Função social

Mesmo se não há preconceito, aidético não deve ser demitido

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19 de março de 2007, 13h20

Empresa tem de dar ênfase à função social que exerce como empregadora quando tem de demitir um empregado. Com este entendimento, a Justiça do Trabalho garantiu a um técnico de telecomunicações da Telesp, portador do vírus HIV, o direito de voltar ao emprego mesmo não tendo sido comprovado que sua dispensa foi discriminatória. A decisão se baseou no conteúdo social do artigo 421 do Código Civil, segundo o qual “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

A decisão da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) e, no TST, pela 4ª Turma e pela Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1).

O trabalhador foi diagnosticado como portador do vírus HIV em 1998, e desde essa época, a Telesp tinha conhecimento do fato. Em 2002, a empresa incluiu-o em seu Plano Incentivado de Desligamento (PID), levando-o a ajuizar reclamação trabalhista na qual pediu sua reintegração ao cargo.

No processo, argumentou que, “muito embora não haja preceito legal que garanta a estabilidade do portador de AIDS, dentro da discricionariedade permitida ao empregador no ato de demitir, deve haver um mínimo de consenso e solidarismo ao escolher quais funcionários serão incluídos ou não no PID”. Sua alegação principal foi a de que a Telesp, ao incluí-lo no PID, “não levou em conta o fato dele ser portador de doença grave e ainda muito discriminada — e que as probabilidades dele vir a ser admitido em outra empresa são quase zero”.

Na primeira instância, os juízes concluíram que não houve realmente qualquer discriminação por parte da empresa, já que ela sabia de seu estado de saúde desde que fora diagnosticado, mas considerou ilegal sua dispensa imotivada, e determinou sua reintegração.

“Trata-se de um caso excepcional, onde está em jogo a vida de um empregado portador de uma doença terrível, incurável e avassaladora, que não só destrói o corpo de seu portador como também sua auto-estima”, afirmaram os juízes. Embora não exista norma legal prevendo estabilidade ao portador de HIV, a sentença considerou que o caso deveria ser analisado pela ótica da função social da empresa, conforme princípios adotados na Constituição Federal, “principalmente no artigo 170, inciso III” – que trata do princípio da função social da propriedade.

Na decisão, os juízes levaram em conta sua dificuldade de recolocação profissional “num mercado de trabalho cada vez mais estrangulado pela crise econômica, que dificulta a entrada de pessoas saudáveis, que dirá de um trabalhador obrigado a seguir o tratamento pelo resto da vida.”

O TRT-SP, ao negar recurso a Telesp, destacou que a determinação de reintegrar o empregado foi acertada “porque efetivamente há que se dar preponderância à função social da empresa e ao bem maior a proteger: o direito à vida”.

Para o Tribunal, o reconhecimento do direito à reintegração decorre da nova ótica jurídica imposta aos contratantes pelo Código Civil de 2002, que, no artigo 421, prevê que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, sobretudo quando o empregador não sofre restrição patrimonial pela manutenção do vínculo de emprego.

A Telesp recorreu então, sucessivamente, à 4ª Turma e à SDI-1 do TST. Alegou a inexistência de preceito legal que garanta a reintegração. Tanto o Recurso de Revista quanto os Embargos não foram conhecidos pelos ministros. Segundo o relator dos Embargos na SDI-1, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, a Telesp não conseguiu demonstrar a ocorrência de divergência jurisprudencial específica.

E-RR 409/2003-004-02-00.1

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