Saúde dos escritórios

Câmara analisa proposta de advogados para parcelar Cofins

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20 de dezembro de 2008, 23h00

Os advogados ainda não se conformaram com o que chamam de “falta de sensibilidade” do Supremo Tribunal Federal ao decidir que os escritórios de advocacia e outras sociedades de profissões regulamentadas têm de pagar a Cofins que deixaram de recolher nos últimos cinco anos. A decisão do STF não respeitou nem mesmo a Súmula 276 do Superior Tribunal de Justiça, que isentava as sociedades da contribuição.

Para tentar reverter a situação, a classe articulou com o deputado Bruno Araújo, vice-líder do PSDB na Câmara, a apresentação de emenda ao projeto de lei de conversão da Medida Provisória 449 que prevê o parcelamento em até 20 anos do débito, sem garantias, sem multas e com incidência dos juros pela taxa da TJLP, que é fixada pelo Conselho Monetário Nacional.

A proposta (Clique aqui para ler) foi entregue pelo deputado no dia 10 de dezembro. Em dezembro de 2007, o parlamentar apresentou um projeto de lei com o mesmo objetivo, mas beneficiava apenas os escritórios de advogados. Para dar uma abrangência maior à medida e aproveitar o rápido tramite de medidas provisórias, retirou o projeto de lei e ofereceu a proposta de emenda à MP, que agora procura beneficiar todas as sociedades de profissões regulamentadas.

A MP 449 está em vigor desde o dia 4 de dezembro e foi criada basicamente para perdoar dívidas tributárias vencidas e parcelar débitos dos contribuintes. Pelo prazo previsto em lei (que na prática não costuma ser atendido), o Congresso Nacional tem até fevereiro de 2009 para transformá-la em lei ou rejeitá-la. A análise da emenda em favor das sociedades também deve acontecer neste período.

O advogado Antonio Corrêa Meyer, presidente do Centro de Estudos das Sociedades de advogados (Cesa), colaborou para a elaboração da emenda. Para ele, era clara e nítida a necessidade de o Supremo modular os efeitos da decisão sobre a cobrança da Cofins. “A emenda é uma forma de o Legislativo responder a essa questão social, causada pela mudança da jurisprudência”, disse.

Troca de jurisprudência

Em maio de 2003, depois de repetidas decisões no mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 276, com o seguinte enunciado: “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado”.

No entanto, em setembro deste ano, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar Recurso Extraordinário (RE 377.457) de um escritório de advocacia do Paraná, reverteu o entendimento até então seguido pelas sociedades de profissionais regulamentados. Decidiu que as sociedades têm de pagar Cofins e negou a modulação dos efeitos da decisão, o que significa que quem deixou de pagar a contribuição nos últimos cinco anos terá de pagar agora. Como esta decisão foi tomada em RE, na prática, só vale para as partes. No entanto, reflete o posicionamento da corte sobre a obrigação.

O entendimento foi firmado por maioria — oito votos a dois. Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Eros Grau. Após decidir a favor da cobrança, os ministros analisaram a possibilidade de modular os efeitos da decisão. Houve empate: cinco a cinco. O STF considerou então que, por lei, é necessária a aprovação de, no mínimo, dois terços do Plenário para que a modulação seja possível.

Em parecer pedido pela OAB, o advogado constitucionalista Luís Roberto Barroso sustenta que o quorum de dois terços do Plenário previstos na Lei 9.868 somente se aplica em caso de declaração de inconstitucionalidade de lei. No caso da cobrança retroativa, não houve declaração de inconstitucionalidade, mas simples mudança de jurisprudência. Por isso, não deveria ser aplicada a lei e sim a regra geral: basta o voto de seis ministros. No caso concreto, a ministra Ellen Gracie deveria ser convocada para votar.

O pagamento de Cofins por sociedades de profissionais também é assunto de Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo PSDB. O resultado do julgamento da ADI valerá para todas as sociedades de profissões regulamentadas e poderá suspender o julgamento dos diversos recursos que ainda discutem a matéria.

Por trás da discussão do pagamento ou não de Cofins, está uma questão antiga: se lei ordinária pode revogar lei complementar, mas com conteúdo de ordinária. No caso da Cofins, a Lei Complementar 70/91, que instituiu a contribuição, isentou as sociedades civis de profissões regulamentadas da obrigação de pagá-la. Em 1996, veio a Lei 9.430/96 e revogou a isenção e determinou a cobrança.

Em novembro, a 1ª Seção do STJ anunciou o cancelamento da Súmula 276 para se alinhar à tese do Supremo.

O presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), Marcio Kayatt, declarou que respeita a decisão do Supremo, mas lamentou que a corte não tenha levado em consideração o fato de o STJ ter uma súmula sobre a matéria, em sentido contrário. “Aqueles que deixaram de pagar com base na súmula deveriam ter, no mínimo, o direito da modulação dos efeitos”, reclamou.

Para ele, a emenda proposta pelo deputado Bruno Araújo é uma tentativa de se fazer justiça, “em uma situação que pegou todo mundo de surpresa”. “O Direito não pode ser uma caixinha de surpresas”, diz. Kayatt entende que o Supremo tratou da modulação com dois pesos e duas medidas. Segundo ele, em um caso em que o Executivo seria beneficiado, modulou os efeitos. Dessa vez, a decisão foi novamente favorável ao Executivo, observou.

Responsabilidade do Estado

A advogada Daniela Gusmão, presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-RJ, entende que a questão ainda não está fechada no Supremo Tribunal Federal. Para ela, é preciso aguardar o voto da ministra Ellen Gracie, que estava ausente da sessão quando foi julgado o Recurso Extraordinário, para desempatar e finalizar o debate. Segundo Daniela, o Conselho Federal ainda estuda recorrer da decisão de não modular os efeitos.

Se depois de todas as tentativas a determinação for mantida, a advogada diz que o Superior Tribunal de Justiça deve ser responsabilizado pelos prejuízos causados aos contribuintes.

Daniela concorda com a proposta legislativa de parcelamento do débito, mas a considera falha. Para ela, é preciso mais. Se as sociedades deixaram de pagar por conta da súmula de 2003 do STJ, a Cofins não pode ser cobrada desde a sua edição até a decisão do Supremo. “A súmula induziu em erro o contribuinte, que confiou na decisão do STJ.”

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