Gestão empresarial

Lei americana protege investidores de perdas no mercado

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13 de agosto de 2008, 11h46

Ultimamente, muitas das empresas, geralmente os grandes conglomerados nacionais e as multinacionais que operam no Brasil, têm dedicado maior atenção aos relatórios de auditoria e aos mecanismos de controle interno e de contabilização. Isso é o que, grosso modo, se resolveu chamar de governança corporativa. Neste trabalho apresentamos algumas breves reflexões sobre a origem e os comandos insertos nas normas que impuseram a mudança de postura nessas empresas.

De inicio, impende assinalar, com o fito de elucidar a matéria, que a legislação referida, ato editado em 2002, veio para dar continuidade à introdução da SEC (Securities and Exchange Commission), criada em 1934, após a quebra da bolsa de Nova Iorque, em 1929.

A SEC, órgão similar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Brasil, é responsável pela regulação e fiscalização do mercado de capitais norte-americano. Consoante explica Chancellor, autor do livro Uma história da especulação financeira, a necessidade de regulamentar o mercado de ações e a SEC, surgiu com a infame prática de especulação no mercado acionário: “A regulamentação de 1697 acompanha o padrão de legislação antiespeculativa, na esteira das crises do mercado acionário – da aprovação da Lei Sir John Barnard de 1734, que pretendeu banir “a infame prática da especulação das ações” após o colapso da bolha de South Sea, ao estabelecimento da Securities and Exchange Commission após o Grande Craque de 1929”. (CHANCELLOR, 2001, p. 72)

Registre-se que, apesar da criação da SEC e a extrema necessidade de regulamentar o mercado financeiro, anos mais tarde, com o governo Reagan, a estrutura que regulou o mercado de 1930, abalado pela quebra da bolsa de Nova Iorque, entrou em decadência total, deixando de ser prioridade e perdendo o seu valor, tendo em vista que o então presidente à época, juntamente com os adeptos do Liberalismo, entendiam “que a intervenção do governo nos assuntos econômicos era indesejável, e que o julgamento do mercado era soberano”. (CHANCELLOR, 2001).

A propósito, é válido transcrever trecho do artigo “Quando os heróis do capitalismo viram vilões”, composição literária de Ricardo Grinbaum, que, resumidamente, esclarece o que resultou os dramáticos escândalos envolvendo empresas de expressão no mercado acionário dos EUA: “Para muitos analistas americanos, a explicação se resume a uma palavra: ambição. A festa especulativa e o dinheiro fácil nas bolsas da década de 90 alimentaram os desejos e enriquecimento rápido e diminuídas as preocupações legais e éticas dos executivos. O ambiente ajudava. Enquanto a Bolsa subia , e todo mundo ganhava dinheiro, ninguém se preocupava em levantar o tapete e ver se havia sujeira. Os próprios investidores, auditores e os xerifes do mercado se davam por satisfeitos enquanto as empresas distribuíssem lucros generosos. Com o estouro da bolha, os resultados minguaram e os problemas começaram a aparecer”..

Instituído, assim, o espírito de livre mercado e desregulamentação, conseqüentemente, o mercado de ações tornou-se suscetível a fraudes corporativas, aumentando consideravelmente os riscos nos investimentos e testando a soberania do país.

Dessa forma, tornou-se aparente a deficiência da maior economia do mundo, extremamente vulnerável nas informações fornecidas aos seus investidores, fato preocupante quanto ao grau de confiabilidade.

Especificamente no ano de 2002, o mercado de capitais norte- americano foi surpreendido pela descoberta de manipulações contábeis em duas de suas maiores empresas: a Eron e a Wordcom, ocasionando um processo de decadência e aniquilação de uma credibilidade de décadas e uma crise de confiança em níveis inéditos, desde a quebra da bolsa de Nova Iorque, em 1929.

O impacto no mercado de capitais norte-americano envolvendo escândalos contábeis de empresas conceituadas mundialmente, despertou na sociedade (investidores) a importância de disseminar valores éticos na gestão corporativa, a qual acabou exercendo o seu direito de cobrar a fidedignidade das informações prestadas pelas empresas na economia capitalista.


