Juiz delegado

STF concede 70% dos HC porque pedido de prisão é ilegal

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3 de setembro de 2007, 13h51

Setenta por cento dos pedidos de Habeas Corpus que questionam ordens de prisão preventiva impetrados no Supremo Tribunal Federal são deferidos pelos ministros porque essas ordens são ilegais. Os decretos não são fundamentados ou se limitam a invocar apenas os limites legais — sem levar em consideração a jurisprudência do STF.

O número e a análise foram apresentados pelo ministro Gilmar Mendes, durante o I Congresso Internacional — Crime, Justiça e Violência, promovido pela Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes e pelo Instituto Panamericano de Política Criminal (Ipan). Gilmar Mendes falou sobre Abuso Acusatório e Jurisprudência do STF, palestra da qual também participou o criminalista Antônio Ruiz Filho.

A aparente liberalidade do STF em conceder Habeas Corpus leva a uma falsa impressão de impunidade. Os números, no entanto, mostram que a sensação de impunidade surge quando a primeira instância, para dar resposta imediata à sociedade, acaba cometendo ilegalidades nos decretos de prisão que precisam ser corrigidas pelas instâncias superiores.

Como é costume o Tribunal de Justiça não revogar o decreto de prisão e a decisão ser mantida pelo Superior Tribunal de Justiça, a última esperança do preso é sempre o STF. Tanto assim que, segundo o ministro Gilmar Mendes, ao contrário do que muita gente acredita, não ganha liberdade apenas quem tem dinheiro para pagar bons advogados.

De acordo com o ministro, os entendimentos mais importantes do STF em matéria criminal são firmados em HCs impetrados por defensorias públicas. Quando um caso de repercussão chega à casa, o que os ministros fazem é aplicar a orientação firmada nos processos que discutem crimes que não foram noticiados pela imprensa.

Para Gilmar Mendes, não se pode basear decreto de prisão em argumentos genéricos, como garantia da ordem pública ou clamor popular. Qualquer HC que questione decreto de prisão preventiva expedido com base nesse argumento certamente será deferido pela corte.

A jurisprudência do Supremo é clara ao afirmar que nem ordem pública nem clamor popular justificam prisão. Estes são argumentos genéricos. E, quando esses argumentos forem invocados, o juiz precisa justificá-los, indicando os fatos concretos em que se baseia.

O decreto de prisão preventiva ainda precisa mostrar prova da existência do crime e indício suficiente de autoria, conforme determina o artigo 312 do Código de Processo Penal. Também não cabe deixar alguém preso por causa da gravidade do delito. Isso fere o princípio constitucional da presunção de inocência.

Como há juízes que ainda insistem em usar argumentos genéricos, não cabe nesse momento, conforme o ministro, restringir a atuação do Supremo Tribunal Federal a ponto de fazê-lo não julgar pedidos de Habeas Corpus. A frase foi comemorada pelo criminalista Ruiz Filho. “Se não é o STF para garantir direitos fundamentais, quem poderá fazê-lo?”, indagou. A platéia de advogados que assistiam a palestra pareceu concordar com o colega, como se a dúvida, com ares de desabafo, fosse a mesma de todos os que militam na área do Direito Criminal.

Sede de acusar

A atuação do Ministério Público na área criminal também foi criticada por Gilmar Mendes. O ministro disse que o Supremo Tribunal Federal tem afirmado constantemente que denúncia genérica não é viável para instaurar Ação Penal. E, assim como os Habeas Corpus deferidos, 60% ou 70% das denúncias são declaradas ineptas pelo STF por não observarem o devido processo legal.

Segundo Gilmar, o que o MP faz, quando apresenta denúncias ineptas, é “transformar o homem em objeto do processo estatal”. Para o ministro, o que o MP precisa é se conscientizar que o “Direito Penal não é instrumento de pena”.

“Instaura-se Ação Penal para satisfazer anseios variados. É aí que está o abuso do poder acusatório”, afirmou o ministro. Gilmar Mendes já firmou, anteriormente, que o MP usa as ações de improbidade administrativa para defender interesses pessoais, corporativistas e políticos.

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