Judiciário infiltrado

Réu soube do pedido de sua prisão, antes da juíza

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30 de novembro de 2007, 13h29

Antes mesmo de chegar às mãos da juíza que o deferiu, cópia do pedido de prisão preventiva contra 18 acusados de pertencerem à máfia dos bingos no Rio de Janeiro já estava nas mãos de defensores dos envolvidos. O vazamento das informações do processo que corria em segredo de Justiça aconteceu, provavelmente, dentro da própria Justiça Federal, no início de novembro, quando os autos foram remetidos da 1ª Vara Criminal Federal para a 6ª Vara, passando pelo setor de distribuição.

O vazamento foi denunciado pela própria juíza que assinou os mandados de prisão, Valéria Caldi – titular da 8ª Vara que atuou como substituta do juiz Marcelo Enes, responsável pelo caso na 6ª Vara. Ao deferir as prisões preventivas, ela expôs: “Antes mesmo de esta magistrada conseguir acabar de analisar todos os volumes do processo e proferir decisão, já tinham alguns dos supostos elementos da quadrilha obtido, sabe-se lá por que meios!!, cópias de suas principais peças, cujo conhecimento, por razões óbvias, é especialmente apto a frustrar a execução das medidas acautelatórias que ora serão decretadas”.

Para a juíza, o fato inusitado comprova que uma quadrilha atua dentro do próprio Judiciário federal no Rio de Janeiro. “Tal fato é a prova concreta de que sobejam indícios no sentido de que o poderio de infiltração do bando nas instituições públicas é muito maior do que se pode imaginar!! “

Coincidência ou não, pela primeira vez uma operação de cumprimento de mandados de prisão feita pela Polícia Federal não foi bem sucedida. Esperava-se, pelo menos, o cumprimento de 16 dos 18 mandados expedidos, já que dois dos réus são argentinos e era previsto que não fossem encontrados. No entanto, vinte e quatro horas depois de os agentes irem à rua, apenas quatro dos réus estavam presos na manhã desta sexta-feira. Mesmo assim porque um deles apresentou-se espontaneamente.

O mais curioso é que entre os presos estão o bicheiro Antônio Petrus Kallil, o “Turcão” e o advogado Sérgio Luzio Marques de Araújo. Foi através da advogada de “Turcão”, Maria Aparecida Medeiros (OAB/RJ 81.911) e do próprio Luzio, que além de advogado é irmão de um juiz federal, que os servidores da 6ª Vara tomaram conhecimento do vazamento dos documentos, antes mesmo do processo (n° 2007.51.01.812262-4) chegar àquela serventia judiciária. Além destes dois réus, a Polícia Federal conseguiu prender José Luiz da Costa Rebello. Já o bicheiro Ailton Guimarães Jorge, o “Capitão Guimarães”, apresentou-se à polícia duas horas depois de os agentes terem estado em sua casa, em Niterói.

Incidentes

O processo que gerou os novos 18 mandados de prisão, iniciado no segundo semestre do ano passado, acumula uma série de pequenos incidentes. Ele foi deflagrado com um pedido de busca e apreensão assinado pelos procuradores da República Carlos Alberto Aguiar, Eduardo André Lopes, José Augusto Vagos e Luiz Fernando Lessa, para o recolhimento de máquinas caça-níqueis instaladas em 17 bingos da cidade do Rio de Janeiro. Os procuradores alegavam que tais máquinas possuíam um equipamento eletrônico – noteiro (utilizado para identificar o valor das cédulas colocadas nas máquinas) – de fabricação estrangeira cuja importação é proibida. Portanto, seu ingresso no país é fruto de contrabando.

Distribuído livremente, o caso caiu nas mãos do juiz Marcos Bizzo Moliari, da 1ª Vara Federal Criminal. Em um primeiro momento Bizzo negou o pedido para, tempos depois, provocado pelos procuradores, reconsiderar a decisão. Em dezembro, cumprindo os mandados por ele assinados, a Polícia Federal recolheu 2.555 máquinas nas 17 casas de bingo sob investigação durante a Operação Ouro de Tolo.

Por se tratar de uma tarefa braçal difícil de executar, houve máquinas que deixaram de ser formalmente recolhidas, até por falta de espaço para depositá-las. Isto levou o juiz a rever sua decisão, liberando as que estavam apreendidas. A medida foi suspensa, através de recurso dos procuradores junto ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo). O desembargador Abel Gomes, manteve a apreensão, em janeiro passado.

Enquanto as máquinas apreendidas eram periciadas para comprovar a existência da peça contrabandeada, os membros da máfia do bingo no Rio foram atingidos pela Operação Furacão. Nela, cumprindo mandados expedidos pelo ministro César Peluso, do Supremo Tribunal Federal (STF), a polícia federal prendeu 25 pessoas entre donos de bingos, de máquinas caça-níqueis, advogados e membros do Judiciário acusados de corrupção. Entre os presos estavam dois desembargadores federais do Rio – Ricardo Regueira e Carreira Alvim –, um juiz do TRT de Campinas, Ernesto Dória, um procurador regional da República, João Ricardo Leal.


A Operação Furacão foi deflagrada também por conta de apreensões de máquinas caça-níqueis, mas em outra operação policial — Vegas e Vegas1—, desenvolvida pela delegacia da Polícia Federal em Niterói, atingindo bingos daquela cidade. Para liberar aquelas máquinas é que teriam sido negociados pagamentos de propinas a membros do Poder Judiciário, entre eles o ministro do Superior Tribunal de Justiça, Paulo Medina, como consta das denúncias do caso.

Por conta da Operação Furacão, que no Rio tramita na 6ª Vara Federal, o juiz Bizzo, ao receber a denuncia e o pedido de prisão preventiva contra 18 acusados de serem donos das máquinas apreendidas na Operação Ouro de Tolo, considerou que o MPF estaria tentando repetir demanda penal já em curso. Ele então se deu por incompetente e encaminhou o caso para a 6ª Vara. Isto ocorreu no dia 6 de novembro. Entre os 18 denunciados encontram-se 15 réus da Operação Furacão.

Somente três dias depois, na sexta-feira dia 9, é que o processo foi encaminhado para o setor de distribuição. Mas foi no final do dia 12, segunda-feira, que o sistema informatizado da Justiça Federal do Rio – Apolo – registrou a redistribuição dos autos que corriam em segredo de Justiça. Foi também no final daquela segunda-feira que a 6ª Vara recebeu o processo os diversos volumes dos autos.

Antes, porém, da secretaria da 6ª Vara tomar conhecimento desta redistribuição, o seu diretor, João de Almeida Rodrigues Neto, foi procurado pelo réu e advogado Sérgio Luzio querendo saber do processo em curso, como narra a juíza Caldi em seu despacho. Ao saber disto, a juíza procurou informações com sua colega da 1ª Vara, Rosália Monteiro Figueira e descobriu que já no dia 9, sexta-feira, ela foi procurada por outro advogado “que não tem condições de identificar, indagando sobre o presente processo e o pedido de prisão preventiva, requerendo, ainda, verbalmente, vista dos autos.”

Na 6ª Vara o processo tramitou apenas nas mãos do diretor da secretaria, Rodrigues Neto, e da juíza Caldi, tendo permanecido trancado em armário ao qual apenas Rodrigues Neto tem acesso. Mas, no dia 14, quando a juíza ainda analisava o caso, a advogada Maria Aparecida Medeiros – defensora de Turcão – “solicitando informação sobre a localização física dos presentes autos, pois já estava ciente da decisão de declínio de competência proferida pelo juízo da 1ª Vara Federal Criminal”.

O diretor da secretaria formulou uma informação dentro do autos, na qual, segundo a juíza Caldi, consta que “a citada advogada apresentou, ao Diretor de Secretaria desta vara, cópias de parte da denúncia, do pedido de prisão preventiva formulado pelo MPF e da referida decisão, que foram por ele reproduzidas para serem juntadas aos autos”.

Caldi não escondeu seu espanto nos autos onde relatou: “Não havia, portanto, nenhum motivo lícito para que qualquer advogado ou acusado tivesse ciência do teor da denúncia e do requerimento de prisão preventiva formulados pelo MPF. Qual não é a surpresa desta magistrada ao se deparar com a absurda situação de que terceiras pessoas não apenas têm conhecimento da existência do procedimento e do seu conteúdo como têm, inclusive, cópias do mesmo. E tais terceiras pessoas são ninguém menos do que alguns dos denunciados e seus respectivos advogados, sendo identificados até o momento o denunciado Sérgio Luzio e a advogada do denunciado Antonio Petrus Kallil”.

Toda esta situação explicaria o insucesso da operação da Polícia Federal para prender os 18 acusados, Ela agora autorizou o Ministério Público a tirar cópia da peças do processo para tomar as medidas que entender necessárias.

Leia o despacho da juíza

2007.51.01.812262-4 26005 – PROCEDIMENTO CRIMINAL COM DENUNCIA

Autuado em 31/10/2007 – Consulta Realizada em 30/11/2007 às 10:57

AUTOR : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

PROCURADOR: CARLOS ALBERTO GOMES DE AGUIAR E OUTROS

REU : JOSE RENATO GRANADO FERREIRA E OUTROS

ADVOGADO : ROGERIO MARCOLINI DE SOUZA E OUTROS

06ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro – VALERIA CALDI MAGALHAES

Juiz – Decisão: VALERIA CALDI MAGALHAES

Objetos: CONTRABANDO E/OU DESCAMINHO

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Concluso ao Juiz(a) VALERIA CALDI MAGALHAES em 19/11/2007 para Decisão SEM LIMINAR por JRJJRT


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Processo n? 2007.5101.812262-4

Trata-se de denúncia oferecida contra JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, AÍLTON GUIMARÃES JORGE, JÚLIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, ANIZ ABRAHÃO DAVID, NAGIB TEIXEIRA SUAID, ANTÔNIO PETRUS KALIL, MARCELO CALIL PETRUS, LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA, SÉRGIO LUZIO MARQUES DE ARAÚJO, JOSÉ GRILLE SANCHINO, FRANCISCO RECAREY VILAR, originalmente distribuída à 1ª Vara Criminal.

Às fls. 226/234, o juízo da 1ª Vara Criminal deu-se por incompetente para o processamento do feito, remetendo os autos a este juízo, pelas seguintes razões:

a) existência de bis in idem em relação aos delitos de contrabando e quadrilha apurados na ação penal n? 2007.5101.802985-5;

b) conexão do delito remanescente (art. 2º, inc. IX da Lei 1521/51) com os fatos em apuração nos autos da referida ação penal.

1. Da competência deste juízo.

Firmo a competência deste juízo, embora por razões distintas daquelas invocadas pelo ilustre colega da 1a Vara Criminal, as quais reputo equivocadas.

De fato, aqui tramita a ação penal n? 2007.5101.802985-5, na qual imputa-se aos acusados JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, AÍLTON GUIMARÃES JORGE, JÚLIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, ANIZ ABRAHÃO DAVID, NAGIB TEIXEIRA SUAID, ANTÔNIO PETRUS KALIL, MARCELO CALIL PETRUS, LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA e SÉRGIO LUZIO MARQUES DE ARAÚJO, entre outros, o delito de quadrilha ou bando e contrabando.

Inicia a denúncia por esclarecer que os acusados compõem uma organização criminosa voltada à exploração ilegal das atividades de bingos e máquinas caça-níqueis no Estado do Rio de Janeiro, praticando, para tanto, diversos crimes autônomos contra a Administração Pública de forma estável, permanente e reiterada. E prossegue esmiuçando os níveis em que se estrutura a referida organização, as atribuições de cada um para, depois, apontar alguns dos crimes por ela praticados.

Por outro lado, na denúncia oferecida nestes autos, já em sua parte introdutória, esclarece o parquet que a imputação abrange, preliminarmente, crimes de contrabando pela utilização, em proveito próprio e no exercício de atividade comercial, de mercadoria estrangeira que sabem os denunciados ser produto de introdução clandestina no país e pela aquisição de mercadorias da mesma natureza desacompanhadas de documentação legal, tudo em relação a 5.255 máquinas apreendidas em buscas e apreensões deferidas judicialmente.

Paralelamente, por serem tais máquinas caça-níqueis manipuláveis, a imputação abrange, também, o crime contra a economia popular tipificado no artigo 2º, inc. IX da Lei 1521/51.

E prossegue o MPF, afirmando que ainda, por terem se reunido todos os denunciados para a prática reiterada e estável dos crimes encimados, imputar-se-á face aos mesmos o crime tipificado no artigo 288 do CP.

Há, por fim, uma imputação de falsidade ideológica dirigida a apenas dois dos denunciados LICÍNIO e LAURENTINO.

O primeiro motivo invocado na decisão de fls. 226/234 afigura-se, data venia, errôneo. Isto porque ele parte da falsa premissa de que o MPF, em relação à imputação do crime de contrabando, reproduz ação que já tramita contra os denunciados.

O ilustre magistrado da 1a Vara Federal Criminal afirma, em sua decisão, ter realizado investigações sponte propria nas quais logrou tomar conhecimento da existência de aditamento à denúncia nos autos da ação penal 2007.5101.802985-5 (desta 6a Vara Criminal) pela prática do delito de contrabando, aditamento este que não foi juntado aos autos pelo MPF, no seu entender por um lapso. Afirma, também, categoricamente, que, nesta nova ação (processo n. 20075101.812262-4), o MPF tenta repetir demanda penal já em curso, justamente aquela inserida no citado aditamento.

Ocorre que uma análise prima facie de ambos os feitos afasta toda e qualquer possibilidade de correção deste ponto de vista, senão vejamos.

Na ação penal n. 2007.5101.802985-5, à qual respondem os acusados pela pratica dos delitos de quadrilha, corrupção ativa e passiva, o MPF aditou a denúncia originalmente oferecida para nela ver incluída a imputação do delito previsto no art. 334, § 1o, “c” do Código Penal, nos seguintes termos:

“ De fato, os denunciados SILVÉRIO CABRAL NERY JUNIOR, SERGIO LUZIO DE ARAUJO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA e PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, agindo para atender aos interesses dos denunciados JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA JUNIOR (BETEC), LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO (BINGO ICARAÍ), AILTON GUIMARÃES JORGE (CAPITÃO GUIMARÃES), ANIZ ABRAHÃO DAVID e ANTONIO PETRUS KALIL (TURCÃO) – que tinham pleno conhecimento dos fatos e exerciam absoluto domínio finalístico sobre os atos de corrupção “ ofereceram e efetuaram pagamento indevido em valores ao Desembargador Federal CARREIRA ALVIM, a fim de que o mesmo praticasse ato de ofício (liminar de liberação de máquinas de caça-níqueis na Medida Cautelar inominada TRF 2a Reg n. 2006.0201.005969-4), o que efetivamente foi feito.