No que concerne à economia capitalista, é de suma importância realçar que o fator fundamental para o seu desenvolvimento é a governança corporativa, a qual refere-se a modos de organização de sistemas econômicos e alocação de capital, ambicionando, dessa forma, a confiança do investidor.

Pois bem. Observa-se, nesse contexto, que houve uma forte evasão dos investimentos, pressionando o então presidente do Congresso Norte-Americano, a assinar, em 30 de julho de 2002, a lei Sarbanes Oxley, oriunda dos projetos de lei elaborados pelo senador democrata Paul Sarbanes e pelo deputado republicano Michael Oxley, com o escopo de restaurar o equilíbrio no mercado, fornecendo maior confiança ao investidor e sustentabilidade às organizações, e assegurar, conseqüentemente, transparência na gestão corporativa.

A lei Sarbanes Oxley, também conhecida como Sarbox ou SOX, é extensa e detalhada, impondo uma série de boas práticas e requisitos técnicos e operacionais, com a finalidade de proteger os investidores e punir severamente os administradores que manipulam as demonstrações financeiras da empresa a qual se incorporam, e penalizar, ainda, os auditores que indevidamente certificarem números “maquiados”, buscando, com isso, estabelecer a ética nas operações financeiras do mercado de capitais.

É dessa forma que, ante o evidente desequilíbrio, a SOX exibe como principal objetivo a recuperação da credibilidade do mercado de capitais norte-americano, evitando a incidência de novos erros e impedindo, de forma rigorosa, que as empresas realizem operações consideradas lesivas aos interesses dos investidores.

A princípio, acreditava-se que a SOX iria atingir tão somente as empresas norte-americanas ou empresas estrangeiras com títulos negociáveis no mercado acionário dos Estados Unidos. Todavia, o que se vê é um grande interesse dos principais mercados internacionais nesta legislação que contém 11 títulos, com 1.107 artigos, regras estas propostas pela SEC (Securities And Exchange Commission).

Nesse tom, merecem realce os principais artigos da SARBOX no tocante aos impactos nas empresas que têm interesse em atuar no mercado acionário dos Estados Unidos, consoante destacados infra:

>> Artigos 302 e 906 – Certificações pelo CEO (Chief Executive Officer) e CFO (Chief Financial Officer) dos relatórios anuais, contendo as demonstrações financeiras das companhias sob pena de responsabilidade civil e criminal.

>> Artigo 402 – Proibição de empréstimos para conselheiros e diretores.

>> Artigo 301 – Regras adotadas pela SEC em relação ao comitê de auditoria independente.

>> Artigo 201 e 202 – Proibição de prestação de certos serviços pelas empresas de auditoria externa.

>> Artigo 404,406 até 409 – Maior publicidade das informações e fiscalização da SEC, que deverão ser publicadas em tempo real.

>> Artigo 304 – Penalidades para diretores e conselheiros por violações do dever de conduta, quando eles modificarem e publicarem relatórios com alterações nas informações financeiras.

>> Artigo 306 – Limitação aos planos de benefícios para empregados da alta administração.

>> Artigo 307 – Padrões de conduta para advogados.

>> Artigo 804 – Prescrição das penalidades, tendo por objetivo questões atinentes à fraude e à manipulação de informações envolvendo valores mobiliários, em cinco anos após a ocorrência do fato ou dois anos após o descobrimento da sua ocorrência, o que for maior.

Destaca-se, desde logo, as seções de números 302 e 404, referentes às certificações e divulgações, respectivamente, por controle interno, os quais determinam de forma exigente que o presidente e os diretores da companhia estejam conscientes da verificação corretiva, ensejando, por conseguinte, uma maior responsabilidade pela situação financeira e patrimonial divulgada pela empresa.

Apesar da Sarbox ser aplicável apenas às empresas brasileiras com ADRs (American Depositary Receipts), listadas na SEC ou subsidiárias destas, a análise do atual panorama das empresas brasileiras demonstra a crescente preocupação dos dirigentes não só com os ditames da legislação, mas com os princípios da boa governança corporativa.


