Ameaça ao irmão

Prisão de Suzane Richthofen é necessária, decide Supremo

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11 de setembro de 2007, 19h07

A prisão preventiva de Suzane Von Richthofen, condenada a 39 anos de reclusão e seis meses de detenção, não deve ser relaxada. A decisão é da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, por três votos a um. Suzane foi condenada pelo assassinato de seus pais, Manfred e Marísia von Richthofen. O crime ocorreu em 2002.

O ministro Ricardo Lewandowski, que trouxe voto-vista no Habeas Corpus, entendeu que embora não haja decisão definitiva sobre o assunto, a prisão de Suzane está dentro da lei. “Entendo que a prisão da paciente, embora determinada em sentença condenatória ainda pendente de trânsito em julgado, foi ela decretada em harmonia com os parâmetros legais”, justifica.

Lewandowski reconheceu que o STF tem levado em consideração o princípio da presunção da inocência. Assim, só deve ser mantido preso quem tem contra si uma sentença definitiva. Ou, excepcionalmente, quando for o caso de prisão cautelar, é preciso observar os parâmetros do artigo 312 do Código de Processo Penal. Porém, o ministro entendeu que o caso de Suzane não se encaixa nesta tendência.

“Com efeito, as reiteradas ordens de prisão expedidas em desfavor da paciente não apenas invocaram a necessidade de sua segregação cautelar como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, como também ressaltaram a periculosidade que aquela ostenta, particularmente no tocante ao risco que representa para a integridade física do irmão, com quem disputa a partilha dos bens dos pais”, justificou o ministro.

Ele votou no sentido de negar a ordem. Foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha e pelo ministro Carlos Ayres Britto. O ministro Menezes Direito não participou deste julgamento. O ministro Marco Aurélio, relator do Habeas Corpus, havia votado pelo relaxamento da prisão.

Suzane foi condenada a 39 anos e 6 meses de prisão, mesma sentença dada ao então namorado dela, Daniel Cravinhos. O julgamento aconteceu em São Paulo, no ano passado. O irmão de Daniel, Christian, participou do crime e foi condenado a 38 anos e 6 meses de prisão.

Leia a decisão:

HABEAS CORPUS 89.218-3 SÃO PAULO

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

PACIENTE(S): SUZANE LOUISE VON RICHTHOFEN

IMPETRANTE(S): MÁRIO SÉRGIO DE OLIVEIRA E OUTRO(A/S)

ADVOGADO(A/S): DENIVALDO BARNI

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

V O T O – V I S T A

O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI (Relator): Ouso divergir do eminente Ministro Marco Aurélio, relator do presente habeas corpus, que houve por bem deferir a ordem para determinar a libertação da paciente Suzanne Louise von Richthofen, por entender, em suma, que a prisão cautelar não se acha em consonância com os requisitos do art. 312 do CPP, visto que a alegada periculosidade da paciente, estaria, no caso, puramente ligada ao próprio tipo penal, não podendo mais, uma vez superada a fase probatória, ser ela invocada para cercear-lhe o direito de apelar em liberdade.

Colho da decisão que, originalmente, determinou a prisão preventiva da paciente, confirmada pelo egrégio STJ no HC nº 58.813/SP (fls. 137/183), o seguinte:

“Tem-se assistido, pelos diversos veículos de mídia, uma pletora de pronunciamentos da ré, em vista da proximidade de seu julgamento Plenário.

As notícias trazidas pelo Ministério Público, agora, traduzem um verdadeiro risco para testemunha do feito, bem como para a aplicação da lei penal.

Com efeito, o documento de fl., colacionando reprodução de fotografia da ré, em companhia, supostamente, de sua avó, deixa evidente que está ao seu alcance a testemunha Andreas.

Tornaram-se públicas as divergências havidas entre Suzanne e seu irmão, ora por desacordo na partilha de bens dos falecidos pais, vítimas.

Mais do que garantir a aplicação da lei penal e proteger uma testemunha, tem-se a necessidade de garantir a perfeita ordem de julgamento da ré e dos demais acusados, uma vez que se nota a clara a intenção de criar fatos e situações novas, modificando, indevidamente, o panorama processual. Aos senhores jurados deverá ser assegurado o direito, constitucional, de julgamento pelas provas dos autos, o que se visa garantir, também, pela presente.

Por tais motivos, decreto a prisão preventiva de Suzanne Louise von Richthofen. Expeça-se mandado de prisão em seu desfavor” (fls. 266-267).

Dada a configuração fática do momento em que a decisão acima transcrita foi prolatada, entendeu o juiz estarem presentes os requisitos que autorizam a custódia cautelar, a saber, a necessidade de proteção de uma das testemunhas, além da possível ingerência da acusada no panorama processual.