Já JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA, SEGIO LUZIO DE ARAUJO e PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, agindo para atender aos interesses dos denunciados JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA JUNIOR (BETEC), LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO (BINGO ICARAÍ), AILTON GUIMARÃES JORGE (CAPITÃO GUIMARÃES), ANIZ ABRAHÃO DAVID e ANTONIO PETRUS KALIL (TURCÃO) – que tinham pleno conhecimento dos fatos e exerciam absoluto domínio finalístico sobre os atos de corrupção “, não somente ofereceram como efetuaram pagamento indevido em valores, por intermédio de VIRGÍLIO MEDINA , ao Ministro PAULO MEDINA, afim de que o mesmo praticasse ato de ofício (liminar de liberação de máquinas caça-níqueis na Reclamação STJ n. 2211), o que efetivamente foi feito. Ademais, também por intermédio de VIRGÍLIO MEDINA, ofereceram pagamento indevido em valores para que o Ministro PAULO MEDINA proferisse voto favorável a empresas de caça-níqueis no julgamento de mérito da Reclamação STJ n. 2211.

Ainda consoante o teor da imputação contida na denúncia, em outra oportunidade, MARCELO KALIL e SERGIO LUZIO DE ARAUJO entregaram a quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais ) ao Magistrado CARREIRA ALVIM, a fim de que, no interesse da organização criminosa por ele próprio integrada, liberasse outras máquinas caça-níquel apreendidas pela Polícia Federal.

As aludidas máquinas, cuja liberação foi “negociada” com os magistrados PAULO MEDINA e CARREIRA LAVIM, foram apreendidas em abril de 2006, por determinação do Juiz da 4a Vara Federal de Niterói, RJ, que expediu mandados de busca e apreensão de máquinas caça-níqueis instaladas em três casas de Bingo “ CENTRAL, PIRATININGA e ICARAÍ- pertencentes, de fato, aos denunciados LICÍNIO SOARES BASTOS e LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS.

Perícia nelas realizada, constatou a presença de “componentes de origem estrangeira”, sendo certo que sua internação é proscrita nos termos da normativa vigente (vide laudos em anexo).

(…)

Em sendo assim, …, os denunciados VIRGÍLIO MEDINA, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, SILVÉRIO CABRAL NERY JUNIOR, SÉRGIO LUZIO DE ARAÚJO, JAIME GARCIA DIAS, MARCELO CALIL PETRUS, NAGIB TEIXEIRA SAUID, JOÃO OLIVERIA DE FARIAS, EVANDRO DA FONSECA, JULIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTIS FERREIRA JUNIOR (BETEC), LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO (BINGO ICARAÍ), AILTON GUIMARÃES JORGE (CAPITÃO GUIMARÃES), ANIZ ABRAHÃO DAVID e ANTONIO PETRUS KALIL (TURCÃO) “ … “ concorreram para a prática do delito de contrabando, em sua modalidade descrita na alínea “c” do parágrafo 1o do artigo 334 do CP.” (grifei)

Veja-se que os fatos imputados no aditamento (ação penal n? 2007.5101.802985-5) são bastante específicos: com a prática dos atos de corrupção do Desembargador Federal Carreira Alvim e do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Virgilio Medina, teriam os denunciados, concomitantemente, concorrido para o delito de contrabando das máquinas apreendidas nos Bingos CENTRAL, PIRATININGA e ICARAÍ, no bojo da intitulada Operação VEGAS II, da 4ª Vara Federal de Niterói, e cuja liberação foi determinada pelas decisões judiciais supostamente negociadas com seus prolatores.

Já na denúncia oferecida nestes autos (processo n 2007.5101.812262-4), a imputação do delito de contrabando refere-se, especificamente, às 5.255 (cinco mil, duzentas e cinqüenta e cinco) máquinas apreendidas na denominada Operação Ouro de Tolo, em cumprimento a mandados de busca e apreensão deferidos nos autos da medida cautelar n. 2006.5101.532730-9 pela 1ª Vara Federal Criminal. Referidas máquinas foram apreendidas em dezembro de 2006, nos seguintes estabelecimentos: BINGO ESPAÇO MARQUES, BINGO SAENS PEÑA, BINGO DA PRAIA, BINGO CIDADE, BINGO TAQUARA, BARRA BINGO, BINGO ASSEMBLÉIA, BINGO ARPOADOR, BINGO CARIOCA, BINGO DAS NAÇÕES, BINGO RECREIO, BINGO IPANEMA, BINGO RIO BRANCO, BINGO INTENDENTE MAGALHÃES, BINGO VOLUNTÁRIOS, BINGO SCALAMARE e BINGO CAMPO GRANDE, todos localizados na cidade do Rio de Janeiro.

Estes alguns dos trechos pertinentes desta nova denúncia, que delimitam a imputação:

“ neste feito cinge-se a imputatio ao autônomo e continuado crime de utilizarem, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial, mercadoria de procedência estrangeira que sabiam ser produto de introdução clandestina no território nacional (artigo 334, parágrafo 1o., “c”, c/c 71, do CP), além de adquirirem ou receberem, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial, mercadoria de procedência estrangeira desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabiam serem falsos (artigo 334, parágrafo 1o., “d”, c/c 71, do CP), tudo em relação às 5.255 (cinco mil duzentas e cinquenta e cinco) máquinas caça-níqueis que foram apreendidas a partir das buscas e apreensões determinadas por esse Juízo na Cautelar em epígrafe, e que deram ensejo às instaurações dos inquéritos policiais em anexo.


(…)

Como se constatou dos laudos periciais promovidos pelo Núcleo de Criminalística da Polícia Federal a partir do exame por amostragem das máquinas apreendidas por ordem desse Juízo, vários dos seus componentes possuem origem estrangeira. São citados microprocessadores, memórias, circuitos integrados, analisadores de cédulas, dentre outros, que provém de países como os Estados Unidos, Inglaterra, China, Cingapura, Malásia, Canadá, Taiwan e Japão.

Os laudos estão em perfeita sintonia com os diálogos sobre importações fraudulentas captadas nos áudios, valendo destacar conversas entre o denunciado SERGIO LUZIO e interlocutores não identificados, ocorridos respectivamente no mesmo dia e dias após o cumprimento das buscas determinadas por esse Juízo, quando resta patente que no mínimo todos os analisadores de cédulas (noteiros) utilizados pelas MEP exploradas pelos denunciados são importados ilegalmente, circunstância de pleno conhecimento por parte da quadrilha

(…)

As máquinas exploradas comercialmente e mantidas em depósito pelos acusados eram de diversos modelos e fabricantes, assim, por exemplo no laudo nº 1780/06. Sem exceção, as máquinas dependiam para funcionar de um conjunto formado por uma placa-mãe (motherboard) e um comparador (contador, leitor, identificador, analisador, comparador) de cédulas. Este último componente, repise-se, jamais foi fabricado no Brasil. Fato que de amplo conhecimento dos denunciados. Ou seja, em todas as 5.255 (cinco mil duzentas e cinquenta e cinco) máquinas empregadas comercialmente ou mantidas em depósito pelos denunciados em sua atividade ilícita o comparador de cédulas empregado foi internalizado no Brasil de forma clandestina, escondido das autoridades fazendárias.” (grifei)

Enquanto na ação penal 2007.5101.802985-5 os réus são acusados de concorrerem para o delito de contrabando de máquinas apreendidas em abril de 2006 na cidade de Niterói, mediante a prática de atos de corrupção, nesta, são denunciados pela prática do contrabando em relação a máquinas totalmente distintas, apreendidas oito meses depois em Bingos da cidade do Rio de Janeiro.

Conclui-se, portanto, que o objeto material, o local e o tempo de cada um dos crimes são totalmente distintos, o que leva à conclusão inexorável de que se está diante de crimes diferentes. Ou, em outras palavras, de que não se configura o bis in idem.

E assim como não há bis in idem, não há, também, motivos para, invocando a figura da progressão criminosa, atestar a ocorrência de absorção de crimes de forma tão precipitada.

A propósito, a afirmação, nesta fase preliminar de admissibilidade da acusação, de princípios relativos à resolução de conflitos aparentes de normas não encontra qualquer respaldo legal ou doutrinário e, obviamente, representa uma indevida antecipação de juízo de valor que somente a sentença de mérito, após a regular instrução, poderá fazer.

Os réus defendem-se dos fatos criminosos imputados na denúncia e não da sua capitulação. Descrevendo a narrativa atos em tese criminosos e distintos entre si, não há que se perquirir acerca de questões que só o esmiuçamento da prova permitirá resolver.

Por outro lado, no que tange ao crime de quadrilha, realmente afirma o parquet, em ambas as ações penais, a existência de associação entre as mesmas pessoas, para a prática de crimes de igual natureza, com a narrativa de idênticas circunstâncias fáticas tais como a estrutura da organização, a utilização de interpostas pessoas, determinados critérios para distribuição de lucros, a utilização de artifícios judiciais e extrajudiciais para consecução dos objetivos do bando, entre outros dados relevantes. Do cotejo de ambas as narrativas, é forçoso concluir que se trata dos mesmos fatos. Há, portanto, bis in idem em relação às acusações, para aqueles denunciados que já respondem pelo delito de quadrilha na ação penal n? 2007.5101.802985-5.

Sucede que a existência de bis in idem, por si só, não seria ensejadora da modificação de competência nos termos invocados pela mencionada decisão. A repetição de demanda já em curso origina a litispendência, que pode ser argüida por meio de exceção ou ser reconhecida de ofício pelo juiz perante o qual foi oferecida a nova demanda.

Assim, ao receber uma denúncia que pretende reproduzir integralmente ação penal já em curso, o juízo deve, simplesmente, deixar de recebê-la, por ausência de justa causa, do mesmo modo que deve, ao tomar conhecimento de tal fato após a instauração da ação penal, extinguí-la, até mesmo de ofício, sem resolução do mérito, por força dos artigos 3o do CPP c/c 267, VI do Código de Processo Civil.

Entretanto, nesta nova denúncia é imputada a prática do mesmo delito de quadrilha também a réus que não integram a ação penal em curso nesta 6a Vara Criminal. Vale dizer, outros supostos integrantes do bando que não foram originalmente denunciados o são, agora, nesta nova ação penal. São eles: ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, JOSÉ GRILLE SANCHINO e FRANCISCO RECAREY VILAR .


Tratando-se de crime de concurso necessário, há continência entre os feitos, pois se imputa a autoria, na mesma quadrilha, a pessoas distintas, tudo nos termos do art. 77, I do Código de Processo Penal, verbis:

“Art. 77. A competência será determinada pela continência quando:

I – duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração;”

E apenas por esta razão é que se deve reconhecer a existência de continência, e não de conexão, a justificar o declínio de competência para este juízo.

Ademais, apesar da absoluta clareza no sentido de que os crimes de contrabando imputados à quadrilha, embora da mesma espécie, são totalmente distintos entre si e aptos, portanto, a instaurar ações penais também distintas, reconheço, além da continência acima mencionada, a existência de conexão entre os feitos.

Isto porque, consoante entendimento pacífico em doutrina e jurisprudência, os crimes praticados por determinado bando são conexos com o próprio delito autônomo do art. 288 do Código Penal. E, como neste processo se cuida de imputação de crime supostamente praticado pela quadrilha cuja existência se apura originalmente na ação penal 2007.5101.802985-5, ambos os feitos devem, também por este motivo, ser apreciados pela 6ª Vara Criminal, preventa nos termos do art. 83 do Código de Processo Penal.

Dúvidas não há quanto à prevenção deste juízo eis que medidas cautelares anteriores às deferidas pela 1ª Vara Criminal foram aqui decretadas, como explicitado na decisão de fls. 226/234.

Por fim, feitas estas considerações acerca de dois dos quatro crimes imputados nesta nova ação penal, bastantes por si só para justificar a alteração de competência deste órgão, desnecessário se mostra analisar exaustivamente a relação do crime contra a economia popular e o crime de falsidade ideológica com os demais delitos. Limito-me a atestar que a descrição precisa de seus elementos e o liame fático com o restante da narrativa são bastantes para a admissibilidade da acusação destes delitos também sob o manto da conexão com os delitos de contrabando e quadrilha.

Diante de todo o exposto e da presença de elementos mínimos de autoria e materialidade delitivas que serão adiante especificados:

a) RECEBO A DENÚNCIA, integralmente, em relação aos denunciados ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, JOSÉ GRILLE SANCHINO e FRANCISCO RECAREY VILAR

b) REJEITO PARCIALMENTE A DENUNCIA, com fulcro no art. 43, III do CPP , em relação aos denunciados JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA JUNIOR, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, AÍLTON GUIMARÃES JORGE, JÚLIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, ANIZ ABRAHÃO DAVID, NAGIB TEIXEIRA SUAID, ANTÔNIO PETRUS KALIL, MARCELO CALIL PETRUS, LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA e SÉRGIO LUZIO MARQUES DE ARAÚJO, no que toca à imputação do delito de quadrilha (art. 288 do Código Penal), RECEBENDO-A quanto aos demais fatos.

Defiro, parcialmente, os requerimentos iniciais do MPF, nos termos que seguem.

Requisitem-se as FACs dos acusados.

Defiro a realização de perícia requerida no item 4 de fl. 65, eis que se mostra relevante para a solução da causa a prova sobre a capacidade de manipulação de resultado das referidas máquinas como também o grau e os percentuais em que tal manipulação pode se dar. Apresente o MPF os seus quesitos, no prazo de 5 dias.

Defiro, apenas, a parte final do item 5 de fl. 65, eis que o perdimento do valor em favor da União só pode ser objeto da sentença. Defiro a utilização temporária do veículo FIAT IDEA 2006/2007, chassis 9BD 13561372040623, em atividades típicas da Polícia Federal. Os indícios de aquisição do bem com proveito da prática criminosa não recomendam, por ora, que seja nomeado depositário qualquer dos acusados. Expeça-se ofício ao Superintendente da Polícia Federal para que indique depositário para este fim.

Defiro parcialmente o item 6 de fls. 65. Oficie-se ao Governo do Estado do Rio de Janeiro para informar se tem interesse em receber parte das MEP apreendidas a fim de transformá-las, provisória e temporariamente, em computadores destinados a escolas públicas e programas de inclusão digital nos termos requeridos. Quanto ao pleito de destruição liminar das máquinas, indefiro-o, por ora, eis que representaria afirmar desde logo a existência do crime cuja apuração está, apenas, a iniciar-se.

Defiro os itens 7, 8 e 10 de fls. 65/66. Oficie-se como requerido.

Defiro, igualmente, a juntada dos documentos oferecidos com a inicial. Acautele-se o HD fornecido pelo MPF com as cautelas necessárias.

