Boi na linha

Vivo Celular é condenada por bloqueio indevido de linhas

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1 de maio de 2007, 0h01

Por bloquear, indevidamente, dez linhas telefônicas, a Vivo Celular terá que pagar pelos prejuízos causados a uma empresa de cosméticos do Distrito Federal. A decisão é da 1ª Vara Cível de Taguatinga (DF), que condenou a operadora a pagar à empresa BSB Italian Cosméticos R$ 15 mil por danos morais e R$ 20 mil por não cumprir a liminar que determinou o desbloqueio das linhas. Cabe recurso.

Segundo a juíza Sandra Reves Vasques Tonussi, o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 227, definiu que os prejuízos às empresas também podem ser considerados como danos morais. Para ela, “o bloqueio levado a efeito pelo réu impediu que a autora desenvolvesse regularmente suas atividades, causando transtornos inquestionáveis à autora, seja na relação desta com seus clientes ou com seus empregados”.

De acordo com os autos, a empresa de cosméticos adquiriu junto a Vivo Tele Centro-Oeste dez linhas de telefone celular para incrementar as vendas dos seus produtos. Entretanto, a Vivo bloqueou todos os celulares, possibilitando apenas o recebimento de ligações, alegando que, em seu sistema, constavam débitos em aberto em nome da empresa de cosméticos.

Para a juíza, não houve justificativa para que as linhas fossem bloqueadas, já a empresa comprovou o pagamento do valor indicado pela própria Vivo. Apesar da controvérsia quanto ao número de dias do bloqueio (dois dias, segundo a Vivo, e cerca de sete meses, segundo a autora), a juíza baseou-se nas faturas do período de abril a julho de 2006, em que não houve uma única chamada originada pelos telefones adquiridos. Ela fixou como data inicial do descumprimento o dia 3 de maio de 2006 e data final o dia 15 de outubro do mesmo ano.

Por a Vivo não ter cumprido a decisão liminar que determinava o desbloqueio dos celulares, foi determinada uma multa diária no valor de R$ 1 mil, totalizando R$ 165 mil. Porém, a juíza entendeu que a quantia é excessiva e reduziu para R$ 20 mil, de acordo com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

“O descumprimento da aludida decisão, constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição; neste caso, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que as multas devem ser revertidas em favor da parte que suportou as conseqüências do inadimplemento ensejador de sua fixação, e não do Estado”, concluiu.

Leia a decisão

1ª VARA CÍVEL DA CIRCUNSCRIÇÃO JUDICIÁRIA DE TAGUATINGA

Processo 2006.07.1.006576-6

SENTENÇA

BSB ITALIAN COSMÉTICOS LTDA ingressou em Juízo com ação indenizatória em face de VIVO TELE CENTRO OESTE CELULAR PARTICIPAÇÕES S/A, partes devidamente qualificadas na inicial.

Alega que adquiriu junto ao réu dez linhas de telefone celular a fim de incrementar as vendas dos artigos de perfumaria e cosméticos que comercializa. Afirma que, mesmo não possuindo nenhum débito com o réu, este bloqueou todos os dez telefones para efetuar ligações, estando operando apenas para recebimento.

Diz que, apesar de ter comunicado o ocorrido, o réu não reabilitou os aparelhos, vindo a prejudicar as vendas da autora efetuadas por telefone, bem como a comissão dos funcionários que atuam nesta área da empresa. Acrescenta que o fato traz uma série de constrangimentos junto aos clientes, os quais creditam o acontecido ao descaso da autora.

Requer, em preliminar, seja determinado o desbloqueio dos aludidas linhas, e, no mérito, a condenação do réu no pagamento da importância de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) a título de danos morais.

A autora junta às fls. 61/62 faturas emitidas pelo réu, reconhecendo a procedência da reclamação efetuada pela autora. Todavia, informa que o réu ainda não desbloqueou as linhas objeto da lide.

Decisão postergando a análise da tutela antecipada à formação do contraditório, tendo em vista não constar dos autos comprovantes de pagamento de todas as faturas recentes das linhas em questão (fl. 63).

Nova petição da autora esclarecendo que adquiriu junto ao réu plano empresarial que lhe dava direito de usufruir 1.000 (mil) minutos nas dez linhas de telefones celulares mediante o pagamento mensal do importe de R$ 290,00 (duzentos e noventa reais), mais R$ 35 (trinta e cinco reais) pelo plano intra-rede (ligações entre os dez telefones comprados). Acrescenta que todas as ligações efetuadas em decorrência desses planos geram uma única conta em nome da autora. Demonstra à fl. 66 o cumprimento de sua obrigação de pagamento pelos serviços utilizados no período de 2/10/2005 a 1/12/2005, ressaltando existirem débitos do período de 2/1/2006 a 1/3/2006 ainda não vencidos.

