (que sequer se iniciou), caracterizando, assim, o constrangimento ilegal que fundamenta nosso pedido.

95. Esta defesa não provocou o excesso de prazo que está evidente. Não requereu qualquer adiamento ou prorrogação de atos processuais. Se não houve retardamento por parte da defesa, este se deu por culpa única e exclusiva do poder estatal.

96. A jurisprudência é pacífica em relação ao tema:

Instrução criminal. Excesso de prazo sem qualquer contribuição do Paciente. Permanência do mesmo no cárcere. Impossibilidade. Se não houver contribuição por parte do Paciente, não podendo ser-lhe atribuída qualquer culpa pela demora na tramitação do processo, é impossível mantê-lo encarcerado, pelo excesso do prazo na formação da culpa. (TACRIM-SP – HC 268.434 – j. 07/12/94 – Rel. Vico Mañas – 9ª Câmara)

Habeas Corpus. Processual Penal. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal. O prazo para encerramento da instrução criminal conta-se separadamente. Precedentes. A demora na formação da culpa, excedendo os 81 dias, sem motivo dado pela defesa, caracteriza constrangimento ilegal. Habeas deferido”. (STF – JSTF 268/26)

97. Aliás, esta “culpa” sequer foi comprovada pelos representantes do Parquet Federal. Apenas e tão somente possuem indícios de que o Paciente teria sido o autor dos fatos, mas provas concretas ainda não foram formalmente apresentadas.


98. Outrossim, essa permanência injustificada no cárcere não pode ser atribuída à eventual complexidade da matéria, pelo simples fato do Paciente estar preso noutro país ou por lá residir (já que compareceu em todos os atos quando solicitado por Carta Rogatória). Nada justifica o excesso caracterizado!

99. Não se observou, até o momento, neste caso, o que determina a Carta Política de 1988 em seu artigo 5º, inciso LIV:

Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

100. A partir do momento em que sequer citou-se o Paciente, ou seja, nem se iniciou a instrução criminal, a ilustre autoridade coatora a quo jamais poderia fundamentar a necessidade da permanência do mandado de prisão contra o Paciente, expedido outrora para garantia da aplicação da lei e conveniência da instrução processual!

101. De outra sorte, sepultaram o quanto determinado na Constituição Federal, bem como na Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 8º: Toda pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei).

102. Conforme já dito anteriormente, o Paciente, em total boa-fé para com a Justiça, colocou-se à disposição do juízo por intermédio do seu defensor (que, informou o endereço do Paciente onde, por diversas vezes foi localizado, sendo ouvido por Carta Rogatória. Ou seja, jamais se esquivou de atender a Justiça brasileira).

103. O que está em jogo aqui, nobres Julgadores, é a liberdade do Paciente, sendo de rigor a expedição do competente alvará de soltura (clausulado, se assim for do interesse de Vossas Excelências), tendo em vista o manifesto constrangimento ilegal a que está sendo submetido, desde a decretação infundada de sua prisão preventiva, tendo em vista o encerramento do prazo da instrução criminal, sendo certo que até o momento sequer houve a citação.

DA CONCLUSÃO

104. Ex positis e, diante das vastas provas que encartam o presente writ, somente se pode concluir, de forma límpida e cristalina, que os mandados de prisão preventiva expedidos em desfavor do Paciente, que não possui condenação judicial definitiva, e portanto deve aguardar em liberdade o julgamento de seu recurso, não possuem justa causa e possuem motivação inconfessávelmente política.


105. Falta justa causa para a decretação e manutenção de prisão preventiva do Paciente, uma vez que o prazo para a instrução criminal já se encerrou e, principalmente, porque não há, até o momento, trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

106. Repita-se que as provas materiais carreadas neste mandamus são inequívocas, vez que comprovam de maneira clara, evidente e incontroversa que o Paciente está sofrendo grave constrangimento ilegal com o cerceamento indevido de sua liberdade de locomoção, preso no exterior a pedido de nossas autoridades, demonstrando, também, as manobras processuais do Parquet Federal, que o considera inimigo emblemático por razões meramente pessoais.

DO PEDIDO

107. Nesta conformidade, o Paciente, que não possui condenação penal definitiva, bate às portas desse Egrégio Tribunal Regional Federal e aguarda que seja recebida e procedimentada a presente ORDEM DE HABEAS CORPUS requisitando-se, caso necessário, as informações da autoridade apontada coatora, se assim o entender esse Juízo, para o fim de ser concedida a ordem, neste Writ.

108. Por tratar-se de medida urgente, uma vez que o Paciente está sofrendo flagrante constrangimento ilegal, inclusive submetido a custódia judicial no exterior, a demora na concessão da ordem poderá significar gravame irreparável a este Paciente, pelo que se requer a respectiva concessão da

MEDIDA LIMINAR,

suspendendo a eficácia dos mandados de prisão preventiva expedidos em desfavor do Paciente, temporariamente, até o julgamento do mérito deste writ, comunicando-se o Ministério da Justiça e o Ministério das Relações Exteriores, para que estes órgãos governamentais comuniquem de imediato a INTERPOL e as autoridades do Principado de Mônaco (onde o Paciente está submetido a custódia judicial) pois de pronto, poder-se-á evitar um mal maior, ressaltando-se a presença da “fumaça do bom direito” além do “periculum in mora”.

109. E aqui, nobre Desembargador, aproveitamos para esclarecer que o pedido liminar não se confunde com o pedido meritório, eis que neste momento pedimos apenas a suspensão momentânea dos pedidos de prisão preventiva até o julgamento final deste writ. Tal pedido é feito com o único e exclusivo fim de se evitar que o Paciente venha a sofrer outros constrangimentos oriundos do MM. Juízo Federal de primeira instância, enquanto não se analisam os pedidos aqui apresentados.


110. Aliás, esta possibilidade é validada, inclusive, pela Egrégia Suprema Corte, conforme respeitável decisão trazida à colação:

“Nos termos do art. 186, c.c. o art. 22, IV, do Regimento Interno do STF, é de se conceder a medida liminar solicitada pelo paciente, no sentido de se sobrestar seu julgamento pelo Júri, até que seja apreciado o habeas corpus por ele impetrado”. (STF – RT 548/417 – Obs: A ementa refere-se ao antigo RISTF) (Grifo nosso)

111. Lembramos, outrossim, que a prescrição da Ação Penal está distante, fato este que autoriza a concessão da medida liminar pleiteada, não prejudicando, senão auxiliando a Justiça.

112. Requer-se, por fim, após os trâmites legais, e a análise do pedido liminar com sua conseqüente concessão, seja, ao final, quando do julgamento do mérito, CONCEDIDA A ORDEM DE HABEAS CORPUS, determinado a expedição do alvará de soltura, comunicando-se esta decisão, também, ao Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Justiça, ao Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores (para que comunique as Autoridades Judiciárias do Principado de Mônaco), ao Ilustríssimo Senhor Diretor do Departamento de Polícia Federal e ao Ilustríssimo Senhor Diretor da Interpol, encerrando os constrangimentos ilegais que ora se apresentam, em respeito às normas infraconstitucionais, à Constituição Federal brasileira e, principalmente, como medida de Justiça.

De São Paulo (SP) para o Rio de Janeiro (RJ), 10 de janeiro de 2008.

p.p. Carlos Ely Eluf

OAB/SP nº 23.437


[1] MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado, Atlas, São Paulo, 8ª Edição, 2000, p. 704.

[2] Ob. Cit.

[3] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, 3º Volume, 10ª Edição, Saraiva, São Paulo, p. 423.

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