2. Da prisão preventiva dos denunciados

Passo a apreciar o requerimento de decretação de prisão preventiva feito em face dos denunciados JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, AÍLTON GUIMARÃES JORGE, JÚLIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, ANIZ ABRAHÃO DAVID, NAGIB TEIXEIRA SUAID, ANTÔNIO PETRUS KALIL, MARCELO CALIL PETRUS, LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA, e a necessidade de decretação da mesma, ainda que de ofício, em relação aos demais acusados ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, JOSÉ GRILLE SANCHINO, SÉRGIO LUZIO MARQUES DE ARAÚJO, FRANCISCO RECAREY VILAR, tal qual autoriza o artigo 312 do Código de Processo Penal.


A prisão preventiva dos ora réus, inclusive de alguns em relação aos quais não foi a mesma requerida, é absolutamente necessária, como se passará a demonstrar.

Ressalto, desde logo, que indícios de autoria e materialidade dos delitos imputados nesta denúncia pululam no acervo probatório até o presente momento produzido.

Cingindo-me, primeiramente, ao delito de contrabando, verifico que nos laudos periciais constantes dos inquéritos policiais que instruem esta ação penal há a confirmação de que todas as máquinas apreendidas e citadas na denúncia ou são integralmente de procedência estrangeira ou são integradas por componentes estrangeiros que, por definição, têm a sua importação proibida por normas expressas (Instruções Normativas n( 126 de 26.10.1999, n( 172, de 30.12.1999, n( 93, de 29.09.2000 e n( 309 de 18.03.2003, todas da Receita Federal, além da Portaria SECEX n( 7/2000). Logo, tudo está a indicar que a sua internação no país só pode ter se dado de forma ilícita.

Quanto à autoria, as acusações feitas pelo parquet no sentido de que os acusados atuam, de fato, como verdadeiros sócios no negócio da exploração de bingos e máquinas caça-níqueis encontram respaldo probatório nos inúmeros diálogos captados em interceptação telefônica e nos documentos apreendidos nas buscas, dos quais defluem, entre outros, indícios de absoluto controle da exploração das máquinas caça-níqueis e da obtenção e distribuição dos lucros milionários que elas propiciavam entre os denunciados. Tais pontos serão esmiuçados mais adiante.

No que toca aos indicativos da prática do crime de quadrilha, os diálogos citados pelo parquet na inicial, que revelam intenso contato dos acusados ARTURO e FRANCISCO com o denunciado SERGIO (advogado que, consoante os elementos de prova, além de associado, patrocina os interesses do bando), e aqueles que apontam JOSÉ GRILLE SANCHINO como um dos donos das máquinas apreendidas nos Bingos Assembléia e Arpoador, aliados aos documentos que os ligam aos bingos, são suficientes para um juízo positivo de admissibilidade da acusação.

Passo, assim, ao exame dos demais pressupostos do artigo 312 do Código de Processo Penal.

2.1 “ A necessidade da prisão como única forma de garantir a ordem pública e evitar a reiteração delitiva

Prevê o nosso ordenamento infraconstitucional, sem que até hoje tenha sido declarada a sua inconstitucionalidade pelo E. Supremo Tribunal Federal, mais precisamente no art. 312 do Código de Processo Penal, que a prisão preventiva deverá ser decretada pelo juízo, de ofício ou a requerimento do Ministério Público ou da autoridade policial, quando se mostre necessária à garantia da ordem pública, entre outras hipóteses.

Sobre o referido pressuposto, tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm afirmado que ele se destina, entre outros fins, a evitar a reiteração delitiva, como forma de acautelar o meio social, quando, concretamente, haja elementos a indicarem a referida reiteração.

Com a devida vênia das opiniões em contrário, entendo que o elemento concreto para a afirmação da reiteração delitiva cinge-se à constatação da existência de veementes indícios da prática de novo crime ou de circunstâncias das quais possa defluir a iminência desta prática.

Assim, imagine-se a situação de um indivíduo que esteja respondendo em liberdade, eis que não formada ainda sua culpa, a uma ação penal pela prática dos delitos de quadrilha e homicídio praticados no centro de Brasília, tendo sido preso em flagrante após alvejar sua primeira vítima com oito tiros à vista de diversas testemunhas em plena Avenida das Nações.

Imagine-se, outrossim, que este mesmo indivíduo invada o prédio do Superior Tribunal de Justiça, cinco meses depois, e seja preso, novamente, em flagrante delito de homicídio, após alvejar tiros contra um servidor daquela casa na presença de outros servidores e, até mesmo, de ministros.

Dando, ainda, asas à imaginação, para melhor compreender os conceitos que ora são utilizados, suponha-se que este indivíduo fictício, dois meses depois deste segundo fato, não obstante uma outra vez solto para responder à nova ação em liberdade, desta feita pratique idêntica conduta no Supremo Tribunal Federal ou na Câmara dos Deputados.

Indaga-se: estar-se-á diante de fatos concretos que configuram a reiteração delitiva apta a ensejar a custódia cautelar do indivíduo nos dois últimos casos citados? Ainda que ele não tenha sua culpa formada em qualquer dos processos? Será realmente necessário haver o trânsito em julgado de decisão condenatória para que se possa adotar medida segregadora da liberdade em situações como esta?

Quer parecer a este juízo que a única resposta para tais perguntas é: diante da presença de veementes indícios de reiteração delitiva, a prisão preventiva é medida obrigatória, prescindindo-se de formação definitiva da culpa em processo anterior e, muito menos, naquele em que se apura a responsabilidade por fato novo.


Isto porque a prisão preventiva, não obstante vise a evitar eventos futuros, pauta-se, para a sua concessão, no substrato probatório de que o juiz dispõe até o momento da prolação de sua decisão. E se, até aquele momento, já se evidencia a reiteração delitiva por parte de determinado indivíduo, mesmo diante de mecanismos de repressão estatal atuantes, parece fora de qualquer critério de razoabilidade supor que, como que por um passe de mágica, este comportamento vá se alterar.

Voltando ao exemplo anteriormente citado, qual seria a razão lógica para se concluir que nosso personagem imaginário não invadiria, por exemplo, um ministério para praticar crime de igual jaez daqueles que, ao que tudo indica, praticara em locais e circunstâncias semelhantes por três vezes? Seria exigível da sociedade que corresse este risco? Seria necessário, para a decretação da prisão preventiva, captar um diálogo do nosso personagem detalhando precisamente o próximo crime que tem a intenção de cometer? Seriam, realmente, somente estas hipóteses acadêmicas, para não dizer livrescas, aquelas em que a prisão preventiva pode ser decretada para evitar a reiteração delitiva?

Estou convencida do contrário, na esteira de diversos precedentes jurisprudenciais de nossas Cortes Superiores, que admitem a decretação da medida pautada em indícios veementes da reiteração delitiva, especialmente pelo modus operandi do agente, e dos quais cito, por todos, os seguintes:

Habeas Corpus 86973 / RJ – RIO DE JANEIRO

Relator: Min. CARLOS VELLOSO

EMENTA: Penal. Processual Penal. Prisão Preventiva: garantia da ordem pública. CPP, art. 312. I. – Intensa participação do paciente nas atividades delitivas havidas no âmbito do COFEN, numa organização criminosa de que era o mentor. Continuidade das atividades criminosas mesmo após a instauração do inquérito policial. Decreto de prisão preventiva que não se baseia apenas na gravidade dos delitos, mas amparado no modus operandi das condutas e na necessidade de coibir a reiteração dos delitos que vêm sendo praticados há mais de dez anos. II. – HC indeferido.

(STF, Segunda Turma, publicado no DJU em 10.03.2006, pg. 54)

Recurso em Habeas Corpus 85112 / SC – SANTA CATARINA

Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. INTERPOSIÇÃO DIRETA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONHECIMENTO COMO HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. LEGALIDADE. ORDEM DENEGADA. O recurso ordinário em habeas corpus, quando interposto diretamente a esta Corte, deve ser conhecido como habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. É legítima a manutenção da prisão preventiva do paciente quando há no decreto de prisão elementos que demonstrem concretamente não terem cessado as atividades da organização criminosa à qual ele é acusado de pertencer e que evidenciem sua periculosidade.

(STF, Segunda Turma, publicado no DJU em 05.08.2005, pg. 119)

Recurso em Habeas Corpus 84847 / SP – SÃO PAULO

Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA

EMENTA: ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES. POSSE DA DROGA. PRESCINDIBILIDADE. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. REITERAÇÃO CRIMINOSA. PERICULOSIDADE DOS AGENTES. LEGALIDADE. RECURSO IMPROVIDO. A comprovação do crime de associação para o tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/1976, art. 14) deu-se no presente caso por meio de gravações telefônicas e confissões extrajudiciais. Não é imprescindível a posse da droga para configuração desse crime. O decreto de prisão encontra-se devidamente fundamentado no resguardo da ordem pública, ante a necessidade de fazer cessar a reiteração criminosa e em face da periculosidade dos agentes, fundada em fatos concretos, visto que há nos autos indícios de que a organização criminosa não se desfez. Recurso improvido.

(STF, Segunda Turma, publicado no DJU em 03.06.2005, pg. 48)

Habeas Corpus 58290/PE

Rel. Min GILSON DIPP

CRIMINAL. HC. ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRISÃO PREVENTIVA. MODUS OPERANDI. PERICULOSIDADE DO AGENTE. REITERAÇÃO CRIMINOSA. AMEAÇAS ÀS VÍTIMAS E TESTEMUNHAS. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PARA A CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.

Não há ilegalidade no decreto de prisão preventiva exarado contra o paciente, tampouco no acórdão confirmatório da segregação, eis que a

custódia encontra-se fulcrada no dispositivo legal e na jurisprudência dominante.

Paciente apontado como membro de uma conhecida quadrilha de estelionatários, que, em tese, abria empresas de fachada e, ao apresentar-se com nomes fictícios, além de roupas e carros que causavam boa impressão, adquiria em nome de tais empresas quantidades vultosas de produtos, como equipamentos de telefonia celular e materiais de construção, pagando-os com cheques sem fundos, lesando inúmeros comerciantes de cidades do Estado de Pernambuco.


A periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi da prática, em tese, criminosa e da reiteração delitiva configuram fatores concretos que obstam a revogação da segregação cautelar para a garantia da ordem pública.

A prisão cautelar também se impõem para a conveniência da instrução criminal, eis que as ameaças de morte feitas a testemunhas e vítimas demonstram que, acaso venha a ser solto, o paciente poderá efetivamente causar tumulto processual, não se tratando, pois, de meras abstrações levadas a efeito pelo Julgador singular.

Precedentes do STJ e do STF.

Ordem denegada.

(STJ, Quinta Turma, unânime, publicado no DJ de 09.10.2006 p. 327)

Feita esta pequena digressão, não hesito em afirmar que a situação destes autos é rigorosamente igual à que foi criada exemplificativamente linhas atrás para ilustrar o raciocínio, ressalvada apenas a diferença de natureza dos crimes supostamente praticados.

Explico.

Os denunciados são acusados de integrar uma complexa organização criminosa instalada há vários anos e com atuação em várias cidades do Brasil e de países estrangeiros.

A estrutura da referida organização, semelhante à das máfias, já fora objeto de percuciente análise por parte da Dra. Ana Paula Vieira de Carvalho, nos autos da ação penal 2007.5101.807604-3, na qual decretou a prisão preventiva de vários dos ora denunciados. Da extensa e minuciosa decisão, transcrevo apenas um elucidativo trecho:

“A natureza altamente organizada da quadrilha denunciada, de tipo mafioso, vem fortemente indiciada pelos elementos colhidos durante as buscas e apreensões. Apenas para ilustrar esta conclusão, parecem dignos de nota, nesta fase processual, dois dos documentos arrecadados na residência do ora denunciado LUCIANO BOLA, apontado como um dos responsáveis pela contabilidade do bando.

Deveras, o item 8.18 do mandado de busca e apreensão no. 40, cumprido na residência de BOLA, consiste em duas curiosas espécies de “petições iniciais” endereçadas ao “CLUBE BARÃO DRUMMOND”. Nelas o “autor” da “ação” que será julgada pelo clube aparentemente narra um conflito ocorrido em sua área de atuação do jogo do bicho, e, ao final, deduz sua pretensão “ recuperar pontos de bicho tomados por terceiro, direitos “hereditários” negados pelos atuais possuidores, o reconhecimento da qualidade de “sócio” da banca, e não de mero gerente, etc….-, não sem arrolar testemunhas e indicar outros meios de prova que pretende produzir (!). Vale a transcrição de alguns trechos destes documentos:

“ COMO COMEÇOU A SOCIEDADE

SOCIEDADE (1968):

VERDUN 3 PONTOS: (SR. MIRO E SR. ANGELO)

CASA 13

ANDARAI

ITAIPU

COPACABANA 1 PONTO: (SR. ANGELO)

SÁ FERREIRA (ANTIGA GALERIA GEBARA)

GRAJAÚ (CARECA)

ENGENHO NOVO (CARECA)

PÇA 7 (CARECA)

MERCADO (CATETE) (CARECA)

PÇA SÃO SALVADOR (CATETE) (CARECA)

JUNTOU TUDO: 1/3 CARECA

1/3 SR. MIRO

1/3 SR. ANGELO

OBS: CARECA PASSOU A COMPRAR PARA A BANCA EM 3/3 TOMAR CONTA DO NEGÓCIO E PRESTAR CONTAS

(…)

SOCIEDADE (1974): COPACABANA, VERDUN E CATETE CRESCERAM E RENEGOCIARAM

SEPARARAM O VERDUN PARA O SR. MIRO, COPACABANA PARA O SR. ANGELO

E O CATETE PARA O CARECA, O RESTANTE CONTINUOU NA BANCA EM 3/3.

OBS: CARECA CONTINUOU COMPRANDO PRA BANCA EM 3/3 E TOMANDO CONTA DO NEGOCIO TODO E PRESTANDO CONTAS”.

“RELATO DE ACONTECIMENTOS

Tudo ia muito bem, até que os Banqueiros foram presos, e com eles o Sr. Miro e o Maninho.

A alta despesa com advogados, quantias elevadas enviadas para prisão (quase que diariamente), as despesas pessoais dos sócios (ex: Sr. Miro mandava enviar R$ 40.000,00 para Tiana por semana) as despesas operacionais do negocio que já não iam bem, levaram a banca a uma seria crise financeira, que foi levada ao conhecimento do sócio, Sr. Miro. Que na ocasião, disse ao meu pai “Careca”, ao “gato preto” (gerente geral da banca) e perante mim na prisão, que nós não nos preocupássemos e que nós não poderíamos era sermos presos. E quanto ao dinheiro, que pegássemos emprestado com o “Doutor”, com a “menina” do Unibanco, e com quem precisássemos, que quando ele saísse da prisão, ele iria ao Paraguai traria (hum milhão) e poria tudo em ordem.

Assim, com a ciência do Sr. Miro, foram feitas algumas dívidas com as pessoas acima relacionadas, e foi também quando meu pai pegou U$ 100.000,00 com o Sr. Poty, emprestado para a banca, (e que o Maninho não pagou).

