Segunda Leitura

Segunda Leitura: Presidir STF exige autoridade moral e força física

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  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

27 de abril de 2008, 13h30

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O Consultor Jurídico estréia, neste domingo (27/4), a coluna Segunda Leitura, escrita pelo desembargador federal aposentado Vladimir Passos de Freitas. Segunda Leitura será publicada sempre aos domingos e tratará do assunto de maior destaque durante a semana que se passou. Passos de Freitas, seu autor, foi presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Hoje, é professor de Direito Ambiental da PUC-PR.

O STF, dia 23 de abril, deu posse ao ministro Gilmar Mendes, novo presidente da corte. Tem, assim, o Judiciário brasileiro, um novo condutor de sua política institucional, que acumula não apenas a direção do mais importante tribunal do Brasil, como ainda o Conselho Nacional de Justiça. A posse foi extremamente concorrida. Presentes 3,6 mil, o presidente, três ex-presidentes da República, os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados. De registrar-se, nenhuma referência à presidente anterior, ministra Ellen Gracie, que durante dois anos, com a discrição que lhe é própria, procurou modernizar os serviços da corte. A máxima do “rei morto, rei posto” foi reafirmada com rigor perverso.

Atributos não faltam ao novo presidente. Fez carreira no Ministério Público Federal, tem sólida formação acadêmica (doutor pela Faculdade de Direito da Westfäliche Wilhelm-Universität Münster – Alemanha) e rica experiência administrativa como ex-subchefe da Casa Civil da Presidência da República e advogado-geral da União. Nesta última função, reestruturou o órgão, fortaleceu-o e tornou-o mais eficiente. Não é pouca coisa.

Porém, as grandes transformações não dependem apenas do presidente. As dificuldades começam pelo tempo do mandato: dois anos. Nos primeiros seis meses, a equipe administrativa da nova gestão estará se adaptando. E nos últimos seis, verá seu poder esvaziar-se, porque a expectativa passa a ser com os que virão na gestão que se aproxima. Além disto, um presidente não interfere na ação dos outros ministros. Por maior que seja seu poder de persuasão, nada poderá fazer, por exemplo, se um colega não colocar um processo importante na pauta de julgamentos.

No que é hoje o maior problema do STF, ou seja, o número de processos, precisará ter elevado poder de convencimento para conduzir a corte a uma política de redução do exame de casos. A edição de novas súmulas e a argüição de relevância caminham a passos lentos e não provocaram alterações significativas. E enquanto o STF continuar recebendo milhares de recursos e ações penais originárias, o Brasil não terá definição em temas complexos e importantes, como o conflito da Raposa Terra do Sol, em Roraima, o sistema de cotas nas universidades ou a união de homossexuais. Eles ficarão perdidos em meio a milhares de processos repetitivos.

Disposição não falta ao novo presidente. Com coragem, criticou as invasões feitas pelos movimentos sociais e a forma como os estudantes invadiram a UNB, impossibilitando o funcionamento da reitoria. Em uma época em que todos preferem astuciosamente omitir-se, o simples falar é um ato de coragem.

Na realidade, o exercício da presidência do STF exige dedicação absoluta e atributos raros. É preciso bem exercer a política institucional com os demais Poderes da República, sem que isto signifique submissão ou envolvimento político-partidário. Relacionar-se bem com os demais ministros da corte, pois, caso contrário, as iniciativas serão frustradas de uma forma ou outra. Liderar a magistratura, mais do que tudo pelo exemplo, sem capitular às reivindicações que possam traduzir um interesse mais corporativo do que público. Evitar a tentação do populismo, não se rendendo aos encantos do “show-espetáculo” em que tudo atualmente se transforma.

Em suma, presidir o STF não é missão simples. A Constituição de 1988 deu ao Judiciário novos poderes, com interferência nas políticas públicas e na vida política do país. Tarefa de tal envergadura exige, de quem a exerce, autoridade moral, equilíbrio psicológico e força física. Aqueles que amam o Brasil, independentemente da posição política ou ideológica, certamente estão cruzando os dedos para que o novo condutor da política judiciária tenha amplo sucesso.

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