Furacão de acusações

Transferência de presos na Hurricane revela atrito na Justiça

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17 de maio de 2007, 14h55

A transferência de 23 presos pela Operação Hurricane — 19 já réus e outros quatro ainda apenas denunciados — para o presídio federal de Campo Grande (MS), conforme determinação da juíza Ana Paula Vieira de Carvalho, da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, esbarrou na Resolução 502 do Conselho da Justiça Federal.

A Resolução criou normas para a transferência de presos e exige, entre outras coisas, a manifestação do juiz da execução penal da comarca onde está o presídio, do Ministério Público e dos próprios réus. Baseado na regra, o juiz da execução penal de Campo Grande, Odilon de Oliveira, abriu procedimento no qual o procurador da República em Mato Grosso do Sul Emerson Kalif Siqueira, em contradição com seus colegas do Rio, manifestou-se contrário à ida dos 23 acusados para o presídio federal daquela cidade.

Kalif Siqueira, numa manifestação que demonstra conflito entre ele e o juiz das execuções penais de Campo Grande, lembrou que o Decreto Presidencial 6.049/07, que regulamenta as transferências, “assevera que a inclusão do preso nos estabelecimentos penais federais deve ser justificada no interesse da segurança pública ou [da segurança] do próprio preso”. Segundo o procurador, na decisão da juíza do Rio “não há justificativa específica com relação a qualquer um dos detidos, se em nome da segurança pública ou do próprio preso”.

O procurador ressalta que “há vários outros aspectos a serem ditos pelo Parquet federal nessa manifestação, mas isto vem sendo solenemente ignorado por esse juízo e nos outros precedentes, chegando a ter casos em que o processo recém-ingressado na sede da Procuradoria da República para fins de emissão do parecer ministerial sobre o pedido de transferência para o presídio federal é posterior à imprensa já veicular notícia da consumação da transferência. Parece ser o caso destes autos também, a teor do que tem sido veiculado na mídia escrita e televisiva, sendo que a transferência parece só não ter se efetivado porque alguns presos não foram interrogados perante o juízo deprecante”.

Ele continuou a crítica ao juiz, dizendo que “não há mais razão para alongar-se na presente manifestação e nem nas demais do mesmo jaez, porque, em tudo indica, já está tomada a decisão. Apenas ela não é conhecida nos autos, mas já é de toda sociedade e da imprensa”. O procurador ainda ressalta que “nos casos em que a decisão contraria a manifestação ministerial, os autos demoram a chegar à Procuradoria da República”.

Diante dessa manifestação, o juiz Oliveira determinou que o procurador indique em quais processos estaria ocorrendo suposta prevaricação e o nome dos servidores responsáveis por isso. Além disso, enviou o caso para o Rio de Janeiro para conhecimento da juíza Ana Paula, que, depois de dar ciência do processo ao MP, abriu vista de cinco vias para as defesa se manifestarem.

Na decisão assinada em 20 de abril, Ana Paula realmente não fala na questão da segurança pública ou na do preso, mas deixa claro “que a custódia dos acusados da Operação Furacão demanda cuidados diferenciados, haja vistos os indícios de enorme poderio econômico-financeiro da quadrilha e as notórias dificuldades que enfrentam o sistema penitenciário do estado do Rio”.

Mais adiante, salientou “que os autos tratam de uma quadrilha em tese fortemente infiltrada no aparelho estatal e, em especial, na estrutura policial. Quadrilha esta que, segundo o relatório policial federal, realizava pagamentos de milhares de reais mensais a dezenas de agentes encarregados da segurança pública”.

A decisão da juíza Ana Paula de pedir a transferência dos presos foi tomada a pedido dos procuradores Marcelo Freire e Orlando Monteiro da Cunha, que atuam no caso. Eles ainda não se manifestaram sobre a posição de seu colega de Campo Grande.

Para a defesa dos réus, que não conseguiu em nenhuma das muitas tentativas, liminar em HC determinando a liberdade dos mesmos, a discussão em torno da transferência é muito favorável. Com isto, eles ganham tempo para que o Superior Tribunal de Justiça manifeste-se sobre os pedidos de Habeas Corpus que tentam evitar a transferência dos presos, impetrados pela defesa naquele tribunal.

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