Chefe da garagem

Troca de carros de desembargadores paulistas gera polêmica

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1 de setembro de 2007, 0h01

Desta vez não foi o PSOL nem o MST que reclamaram. Um desembargador do próprio Tribunal de Justiça de São Paulo mandou um ofício à presidência da casa questionando os R$ 4,8 milhões gastos para comprar 125 carros e renovar a frota de automóveis que servem os desembargadores paulistas. A licitação, feita por meio de pregão eletrônico, foi vencida pela General Motors.

O desembargador Luiz Pantaleão, da 3ª Câmara Criminal, quer que a presidência explique o uso de dinheiro do Fundo Especial do Tribunal para comprar carros. Pantaleão defende que a finalidade do Fundo é assegurar a “expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional, visando ampliar o acesso à Justiça”.

Para Pantaleão “os desembargadores têm meios próprios de locomoção” e a compra dos 125 carros não contribui para “expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional” conforme previsto na lei que criou o Fundo Especial. O desembargador alega que o dinheiro do fundo deve ser usado para desenvolvimento de programas internos e aquisição de equipamentos de informática e aperfeiçoamento de servidores e juízes. “Não se pode afirmar que o carro de ‘representação’ influi na proficiência funcional do desembargador e no desempenho da específica atividade jurisdicional. Também, é claro, não amplia acesso à Justiça”, diz.

Pantaleão pediu também que o Tribunal de Contas de São Paulo fiscalize a legalidade da compra.

À revista Consultor Jurídico o presidente do TJ-SP, desembargador Celso Limongi, garante que o tribunal comprou os carros para renovar uma frota de nove anos e que Pantaleão está “desinformado”. “A única verba de que dispomos para resolver questões como essa é a do Fundo Especial. A Lei 8.876/94, que instituiu o Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi redigida com minha ajuda. A licitação foi feita dentro da legalidade e a troca de carros era uma necessidade, que pode ser comprovada. A presidência do tribunal é absolutamente transparente”, afirma Limongi.

De acordo com ele, os carros novos já estão em uso. “Os desembargadores corriam risco com os veículos antigos. Lamento que o desembargador Pantaleão não tenha se informado antes de apresentar esse ofício. Não há irregularidade”, garante.

Celso Limongi ainda disse que desde o início da sua gestão, tenta acabar com a exclusividade de carros para desembargadores. Até porque é impossível ter uma frota de 360 veículos (um para cada magistrado). O quadro de motoristas também está sendo remanejado. A intenção é terceirizar este tipo de serviço.

Leia o ofício do desembargador Luiz Pantaleão

São Paulo, 27 de agosto de 2007

Assunto: Carros de “representação” versus Legalidade

Senhor Presidente

Vossa Excelência e seu delegado ordenador de despesa, Juiz Assessor, este representando o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na formalização negocial, gastaram R$ 4.818.750,00 (quatro milhões, oitocentos e dezoito mil e setecentos e cinqüenta reais), adquirindo cento e vinte e cinco veículos de “representação” para uso dos Senhores Desembargadores (Contrato nº 000.006/07 com aditamento – SAD 4.2). O ônus recaiu nos recursos do Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

A Lei Estadual nº 8.876, de 2 de setembro de 1994, que instituiu o Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, estabeleceu no artigo 2º: “Sem prejuízo das dotações consignadas no orçamento, o Fundo a que se refere o artigo anterior tem por finalidade assegurar recursos para expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional, visando ampliar o acesso à Justiça.”.

Acontece que causa grande perplexidade que o Fundo tenha sido onerado com despesa decorrente de compra de automóveis de “representação” dos Desembargadores. Tais carros não implicam expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional, como aconteceria, por exemplo, com despesas para aquisição de equipamentos de informática e treinamento de servidores. Também, por óbvio, não implicam ampliação do acesso à Justiça. – Como sustentar que aquisição de carros de “representação” tem por finalidade aperfeiçoamento da atividade jurisdicional ou ampliação do acesso à Justiça? Aliás, veículo automotor de “representação” não é nem deve ser prioridade. Os Senhores Desembargadores têm mesmo, em princípio, meios próprios de locomoção.

Observe-se que os carros de “representação” já estão a compor uma frota de aproximadamente duzentos e oitenta unidades. Ao que parece, a pretensão é de atingir a marca de trezentos e sessenta veículos de “representação”, ou seja, um para cada Desembargador. Evidentemente, uma frota dessa proporção acarreta grandes despesas de manutenção e compra de combustível, além de exigir o concurso de muitos agentes de segurança (motoristas). Vossa Excelência bem sabe que, considerando-se o uso restrito que o chamado carro de “representação” deve ter, uma pequena frota bastaria para o atendimento dos Senhores Desembargadores. Suficiente seria alguma adequação administrativa na organização do serviço. O que se não pode afirmar é que o carro de “representação” influi na proficiência funcional do Desembargador no desempenho da específica atividade jurisdicional. Também, é claro, não amplia acesso à Justiça.

Referentemente a esse ônus que recaiu sobre o Fundo Especial de Despesa, já formalizei, conforme protocolo de 23.8.2007 e na forma da Lei Complementar Estadual nº 709, de 14 de janeiro de 1993, o cabível expediente perante o Egrégio Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Outrossim, a verba empregada na compra dos veículos de “representação”, tinha de ser dirigida ao pagamento das indenizações de natureza alimentar devidas, com chancela administrativa, aos Senhores Funcionários do Poder Judiciário, incluindo-se o principal e o montante decorrente da aplicação do Fator de Atualização Monetária (“FAM”). É de conhecimento geral que a Lei Estadual nº 12.395, de 21 de julho de 2006, introduziu alteração na Lei nº 8.876, de 2 de setembro de 1994, exatamente para que o Fundo Especial de Despesa pudesse bancar indenizações administrativas (parágrafo único, do art. 2º). Na mesma ordem de idéia, não se perca de vista que, para efeito da apuração dos limites estabelecidos nos arts. 19, 20, 22, parágrafo único, e 71, todos da Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), devem ser desconsideradas as despesas de pessoal decorrentes de direito reconhecido pela via administrativa, cujo fato gerador seja anterior ao período de apuração da despesa total de pessoal estabelecido no parágrafo 2º, do art. 18, do citado Diploma.

Em face do exposto, – e já notificando essa Presidência que dirigi representação aos eminentes integrantes do Colendo Órgão Especial para apuração da regularidade da licitação e aquisição dos mencionados carros de “representação” -, requeiro que Vossa Excelência leve urgentemente ao Colendo Órgão Especial, as seguintes propostas: a) imediato pagamento, na proporção dos recursos existentes no Fundo Especial de Despesa, das indenizações devidas aos Senhores Funcionários; b) prévia autorização do Colendo Órgão Especial para a realização de quaisquer gastos que onerem o Fundo Especial de Despesa; c) indicação, no momento da inscrição eleitoral da candidatura do Desembargador para o cargo diretivo de Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, dos nomes dos Juízes que integrarão a numerosa equipe de Assessores, para o conhecimento do Colendo Tribunal Pleno da identidade dos Magistrados que, delegados ordenadores de despesa, representarão a Corte perante terceiros.

Ao ensejo, apresento protestos de elevado apreço e consideração.

Luiz Pantaleão, Desembargador

AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR

CELSO LUIZ LIMONGI

DD. PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

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