Ficamos meu pai “Careca”, o “gato preto” eu e meu irmão tocando o negocio a medida do possível.


Quando saíram da prisão, o Maninho saiu revoltado com mentiras levadas por puxa sacos em troca de uns trocados, e começou a tomar atitudes erradas, como tomar a caixa do “gato preto” (gerente geral) e não fazer as devidas contas.

Tinham vário agentes de descarga devendo, tinham rabos de guias que estavam em cima do caixa dele, e tinham as dívidas que o pai dele tinha ciência.

Sr. Miro não tinha motivos para acreditar nessas “histórias inventadas”, pois ele sabia da índole do meu pai, afinal de contas tiveram uma sociedade de 32 anos, sem nenhum problema até o Maninho se intrometer.

Mas infelizmente, ele, Sr. Miro se omitiu não revelando o que tinha sido combinado na prisão, e de que ele tinha ciência de tudo que tinha sido feito.

Maninho se aproveitou dessa situação agindo da sua maneira, usando de covardia e fazendo tudo na marra, como era o estilo dele. “Era a hora de ir a forra”, pois, ele sempre teve ciúmes do meu pai “Careca”, pois Sr. Miro sempre apoiava as atitudes e decisões do meu pai que era seu sócio, e não dava muita força a ele Maninho que era seu filho, tanto que ele só “tomava conta” de Copacabana, e todo o restante era com meu pai “Careca”.

(…) Achamos por bem esperar, pois com Maninho não se tinha argumento e nem conversa. Ele queria ganhar tudo no grito e na marra, era uma briga desigual, nós enfrentarmos ele com um batalhão de seguranças, muito bem armados, e nós sozinhos, sem seguranças e sem uma estrutura para isso.

Com o seu temperamento explosivo muitas vezes desnecessário, e com todas as coisas que ele já tinha feito durante sua vida com terceiros e continuava fazendo, não respeitando nada nem ninguém, se metendo nos negócios dos outros, e querendo ser o “Dono do Rio”. Seria inevitável que alguém fizesse alguma coisa contra ele, como infelizmente aconteceu.

Após a morte do Maninho, procuramos o Sr. Miro, para falarmos sobre o mesmo assunto, mas ele estava sem saúde e muito abalado com a morte do filho, e disse que não tinha condições de conversar sobre essas coisas. Mas que nós deixássemos o nosso telefone, e voltássemos uma outra hora, para discutirmos o assunto. Infelizmente não deu tempo, Sr. Miro faleceu um mês depois da morte do filho.

(…) Procuramos o secretário Cúpula para requerer uma reunião, pois sempre soubemos que nesta organização sempre se fez o certo e o correto, dando o direito de que é de direito, e sempre fazendo justiça. (grifo nosso).

Nossos pais tiveram uma sociedade de 32 anos sem brigas ou desavenças, e temos provas disso. E como eu sempre tive uma excelente relação com o “Bid”, tenho a certeza de que não vai ser diferente, pois apenas há um empasse e não uma briga. Acredito que tudo vai ser resolvido da melhor forma possível, com o auxílio e a orientação dos senhores”.

(Item 8.18 do Mandado de Busca e Apreensão n.º 40/2007)

“PROVAS DE QUE O CARECA ERA SÓCIO DO NEGOCIO

GUIAS DE PRESTAÇÕES DE CONTAS EM 1/3 DA BANCA.

28 IMOVEI EM SOCIEDADE DE 50%, DOS QUAIS 06 DELES AINDA SÃO USADOS PARA O NEGOCIO (COM FLAGRANTE DE JOGO).

OUTROS IMOVEIS DE PROPRIEDADE DO “CARECA” QUE FORAM UTILIZADOS PARA O NEGOCIO (COM FLAGRANTE DE JOGO).

PARTICIPAVA E VOTAVA NAS REUNIÕES DA CÚPULA.

SEMPRE ERA APRESENTADO PELO Sr. MIRO COMO SÓCIO.

FOI PRESIDENTE DA G.R.E.S. VILA ISABEL 1980.

JOGO DE RONDA EM SOCIEDADE DE 50% COM Sr. MIRO NO GRAJAÚ (Sr. D”AVILA E O Sr. BACALHAU PODEM SER TESTEMUNHAS).

TINHA 175 CAVALOS NO JOCKEY CLUB, ONDE TINHA DUAS COCHEIRAS, UM STUD “STUD LANDINHO” E BANCAVA CORRIDAS DE CAVALOS (Sr. JOSÉ SCAFURA PODE SER TESTEMUNHA).

FOI ABRIR FRENTE DE JOGO EM MACEIÓ-AL JUNTO COM O PROPRIO MANINHO.

Rio de Janeiro, 15 de Fevereiro de 2005”.

(Item 8.18 do Mandado de Busca e Apreensão n.º 40/2007)

E, no outro documento:

“Aos Senhores Diretores do Clube Barão Drumond,

MANUEL ANTONIO ALVES DE BARROS FILHO (MANELÃO)

Vem por meio desta requerer aos senhores que seja realizada uma reunião com a máxima urgência possível a fim de solucionar questões pendentes relacionadas à área da Penha, pelos motivos adiante expostos.

Em 1974, o MANELÁO foi trazido pelo JUVENIL e pelo OSWALDO MALUCO para trabalhar no ponto de bicho e das corridas na Penha. Posteriormente, com o passar do tempo o Manelão trouxe juntamente com Juvenil e Oswaldo, o seu pai o SR. NECA para trabalhar na apuração do PADEIRINHO.

Nesta ocasião o Manelão estava enrolado nas contas dos pontos da Penha e trouxe por sugestão do Oswaldo Maluco o pai (sr. Neca) para tomar conta dos pontos da Penha junto com ele. Houve um desentendimento do Juvenil e Osvaldo Maluco com o Padeirinho, e o Juvenil convidou o sr. Neca e o Manelão para bancar o jogo e não mandar mais o jogo para o Padeirinho bancar. Algum tempo depois ficou acertado entre o Juvenil o Sr Neca e o Manelão que eles tomariam conta dos pontos e dariam um valor mensalmente ao Juvenil.


(…) Durante a formação desta sociedade, vários fatos aconteceram, e o Manelão por ter o mesmo nome do pai e querer preservá-lo, assumiu todas as conseqüências destes fatos, inclusive respondendo a cinco artigos 121 (homicídio), várias portarias, Artigo 58 e Tavolagem.

Muito tempo depois com o surgimento das máquinas de vídeo-pôquer, o filho mais novo do Sr. Neca, MAURÍCIO, que até então era apenas Policial, e o filho do LUIZ BUTUCA, O LUIZINHO, que nunca tinha se envolvido com nada de jogo e era gerente de Banco, resolveram explorar essas máquinas.

Entretanto, como a repressão contra as máquinas foi muito intensa, inclusive ameaçando a todos os banqueiros que exploravam tais máquinas, o Maurício e o Luizinho se eximiram das responsabilidades e novamente o Manelão, por ter o mesmo nome do pai, assumiu e respondeu perante à polícia federal e Delegacias das respectivas áreas, a tudo que era relacionado às máquinas.

Por tudo isso, o Sr. Neca teve que gastar uma enorme quantia em dinheiro para solucionar os problemas.

(…) Dentro de sua área, o Manelão respondeu e se responsabilizou por tudo, incluindo depoimentos na Polícia Federal, inquéritos nas 22ª e 27ª D. P., apreensão de 127 máquinas (que na época custavam entre USS 1.000 e 1500 ) e superou todos os outros problemas junto com os demais. Todos esses fatos podem ser comprovados por todos os sócios que passaram por ali e acompanharam todo o sofrimento para a possibilidade de continuação de funcionamento das máquinas. Dentre esses sócios podemos citar: GELSON E RAMIREZ, depois, JOSÉ CARLOS PORTUGÊS e seu irmão ROGERÃO, posteriormente MIGUEL DE CAXIAS (da máquina Maracanã), e os atuais sócios JORGE TICÃO de Bonsucesso, E LUIZ CARLOS do Quitungo.

Diante da aparente tranqüilidade no funcionamento das máquinas, o irmão mais novo do Manelão, Maurício, que nada tinha feito em benefício da manutenção e funcionamento das máquinas tentou junto ao seu pai, Sr. Neca algum tipo de vantagem financeira relacionada às máquinas, o que foi negado pelo pai e lembrado a ele que a exploração das máquinas caça-níqueis pertenciam ao seu outro filho, o Manelão.

Em janeiro de 2003, o Manelão teve que se submeter a uma cirurgia cardíaca, ocasião em que ficou internado para operar o coração, e se aproveitando da fragilidade do irmão, o Maurício tentou instalar máquinas na área da Penha contra a vontade do seu próprio pai, pois este já tinha dado o direito de exploração das máquinas para o seu filho Manelão, que havia começado no jogo junto com ele, e que havia passado por todos os obstáculos e sofrimento com as máquinas e que qualquer assunto relacionado a máquina, fosse de seus filhos ou outra pessoa, deveria ser tratado com o Manoel (Manelão) pois ele era o dono das máquinas.

Para reafirmar todo o exposto acima, nesta mesma ocasião, aconteceu uma reunião, inclusive com a presença de um dos diretores o Sr. LUIZINHO DRUMOND, que presenciou o Sr. Neca afirmando que tudo relacionado a máquina deveria ser tratado com o Manelão.

Com o falecimento do Sr. Neca, os Diretores do Clube Barão de Drumond, decidiram que o último contrato assinado pelo Sr. Manelão seria cumprido integralmente e que a viúva do Sr. Neca, D. PAULINA, indicaria alguém para ficar a frente do jogo de bicho e este indicado foi seu filho mais novo Maurício porque o Manoel já era dono das máquinas. ( grifo nosso)

Em junho de 2004, o Manelão comprou o direito de exploração de 14 pontos do Sr. ALILSON CERPA CALDAS, que estavam arrendados ao falecido Sr. Neca (recibo em anexo). Porém não exerceu o seu direito de exploração para não dividir a área e não diminuir os recursos da sua mãe.

Falecendo também a D. Paulina, em novembro de 2004, foi sugerido ao Manelão, por membros da Diretoria que esperasse o término do último contrato feito por ele com JORGE TICÃO de Bonsucesso, que terminou em janeiro de 2005 (inclusive sendo renovado sem o conhecimento ou participação do MANELÃO QUE SEMPRE FOI O DONO) e após isso, enviasse uma carta ao Clube Barão de Drumond requerendo esta reunião para definição de quem exploraria o jogo.(grifo nosso)

Tudo o que foi relatado anteriormente poderá ser comprovado através das testemunhas que serão levadas à reunião e por todas as pessoas que acompanharam a história da área.

Senhores Diretores, é justo, depois de todo o sofrimento, de tanto trabalho, de tanto transtorno, tantos problemas superados o Manelão aceitasse a proposta feita pelo Maurício, de ficar com 10% das máquinas e do bicho?

Vale ressaltar que além de herdeiro natural do Sr. Neca, além de ter começado o jogo junto com o pai, além de ter sido reconhecido por seu pai como dono da exploração das máquinas, ele possui ainda 14 pontos seus na área. Acreditando na coerência, na idoneidade e bom senso dos membros da diretoria, O Manelão não tomou nenhuma atitude drástica para fazer valer os seus direitos e espera ser reconduzido ao lugar que é seu de fato e de direito e de onde foi tirado de forma covarde e ardilosa por seus dois irmãos (Maurício e Mozart).(grifo nosso)


Diante de todo o exposto, o Manelão requer que seja reconhecido como verdadeiro titular do direito de exploração das máquinas, porém em momento nenhum deixando os irmãos desamparados, sendo que o Maurício ficaria responsável pelo jogo do bicho, o Manelão pela exploração das máquinas e exista uma prestação de contas e que cada irmão receba um valor, tanto do jogo de bicho, quanto das máquinas.(grifo nosso)

E, a fim de manter a harmonia, o Manelão cede temporariamente a exploração dos seus 14 pontos do jogo de bicho para os irmãos.

Desde já, aguardo a confirmação da data da reunião pelos senhores e agradeço pela atenção.

Segue a lista de testemunhas a serem ouvidas

SR. PAULINO, irmão;

SR. ALILSON. Ex dono de pontos na área;

SR. ARY, banqueiro;

SR. JOEL, gerente de ponto a mais de 25 anos;

SR. CATETE, despacha a mais de 30 anos;

SR. MÁRIO, antigo gerente do Dr. Castor;

SR. JORGE LEONARDO, dono de pontos na área;

SR. PAULISTA, cobrador de descarga do falecido Maninho;

E quem mais a Diretoria achar conveniente ouvir.

Aguardando confirmação da data nos telefones:

(21) 8138-1467

(21) 7834-1409

(21) 2493-5000

_______________________________

MANUEL ANTONIO ALVES DE BARROS FILHO

(MANELÃO)”.

(Item 8.18 do Mandado de Busca e Apreensão n.º 40/2007)

As investigações apontam (item 87.12 do mandado no. 60/2007) que o CLUBE BARÃO DRUMMOND funcionaria na Rua da Assembléia, 10, 1513, imóvel administrado pelo ora denunciado MARCO ANTONIO MACHADO ROMEIRO e de propriedade dos denunciados AILTON GUIMARÃES JORGE, ANTONIO PETRUS KALIL, CASTOR DE ANDRADE, WALDEMIR GARCIA e HAROLDO RODRIGUES NUNES, segundo escrituras apreendidas durante as buscas.

Há, portanto, indicativos robustos de que a exploração do jogo ilegal neste Estado esteja estruturada como verdadeiro estado paralelo, com a criação de “tribunais” julgadores dos conflitos referentes à atividade, onde os mais fortes e poderosos assumem a função de juízes de seus semelhantes, “processando feitos”, “colhendo provas” e ao final julgando, sabe-se lá para a imposição de qual pena.

A existência de um “colegiado julgador” com “jurisdição” em todo o Estado do Rio de Janeiro vem mencionada também no seguinte documento, apreendido na residência de LUCIANO BOLA (item 8.10), que ora transcrevo:

“Declaro a quem interessar possa, que eu, JORGE THOMÉ, brasileiro, casado, com 83 anos de idade, residente à Avenida 15 de Novembro n.º 173 “ Centro “ Três Rios comunico, para conhecimento de todos e em particular dos senhores Banqueiros integrantes do colegiado que preside e dita as normas éticas garantidoras, da correta, honesta e escrupulosa exploração do jogo de bicho neste Estado, que nesta data, transfiro para meu filho, LAER SIMIÃO THOMÉ, brasileiro, solteiro, dono de gráfica com n.º do CGC 29148756-000164, inscrição estadual: 80821085, mesmo domicílio do declarante, e para minha esposa SYLVIA TAVARES THOMÉ, brasileira, casada, do lar, mesmo domicílio do declarante, a direção, posse, propriedade, domínio e administração de todo o meu negócio no ramo da contravenção, incluídos neste, todos os pontos dentro do Estado do Rio de Janeiro de minha propriedade em específico Três Rios, Levi Gasparian e Areal, imóveis, telefones, mobiliários e tudo mais componentes e necessários ao funcionamento da atividade mencionada.

