Voz em episódios

Herdeiros do dublador do Chaves não conseguem indenização

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21 de maio de 2007, 17h52

Dublador que não garante no contrato direitos autorais não deve recebê-los posteriormente. O entendimento é da juíza Renata Soubhie Nogueira Bório, da 6ª Vara Cível de Osasco, na Grande São Paulo. A juíza negou o pedido de indenização por danos morais dos herdeiros de Marcelo Gastaldi Júnior, dublador do personagem Chaves, em ação movida contra o SBT. Cabe recurso.

Marcelo Gastaldi Júnior morreu em 1995. Desde então, o SBT exibe os episódios que já estavam com a voz do dublador. A família alega que tudo está sendo feito sem autorização e sem pagamento dos direitos autorais. Ainda foi produzido um DVD com alguns episódios do programa, também sem pagamento dos direitos.

O SBT, para se defender, argumentou que adquiriu os direitos do programa depois da morte de Gastaldi e que o dublador não é artista intérprete. Por isso, não é titular dos direitos conexos nem dos direitos autorais.

A juíza negou o pedido de indenização com base no fato de o programa Chaves ter sido dublado e sonorizado por outras empresas.

“Marcelo Gastaldi Júnior não firmou com a ré qualquer contrato de dublagem onde estariam garantidos os seus direitos, porquanto fez contrato para a dublagem da produção. Por isso, Marcelo não era funcionário da ré, mas sim da Maga Produções e Empreendimentos Artísticos e da Marsh Mallow Mídia Eletrônica. Assim, eventual responsabilidade pelo pagamento de direitos conexos ou autorais é das empresas de dublagem que contrataram os serviços do falecido Marcelo”, entendeu.

“O mesmo se diga com relação à execução da música. Ora, a Editora responsável pela música de abertura autoriza a sua utilização e é devidamente remunerada pela ré. Se Marcelo contribuiu com sua voz, deverá reivindicar seus direitos junto à ela e não à ré”, afirmou. Os herdeiros do dublador ainda podem recorrer.

Leia a sentença

Processo 034.920/2006

SEXTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE OSASCO PROCESSO nº 1.298/02 Vistos. OLGA MARIA RIBEIRO GASTALDI, MARCIO RIBEIRO GASTALDI, DANIEL RIBEIRO GASTALDI, JULIANA RIBEIRO GASTALDI e GABRIELA RIBEIRO GASTALDI, qualificados nos autos, intentaram AÇÃO DE INDENIZAÇÃO PELO USO DA VOZ EM RE-EXIBIÇÃO E RETRANSMISSÃO DE EPISÓDIOS TELEVISIVOS em face de TVSBT – CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A, alegando que os autores são sucessores de Marcelo Gastaldi Júnior, falecido em 03.08.1995, e intentaram ação de exibição de documento objetivando saber em que condições foi realizado o contrato de labor de Marcelo Gastaldi Júnior, que foi julgada procedente em 1º e 2º Instância.

As dublagens realizadas por Marcelo foram dos personagens Chisperito, Chaves e Chapolin, além de participar da gravação de LP-Chaves, lançado pela Polygram. Ocorre que desde o falecimento de Marcelo, a ré vem utilizando os episódios dublados por Marcelo Gastaldi Júnior e das suas músicas. Por isso, as re-exibições dos episódios estão sendo feitas sem a autorização da família. Ademais, a empresa Imagem Filmes promoveu o lançamento do DVD – O Melhor do Chaves – vol. 1, com uso indevido de voz, sem o pagamento dos direitos autorais da produção, dublagem e ausência de créditos nominativos. Por isso, sustentam que devem ser indenizados. Requerem, portanto, a procedência da ação para que sejam indenizados nos direitos conexos e autorais.

Acostaram documentos (fls. 22/318 e 331/367). Citado, o réu ofereceu contestação (fls. 381/401), argüindo, em preliminar, prescrição; ilegitimidade passiva e ativa; e inexistência de especificação e comprovação dos danos alegados. No mérito, aduz que Marcelo não participou da dublagem do Programa Chespirito, pois os direitos de exibição do programa foram adquiridos a partir de 1998, após o falecimento de Marcelo. Alega que o dublador não é artista intérprete e por isso não é titular dos direitos conexos e nem dos direitos autorais. Insurge-se contra o pedido de indenização. Requer a improcedência da ação. Documentos a fls. 402/471. Réplica (fls. 473/484). Em audiência preliminar não foi obtida a conciliação (fls. 491). Encerrada a instrução, as partes apresentaram alegações finais (fls. 493/501 e 511/520). A ré agravou de forma retida do despacho de fls. 491, e, mantida a decisão, trouxeram os autores resposta. É o relatório.

