Água no leite

Eurofood participa de assembleia de credores da Parmalat

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27 de março de 2007, 12h07

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu à empresa Eurofood IFSC o direito de participar com voz e voto da assembléia-geral de credores da Parmalat Participações do Brasil. A Eurofood alega ser credora de US$ 100 milhões, representados por cinco notas promissórias de US$ 20 milhões.

A decisão, por votação unânime da Câmara Especial de Falência, tratou exclusivamente do direito a voz e voto na assembléia-geral e não apreciou o suposto crédito reclamado pela Eurofood. A habilitação ou impugnação dele vai depender de prova que a empresa terá que apresentar para ser admitida no quadro de credores da Parmalat Participações.

A Eurofood entrou com pedido de habilitação de crédito na recuperação judicial da Parmalat Participações. O administrador judicial, Alfredo Luiz Kugelmas, negou provimento ao pedido. A alegação foi a de que ela seria cessionária de notas promissórias que foram emitidas em nome do Bank of América. Kugelmas sustentou que o poder de voto na assembléia pertence ao credor original. Alegou, ainda, que a Eurofood integraria o grupo Parmalat.

A Eurofood contra-atacou dizendo que não houve cessão de nota promissória, sendo ela credora original. Sustentou que está em liquidação judicial na Irlanda e que não pertence ao grupo Parmalat. A empresa entrou com pedido na 1ª Vara de Falência e Recuperação Judicial, mas o juiz Alexandre Lazzarini indeferiu o pedido. O fundamento foi o de que o cessionário não tem interesse na recuperação da empresa, mas apenas no recebimento do crédito e que o direito a voto não pode ser objeto de cessão, por ser personalíssimo e exclusivo do credor original.

Não satisfeita, a Eurofood entrou com agravo no tribunal. A Câmara Especial de Falências entendeu que pelo menos para o reconhecimento do direito a voz e voto, a Eurofood demonstrou, satisfatoriamente, ser credora, por força de instrumento de contrato, de US$ 100 milhões. A turma julgadora levou em conta, ainda, documentos do Banco Central (BC) que confirmam o ingresso de divisas, decorrente de empréstimos, que teve como credor o Bank of América e como devedora a Parmalat Participações. “Referida documentação é suficiente para se reconhecer a agravante (Eurofood) como credora, para fins de participar das Assembléias-Gerais de Credores da Parmalat Participações, podendo votar”, afirmou o relator, Pereira Calças.

No entanto, o relator sustentou que as provas não esclarecem se a Eurofood faz ou não parte do grupo Parmalat. O artigo 43 da nova Lei de Falências e Recuperação Judicial proíbe de participar das assembléias com direito a voto as empresas coligadas, controladoras ou as que tenham sócios ou acionistas com participação superior a 10% do capital social do devedor.

A Eurofood teve sua liquidação decretada pela justiça irlandesa, por decisão do Tribunal Superior da IrIanda. Por causa disso, a Parmalat Itália ingressou com recurso no Tribunal de Justiça da Comunidade Européia onde questiona a competência da corte irlandesa para deferir a liquidação. A Eurofood foi subsidiária da Parmalat Itália e isto é reconhecido por ela. O que precisa ser esclarecido é se, com sua liquidação acabou ou não o vínculo societário entre as duas empresas.

Plano de recuperação

A Parmalat Participações não deve ser confundida com a Parmalat Alimentos. A primeira é uma holding que controlou a segunda, mas hoje possui apenas uma pequena participação na Parmalat Alimentos. Esta teve seu plano de recuperação judicial aprovado no ano passado enquanto a ex-holding briga com os credores para aprovar a recuperação.

Em fevereiro, o TJ paulista permitiu que a Parmalat Participações reapresente o novo plano de recuperação judicial à assembléia-geral de credores. Dois planos já foram rejeitados. O segundo é parecido com o primeiro e sofreu algumas rejeições dos credores. A desaprovação sinaliza que se não houver alteração plano será novamente rejeitado.

Na decisão, o tribunal negou o pedido de falência da empresa feito pelo Banque Marocaine de Commerce Exterieur, do Marrocos. O banco credor alegou que, como o plano de recuperação não foi aprovado pelos credores, a falência deve ser imediatamente decretada, como determina a nova Lei de Falências. Mas, em primeira instância, o juiz aceitou que a Parmalat reapresentasse um plano alternativo para ser analisado pelos credores.

O debate se deu sobre os limites da soberania da assembléia de credores. Ou seja, a Câmara Especial de Falências discutiu se as decisões da assembléia de credores, tida como soberana, podem ser alvo de análise da Justiça, ainda que não haja irregularidades nelas. A previsão para que seja declarada a falência quando o plano é rejeitado pelos credores está em dois artigos da Lei 11.101/05 (nova Lei de Falências) — artigo 56, parágrafo 4º, e artigo 73, inciso III.

No entanto, o desembargador Pereira Calças observou que, de acordo com o que manda a Lei de Introdução ao Código Civil, a leis têm de ser interpretadas de maneira razoável. O artigo 5º da LICC diz: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. Para ele, embora a assembléia seja soberana, a Justiça está acima dela e não há nada que impeça o juiz de permitir que a empresa faça novo plano para os credores analisarem. “A nova Lei de Falências tornou maior a atuação dos credores no processo, mas não transformou o juiz em chancelador da assembléia.” O desembargador Lino Machado acompanhou o raciocínio do relator.

Os outros desembargadores da Câmara (Boris Kauffmann e Elliot Akel) — que não votam, mas participam da sessão — afirmaram que se o Tribunal de Justiça admitir um novo plano, pode ser aberto um precedente para que os juízes de primeira instância não decretem falências, mas sempre peçam plano alternativo. O que está em jogo, disseram, é saber como conciliar a soberania da assembléia de credores com o poder do Judiciário.

Credit Suisse

Um dos problemas para a aprovação do plano de recuperação reside na insistência do Credit Suisse First Boston que reclama ser credor de 500 milhões de euros. A Parmalat Participações afirma que já pagou a dívida, quer a exclusão do banco do rol de credores e ingressou na Justiça com ação na qual cobra do banco uma indenização de 1 bilhão de euros.

A disputa com o banco nasceu da emissão de 500 milhões de euros em bônus feita pela Parmalat em 2001 e subscrita pelo Credit Suisse. No vencimento, em 2007, esses títulos seriam resgatados pela Parmalat Participações e transformados em cotas de capital da empresa. No entanto, um documento numa auditoria atestaria que a Parmalat Itália, a matriz do grupo, já teria quitado metade da dívida.

Com esse argumento, a Parmalat Participações não reconhece os 500 milhões de euros como um crédito a que o banco suíço teria direito. Porém, o banco alega que é o maior credor da holding e tenta garantir esse valor na Justiça. A instituição financeira pediu para habilitar essa quantia entre os créditos reconhecidos na concordata da Parmalat Participações. Quando a companhia migrou para o regime de recuperação judicial.

Quando o banco fez esse pedido, a Parmalat resolveu processá-lo com base no Código Civil que estabelece que se um credor cobra uma cifra já recebida, como penalidade tem de pagar o dobro desse valor.

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