Deferida a antecipação da tutela a fim de que o réu promovesse o desbloqueio das linhas de celulares objeto da lide à fl. 69.

Procedida à citação e intimação do réu (fl. 73-v), a autora avia petitório informando que aquele não havia cumprido a ordem judicial.


À fl. 76 consta nova decisão impondo multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de descumprimento da aludida decisão.

A autora junta comprovante do pagamento das faturas do período de 2/1/2006 a 1/3/2006 às fls. 80/81.

Certidão à fl. 84 atestando que a intimação do réu no dia 2/5/2006 para o cumprimento da decisão de fl. 76.

Certidão à fl. 87 informando que o réu não apresentou defesa e que expirou o prazo concedido para o atendimento da decisão de fl. 76.

Nova petição da autora requerendo o julgamento antecipado da lide com a decretação da revelia do réu e a aplicação da pena diária fixada na decisão de fl. 76 desde o dia 24/3/2006, uma vez que o réu ainda não havia cumprido tal determinação judicial até o dia 17/5/2006.

O réu avia contestação intempestiva às fls. 92/136, aduzindo que os bloqueios efetivados ocorreram porque constavam de seu sistema faturas em aberto cujo pagamento era de responsabilidade da autora. Informa que os valores de tais faturas foram contestados pela autora, tendo o réu promovido o desbloqueio das linhas durante o período de análise, e considerado as contestações procedentes. Assevera que os bloqueios não perduraram por prazo superior a dois dias. Sustenta que diante dessa situação resta inviabilizada a configuração do dano moral alegado. Requer a improcedência do pedido.

Despacho determinando a juntada de comprovante do desbloqueio das linhas de telefone celular indicadas na inicial sem prejuízo do “dies a quo” (fl. 137).

Em cumprimento o réu juntou os documentos de fls. 144/148.

Manifestação do autor noticiando que os documentos de fls. 144/148 foram acostados intempestivamente, que o desbloqueio não foi realizado até o dia 7/8/2005, e que vem efetuando o pagamento das faturas posteriores a fim de evitar o envio de seu nome aos órgãos de proteção ao crédito, visto que possui plano de fidelização de dois anos.

Despacho ordenando a intimação da ANATEL para informar se houve cumprimento da liminar (fl. 161).

Em resposta, a ANATEL expediu o ofício de fls. 167/168, dizendo que obteve informações junto ao representante da autora de que as linhas somente foram desbloqueadas no dia 15/10/2006, e perante o réu de que as linhas foram bloqueadas no dia 7/3/2006 e desbloqueadas no mesmo dia, e novamente bloqueadas no dia 23/3/2006 e desbloqueadas no dia 7/3/2006.

Novas petições das partes às fls. 181/182 e 184/185.

É o relatório.

DECIDO.

Julgo antecipadamente a lide na forma do Art. 330, II, CPC.

O réu, embora devidamente citado e especialmente advertido das conseqüências jurídicas de sua inércia, não apresentou defesa, deixando transcorrer in albis o prazo legal para se opor à pretensão deduzida, dando causa, por sua exclusiva desídia, à eclosão dos efeitos da revelia, que ora decreto, reputando verdadeiros os fatos declinados pelo Autor na inicial, no que tange ao ato ilícito noticiado, com amparo no artigo 319 do Código de Processo Civil.

Conforme se depreende da certidão de fl. 73-v e do protocolo de fl. 92, o mandado de citação devidamente cumprido foi juntado aos autos no dia 18/4/2006 e o réu somente apresentou sua contestação no dia 18/5/2005, tendo a intempestividade da peça de defesa sido devidamente atestada à fl. 87.

A despeito da revelia decretada, constam dos autos provas suficientes do ilícito praticado pelo réu.

Em sua intempestiva contestação, o réu sustenta que os bloqueios objeto da lide foram efetivados em razão de constar em seu sistema débito de responsabilidade da autora em aberto. Todavia, em contraposição à própria tese expendida, o réu reconheceu que tal dívida foi questionada pela autora e que a reclamação foi reputada procedente, sendo certo que constam dos autos comprovantes dos pagamentos dos novos valores por parte da autora, nos respectivos prazos concedidos pelo réu (fls. 8, 21, 31, 40, 80 e 81), segundo pormenorizadamente explicitado às fls. 65/66.

