Eleições na Ajufe

Entrevista: Fernando da Costa Tourinho Neto, juiz federal

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15 de abril de 2008, 14h51

Fernando Tourinho Neto - por SpaccaSpacca" data-GUID="fernando_tourinho_neto.jpeg">Apesar de ser a mais produtiva do país, a Justiça Federal sofre com a falta de estrutura, de gestão e com a má distribuição de suas varas pelo país. A opinião é do juiz federal Fernando da Costa Tourinho Neto, que disputa na sexta-feira (18/4), pela chapa da oposição, a presidência da Associação dos Juízes Federais do Brasil, a Ajufe.

Juiz federal há quase 30 anos e membro do Tribunal Regional Federal da 1ª Região há 19 anos, ele defende a instalação de varas onde há efetiva necessidade, além do aumento do número de tribunais e juízes. Tourinho Neto reconhece o esforço de seus adversários no comando da entidade, mas afirma que não há entusiasmo na defesa dos projetos que interessam à categoria. “A atual diretoria da Ajufe tem trabalhado em projetos que melhoram a atuação do juiz, mas sem grande entusiasmo, sem a necessária combatividade. Está morna, apática”.

Assim como a estrutura, a gestão da Justiça Federal no país precisa de mudanças. Em sua opinião há má orientação dos trabalhos. “Há juízes que subutilizam a informática, outros são perfeccionistas, outros são muito detalhistas, outros não tratam bem os servidores, fazendo com que trabalhem com receio de errar”, afirma.

Em entrevista ao site Consultor Jurídico, Tourinho defende as férias de 60 dias para os juízes — “o juiz precisa de férias dobradas porque, no dia a dia, trabalha de madrugada, nos finais de semana” — e apóia a volta férias coletivas. Para ele, férias individuais contribuem para a insegurança jurídica: “Muitas vezes há apenas um juiz do tribunal na sessão e dois convocados, os quais podem ter entendimentos totalmente diferentes daqueles já consagrados nas turmas”.

Desde 1965, quando concluiu a Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia,Tourinho Neto passou pela advocacia, foi promotor e chegou ao cargo de juiz federal por meio de concurso público em 1979, depois de passar também pela magistratura estadual. Sua ida para a magistratura nasceu, segundo ele, da frustração do promotor que oferecia denúncias e depois assistia a prescrição por causa da demora dos julgamentos.

O juiz, que já foi presidente da Ajufe de 1998 a 2000, agora quer voltar ao comando da entidade para “agitar” os trabalhos. “Todas as gestões trabalharam, mas aquele trabalho morno, sem garra”, afirma. Ele lembra que em sua gestão a categoria conseguiu reajuste de R$ 3 mil. De acordo com Tourinho Neto, a atual diretoria da Ajufe tem trabalhado, mas não tem sido combativa, enérgica. Ele disputa o comando da entidade com o juiz federal Fernando Mattos, da situação, cuja entrevista concedida à ConJur será publicada nesta quarta-feira.

Leia a entrevista com Tourinho Neto

ConJur — Os mais recentes números do CNJ mostram que a Justiça Federal é a mais produtivas do país. A estrutura da Justiça Federal é adequada e está bem distribuída?

Tourinho Neto — Não. Há má distribuição das varas, poucos juízes nos tribunais e nas seções e subseções judiciárias. Há lugares em que, sem nenhuma necessidade, existe subseção, como Campo Formoso (BA) e, em outros, há varas de menos, como Canoas (RS).

ConJur — Qual é a solução?

Tourinho Neto — Não criar, por enquanto, mais subseções. E instalar as varas onde há efetiva necessidade. É preciso, ainda, aumentar o número de tribunais ou de seus membros, assim como de juízes nas turmas recursais. Tudo isso poderia contribuir para um melhor funcionamento do Judiciário.

ConJur — Só aumentar a estrutura resolve? O problema não seria também de gestão, já que há varas e gabinetes de desembargadores que estão praticamente em dia e outros, com o mesmo número de processos, abarrotados?

Tourinho Neto — Como disse antes, deve-se ampliar o número de tribunais e juízes e instalar mais varas. Porém, é imperioso trabalhar a gestão. Por que há gabinetes de juízes dos tribunais e de varas, trabalhando com a mesma matéria, sendo que uns estão com uma enormidade de processos e outros, em dia? É porque o juiz trabalha pouco? Não. O que existe é má orientação dos trabalhos. Uns têm metodologia mais rápida. Há juízes que subutilizam a informática, outros são perfeccionistas, outros são muito detalhistas, outros não tratam bem os servidores, fazendo com que trabalhem com receio de errar e, assim, demorem a preparar a minuta de decisões, sentenças ou votos.