Declaro mais, que os pontos cedidos estão nesta capital”. ( grifo nosso)

No mesmo envelope consta declaração semelhante, assinada por SYLVIA TAVARES THOMÉ, porém transferindo pontos de bicho na cidade de Três Rios, Levi Gasparian e Areal a filhos e netos, já no ano de 2001, documento este (pasme-se) com reconhecimento de firma feito pelo cartório do 10o Ofício de Notas.

A par deste caráter claramente mafioso que assume, em princípio, a organização denunciada, considero também especialmente relevante para a análise da necessidade da prisão provisória neste feito a constatação de que robustos indícios colhidos durante as buscas apontam, em princípio, para uma atuação da quadrilha, em tese, há décadas no ramo de jogos ilegais no Estado do Rio de Janeiro.

A servir de lastro a esta conclusão estão, além das “petições iniciais” acima, que indicam a exploração da atividade de forma estruturada desde pelo menos a década de setenta (1968 na primeira “petição” e 1974 na segunda), inúmeros outros documentos arrecadados durante as buscas, sendo de destacar aqueles que serão mencionados quando da apreciação da conduta de NAGIB SUAID, referentes a “cessões de pontos de bicho” datadas da década de oitenta (item 2.7. desta decisão).

Vê-se, pois, que há indícios veementes de que estejamos diante de organização criminosa que atua há decênios neste estado, manejando altíssimo volume de dinheiro.”


Este excerto da referida decisão enfatiza a existência de robustas provas que indicam que uma determinada quadrilha existe e atua há várias décadas neste Estado na exploração de jogos ilegais (originalmente “jogo do bicho”), organizada como se fora uma grande empresa que conta com uma alta diretoria, vários outros escalões, departamento pessoal, contabilidade, advogados e funcionários.

Pois bem, as provas colhidas durante as investigações que originaram a ação penal n? 2007.5101.802985-5, especialmente as buscas deferidas pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Cesar Peluso, assim como aquelas autorizadas por este juízo, apontam, também, para a atual e franca atuação da referida quadrilha, apenas com o adendo de que teria a mesma “migrado” para o ramo dos jogos ilegais de bingos e máquinas caça-níqueis, estas últimas objeto material dos crimes de contrabando ora em apuração. Somem-se a tal constatação a particular característica de praticar o bando, ao que tudo indica, concomitantemente, diversos crimes contra a administração, especialmente a corrupção de agentes públicos (magistrados, policiais civis e federais, entre outros), para assegurar a continuidade da exploração ilegal dos referidos jogos.

Em linhas gerais, portanto, o conjunto probatório carreado nas buscas que originaram a ação penal n? 2007.5101.802985-5, nas que lhe são conexas e nestas, traz robustíssimos indícios de que:

a) os denunciados fazem do seu meio de vida, alguns há décadas, a exploração de jogos ilegais, através da referida organização criminosa, atualmente centrada no controle total dos bingos e das empresas que, supostamente, importam e alocam as máquinas caça-níqueis no interior daqueles estabelecimentos;

b) os denunciados, para o fim de atingir os seus objetivos maiores “ a obtenção do lucro com estas operações “ praticam reiteradamente delitos contra a administração pública, interferindo diretamente no funcionamento de instituições públicas (Poder Judiciário, Polícias e outros), entre eles repetidos delitos de corrupção e contrabando.

Tal constatação é suficiente para a decretação da prisão preventiva dos acusados pois incide sobre fatos que, concretamente, apontam para a habitualidade nas práticas criminosas.

Alia-se a estas considerações genéricas a verificação da inserção dos denunciados no seio da organização, não de forma periférica, de somenos importância, mas sim de forma intensa e relevante, que confere um alto grau de periculosidade individual a cada denunciado.

Assim é que os acusados ANTONIO PETRUS KALIL, AILTON GUIMARÃES JORGE e ANIZ ABRAHAO DAVI são, segundo as investigações, a cúpula da cúpula da organização, os capos, para usar o termo aplicado às máfias italianas, que compõem um verdadeiro tribunal julgador de fatos envolvendo os jogos ilegais e que se mantêm ocultos, agindo através de pessoas de sua inteira confiança, respectivamente MARCELO CALIL PETRUS, JULIO GUIMARÃES SOBREIRA e NAGIB TEIXEIRA SAUID.

Nos diálogos captados na investigação conduzida, temporariamente, perante o Supremo Tribunal Federal, há inúmeros que referem-se àqueles três denunciados, os TIOS, como os responsáveis finais por decisões de assuntos do interesse da quadrilha. Nas residências e endereços comerciais dos três foram, também, apreendidos documentos que indicam o seu controle sobre a contabilidade e os lucros de bingos e, especificamente, de máquinas caça-níqueis, incluídas aquelas apreendidas neste processo.

Na residência de AILTON foi apreendido farto material, entre ele documentos que apontam para o controle de dados financeiros dos bingos e de porcentagens nas máquinas caça-níqueis, como por exemplo o que segue abaixo transcrito.

“Item 05A(…) Nas outras quatro folhas constam dados financeiros aparentemente dos bingos e porcentagens nas máquinas. Cumpre lembrar que estes documentos foram apreendidos em poder do JÚLIO GUIMARÃES, no momento da sua prisão. Vejamos: (…) Trata-se de anotações referentes à porcentagem do AÍLTON GUIMARÃES JORGE (Letra G.) e JÚLIO CÉSAR GUIMARÃES SOBREIRA (Letra J.) nos bingos. Verifica-se que a porcentagem de Júlio é bem menor que a do seu tio Aílton. Cumpre ressaltar que JÚLIO GUIMARÃES afirma que somente é proprietário da casa de bingo SERRA, mas as anotações demonstram que ele possui participação em outros bingos, inclusive na porcentagem das máquinas (…) Na folha, os bingos aparecem de forma abreviada. AM “ possivelmente Bingo das Américas “ os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), DANILO JORGE DE OLIVEIRA (ligações do dia 18/07 – 18h10 e 21/07 – 15:59); JÚLIO (investigado) e NAGIB (investigado). TIJ “ possivelmente Bingo Tijuca – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e NAGIB (investigado), conforme ligação do dia 17/01/07, caso da demissão do MÁRIO. S.J “ possivelmente Bingo São João – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado)e PAULO ROBERTO FERREIRA LINO. VOL “ possivelmente Bingo Voluntários da Pátria – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e NAGIB (investigado), conforme ligação do dia 03/04/07, às 18H51. Vila “ possivelmente Bingo da Vila – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e NAGIB (investigado), conforme ligação do dia 03/04/07, às 18H51. Serra “ possivelmente Serra Bingo Ltda – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e DANILO JORGE DE OLIVEIRA. As abreviaturas RP, COP e COMP, na coluna de DESP, não foram identificadas sobre o que se trata. (…) Indica mais uma relação de bingos e, além dos citados acima estão os: Ban “ possivelmente Bingo Bangu. Não foram identificados os donos de fato. Ilh “ possivelmente Bingo Ilha Rio, os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e AÍLTON PEREIRA LAJAS. VI “ possivelmente Bingo da Vila – os donos de fato possivelmente são AÍLTON GUIMARÃES JORGE (investigado), JÚLIO (investigado) e NAGIB (investigado), conforme ligação do dia 03/04/07, às 18H51".


Importante ressaltar, outrossim, que foram apreendidos inúmeros outros documentos indicando a propriedade de fato de bingos e máquinas caça-níqueis por parte dos denunciados ANIZ, ANTONIO e AILTON.

Exemplificativamente, tem-se uma declaração na qual ANTONIO PETRUS KALIL, em 06 de junho de 2005, ou seja, recentemente, declara que, em caso de morte ou invalidez, seus negócios de jogo em geral, numéricos e eletrônicos, passarão a ser administrados por seu filho MARCELO CALIL PETRUS, o que é um robusto elemento de prova de que o mesmo exerce a atividade de exploração das máquinas caça-níqueis e se beneficia diretamente dos lucros que com ela são obtidos.

Na sua residência, foi apreendida ainda mais de uma dezena de pastas e documentos contendo a contabilidade do jogo do bicho e da exploração de máquinas caça-níqueis.

E, do mesmo modo, no escritório do BARRABINGO, foram apreendidas fotos de ANIZ ABRAHAO DAVI. Em relação a ANIZ, há, ainda, diálogos que denotam o controle de atividades policiais relacionadas à exploração de jogos ilegais e o indicativo de que relaciona-se intensamente com os acusados ANTONIO PETRUS, AILTON e JULIO, realizando, inclusive, viagens ao exterior, financiadas, provavelmente, pela rentável atividade ilícita que elegeu para sobreviver.

Ao que tudo indica, portanto, pela prova colhida nestes autos, os denunciados são os verdadeiros “chefes” da organização criminosa, que recebem a maior parte dos milionários valores auferidos com a prática reiterada dos delitos de cotnrabando que se apuram nesta ação penal e persistem na atividade ilícita há muito tempo.

Quanto a MARCELO CALIL PETRUS, como restou demonstrado linhas atrás, há veementes indícios de que seja o sucessor de seu pai ANTONIO PETRUS, tanto que este teve o cuidado de deixar uma espécie de “testamento” informal devidamente documentado.

De que forma se poderia interpretar esta denominada “sucessão”??? Não se trata de uma simples sucessão de bens, mas sim de uma sucessão de negócios e atividades que passarão a ser administradas por este denunciado, segundo os termos utilizados pelo próprio ANTONIO PETRUS.

Ora, se já restou assentado que tudo indica que as atividades exercidas por ANTONIO PETRUS, no ramo dos jogos em geral, é ilegal, caracterizadora mesmo de fatos criminosos, por certo que a continuidade de tais atividades ostenta e ostentará a mesma natureza ilícita.

Assim, o fato de atuar como assessor direto de um dos supostos chefes e ser o seu sucessor natural é bastante para atestar a sua destacada função na organização, a sua periculosidade e a determinação deliberada de prosseguir na prática de delitos.

Já quanto a JULIO GUIMARÃES SOBREIRA e NAGIB TEIXEIRA SUAID reuniram-se, tanto em diálogos quanto em documentos apreendidos, elementos bastantes para imputar-lhes, num primeiro momento, a exploração comercial das referidas máquinas, juntamente com seus chefes.

Na Operação Hurricane imputa-se a JULIO, entre outros fato gravíssimos, o de gerir a “caixinha” para a qual mensalmente contribuem os donos de bingos, bicheiros e maquineiros, destinada ao pagamento de propina a policiais.

Some-se a isso que, além de ser JULIO dirigente da ABERJ, Associação Brasileira de Empresas de Bingo e Similares, ao que tudo indica divide com NAGIB a sociedade oculta dos Bingos PRAIA e BARRA. Veja-se, a respeito, o seguinte diálogo, travado entre JULIO e NAGIB:

TELEFONE NOME DO ALVO

2178156545 JÚLIO CÉSAR GUIMARÃES SOBREIRA

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

JÚLIO X NAGIB @@

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

06/03/2007 10:48:24 06/03/2007 10:49:34 00:01:10

ALVO INTERLOCUTOR ORIGEM DA LIGAÇÃO TIPO

2178156545 55-24-6544 2178156545 R

RESUMO

CASO TIOS

DIÁLOGO

NAGIB pergunta "lá no américas (BINGO AMÉRICAS) nós dois dividimos com o JOCA ou nós dois mais o MANDRAKE dividimos com o JOCA". JÚLIO diz "no AMÉRICAS é 4% que cada um de nós temos, 4% , eu você e JOCA, cada um 4". NAGIB diz "tá então o MANDRAKE não entra nisso não, porque era 6% pra cada um de nós, 2% pro DANILO e 10% pra cada TIO e então ele ficou de fora". JÚLIO diz "VILA ISABEL é dividido por 4, pelo amor de deus". JÚLIO pergunta se vai ter reunião hoje. NAGIB diz que JÚLIO tinha dito as 17:00, e que vai força o PAULO pra ir e que amanhã eles não tem hora pra sair de lá. JÚLIO diz que é e que que está indo pra ginástica.

Pelos intensos contatos que JULIO mantém com os supostos integrantes da cúpula da organização e pela posição de sucessor natural de ALITON GUIMARÃES JORGE (de quem é sobrinho), ocupa posição semelhante à ocupada por MARCELO CALIL em relação a ANTONIO, podendo-se, assim, afirmar o seu destacado papel na organização e a sua propensão individual para a reiteração delitiva.


O mesmo se diga acerca de NAGIB, em relação a quem foram apreendidos diversos documentos “ por exemplo, na casa do contador da quadrilha, Luciano Bola – que o apontam como um dos exploradores das referidas máquinas caça-níqueis, paralelamente à sua intensa atuação no “jogo do bicho”.

Suas posições, portanto, são posições de total inserção na mecânica da organização e de especial destaque dentro da sua estrutura.

Os irmãos JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA e BELMIRO MARTINS FERREIRA são proprietários, juntamente com ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, da BETEC GAMES, uma das maiores empresas de caça-níqueis do Estado do Rio de Janeiro, e da BMI BRASIL MÁQUINAS E INFORMÁTICA LTDA, que requereu, nestes autos, restituição de máquinas caça-níqueis apreendidas em todas as casas de bingo que foram alvo das buscas.

Os canhotos de cheques apreendidos na sede da BETEC GAMES são um importantíssimo indicativo dos lucros milionários auferidos com o jogo ilegal. Apenas a título de exemplo, foram identificados cheques emitidos em favor dos irmãos JOSÉ RENATO e BELMIRO que somavam, em um único dia, a absurda quantia de dois milhões de reais. Em outros locais (como a residência da Secretária da ABERJ Ana Claudia Rodrigues do Espírito Santo), foram apreendidos, também, documentos que indicam o controle de percentuais referentes a empresas de máquinas caça-níqueis, recibos de pagamento e uma planilha relativa ao mês de março de 2007, que aponta uma arrecadação, com a exploração das referidas máquinas, de quase 30 milhões de reais.

Na sede da referida empresa foram apreendidos, ainda, documentos indicativos da prática de sonegação fiscal, de contabilidade paralela, de utilização de notas fiscais falsas e, sobretudo, da divisão de lucros entre os donos de máquinas e os donos dos estabelecimentos de bingos. Este foi, certamente, um dos dados que fez o MPF afirmar na denúncia que a divisão meio a meio entre “bingueiros” e “maquineiros” do produto auferido com a exploração de MPE contrabandeadas é a prova cabal de que mais do que um mero aluguel entre as partes o que de fato ocorria era uma sociedade de fato, onde o lucro era dividido de forma igualitária entre o dono do estabelecimento (que investiu milhões na sua instalação) e o dono do maquinário (que também investiu milhões em sua importação e montagem)..