Ocorre que, durante o tramitar do presente writ, sobrevieram mais duas decisões, todas mantendo a prisão preventiva da paciente. A primeira, exarada por ocasião da sentença de pronúncia, na parte que interessa, encontra-se assim redigida:

“Embora os réus sejam primários e não ostentem antecedentes, os crimes de homicídio pelos quais serão julgados são de extrema gravidade, estão classificados como hediondos e causaram intenso clamor público, de modo que, caso os réus não permaneçam privados de liberdade, a ordem pública poderá não estar garantida, assim como a própria segurança deles eventualmente poderá estar em risco.

Portanto, mantida a prisão cautelar, os réus não poderão recorrer em liberdade, bem como, presos deverão aguardar o julgamento pelo Tribunal do Júri” (fl. 264).

A segunda, que confirma as anteriores, foi prolatada no bojo da sentença condenatória, nos termos abaixo:

“Por serem crimes hediondos os homicídios qualificados, a ré cumprirá a pena de reclusão, em regime integralmente fechado e, a de detenção, em regime semi-aberto, primeiro a de reclusão e finalmente a de detenção.

Estando presa preventivamente e, considerando a evidente periculosidade da ré, não poderá recorrer da presente sentença em liberdade, devendo ser expedido mandado de prisão contra a ré Suzane Louise von Richthofen” (fl. 278).

Tem-se, portanto, como ato pretensamente coator, essa última decisão judicial, amparada em veredicto proferido por júri popular.

Claro está que a mera condenação não seria suficiente para o encarceramento da paciente. A regra contida no art. 594 do Código de Processo Penal, que prevê a necessidade de o réu recolher-se à prisão como condição de sua apelação, tem sido interpretada por esta Corte em consonância com as garantias fundamentais inscritas na Constituição da República.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal vem entendendo que decorre do princípio de presunção de inocência que só se recolha ao cárcere aquele que tem contra si sentença penal transitada em julgado ou, excepcionalmente, quando for o caso da decretação de uma das modalidades de prisão cautelar, observados os parâmetros do art. 312 do CPP.

Pois bem, na situação em apreço entendo que a prisão da paciente, embora determinada em sentença condenatória ainda pendente de trânsito em julgado, foi ela decretada em harmonia com os parâmetros legais.

Com efeito, as reiteradas ordens de prisão expedidas em desfavor da paciente não apenas invocaram a necessidade de sua segregação cautelar como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, como também ressaltaram a periculosidade que aquela ostenta, particularmente no tocante ao risco que representa para a integridade física do irmão, com quem disputa a partilha dos bens dos pais, vítimas da acusação de homicídio a que responde.

Ora, como corretamente anota Julio Fabbrini Mirabete, ao comentar o dispositivo do CPP que estabelece os requisitos para a prisão preventiva, a lei se refere:

“… em primeiro lugar, às providências de segurança necessárias para evitar que o delinqüente pratique novos crimes contra a vítima e seus familiares ou qualquer outra pessoa, quer porque é acentuadamente propenso às praticas delituosas, quer porque em liberdade encontrará os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida.”

As decisões atacadas, de resto, encontram-se em linha com diversos precedentes desta Corte, tais como o HC 90.513/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, o HC 88.196/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, o HC 87.571/MT, Rel. Min. Gilmar Mendes, o HC 87.194/SE, Rel. Min. Joaquim Barbosa, o HC 84.981/ES, Rel. Min. Carlos Velloso e o HC 89.266/GO, de minha relatoria.

Convém ressaltar, ainda, que o já citado Mirabete, ao referir-se ao primeiro fundamento legal para a decretação da custódia cautelar, qual seja, a garantia da ordem pública, invocada, dentre outros fundamentos, nas decisões que determinaram o cerceamento da liberdade da paciente, acertadamente observa que:

“… o conceito de ordem pública não se limita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão. A conveniência da medida, como já se decidiu no STF, deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa. Embora seja certo que a gravidade do delito, por si só, não basta à decretação da custódia provisória, não menos exato é que, a forma de execução do crime, a conduta do acusado, antes e depois do evento, e outras circunstâncias provoquem intensa repercussão, e clamor público, abalando a própria garantia da ordem pública.”

As decisões encartadas nos autos, acima transcritas em resumo, bem como a notoriedade dos fatos que envolvem o processo em questão, autorizam, data venia, que se conclua pelo acerto das ordens de prisão decretadas nas instâncias inferiores contra a paciente, as quais, no meu entender, encontram-se hígidas sob o ponto de vista legal.

Penso, ademais, que o habeas corpus não constitui instrumento idôneo para rever a avaliação da personalidade da paciente realizada, vis-à-vis, pelo magistrado a quo.

Em face do exposto, pois, e pedindo as vênias de estilo ao eminente Ministro Marco Aurélio, pelo meu voto, denego a ordem.

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