ConJur — A Justiça Federal precisa ser melhor informatizada?

Tourinho Neto — Precisa. Ainda estamos muito distantes do ideal. Compare-se a informatização dos estabelecimentos de crédito com a nossa e veremos a grande velocidade adquirida pelos primeiros.


ConJur — Os Juizados Especiais Federais, uma das grandes conquistas do Judiciário brasileiro, estão sobrecarregados e perdendo suas características mais valiosas de agilidade e efetividade. Como resolver o problema?

Tourinho Neto — É uma verdade. Os Juizados Especiais Federais estão altamente sobrecarregados. Já há audiências marcadas para daqui um ano. É certo que a estrutura do JEF já nasceu deficiente, com menos servidores e funções. O que fazer? Melhorar a informatização, imbuir o juiz de que as decisões têm de ser concisas ao máximo, sem muitas citações de jurisprudência e de doutrina, julgar mais pelo bom senso para procurar fazer justiça, sem esquecer a lei. Criar cargos de juiz nas turmas recursais também é essencial.

ConJur — Como o senhor vê a segurança jurídica no país?

Tourinho Neto — Péssima. Muda-se a composição da turma de um tribunal e percebemos que praticamente se altera a jurisprudência, criando-se, algumas vezes, decisões conflitantes para a mesma matéria. É um horror! O término das férias coletivas contribuiu muito para isso. Muitas vezes há apenas um juiz do tribunal na sessão e dois convocados, os quais podem ter entendimentos totalmente diferentes daqueles já consagrados nas turmas. Surge assim um problema, pois as partes do processo ficam confusas com duas jurisprudências diferentes numa mesma turma. Precisamos retomar as férias coletivas, que foram tidas, inicialmente, como prejudiciais pelos advogados, que tanto lutaram pelo seu fim. Agora se arrependem, como vão se arrepender com o término do recesso.

ConJur — Juízes de primeira instância respeitam jurisprudência? Juízes de segunda instância homenageiam as decisões da primeira?

Tourinho Neto — Acredito que ambos se respeitem, embora possam concordar ou não com o entendimento um do outro. É natural, pois a lei deve ser interpretada pelo magistrado, o que nem sempre gera opiniões idênticas.

ConJur — Juízes de primeiro grau precisam de assessores?

Tourinho Neto — Precisam. A diferença entre as decisões dos juízes da primeira e da segunda instância é apenas de grau, a essência é a mesma. Se os juízes dos tribunais têm assessores, não vejo por que os de primeira instância não terem. A necessidade é a mesma.

ConJur — Eliminar as férias de 60 dias para os juízes não ajudaria no combate à morosidade? Por que juiz tem de ter 60 dias de férias?

Tourinho Neto — O juiz precisa de férias dobradas porque, no dia a dia, trabalha de madrugada, nos finais de semana. O juiz não pára de pensar em uma solução para o processo. O desgaste mental é grande. É necessário que juiz possa ter um período de descanso maior para repor suas energias. Observe-se que a maioria dos cidadãos não gosta de julgar as coisas mais simples, nem em casa… Realmente, é difícil. O período de 60 dias de férias deveria ser, no entanto, gozado parceladamente, em períodos de 30 dias, fruídos de seis em seis meses.

ConJur — A Justiça Federal sofre com processos repetitivos, sobretudo, envolvendo a Previdência Social. Como resolver isso?

Tourinho Neto — Sofre não só com os processos repetitivos relativos à Previdência Social, como também com os tributários. As súmulas vinculantes e impeditivas de recurso serão a solução do problema.

ConJur — O que o senhor acha da prerrogativa de foro? E da posição da Ajufe contra a prerrogativa e a sua extensão aos ex-integrantes de cargos públicos?

Tourinho Neto — A questão da prerrogativa de foro é complexa. Como um juiz inferior — de primeiro ou segundo grau — pode condenar um magistrado de hierarquia superior e determinar seu afastamento? Soa estranho e quebra a ordem natural das coisas. Como o juiz de primeiro ou segundo grau, ou mesmo o STJ, vai afastar do cargo o presidente da Câmara, do Senado ou da República, ou mesmo um parlamentar do Congresso ou autoridades do primeiro escalão da República, como os ministros? Já em relação aos ex-integrantes de cargos públicos, não vejo motivo para terem prerrogativa de foro.

ConJur — Qual sua opinião sobre o projeto que transforma a execução fiscal judicial em administrativa? Desafogaria a Justiça?