Foram, ademais, apreendidas na sede da BETEC GAMES pastas que a ligam a todos os bingos que foram alvo de buscas determinadas por este juízo e documentos (listas de nomes) de pessoas que aparecem repetidamente como supostos proprietários de algumas empresas de importação, montagem e comercialização das máquinas, tudo a indicar que se trata de “laranjas” e que os referidos denunciados são sócios ocultos também dessas empresas, dominando, portanto, toda a cadeia delitiva: internação clandestina das peças e máquinas, montagem e instalação nos bingos, exploração e auferição de lucros.

Os elementos acima descritos são claramente indicativos da relevância do papel supostamente desempenhado pelos referidos denunciados na organização criminosa. Ademais, as datas dos documentos permitem afirmar que os denunciados atuam, há mais de cinco anos, de forma ininterrupta nesta atividade ilícita, o que é um claro indicativo da habitualidade criminosa e, conseqüentemente, da propensão à reiteração delitiva.

Ainda segundo a prova dos autos, ARTURO seria um dos “braços” da organização fora do país, sendo proprietário de empresas na Argentina de onde provém, provavelmente, parte do material contrabandeado para as máquinas caça-níqueis, ostentando posição de extrema relevância na sua estrutura.

PAULO ROBERTO FERREIRA LINO é o presidente da ABERJ “ Associação Brasileira de Empresas de Bingo e Similares “ e, pela prova dos autos, a utilizaria para acobertar não só a associação criminosa como a própria exploração ilegal do jogo através de contrabando de máquinas.

De fato, contra a sua pessoa, pendem indícios graves que apontam para a veracidade desta tese, como o diálogo travado com o acusado JAIME, abaixo transcrito:

TELEFONE NOME DO ALVO

2178294351 JAIME DIAS

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

PAULO LINO x JAIME@"Venda de liminar"

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

07/09/2006 14:57:55 07/09/2006 15:00:24 00:02:29

ALVO INTERLOCUTOR ORIGEM DA LIGAÇÃO TIPO

2178294351 2178415676 2178415676 A

RESUMO

JAIME diz que o pessoal não estava querendo pagar pelo negócio (liminar). PAULO diz para JAIME fazer jogo duro. Demonstram receio de interceptação.VIRGÍLIO. RECLAMAÇÃO STJ SS nº 1664; SUBLOCAÇÃO.


DIÁLOGO

PAULO pergunta se estava tudo resolvido. JAIME diz que daquele negócio nada. PAULO pergunta se ninguém fechara. JAIME diz que ninguém, somente a VIRTUAL que não tinha que dar nada. PAULO pergunta sobre a CRISTINA. JAIME diz que ela estivera com ele, porém dissera que o sócio não queria. PAULO pergunta se ela não vai entrar. JAIME diz que a mesma blefara. PAULO diz que o sócio dela é cheio da grana e comenta: "É o tal do ARI, que é sócio lá naquele que está para reabrir." JAIME diz: "hum, tá!" PAULO diz: "Não. Jogo duro, jogo duro!" JAIME diz que estava fazendo isso mesmo e diz: "Tropical também nada." PAULO diz que vai ter que entrar o ajudando na segunda e comenta: "O que não der tempo de encaminhar na segunda, eu arremato na terça ou na quarta." JAIME diz que ele (PAULO) irá fechando e observa: "Aquele documento que você me pediu, eu já achei. Aí eu vou te dar e você mesmo dá a cópia para o pessoal." PAULO concorda e diz que na segunda se falariam. PAULO informa que estava indo a Maresias, mas que estava com o "pequenininho". JAIME diz que achara o "sigilo" dele. PAULO informa que estava com o LAP TOP e que poderiam conversar ao longo do fim de semana. JAIME diz que levará o dele também. Despedem-se.

Frise-se que, na Operação Hurricane, a ABERJ é apontada como um local que centraliza o recebimento do dinheiro ilegalmente obtido com a exploração dos jogos ilegais, entre eles as máquinas caça-níqueis objeto desta ação, tudo corroborado por veementes elementos de prova.

A intensa relação de PAULO com os demais denunciados, especialmente pessoas diretamente ligadas aos supostos capos da organização (JULIO GUIMARÃES, por exemplo, é secretário da ABERJ), sua posição de dirigente de uma associação com âmbito nacional aparentemente criada para acobertar ilicitudes e seus permanentes contatos com JAIME, a pessoa apontada como lobista da associação, indicam o seu destacado papel no grupo e sua periculosidade.

Os denunciados LICINIO SOARES BASTOS e LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, juntamente com JOSÉ LUIZ DA COSTA RABELLO, seriam sócios ocultos, em sociedade com outros denunciados, de vários dos bingos que foram alvo de buscas deferidas por este juízo e onde foram apreendidas milhares de máquinas caça-níqueis.

De fato, em suas residências, foram apreendidos documentos que apontam para a referida sociedade de fato e para a administração de estabelecimentos de bingos realizada através de interpostas pessoas.

Por exemplo, automóveis de alto padrão apreendidos na residência de LAURENTINO estavam registrado em nome de pessoas que, concomitantemente, figuram ou figuraram como sócios de vários Bingos.

Na de JOSÉ LUIZ, foram arrecadados cópias de documentos de identidade das referidas pessoas (aparentemente “laranjas”) e de recibos de salários de empregados de Bingos, a demonstrar a sua estreita ligação com os mesmos.

Já na residência de LICINIO foi arrecadado um verdadeiro organograma que aponta LAURENTINO como dono dos Bingos BARRA, RIO BRANCO e ICARAÍ, além de diversos documentos com anotações de participação na divisão de lucros de máquinas.

Em outros locais alvos de busca por parte dos mandados expedidos pelo Supremo Tribunal Federal, foram, ainda, arrecadados documentos indicativos da atuação de LICINIO e LAURENTINO, como por exemplo na residência no suposto contador da quadrilha, LUCIANO BOLA.

Ademais, diversos diálogos são indicativos de um especial interesse de LICÍNIO e LAURENTINO na tramitação de ações judiciais envolvendo bingos. Alguns deles, travados com os denunciados JAIME e SERGIO, são claramente indicativos da tentativa de ingerência junto a servidores da justiça federal, seja para que lhes fosse adiantado o conteúdo de mandados judiciais expedidos pela 6ª Vara Cível contra casas de bingos seja para atrasar o seu cumprimento.

Suas supostas atuações no bando, portanto, são, ao que tudo indica, intensas, a apontar para destacados papéis de controle.

O denunciado JAIME GARCIA DIAS é apontado na Operação Hurricane como um dos mais ativos lobistas do grupo de bingueiros e maquineiros, atuando diretamente junto a membros do Poder Judiciário, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, entre outras instituições públicas. Teria agido, por diversas vezes, em conjunto com SERGIO LUZIO, e sempre se fazendo acompanhar por EVANDRO, em prol dos interesses da organização.

Desde logo, portanto, ressalta-se que o conjunto probatório abraça, com veementes indícios captados em diálogos interceptados e documentos, esta imputação.

Sobejam, ademais, nestes autos, elementos no sentido de que JAIME e EVANDRO mantinham máquinas caça-níqueis em diversos bingos do Rio de Janeiro, pela posição que ocupavam de sócios ocultos da empresa LUCKY NUMBER IND ELETRONICA LTDA. e TROPICAL ENTRETENIMENTO.


No escritório e na residência do primeiro, foram apreendidos vários documentos ligados às referidas empresas além de notas fiscais, relações de máquinas e os respectivos bingos onde estariam instaladas e listas de controle de lucros.

Por fim, na busca realizada no Bingo MARQUÊS, foram apreendidos vários documentos pessoais de JAIME, fato este claramente indicativo de que ele é, de fato, o proprietário do referido estabelecimento. Friso que, neste local, foram apreendidas centenas de máquinas caça-níqueis, já periciadas, atestando o laudo a sua composição com peças de origem estrangeira e de importação proibida. Isto sem mencionar os documentos que o ligam ao Bingo IPANEMA.

O fato de, aparentemente, funcionar como “lobista” do bando e, ademais, acumular a função de “bingueiro” e “maquineiro”, transitando entre todos os demais denunciados, revela a intensa atividade de JAIME e sua posição de destaque na organização.

Quanto a EVANDRO, situação semelhante se apresenta, na medida em que em sua residência foram apreendidos documentos indicativos da realização de reuniões em nome da LUCKY NUMBER, da cobrança de valores cobrados a diversas casas de bingo e de uma “relação de associados” contendo os nomes de mais de uma dezena de bingos, tudo a indicar sua perfeita e intensa inserção na organização, justificando a tomada de conclusões idênticas quanto a sua periculosidade.

Segundo a denúncia SERGIO LUZIO, extrapolando a condição de mero advogado, teria se associado ao bando para orientar e patrocinar a importação de máquinas contrabandeadas e concorrendo diretamente para o delito de contrabando das referidas máquinas.

De fato, em sua residência foram apreendidos elementos de prova robustos de que SERGIO se utilizava de grande quantidade de notas fiscais falsas para requerer judicialmente a liberação de máquinas caça-níqueis, tendo plena ciência de serem objeto de contrabando.

Nos autos de apreensão, constam inclusive cópias de notas fiscais emitidas pela empresa AMERICAN INDUSTRIA E COMERCIO LTDA, em duplicidade, para bingos diferentes.

Em sua residência foram apreendidos, ainda, cópias de contratos de depósitos, relações de máquinas caça-níqueis e contratos de locação de bens imóveis com vários estabelecimentos de Bingo, a indicar não apenas o exercício de sua atividade profissional regular mas, também, a sua inserção no bando e o concurso direto para o êxito dos delitos de contrabando que ora se apuram.

A tais fatos devem ser somadas outras evidências no sentido de que SERGIO LUZIO se articulava, constantemente, com alguns integrantes do grupo, até mesmo declarando ser possuidor de máquinas caça-níqueis:

TELEFONE NOME DO ALVO

2178439679 SERGIO LUZIO MARQUES ARAÚJO

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

SÉRGIO X IGOR @

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

16/12/2006 12:46:49 16/12/2006 12:49:01 00:02:12

ALVO INTERLOCUTOR ORIGEM DA LIGAÇÃO TIPO

2178439679 55-46-16894 2178439679 R

DIÁLOGO

IGOR conta que já passou por uma situação igual a essa em um bingo no interior. Fala que a polícia apreendeu tudo mas não interditou a atividade e no dia seguinte poderia se colocar outras máquinas no local pois o mandado era para aquelas máquinas especificamente. SÉRGIO diz que para colocar outras máquinas só se tiverem todos os componentes nacionais. SÉRGIO diz que possui uma máquina toda nacional. Fala que não tem coletor e que trata-se de máquina de cartela. SÉRGIO diz que funciona com sistema de crédito. IGOR pergunta se essa máquina pode ser colocada. SÉRGIO diz que o problema está sendo os coletores e essa não possui tal componente. IGOR diz que o bingo permanente irá ficar aberto mas que estão levando os servidores desse bingo também. SÉRGIO diz que falou com o delegado CRISTIAN e mandou não mexer no permanente. IGOR pede para que SÉRGIO entre em contato com esse delegado. SÉRGIO diz que vai ligar

TELEFONE NOME DO ALVO

2178439679 SERGIO LUZIO MARQUES ARAÚJO

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

GERALDO X SÉRGIO @

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

20/12/2006 19:03:44 20/12/2006 19:07:04 00:03:20

ALVO INTERLOCUTOR ORIGEM DA LIGAÇÃO TIPO

2178439679 724000001724104 724000001724104 R

RESUMO

OURO DE TOLO – GERALDO diz que o desembargador concedeu 10 dias para a polícia "provar tudo" ou restituir os materiais apreendidos. SÉRGIO diz que a polícia levou amostras para realizar a perícia e que o laudo fica pronto rapidamente.


DIÁLOGO

GERALDO diz que o desembargador concedeu 10 dias para a polícia "provar tudo" ou restituir os materiais apreendidos. SÉRGIO diz que a polícia levou amostras para realizar a perícia e que o laudo fica pronto rapidamente. GERALDO pergunta se saindo o laudo darão o perdimento das máquinas ou as operadoras poderão recorrer. SÉRGIO desconversa e diz que está com máquinas nacionais para colocar nos bingos. Fala que funciona por sistema de crédito e que cada máquina possui dois jogos: cartela e abelhinha. Explica que essas máquinas não tem sistema de coletor e são nacionais. GERALDO pergunta se essas máquinas não tem placa de computador. SÉRGIO diz que é nacional e todos os componentes são fabricados na zona franca de MANAUS. GERALDO pergunta se é da VIRTUAL. SÉRGIO diz que não e que pertence a uma pessoa que trabalhava em uma empresa de máquinas, saiu e criou o jogo. Diz que o bingo tem que comprar a máquina e fala que funciona com um sistema de digitais para liberar o jogo. GERALDO pergunta se SÉRGIO já falou com LOURINHO (LICÍNIO) sobre isso. SÉRGIO diz que ainda não. GERALDO manda SÉRGIO falar com LICÍNIO antes de falar com DENTINHO (ZÉ RENATO). SÉRGIO concorda e diz que ZÉ RENATO ficará com raiva dele por estar tomando seu espaço

Vários outros elementos de prova existem a apontar o seu relacionamento direto e intenso com a maioria dos integrantes do bando e a sua efetiva participação nas atividades criminosas, com especial atuação na interferência, fora dos limites da lei, nas atividades do Poder Judiciário, o que é elemento determinante para a afirmação de sua periculosidade.

JOSÉ GRILLE SANCHINO, vulgo PÊPE, é, segundo a prova dos autos, o sócio-proprietário dos BINGOS ARPOADOR e ASSEMBLÉIA, figurando efetivamente nos contratos sociais dos mesmos.

No interior dos referidos estabelecimentos, foram apreendidas mais de 500 máquinas caça- níqueis de modo que os indícios de prática de contrabando são também veementes quanto a sua pessoa.

Como se vê da farta quantidade de documentos apreendidos, sua ligação com os demais denunciados é, aparentemente, inafastável.

Isto porque as máquinas instaladas em todos os bingos que foram objeto de busca, geravam lucros que eram, ao que tudo indica, divididos entre os “capos” e vários outros denunciados apontados como maquineiros e bingueiros. Ademais, há indícios de que todos os bingos foram, em alguma medida, favorecidos por medidas criminosas adotadas pelo bando (corrupção de policiais e servidores públicos, obtenção de informações privilegiadas, dissimulação de origem das máquinas mediante uso de notas fiscais falsas e contratos de depósito simulados, entre outras).

Portanto, a administração de fato de um estabelecimento de bingo “ especialmente os maiores e mais lucrativos, como é o caso dos ora apontados “ exigia, necessariamente, um elevado grau de interação com o suposto bando, elemento suficiente para indiciar sua posição de destaque na organização, a propensão do referido acusado para práticas criminosas e, conseqüentemente, a sua periculosidade.

