Amparo público

Estado tem de dar remédio e não pode se esconder em burocracia

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3 de novembro de 2007, 23h00

O Estado tem o dever de resolver suas dificuldades burocráticas e não se esconder atrás delas para impedir o tratamento dos que dele necessita. Com esse fundamento, o Tribunal de Justiça de São Paulo mandou a Secretaria de Estado da Saúde e a Prefeitura de Mogi Guaçu fornecerem o medicamento Lugiman à idosa Maria da Conceição Oliveira, de 84 anos, que sofre de glaucoma. Cabe recurso.

A decisão unânime foi da 10ª Câmara de Direito Público, que negou recurso da Fazenda do Estado e do Município. A turma julgadora entendeu que o poder público deve prover o que for necessário para garantir o direito à saúde e à proteção e amparo do idoso, como manda a lei. De acordo com os desembargadores, o tratamento foi definido no atestado médico e não há o que contestar.

Estado e Município alegaram que a decisão de primeira instância, que mandou fornecer o medicamento, interferia na gestão da coisa pública e violava o princípio da separação dos poderes. Sustentaram, ainda, que o medicamento era caro e que, nesses casos, os custos são de responsabilidade da União. O Estado seria apenas o gestor das verbas federais e o Município o responsável pelas ações básicas de saúde e de baixa complexidade.

A Fazenda Pública contestou, ainda, a legitimidade do Ministério Público Estadual para propor a Ação Civil Pública. Segundo o Estado e o Município, o processo não trata de direitos difusos e coletivos, mas de um caso individual, o que configuraria falta de interesse de agir.

A turma julgadora afirmou que não há ofensa à Constituição Federal, pois a sentença não impede o Estado de executar qualquer uma de suas políticas públicas. Para os desembargadores, o Ministério Público tem legitimidade para a defesa dos direitos individuais indisponíveis, mesmo quando a ação vise a tutela de uma pessoa.

A Fazenda Pública queria, ainda, se ver livre da aplicação de multa diária no caso de descumprir a decisão. Alegou que a penalidade iria onerar os cofres públicos e, portanto, o contribuinte. O relator, Torres de Carvalho, entendeu que o Estado não pode ter privilégios e benefícios dessa natureza. Para o desembargador, a preocupação tem sabor de premedito descumprimento da decisão judicial, exatamente por parte daqueles que devem obediência irrestrita e imediata a sentença do Judiciário.

“A multa onera o contribuinte na medida da negligência e da responsabilidade funcional do agente público”, disse o relator. “Cabe ao administrador, em isso ocorrendo, adotar as providências administrativas, judiciais e criminais contra o servidor faltoso que a elas deu causa”, completou Torres de Carvalho.

A ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, já entendeu que não se deve confundir direito à saúde com direito a remédio. Ela adotou esse entendimento ao julgar um recurso do estado de Alagoas contra o fornecimento de medicamentos para um paciente individual.

De acordo com ela, o artigo 196 da Constituição Federal, ao assegurar o direito à saúde, se refere, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando o acesso universal e igualitário. A ministra destacou que ele não garante situações individualizadas, como o fornecimento de remédios excepcionais e de alto custo que estão fora da lista do Sistema Único de Saúde (SUS).

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