Tourinho Neto — Sim, desafogaria. A execução fiscal, até os embargos, constitui mero ato burocrático, fazendo do juiz um servidor da Fazenda Pública, que não se preocupa em localizar o devedor, em apontar bens para penhora, deixando tudo para o Judiciário. Falta estrutura à Procuradoria da Fazenda Nacional. Joga-se, assim, a responsabilidade para o Poder Judiciário.

ConJur — O que o senhor acha do caso do juiz algemado no Carnaval, no Rio de Janeiro?

Tourinho Neto — Foi uma selvageria. A Polícia age, quase sempre, com abuso de autoridade. A farda e as camisetas pretas para amedrontar dão-lhe força, poder. Ali, naquele momento, é o policial que manda, não tem nenhuma outra autoridade maior que a dele. Qualquer cidadão, seja ele qual for, senador, deputado federal, ministro, juiz, lixeiro, servente, está sujeito à estupidez, ao abuso do policial, geralmente mal-educado. O poder gera abusos se não for devidamente contido.


ConJur — A juíza que deu liminar que permitindo a seis bacharéis advogar sem fazer o Exame de Ordem já tinha processado a OAB, com ação de indenização por danos morais. Diante disso, ela pode julgar o caso?

Tourinho Neto — Em princípio, pode. O juiz pode julgar as causas da Receita Federal, (imposto de renda) e estar na “malha fina”; da CEF e pode ser devedor dela, etc. Entendo que a juíza, pelo fato de ter ajuizado ação por danos morais contra a OAB, não perde a isenção exigida por lei para julgar qualquer processo judicial que envolva interesses da Ordem.

ConJur — O que a Ajufe precisa fazer e não vem fazendo?

Tourinho Neto — A atual diretoria da Ajufe tem trabalhado, mas não tem sido combativa, enérgica. Age, mas não chega às últimas conseqüências. Os projetos de lei estão estancados nas comissões do Congresso e a Ajufe nada faz. Conversa mais com o “baixo clero” do Parlamento e menos com as lideranças. Curva-se muito aos conselhos, o da Justiça Federal e o Nacional de Justiça, permitindo que estes extrapolem suas funções. São órgãos necessários à administração da Justiça, decisões boas têm sido proferidas, freando, muitas vezes, as arbitrariedades dos tribunais, mas não podem agir como se fossem corregedorias dos tribunais e como diretorias de foro, como se fossem o próprio Supremo Tribunal Federal.

ConJur — O que a associação está fazendo de bom e deve continuar a fazer?

Tourinho Neto — A atual diretoria da Ajufe tem trabalhado em projetos que melhoram a atuação do juiz, mas sem grande entusiasmo, sem a necessária combatividade. Está morna, apática. Procurar a imprensa para mostrar a importância do juiz na sociedade é necessário. O delegado prende porque o juiz mandou. O Ministério Público apenas requer, mas quem decide se deve o acusado ser condenado ou absolvido é o juiz. É o juiz que julga procedente ou improcedente a ação civil pública ou a de improbidade. Precisamos resgatar a figura do juiz, seu papel e valor na sociedade. Sem Justiça não há democracia. Todos precisam da Justiça — do servente, da empregada doméstica e da prostituta ao Congresso Nacional, ao parlamentar, ao ministro de Estado, ao presidente da República, ao próprio magistrado. Todos necessitam, vez ou outra, recorrer ao juiz.

ConJur — Quais serão suas ações se eleito presidente da Ajufe?

Tourinho Neto — Primeiramente, mobilizar a classe. Unir os juízes em torno das suas reivindicações. A Ajufe sozinha pouco pode fazer. É preciso que os juízes também lutem, mostrem sua disposição e força. O general, na guerra, nada pode fazer se não tem ao seu lado o exército. Não se ganha batalha só com o comando bélico. A chapa Ajufe Forte e Combativa pretende reestruturar a carreira do juiz federal substituto. A própria carreira já tem sugestões como extinção do termo substituto, criação de entrâncias, criação de um cargo em extinção. Pretende nossa chapa impedir o achatamento do subsídio. Não basta o reajuste, pois a inflação oficial não é a mesma que a real; é menor. É nosso propósito lutar pela remuneração dos cargos de diretor de Foro, substituição por acúmulo de varas, de plantão.

ConJur — Em síntese, quais são suas principais propostas?

Tourinho Neto A criação de novos tribunais federais e o aumento do número de juízes nos atuais tribunais. A criação de turmas descentralizadas, de cargos de juiz e de cargos em comissão nas turmas recursais. É preciso também dar melhor estrutura de trabalho aos juízes substitutos, criar cargo de assessor para a primeira instância, implementar novas varas federais, criar uma comissão permanente de prerrogativas dos magistrados federais e o Fundo de Pensão Associativo da Justiça Federal, entre outras coisas.

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