O denunciado FRANCISCO RECAREY é, segundo diálogos captados, sócio oculto do BINGO SCALAMARE e, portanto, responsável pela exploração das máquinas contrabandeadas que lá se encontravam instaladas.

O diálogo abaixo transcrito, travado com o acusado SERGIO LUZIO, é indiciário de que o mesmo não apenas aufere os lucros do negócio como tem plena ciência das estratégias adotadas pelo bando na consecução de seus fins.

TELEFONE NOME DO ALVO

2178439679 SERGIO LUZIO MARQUES ARAÚJO

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

CHICO RECAREY X SÉRGIO @

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

31/10/2006 11:50:02 31/10/2006 11:52:12 00:02:10

DIÁLOGO

SÉRGIO diz que está indo para o Tribunal. Fala que está esperando a situação da BETEC em BRASÍLIA ser apreciada pois a liminar de NITERÓI da empresa caiu. SÉRGIO conta que segunda-feira deverá ter uma solução. Conta que a medida cautelar deverá ser apreciada na próxima semana, que "aquela pessoa vai apreciar a cautelar". Diz que acabou de sair de uma reunião com ZÉ RENATO e o mesmo está montando uma nova estratégia, fala que entrarão com ações novas. SÉRGIO diz que passou no bingo SCALA para pegar a documentação só que o MANOEL havia deixado em outro lugar. Explica que vai pegar o contrato social para entrar com a ação nova. SÉRGIO diz que entrarão com várias ações com confederações novas na próxima semana. Falam sobre o movimento do bingo. Ficam de se falar depois

Outro diálogo que merece destaque é o que segue.

TELEFONE NOME DO ALVO


2178439679 SERGIO LUZIO MARQUES ARAÚJO

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

SÉRGIO X FRED @

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

17/12/2006 11:02:11 17/12/2006 11:08:43 00:06:32

RESUMO

OURO DE TOLO – SÉRGIO diz que fecharam todas as casas e "agora fudeu". Fala que só lhe resta CHICO RECAREY. SÉRGIO conta que esteve no bingo SAENS PEÑA e fala que RECAREY queria que ele fosse no SCALA pois estavam tentando entrar em seu escritório

DIÁLOGO

SÉRGIO diz que fecharam todas as casas e "agora fudeu". Fala que só lhe resta CHICO RECAREY. SÉRGIO conta que esteve no bingo SAENS PEÑA e fala que RECAREY queria que ele fosse no SCALA pois estavam tentando entrar em seu escritório. Conta que ligou para o SCALA e conversou com o delegado. Fala que RECAREY está desesperado e que disse que só o bingo estava lhe dando dinheiro…FRED pergunta sobre a decisão do Tribunal, a respeito da medida cautelar. SÉRGIO diz que não adianta pois apreenderam as máquinas e interditaram os bingos. Fala que foi uma medida cautelar de busca e apreensão da 1ª Vara federal. FRED diz que a decisão das máquinas é a que estava faltando ser cumprida no RIO DE JANEIRO. SÉRGIO confirma e diz que aproveitaram que havia uma equipe grande da POLÍCIA FEDERAL para prender PMs e desencadearam essa operação contra bingos. FRED fala que agora precisam entrar com mandado de segurança para os bingos. SÉRGIO concorda mas fala que demorará bastante tempo. FRED diz que isso é rápido. SÉRGIO diz que se conseguirem uma liminar só sairá uma decisão em março. SÉRGIO diz que não conseguiram pagar o aluguel de 5 casas fechadas e que cada aluguel é 50.000,00 reais. FRED fala que o bingo permanente não paga essa despesa. SÉRGIO diz que permanente é uma "merda" mas também será fechado. SÉRGIO diz que RECAREY ligou dizendo que a POLÍCIA FEDERAL chegou com 10 caminhões no SCALA e queriam apreender documentos. Fala que ligou para o delegado e disse que se tratava de uma empresa nova e que ele não poderia fazer esse tipo de apreensão. FRED diz que não estava sabendo de nada disso. SÉRGIO fala que FRED desliga o telefone e fica incomunicável. SÉRGIO diz que VILELA ligou reclamando…SÉRGIO fala que hoje ainda fecharão mais casas. FRED diz que não fecharam as casas e sim apreenderam os bingos. SÉRGIO diz que interditaram as casas também

Ele está a indicar que o referido acusado aufere seus rendimentos única e exclusivamente da referida atividade ilícita, a exploração do jogo ilegal, que adotou como verdadeiro modus vivendi.

Feitas estas considerações, que abarcam um espectro mínimo de todo o acervo probatório reunido até o momento, pode-se afirmar que todos estes fatos, além de constituírem indícios veementes de atividade delitiva, constituem veementes indícios:

a) de uma perfeita inserção de cada uma dos denunciados na organização criminosa, com o exercício de atividades relevantes para a consecução dos seus objetivos;

b) da ciência, do consentimento e do aproveitamento pessoal, há muito tempo, por parte de cada um dos denunciados, da complexa estrutura da organização e dos métodos por ela utilizados para manter-se ativa, a indicar uma especial propensão individual à prática criminosa.

Todos estes elementos permitem afirmar que os denunciados, ao que tudo indica, fazem da habitualidade criminosa o seu mister, o que exige a sua segregação cautelar para evitar a continuidade da prática de crimes.

Frise-se, por fim, que os acusados ANIZ ABRAHÃO DAVI, ANTONIO PETRUS KALIL e AILTON GUIMARÃES JORGE já tiveram sua culpa formada em processo criminal pela prática do crime de quadrilha, processo este que restou notoriamente conhecido neste Estado do Rio de Janeiro.

Configura-se, para os referidos acusados, portanto, sob qualquer dos ângulos que se analise a questão, a reiteração concreta de prática delitiva, fato este que foi, inclusive, ressaltado pelo Exmo. Sr. Ministro Cezar Peluso ao apreciar e negar o requerimento de prisão preventiva dos denunciados com foro por prerrogativa de função, na ação penal que ainda tramita perante aquela Corte, verbis:

“A idéia de periculosidade dos aqui denunciados, presumida à gravidade teórica dos crimes, não constitui hipótese legal de prisão cautelar, hostiliza a presunção constitucional de não culpabilidade e, nas circunstâncias do caso, em que, com o desmembramento do inquérito e a submissão do respectivo feito a outro juízo, os membros dos níveis mais elevados da organização criminosa descrita na denúncia, alguns dos quais já não são primários e, por isso, poderão sujeitar-se a prisão preventiva “ que já pode ter sido decretada -, não induz probabilidade, pelo menos próxima e enquanto se não defina esta causa, de continuidade delitiva”.


Relativamente ao acusado FRANCISCO RECAREY VILLAR, pessoa também publicamente conhecida no ramo de entretenimento desta cidade, também já há formação de culpa, com condenação anterior transitada em julgado pela prática de crime, proferida perante esta justiça federal, em razão da qual o mesmo encontra-se cumprindo pena. Em seu nome, no sistema Apolo da Justiça Federal, constam, pelo menos, duas execuções criminais, de n?s 2004.51.01.514627-6 e 2007.5101806899-0.

Portanto, a existência de veementes indícios de autoria e materialidade de graves delitos posteriores a tais fatos permite concluir que, em relação a estes quatro acusados, configura-se ainda mais robustamente a hipótese de reiteração delitiva, a exigir a decretação da custódia cautelar.

2.2 Novos indícios de prática delitiva que estão a demonstrar, concomitantemente, a imprescindibilidade da prisão, seja para evitar a reiteração delitiva seja para assegurar a regular instrução criminal

O que se procurou demonstrar com toda a explanação anteriormente feita é que há veementes indícios de que a referida quadrilha não só ostenta enorme poder de infiltração das instituições públicas como também de que estaria, ainda, ao que tudo indica, em franca atuação, utilizando-se dos mesmos métodos espúrios de cooptação de pessoas para a satisfação de seus variados interesses.

Além dos exemplos anteriormente citados de infiltração em instituições públicas as mais variadas, entre elas o Poder Judiciário, há, no contexto da investigação, importantes elementos de prova a indicar que a suposta organização tinha, entre os métodos eleitos para garantir o sucesso das suas empreitadas criminosas, o hábito de obter informações privilegiadas, mediante paga ou não, e criar obstáculos diretos às decisões judiciais que lhes fossem contrárias. Isso sem mencionar a atuação com vistas a obter, diretamente do Poder Judiciário, decisões que lhes fossem favoráveis, a qualquer preço!

Assim é que, segundo consta dos áudios captados na fase de investigação, há notícia de que os acusados, dado o grau de infiltração que conseguiram atingir em instituições públicas, obtêm, reiteradamente, informações privilegiadas das medidas que virão a ser executadas contra os seus interesses e, com isso, se mobilizam para frustrá-las.

Aliás, uma das facetas da referida organização era, justamente, a manutenção de um staff nas instituições públicas, especialmente nas corporações policiais, para obter as referidas informações.

O diálogo abaixo transcrito, entabulado pelo denunciado JAIME, dá uma idéia do grau da intensidade desta atuação, eis que, consoante o trabalho de análise policial, ele chega a se vangloriar de, tal qual um vidente, “saber de tudo antes”.

TELEFONE NOME DO ALVO

1178351101 JAIME DIAS

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

LAURENTINO x JAIME@

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

06/02/2007 20:05:30 06/02/2007 20:07:15 00:01:45

DIÁLOGO

JAIME diz que falara com o PAULO FRAGA, para dar uma olhada no Rio Branco e no Saens Peña, pois amanhã terá problema lá e então sugerira que tirasse o financeiro. JAIME informa que está em frente ao Praia e solicita a LAU que passasse lá. LAU sugere que marcassem em um lugar mais adequado para conversarem. JAIME diz que tinha que acabar de conversar "aqui" e, pondera, que não podia demorar muito, haja vista que por causa desse negócio terá que ir a Brasília. LAU sugere que se falassem no FRATELLI em meia hora. JAIME concorda e diz que está indo para lá.

TELEFONE NOME DO ALVO

2178351101 JAIME DIAS

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

JAIME x LAURENTINO@

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

07/02/2007 11:40:23 07/02/2007 11:41:41 00:01:18

DIÁLOGO

LAURENTINO questiona se a mulher tinha assinado de noite (refere-se à juíza da 6ª Vara). JAIME diz sim. LAU diz que achava que ainda não tinha assinado. JAIME se gaba e comenta: "Porra eu consigo ver antes né, vidente!" Diz que vai clarear. LAU diz que tinha fechado e observa que não tinha que abrir "porra nenhuma". JAIME diz que isso era "foda" mesmo e comenta que está indo se encontrar com o espanhol lá no Centro. LAU questiona que JAIME tinha dito que ia a Brasília hoje. JAIME diz que já estava indo arrumado para ir, que somente passará lá (PÊPE). LAU diz que se falarão amanhã à noite

Há notícias, também, de que o acusado SERGIO LUZIO teria, na mesma época, oferecido vantagens a servidor da 6ª. Vara Federal Cível “ onde tramita ação civil pública do interesse das casas de bingo “, bem como teria se articulado com o denunciado LÍCINIO para, ao que tudo indica, corromper oficiais de justiça da justiça federal encarregados da execução de mandados de interesse das casas de bingo (narrada às fls. 2226 e segs do vol 08 do inquérito), atrasando o seu cumprimento. Trata-se de mais um daqueles fatos que, à vista de robustos elementos de prova, atestam uma ousada e crescente estratégia de atuação dos acusados: a utilização de métodos ilícitos para burlar o cumprimento de decisões judiciais e a observância das normas procedimentais que asseguram o bom andamento dos feitos.


A burla do cumprimento das decisões judiciais compreendia, segundo indicam as investigações, desde a apresentação de documentos falsos para liberação de máquinas apreendidas, inclusive notas fiscais montadas, como a troca de peças das mesmas e a retirada de dinheiro e documentos dos locais onde poderiam ocorrer medidas constritivas.

Os diálogos abaixo descritos, e claramente indicativos de tais práticas, são apenas um exemplo do que ora se afirma.

TELEFONE NOME DO ALVO

2178294351 JAIME DIAS

INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO

ALEXIS x JAIME@Fraude

DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL DURAÇÃO

05/09/2006 15:57:46 05/09/2006 15:59:09 00:01:23

DIÁLOGO

ALEXIS pergunta se EVANDRO estava com ele (JAIME), pois gostaria de falar com os dois. JAIME informa que sim. ALEXIS explica que a VISION e a LUCK compram as peças e montam. JAIME diz que sim. ALEXIS diz que a situação então era a seguinte, que eles tinham os comprovantes dos componentes, mas não tinham os comprovantes das máquinas e completa: " O que foi apreendido não foram os componentes, foram as máquinas." JAIME diz para os mesmos pegarem as notas fiscais das máquinas para levarem lá. ALEXIS pergunta: "Comprados de quem?". JAIME diz que se fosse o caso que fosse no juiz e informasse que eles estão descumprindo. ALEXIS diz que teriam que comprovar a propriedade se não eles não poderiam entregar e comenta que não queria colocar a LUCK e a VISION como fabricantes. Observa que não era legal por causa da questão do contrabando. JAIME diz então para tirarem notas fiscais com data anterior. ALEXIS pergunta: "E quem vendendo para eles?" JAIME responde: "Ah, não sei cara! Aí é montagem, eu não sei como vai fazer isso." ALEXIS diz que irá explicar para ver o que eles resolverão

Na mesma linha, segundo informações do COAF, logo após a deflagração da fase ostensiva da Operação Hurricane, o denunciado NAGIB teria tentado sacar quantia superior a um milhão de reais de uma conta no Unibanco, o que certamente frustraria medidas assecuratórias que viessem a ser tomadas por parte deste juízo.

Outra prova a indicar que a reiterada interferência dos referidos denunciados no regular funcionamento das instituições públicas, ao que tudo indica, continuou a ocorrer mesmo após a adoção de medidas de repressão por parte do aparelho estatal, a saber a prisão dos denunciados, veio com as investigações realizadas na Operação que se denominou “Operação Rescaldo”.

Com efeito, logrou-se apurar em interceptação telefônica devidamente autorizada por parte deste juízo a existência de concretos e veementes indícios de reiteração delitiva por parte da organização criminosa, a saber: um dos supostos integrantes da cúpula do bando, o denunciado ANTONIO PETRUS KALIL, teria, mesmo estando preso, providenciado o pagamento de vantagens a policiais federais para conseguir tratamento privilegiado, consistente basicamente em encontros de variada natureza com pessoas estranhas, até mesmo dentro da viatura policial que o transportava para as audiências.

Feito este panorama, é forçoso constatar que, mesmo após a decretação de medidas judiciais repressivas de suas atividades, com graves repercussões no seio da associação (como o foram as sucessivas buscas e apreensões e prisões preventivas), continuam a existir veementes indícios de que os acusados prosseguiram, ao que tudo indica, na atividade criminosa, tomando atitudes voltadas para a recuperação e reorganização de suas atividades ilícitas, inclusive interferindo deliberadamente e obstaculizando o trabalho do Poder Judiciário.