Passo a fundamentar.

Procedo ao julgamento conforme o estado do processo por se tratar de matéria unicamente de direito, já tendo sido produzida a prova documental, única indispensável para o julgamento da lide. Trata-se de ação de indenização de re-exibições relacionado a direitos de dublagem do personagem “Chaves”, além de música. Analiso as preliminares alegadas em contestação. Quanto à prescrição, verifico que os autores fundam os seus pedidos na Lei de Direitos Autorais 5.988/73, que estabelece que a qualquer tempo poderá ser reivindicado o direito pela obra. Como se não bastasse, inexiste prazo específico para a hipótese em questão, motivo pelo qual há de se aplicar o art. 177 do antigo Código Civil, cuja prescrição, neste caso, se operaria em 20 anos.

Ademais, com exceção da viúva, os filhos de Marcelo eram menores, portanto, absolutamente incapazes, não correndo prescrição contra eles. Logo, não houve a alegada prescrição. A inicial não é inepta, há delimitação do pedido de danos materiais e morais, podendo o “quantum” ser fixado eventualmente em sede de liquidação de sentença. Também os autores têm legitimidade ativa, posto que são viúva e filhos do dublador, entendendo terem o direito de serem indenizados pelo direito autoral de seu marido e pai. No que tange à ilegitimidade passiva, ela está demonstrada nos autos. Destarte, verifico que a ré adquiriu a produção de “Charles” e “Chapolin” de empresa mexicana. Antes de exibido, os programas foram dublados e sonorizados por empresas contratadas pela ré, denominadas “Maga Produções e Empreendimentos Artísticos Ltda” e “Marsh Mallow Mídia Eletrônica S/C Ltda” (fls. 407 e segs).

Desta maneira, Marcelo não firmou com a ré qualquer contrato de dublagem onde estariam garantidos os seus direitos, porquanto fez contrato para a dublagem da produção. Por isso, Marcelo não era funcionário da ré, mas sim da Maga Produções e Empreendimentos Artísticos Ltda e da Marsh Mallow Mídia Eletrônica S/C Ltda. E não há como afirmar que as referidas empresas se confundem com a ré, pois têm denominação social, endereço e CNPJ distintos. Assim, eventual responsabilidade pelo pagamento de direitos conexos ou autorais é das empresas de dublagem que contrataram os serviços do falecido Marcelo.

O mesmo se diga com relação à execução da música. Ora, a Editora responsável pela música de abertura autoriza a sua utilização e é devidamente remunerada pela ré. Se Marcelo contribuiu com sua voz, deverá reivindicar seus direitos junto à ela e não à ré. Neste sentido, já decidiu o E. Tribunal de Justiça de São Paulo:

“INDENIZAÇÃO – Danos morais – Direito autoral – Omissão do nome da empresa dubladora dos créditos de obra cinematográfica – Inadmissibilidade – Apelada que não é titular de direitos morais sobre a dublagem – Inacessibilidade destes pelos dubladores, face sua condição de autores de obra derivada – Óbice legal, ademais, à cessão de direitos autorais e conexos decorrentes da prestação de serviços profissionais – Inteligência do artigo 13, parágrafo único, da lei n° 6.533/78 – Indenização indevida – Recurso provido” (Apelação Cível n° 224.665-1 – São Paulo, Relator Des. Álvaro Lazzarini, v.u., CCIV, j. em 21.02.95). Conclui-se, portanto, que diante da ilegitimidade passiva, a extinção da ação é de rigor.

D E C I D O.

Ante o exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, por ser a ré parte ilegítima, nos termos do art. 267, VI, do CPC. Por conseguinte, condeno os autores no pagamento das despesas do processo e dos honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, executáveis caso haja reversão da situação econômica dos autores, em cinco anos. P.R.I. Osasco, 08 de maio de 2007.

RENATA SOUBHIE NOGUEIRA BORIO

Juíza de Direito

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