Ato de guerra

Ação militar em período de guerra é ato de império, diz STJ

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24 de abril de 2008, 15h15

Ação militar praticada em período de guerra constitui ato de império, não se submete, portanto, ao Poder Judiciário nacional. A conclusão é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao negar Recurso Especial ajuizado por descendentes de vítima de barco afundado por alemães em Cabo Frio, no Rio de Janeiro, durante a Segunda Guerra Mundial. Eles pediam reparação pela agressão militar sofrida por uma embarcação brasileira nas águas territoriais do Brasil.

Atos de império ou de autoridade são todos aqueles que a administração pratica usando de sua supremacia sobre o administrado ou servidor e lhes impõe obrigatório atendimento. Tais atos podem ser gerais ou individuais, internos ou externos, mas sempre unilaterais, expressando a vontade oniponente do Estado e seu poder de coerção.

Cinco netos e um genro de Apúlio Vieira de Aguiar entraram na Justiça, com uma ação de indenização por danos morais e materiais contra a República Federal da Alemanha, pela morte do avô e sogro, ocorrida em julho de 1943. De acordo com o pedido, o barco de pesca em que estava a vítima, Changri-lá, teria sido afundado por um submarino de guerra alemão (U-199) que patrulhava a costa brasileira, mais precisamente o litoral de Cabo Frio, no Rio.

De acordo com o processo, mais de 20 navios foram torpedeados pelos alemães, sendo certo que nunca foram encontrados corpos ou restos mortais da vítima ou das demais pessoas que estavam no barco, mas apenas destroços que chegaram à praia, com sinais de explosão. Isso levou à conclusão de que ele teria sido mesmo abatido por uma das naves de guerra alemãs. Posteriormente, o submarino foi abatido pela Marinha de Guerra brasileira e os sobreviventes (prisioneiros) resgatados foram encaminhados aos Estados Unidos, onde confessaram afundamento do barco em que se encontrava a vítima.

Em fevereiro de 1944, o Tribunal Marítimo arquivou o caso, concluindo pela ausência de provas de que o Changri-lá fora abatido por submarino de guerra alemão. Quase seis décadas depois, em 31 de julho de 2001, o Tribunal Marítimo, a pedido da Procuradoria da Marinha, reabriu o processo após tomar conhecimento de documentos que comprovariam o naufrágio do Changri-lá provocado pelo submarino de guerra alemão.

Em primeira instância, o processo foi extinto sem julgamento do mérito. É que, ao ser acionada, a embaixada alemã no Brasil afirmou que são inválidas e ineficazes as citações recebidas referentes às ações de ressarcimento de danos contra a República Federal da Alemanha. “As presentes citações dizem respeito a uma ação de soberania do Estado alemão. O Brasil não possui jurisdição sobre os atos de império (acta iure imperii) praticados por outros países. O encaminhamento de tais citações é, portanto, indevido”, afirmou o documento.

Em apelação, a defesa dos netos e do genro afirmou que não houve declaração expressa da ré acerca de sua imunidade, que não pode ser tácita. Ainda segundo a defesa, ainda que se aplicasse a imunidade de jurisdição, não é ela incidente no caso, pois os fatos ocorridos no território do Estado do foro violam direitos humanos e são pobres os autores, não podendo exercer o direito de ação no estrangeiro.

Os autos foram encaminhados ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região e, em seguida, remetidos ao STJ sob a forma de recurso ordinário, em obediência à regra expressa na Constituição Federal.

Após examinar o pedido, o ministro Fernando Gonçalves, relator do caso, negou o recurso. “A imunidade acta jure imperii é absoluta e não comporta exceção à guisa da pobreza dos autores ou porque os fatos ocorreram no território nacional ou ainda porque se trata de Direitos Humanos. O respeito à soberania do Estado estrangeiro é um preceito maior e anterior a essas questões. “Curvar um Estado à soberania de um outro só por renúncia, por guerra ou por acordo ou tratado bilateral”, justificou o ministro.

Ele foi seguido pelos demais ministros da 4ª Turma.

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