Medida oportuna

Decisão do STF acabará com grevismo abusivo do funcionalismo

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23 de setembro de 2007, 15h37

Ao retomar o julgamento de dois mandados de injunção, um impetrado por professores da rede de ensino básico da Paraíba e outro por policiais do Espírito Santo, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, enquanto o Congresso não aprovar um projeto de lei complementar disciplinando as greves no setor público, o funcionalismo terá de se submeter aos mesmos limites impostos aos trabalhadores da iniciativa privada. O julgamento havia sido suspenso em abril, quando o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a corte não poderia interferir na competência do Congresso. Mas ele mudou de posição e o caso só não foi concluído essa semana porque o ministro Joaquim Barbosa pediu vista do processo. Ainda têm de se manifestar os ministros Marco Aurélio Mello e Ellen Gracie.

Assim, o STF está prestes a adotar uma medida que porá fim ao grevismo abusivo do funcionalismo, além de cobrar maior empenho do Legislativo na aprovação de leis. “Não mais se pode tolerar este estado de continuada e inaceitável inércia. A omissão dos congressistas traduz incompreensível sentimento de desapreço pela autoridade, valor e significado do direito de greve”, disse o decano da corte, Celso de Mello. “Essa é uma contribuição que a corte dá ao processo para o aumento da eficiência administrativa do poder público”, endossou o ministro Ayres de Brito.

Até esse julgamento, a corte entendia que, sendo os Poderes independentes, não cabia ao Judiciário obrigar o Congresso a cumprir suas funções legislativas. Essa posição começou a mudar há alguns meses, quando o ministro Gilmar Mendes emitiu seu voto, afirmando que o mandado de injunção não tem mero “caráter declaratório”. Previsto pela Constituição, o instrumento legal permite ao STF determinar as regras a serem aplicadas quando “a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais”.

É o que ocorre com a falta de uma regulamentação das greves na máquina estatal, quando os direitos dos usuários dos serviços públicos são acintosamente desprezados pelos grevistas. Entre 2003 e 2004, as greves do funcionalismo representaram 28 mil horas paradas. Em 2006, só no primeiro semestre foram 15 mil horas paradas. Com as últimas greves nas universidades federais, nos museus e na rede médico-hospitalar, envolvendo cerca de 100 mil servidores, a estimativa é que em 2007 o total de horas paradas seja superior a 30 mil. O que há de comum em todas essas greves em áreas tão distintas da administração pública é a tranqüila certeza de que, ao contrário do que ocorre na iniciativa privada, não há riscos para os grevistas, como os de desconto por falta e de reposição de dias parados.

É por isso, afirmou o ministro Gilmar Mendes, que a última instância da Justiça pode, por “analogia”, sujeitar o funcionalismo às mesmas regras impostas aos trabalhadores das empresas particulares. Não é a medida ideal, mas é a saída legal mais adequada para evitar que os servidores da administração direta transformem o sofrimento da população em meio de pressão para obter a satisfação de seus interesses corporativos, disse ele. “O STF não pode se abster de reconhecer que, assim como se estabelece o controle judicial sobre a atividade do Legislativo, é possível atuar também nos casos de inatividade ou omissão do Poder” (no caso, os Poderes Legislativo e Executivo), concluiu.

Quando o Supremo finalmente concluir esse julgamento, os servidores que quiserem cruzar os braços terão de agir com base na Lei 7.783, de 1989. Com isso, não mais poderão interromper totalmente a prestação de serviços públicos à população, terão de negociar antes de iniciar a greve, precisarão informar previamente as autoridades sobre a possibilidade de paralisação e não poderão constranger nem ameaçar colegas que não aderirem à greve.

Como o presidente Lula não cumpriu a promessa que fez de mandar para o Legislativo um projeto de lei disciplinando a greve no setor público, e os congressistas jamais deram prioridade a essa matéria, a decisão do STF não poderia ser mais oportuna.

Editorial de O Estado de S. Paulo deste domingo

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