Com efeito, considerando este novo cenário, fica evidente a necessidade de analisar, modificar, implantar e assegurar uma cultura de controle interno, a fim de garantir a confiabilidade das informações, realizar diagnósticos de compliance (cumprimento de regulamentos internos e externos em postos às atividades da instituição), evitando, assim, variadas fontes de informações desconexas, visto que os relatórios encaminhados à SEC deverão cumprir todos os requisitos da lei e as demonstrações financeiras, apresentar, em toda a sua relevância, a situação real e os resultados da operações da empresa.

Ante o exposto, fica claro que a concepção de um sistema de controle interno deve sempre levar em consideração a avaliação de riscos da administração, que podem ser externos ou internos.

De plano, mister elucidar os riscos externos, que compreendem: a competitividade, a disponibilidade de capital, a regulamentação e a interrupção do negócio e os internos, dentre os quais, salienta-se:

Operacional:

— Fraude interna;

— Fraude externa;

— Práticas comerciais (confiabilidade, comercialização, falhas de produtos, obrigação com clientes, aconselhamento);

— Falhas de sistemas;

— Execução e gestão de processos;

— Relações trabalhistas (processos trabalhistas)

Mercado:

— Taxa de juros

— Câmbio

— Ações

— Liquidez

Crédito:

— Inadimplência

— Liquidação

— Garantia

— Concentração

Estratégico:

— Planejamento

— Indicadores de metas

— Precificação

— Recursos humanos

— Custos de oportunidade

Nesses moldes, para se atingir um nível superior de integridade e desempenho corporativo, em cumprimento aos ditames da lei Sarbanes Oxley, necessário se faz um procedimento adequado de controle interno, no qual o Comitê de Auditoria deve receber informações precisas, no momento correto, de fonte segura e no contexto adequado, sendo vital, ainda, que haja comunicação regular, pro-ativa, confiável e direta entre os comitês de auditoria e os auditores externos.

A exegese da lei leva, de plano, à conclusão de que o advogado (auditor externo), contratado pela companhia de capital aberto, é de fundamental importância no processo de adequação da legislação, garantindo a obediência às regras de transparência fiscal e financeira, por meio de relatórios periódicos, e observando integralmente os requerimentos da SEC, não somente em relação às movimentações de processos, mas em relação às demais informações que representam aspectos financeiros e operacionais da companhia.

Nestas circunstâncias, constata-se, em ressunta, que a constituição de um assessoramento de advogados externos torna-se necessário para avaliar os impactos da lei Sarbanes-Oxley neste novo modelo de governança corporativa.

Dessarte, ante a flagrante necessidade de especialistas jurídicos pelos comitês de auditoria, os escritórios de advocacia estão cada vez mais se adaptando, contratando pessoal especializado, no intuito de garantir o cumprimento das exigências estabelecidas pela Sarbanes Oxley, o que traduz, sem dúvida, um ótimo momento para aumento da gama de clientes, e fornecimento de soluções eficientes, como é o caso da emissão de relatórios e da revisão de processos, visando a uma completa adequação ao ato de 2002.

Aniquilando a matéria, de logo, cumpre ressaltar que a SOX estabelece padrões mínimos de conduta profissional para advogados que representem, de qualquer modo, companhias emissoras no mercado de capitais americano, conforme se verifica do artigo 307 do Ato, exigindo que estes comuniquem de imediato ao Conselho Fiscal ou órgão competente da companhia a existência de eventuais irregularidades quanto à sua atuação.

Conclui-se que a Sarbanes Oxley, lei federal norte-americana aprovada em 2002, foi criada com a finalidade de restaurar e fortalecer a governança corporativa, abalada por escândalos contábeis, os quais induziram a discussão acerca da importância da disseminação de uma cultura empresarial naquele setor.

Esta é, de forma sintética, a abordagem acerca dos principais efeitos dessa importante legislação americana, que impôs mudança de postura às empresas de capital aberto situadas nos Estados Unidos, em suas filias, a aplicação no que concerne às empresas estrangeiras que possuem títulos negociáveis no mercado financeiro norte-americano e a essencialidade e a relevância do advogado no cumprimento da SOX.

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