Além da conta

Governo faz gastos irregulares com cartões corporativos, diz TCU

Autor

1 de fevereiro de 2008, 18h47

A primeira vítima do uso de cartões corporativos foi a ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Ela renunciou ao cargo, nesta sexta-feira (1º/2), depois que se soube dos R$ 171,5 mil gastos com viagens e aluguel de carros às custas dos cofres públicos. O presidente Lula não gostou da notícia. Com a pressão, ela se demitiu. Agora, o alvo é o próprio Palácio do Planalto, que tem 42 cartões corporativos.

Reportagem de Sérgio Pardellas na revista IstoÉ deste fim de semana mostra que, em três anos de auditoria, o Tribunal de Contas da União encontrou diversos gastos irregulares, incluindo notas frias e diárias superfaturadas. O relatório do TCU informa que uma comitiva presidencial gastou R$ 23,8 mil em uma viagem oficial à Ribeirão Preto, em 2003. A prova de que pagaram mais do que deviam é que em 2006 a viagem para o mesmo hotel custou R$ 10,2 mil.

Ainda de acordo com a notícia, um dos funcionários identificados pelo TCU como AT só passou dois dias hospedado em Ribeirão Preto. Mas o cartão corporativo foi usado para pagar quatro diárias.

Segundo a IstoÉ, quase todas as irregularidades encontradas pelo TCU são dessa época, quando houve esta viagem para Ribeirão Preto e outra para Sertãozinho, também no interior de São Paulo. “Nessa viagem, foram pagas 22 diárias para pessoas que não constavam na lista de membros da comitiva fornecida pela Secretaria de Administração da Presidência, a um custo total de R$ 3 mil.”

Diante da multiplicação das denúncias de irregularidades em relação ao uso de cartões corporativos, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e o da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage, anunciaram medidas para restringir o uso desses cartões. Os saques em dinheiro foram proibidos aos servidores menos poderosos. A exceção engloba apenas a Presidência da República, vice-presidência, Ministérios da Saúde e da Fazenda, Polícia Federal e escritórios do Ministério das Relações Exteriores em outros países. Mas estes só podem sacar até 30% do limite de crédito.

Os cartões corporativos foram criados em 1998 durante o governo FHC. Mas os gastos se multiplicaram a partir de 2003, quando foi permitido o saque em dinheiro. Nessa época, a Presidência gastou R$ 8,4 milhões. No ano passado, o valor saltou para R$ 16 milhões. As despesas da União pularam de R$ 3,5 milhões em 2002 para R$ 75,6 milhões em 2007.

A oposição, personificada no deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), pretende usar os dados do relatório do TCU para conseguir as assinaturas necessárias (171 na Câmara e 27 no Senado) e instalar a CPI que vai investigar os gastos com cartões corporativos.

Leia trechos do relatório

As análises desenvolvidas no relatório sustentam as seguintes conclusões:

1- As dificuldades encontradas nesse trabalho específico de verificação da regularidade de documentos fiscais podem ser agrupadas sob os seguintes aspectos: 1) a insuficiência da comprovação da irregularidade fiscal para caracterizar a não execução da despesa; e 2) os instrumentos de fiscalização de que dispõe o Tribunal (item II).

2- Depreende-se, com as ressalvas contidas no item II – Limitações de Auditoria, que a análise dos documentos fiscais da amostra não evidenciou a não realização das compras dos bens e/ou aquisição dos serviços. Contudo, foram comprovadas fraudes fiscais da seguinte ordem:

Notas fiscais com AIDF irregular (itens 1.2.1, 1.2.4);

Empresa irregular com o município (item 1.1);

Inexistência das empresas nos endereços consignados na nota fiscal e no CNPJ (item 1.2.1 e 1.2.6);

Ausência de declaração da nota fiscal (item 1.1, 1.2.2, 1.2.6);

Emissão de notas “calçadas” (item 1.1.1, 1.2.3 e 1.4.5).

3- Como encaminhamento, de acordo com cada irregularidade identificada, propõe-se o envio de cópia deste relatório para avaliação da conveniência da instauração dos procedimentos pertinentes:

À secretaria da receita do município e/ ou do estado respectivos e à Secretaria da Receita Federal;

Ao respectivo Ministério Público Estadual;

Ao Ministério Público Federal.

4- No caso das despesas de hospedagem relacionados à viagem presidencial às cidades de Ribeirão Preto e Sertãozinho/SP, realizada em 02 de maio de 2003, foram identificadas as seguintes irregularidades:

Diárias pagas a pessoas que não foram indicadas como membros das comitivas da viagem, no valor de R$ 3.030,00;

Diárias pagas em quantidade superior ao período de estada de alguns participantes, no valor de R$ 1.475,00;

Diárias pagas em 2003 com sobrepreço, comparando-se com orçamento coletado em setembro de 2006, no valor de R$ 13.622,00.

Como encaminhamento, propõe-se a citação do agente suprido responsável pelo pagamento das despesas e do coordenador da viagem que atestou as notas fiscais (item 1.1.1).

5- No caso de despesas de material de escritório, foram identificados indícios de irregularidades fiscais com notas emitidas pelas empresas FR Comércio e Serviços e Representação Ltda., Nova Era Comércio e Serviços Ltda., Candango Comercial de Papelaria e Informática Ltda. e Papelaria Corante Ltda. Na aquisição de material de expediente com a empresa FR, demonstrou-se, por meio de sindicância conduzida pela AS/PR, procedimento irregular executado por um agente suprido. Contudo, ficou evidenciado que os materiais adquiridos junto à empresa FR foram efetivamente entregues, não ocorrendo dano ao erário. Em face dos fatos apurados, a equipe de auditoria entendeu suficiente efetuar determinação à Secretaria de Administração para que seja instaurada nova sindicância visando à apuração da regularidade da conduta dos demais agentes supridos que efetuaram compras com empresas que emitiram notas fiscais irregulares (item 1.3).

6- No caso de gastos relacionados a outros elementos de despesas, foram detectadas irregularidades com notas fiscais das empresas Memory House – Comércio, Importação e Exportação Ltda., Trovata Design Editorial Ltda. – ME e Pharmárcia Meirelles Ltda. que suscitaram, além da proposta de comunicação às receitas, encaminhamento para o Ministério Público para uma avaliação da conveniência e oportunidade de aprofundamento das investigações (itens 1.4.2 a 1.4.4).

7- No exame da conformidade entre os dados constantes da base de dados do Sistema de Controle de Suprimentos de Fundos da Secretaria de Administração – Suprim, do Siafi e das faturas da operadora do CPGF, verificou-se, como resultado, nas despesas realizadas por meio de saques em dinheiro, houve distorção percentual pouco significativa entre os valores registrados no Suprim, no Siafi e nas faturas (cerca de 3,6 % entre os valores registrados no Suprin e no Siafi (item 3).

8- Por envolver informações relacionadas à segurança do Presidente, Vice-Presidente da República e seus familiares, foi proposta a concessão de sigilo dos Anexos 1 a 17 dos presentes autos.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!