Contrariando a ordem natural das coisas, no sentido de que, tendo sido alvos de medidas constritivas (v.g. buscas e apreensões e prisões preventivas), suas atividades criminosas deveriam cessar, de modo a demonstrar, pelo menos, um certo temor pela atuação legítima dos aparelhos de repressão estatal, o que se tem verificado é uma inacreditável sucessão de fatos, atribuíveis em tese à referida organização criminosa, que revelam ousadia e um verdadeiro desprezo pelas instituições públicas, sobretudo pelo Poder Judiciário.

Como se verá adiante, novos fatos configuradores em tese de prática criminosa “ e que só interessam aos supostos membros do bando – continuam a ocorrer, caracterizando, mais uma vez, a reiteração delitiva.

É tão absurda toda esta situação que, no dia 14.11.2007, compareceu a este Juízo, segundo a informação de fls. 236 e seguintes., a advogada MARIA APARECIDA MEDEIROS, OAB/RJ 81.911/RJ, que representa o réu ANTONIO PETRUS KALIL nas outras ações penais que contra ele tramitam nesta vara, solicitando informação sobre a localização física dos presentes autos, pois já estava ciente da decisão de declínio de competência proferida pelo juízo da 1a Vara Federal Criminal.


Ainda segundo a referida informação, a citada advogada apresentou, ao Diretor de Secretaria desta vara, cópias de parte da denúncia, do pedido de prisão preventiva formulado pelo MPF e da referida decisão, que foram por ele reproduzidas para serem juntadas aos autos (fls.238/247).

Sucede que os presentes autos foram distribuídos em segredo de justiça no sistema de informática (APOLO) desta justiça federal, como se vê do termo de autuação que inicia este volume e assim permanecem até o presente momento.

Deles só deveriam ter conhecimento, portanto, os procuradores que atuaram no feito, os servidores e os juízes que o manusearam, sendo certo que houve quebra do sigilo que sobre eles pende.

Com o objetivo de apurar o ocorrido, mantive contato com a 1ª Vara Federal Criminal e esclareceu-me, pessoalmente, a Dra. Rosália Monteiro Figueira que já na sexta-feira, dia 09 de novembro, recebeu em seu gabinete determinado advogado, que não tem condições de identificar, indagando sobre o presente processo e o pedido de prisão preventiva, requerendo, ainda, verbalmente, vista dos autos. Esclareceu-me, ainda, a Dra. Rosália Monteiro Figueira que foi informado ao referido advogado que não lhe seria dada vista do feito, devendo aguardar o momento próprio para tanto.

Segundo consta da informação elaborada pelo Diretor de Secretaria desta vara, o Diretor da 1a Vara Federal Criminal teria, ainda, informado que nenhuma vista deste procedimento com denúncia foi deferida pelo juízo da 1a Vara Federal Criminal, tendo o mesmo tramitado em sigilo absoluto e nele atuando somente o referido diretor e um servidor.

Recapitulando cronologicamente a tramitação do feito, verifiquei, através do sistema Apolo, que a decisão declinatória de competência do juízo, proferida pelo MM. Juiz Marcos Bizzo Moliari, da 1ª Vara Federal Criminal, data de 06/11/2007.

Não obstante, os autos foram remetidos ao setor de Distribuição apenas em 09/11/2007 (sexta-feira), para redistribuição, em razão de problemas no sistema relatados pelos servidores J.G. Ramos e Denival de Souza, ambos da 1a Vara Federal Criminal, às fls. 1004/1007 da Medida Cautelar de Busca e Apreensão n( 2006.5101.532730-9.

No dia 12/11/2007, segunda-feira, no meio do expediente, apresentou-se no balcão desta vara o advogado e denunciado SERGIO LUZIO, solicitando “informações” sobre o processo, ocasião em que o Diretor de Secretaria veio a tomar ciência da redistribuição do feito para a 6a Vara Criminal (cf. informação de fls. 236/237).

Até aquele momento, o Setor de Distribuição não havia feito a remessa eletrônica do processo para a 6a Vara Federal, tanto que os servidores não tinham, sequer, acesso ao mesmo através do sistema.

Frise-se mais uma vez este ponto: até então, o processo não havia, sequer, chegado neste juízo, seja eletrônica seja fisicamente, os servidores desta vara dele não tinham conhecimento, mas o referido denunciado já indagava por ele no balcão.

Os autos só foram fisicamente recebidos nesta vara em 12/11/2007 (segunda-feira), no final do expediente, sendo devidamente trancados em armário próprio para os feitos sigilosos e, a partir de então, tramitaram exclusivamente entre o Diretor de Secretaria e esta Magistrada.

Não havia, portanto, nenhum motivo lícito para que qualquer advogado ou acusado tivesse ciência do teor da denúncia e do requerimento de prisão preventiva formulados pelo MPF.

Qual não é a surpresa desta magistrada ao se deparar com a absurda situação de que terceiras pessoas não apenas têm conhecimento da existência do procedimento e do seu conteúdo como têm, inclusive, cópias do mesmo. E tais terceiras pessoas são ninguém menos do que alguns dos denunciados e seus respectivos advogados, sendo identificados até o momento o denunciado SERGIO LUZIO e a advogada do denunciado ANTONIO PETRUS KALIL.

Antes mesmo de esta magistrada conseguir acabar de analisar todos os volumes do processo e proferir decisão, já tinham alguns dos supostos elementos da quadrilha obtido, sabe-se lá por que meios!!, cópias de suas principais peças, cujo conhecimento, por razões óbvias, é especialmente apto a frustrar a execução das medidas acautelatórias que ora serão decretadas.

Tal fato é a prova concreta de que sobejam indícios no sentido de que o poderio de infiltração do bando nas instituições públicas é muito maior do que se pode imaginar!! Tal fato representa um importante indício, mais do que veemente, de que os métodos suposta e habitualmente utilizados pela também suposta organização criminosa não foram abandonados nem mesmo após a decretação reiterada de prisões preventivas em face dos seus componentes, o que leva à confirmação, em caráter inexorável, de que tudo está a indicar que referidas pessoas ignoram completamente os mecanismos de repressão estatal.


Além de se tratar de mais uma situação de fundada suspeita de reiteração delitiva, está-se, concomitantemente, em face de outros pressupostos para a custódia cautelar: a conveniência da instrução criminal e a segurança da aplicação da lei penal.

Relembro, outrossim, que a prisão preventiva por “conveniência da instrução criminal” destina-se a evitar interferências externas e perturbações ao bom andamento da ação criminal das mais variadas ordens. Ela não se restringe às hipóteses acadêmicas de “ameaça a testemunhas e peritos”, ostentando um espectro de abrangência muito mais amplo, delimitado apenas pelo fim almejado com a norma: assegurar a regularidade da instrução criminal.

A propósito, vejam-se os ensinamentos de Eugenio Pacelli de Oliveira:

“Por conveniência da instrução criminal há que se entender a prisão decretada em razão de perturbação ao regular andamento do processo, o que ocorrerá, por exemplo, quando o acusado, ou qualquer outra pessoa em seu nome, estiver intimidando testemunhas, peritos ou o próprio ofendido, ou ainda provocando qualquer incidente do qual resulte prejuízo manifesto para a instrução criminal. Evidentemente, não estamos nos referindo à eventual atuação do acusado e de seu defensor, cujo objetivo seja a procrastinação da instrução, o que pode ser feito nos limites da própria lei.” (Curso de Processo Penal, 6a Edição, Del Rey, 2006, pg. 434) – grifei

A instrução criminal deste feito já está, evidentemente, prejudicada pelo conhecimento prévio dos acusados de requerimentos que, por sua natureza, deveriam guardar o caráter de sigilosos, pelo menos até o seu cumprimento.

A instrução criminal deste feito pode continuar a ser concretamente prejudicada pela certeza de que os denunciados têm plenas condições de obter antecipadamente ao momento da publicação, tanto que já o fizeram, informações privilegiadas sobre o conteúdo dos requerimentos da parte adversa e de decisões judiciais.

Dentro de todo este contexto, que não apenas aponta para uma evidente reiteração delitiva como também para a absoluta insegurança no processamento da presente ação penal, dada a evidência concreta de que ela já vem sofrendo tentativas “ uma delas exitosa – de interferência externa, mostra-se absolutamente necessária a decretação da prisão preventiva dos supostos integrantes do bando.

Por fim, discordo, frontalmente, do argumento utilizado pelo parquet na promoção de fls. 69/80 para afirmar afastada a necessidade de prisão preventiva dos denunciados JOSÉ GRILLE SANCHINO, SERGIO LUZIO MARQUES DE ARAUJO, ARTURO ROBERTO LEMSEYAN e FRANCISCO RECAREY VILAR. (em síntese, sustenta-se que não poderão dar seguimento às atividades criminosas do grupo com a prisão dos demais).

Em primeiro lugar, a forma de inserção dos referidos denunciados no bando, consoante os indícios até aqui colhidos, não aparenta ser periférica, desprezível a ponto de não serem capazes de dar continuidade às atividades criminosas.

Ademais, a prisão preventiva, neste particular, visa a evitar a reiteração delitiva, não havendo na norma processual penal nenhuma especificidade quanto à natureza desta reiteração. E toda a prova produzida até aqui aponta no sentido de que, justamente pela perfeita e intensamente participativa integração no bando, todos os acusados, inclusive estes, demonstram uma propensão individual para a prática de atividades criminosas em geral, constatação esta que é suficiente, por si só, para a decretação da prisão preventiva.

Outrossim, reitero que o acusado FRANCISCO RECAREY já foi condenado anteriormente por esta Justiça Federal e, para a sua pessoa, o oferecimento de denúncia por crimes posteriores, gravíssimos, diga-se de passagem, representa inegável demonstração de reiteração delitiva.

Quanto ao acusado SERGIO LUZIO MARQUES DE ARAUJO, a par do risco de reiteração delitiva, a prisão preventiva para o fim de assegurar a regular instrução criminal – que abrange todos os acusados “beneficiados” pela clara perturbação que vem sofrendo este processo com a violação do seu sigilo – é especialmente necessária em relação a sua pessoa pois o episódio constitui situação bastante semelhante a algumas protagonizadas justamente pelo referido denunciado e que foram consideradas relevantes para a aferição de sua periculosidade.

Por fim, quanto aos acusados JOSÉ GRILLE SANCHINO e ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, as primeiras provas de participação na quadrilha com a divisão dos altíssimos lucros por ela obtidos mensalmente, aliadas ao fato de serem sócios do negócio há considerável tempo, tendo plena ciência das práticas realizadas pelos demais membros do grupo para a manutenção em atividade das casas de bingo, são, também, indicativos do propósito de reiterar, ainda que individualmente, na prática criminosa e de obstruir a regular instrução criminal.


2.3 “ Da necessidade da custódia cautelar para assegurar, por fim, a aplicação da lei penal

De tudo quanto foi narrado na denúncia e do suporte probatório colhido nas investigações, colhem-se veementes indícios de que todos os acusados, supostos integrantes da organização criminosa que ostenta enorme poderio econômico-financeiro, são pessoas que não reverenciam, em absoluto, as instituições públicas, especialmente o Poder Judiciário, sendo razoável concluir que não se sujeitarão à aplicação da lei penal em caso de eventual condenação.

O modus operandi da quadrilha, com a repetida utilização de interpostas pessoas para a consecução de suas atividades é, também, um claro indicativo da tentativa de se furtar à aplicação da lei penal.

Ademais, vários dos fatos anteriormente narrados, especialmente aqueles que demonstram uma repetida e deliberada atitude de “burla” de decisões judiciais, são indicativos concretos de que todos os acusados, sem exceção, não têm como um de seus parâmetros de comportamento o respeito pelas decisões do Poder Judiciário.

Ora, se há elementos veementes que permitem afirmar que os acusados, em vez de utilizar os meios lícitos para atacar decisões judiciais, ainda impugnáveis, que lhes são desfavoráveis, preferem se utilizar de meios escusos para obstar o seu cumprimento, por que motivo haveriam de respeitar eventual decisão judicial definitiva de mérito que lhes fosse contrária?

O risco para a futura aplicação da lei penal, portanto, deflui de circunstâncias concretas que apontam para a reiterada adoção, por parte dos denunciados, de medidas que têm por propósito afastar a efetividade das decisões judiciais.

Em razão de todo o exposto, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA DOS ACUSADOS JOSÉ RENATO GRANADO FERREIRA, BELMIRO MARTINS FERREIRA JUNIOR, PAULO ROBERTO FERREIRA LINO, ARTURO ROBERTO LEMSEYAN, AÍLTON GUIMARÃES JORGE, JÚLIO CESAR GUIMARÃES SOBREIRA, ANIZ ABRAHÃO DAVID, NAGIB TEIXEIRA SAUID, ANTÔNIO PETRUS KALIL, MARCELO KALIL PETRUS, LICÍNIO SOARES BASTOS, LAURENTINO FREIRE DOS SANTOS, JOSÉ LUIZ DA COSTA REBELLO, JAIME GARCIA DIAS, EVANDRO DA FONSECA, SÉRGIO LUZIO MARQUES DE ARAÚJO, JOSÉ GRILLE SANCHINO, FRANCISCO RECAREY VILAR, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, para garantia de ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.

Expeçam-se os mandados de prisão, devendo aqueles expedidos em desfavor do denunciado ARTURO ser encaminhados, também, à INTERPOL, requisitando-se sua difusão vermelha.

Diante da presença de novos indícios de prática criminosa, desta feita envolvendo a quebra do sigilo destes autos, dê-se vista urgentemente ao MPF para adoção das providências cabíveis, autorizada, desde logo, a utilização de cópias dos autos.

Cumpra-se.

Após o cumprimento dos mandados de prisão, se isso for possível nesta altura dos acontecimentos, deverá ser levantado o segredo de justiça da ação penal, mantido o sigilo apenas sobre o material constante do HD fornecido pelo MPF, eis que contém material cuja revelação indiscriminada pode representar indevida violação do direito à intimidade dos acusados e de terceiras pessoas. Quanto à ação penal e os respectivos inquéritos policiais, deverão tramitar publicamente, por força do princípio da publicidade.

Oportunamente, encaminhem-se os autos à SEDRJ para alterar a autuação do feito para ação penal e corrigir os nomes do segundo, oitavo e do décimo denunciado para que passem a constar os corretos: BELMIRO MARTINS FERREIRA JUNIOR, NAGIB TEIXEIRA SUAID e MARCELO CALIL PETRUS.

Rio de Janeiro, 21 de novembro de 2007.

VALÉRIA CALDI MAGALHÃES

Juíza Titular da 8a Vara Federal Criminal

em auxílio à 6a Vara Federal Criminal

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