Vale dizer, se o montante exigido pelos serviços prestados pela operadora de telefonia, que fundamentou o bloqueio objeto da lide, não era devido, e se a autora efetuou o pagamento da quantia correta, indicada pelo próprio réu, nos prazos conferidos por este, não há justificativa jurídica válida para o bloqueio das linhas telefônicas um dia sequer.

O réu argumenta, ainda, que o bloqueio em questão não perdurou por prazo superior a dois dias. A autora, a seu turno, diz que o bloqueio foi mantido do dia 24/3/2006 ao dia 15/10/2006.

Consoante se deduz dos elementos dos autos, o réu foi intimado para proceder ao desbloqueio das linhas de celular objeto da lide no dia 10/4/2006 (fl. 73-v). Ante a notícia do não atendimento da ordem judicial (fl. 75), foi proferida nova ordem determinando o desbloqueio no prazo de 24 horas e impondo multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de descumprimento da aludida decisão (fl. 76). Procedida a intimação para o cumprimento da decisão de fl. 76 no dia 2/5/2006 (fl. 84), mais uma vez a autora informou que até o dia 17/5/2006 o réu não havia atendido à ordem do Juízo (fl. 90). No dia 18/5/2006 o réu avia contestação intempestiva aduzindo que os bloqueios não perduraram por prazo superior a dois dias (fls. 92/136).


Ante a discrepância entre as informações das partes e a ausência de prova documental do atendimento da decisão judicial, foi proferido o despacho determinando a juntada do comprovante do desbloqueio das linhas de telefone celular em questão no prazo de 72 horas sem prejuízo do “dies a quo” da multa fixada (fl. 137). Em pretenso cumprimento o réu juntou, extemporaneamente, os documentos de fls. 144/148, os quais foram impugnados pela autora à fl. 151, pois publicada a determinação no dia 12/7/2006, o réu somente se manifestou em 19/7/2006, dois dias após o vencimento do prazo 17/7/2006. Nesta mesma petição a autora esclarece que até o dia 7/8/2005 o desbloqueio ainda não tinha sido realizado, e que vinha efetuando o pagamento das faturas posteriores a fim de evitar o envio de seu nome aos órgãos de proteção ao crédito, visto que possuía plano de fidelização de dois anos.

Diante da imprestabilidade dos documentos acostados pelo réu às fls. 144/148 para comprovar o cumprimento da liminar, restou ordenada à fl. 161 a intimação da ANATEL a fim de que fosse informado se o réu desbloqueou as linhas de telefone celular em comento. Todavia, a tentativa não obteve êxito, em virtude de a aludida autarquia federal ter fundamentado sua resposta nas informações obtidas junto às partes, não esclarecendo a controvérsia estabelecida nos autos – a autora insistiu que o desbloqueio somente foi efetivado no dia 15/10/2006, e o réu que as linhas permaneceram bloqueadas por apenas dois dias.

Assim, tendo em vista que o réu foi intimado em duas oportunidades para promover o desbloqueio das linhas em questão (fls. 73-v e 76); que nas duas oportunidades deixou de cumprir as determinações deste Juízo (fls. 75, 90 e 87); que, quando atendia às ordens judiciais, o fazia tardiamente (fls. 92/101 e 142/143) e de forma insatisfatória (fls. 102/136 e 144/148); que não se desincumbiu do ônus de comprovar documentalmente nos autos o cumprimento da decisão judicial (fls. 125/136 e 144/148), mesmo após ser especificamente intimado para tanto (fl. 137), frise-se, prova que estava facilmente ao seu alcance; e que as faturas de fls. 144/145, acostadas pelo próprio réu, e a fatura de fl. 158, juntada pela autora, demonstram que no período de 2/4/2006 a 1/7/2006 não houve uma única chamada originada na área da operadora ou em viagem regional pelo Brasil, reputo não cumprida a liminar deferida pelo Juízo, fixando como termo inicial do descumprimento o dia 3/5/2006, ou seja 24 horas após a regular intimação do réu (2/5/2006), e como termo final o dia 15/10/2006, data em que a autora admitiu o desbloqueio.

Não obstante a independência da obrigação de fazer estipulada em antecipação de tutela e a ensejadora da reparação civil intentada pela autora (R$ 40.000,00), bem como o fato de que a multa diária deve ser contada durante todo o período de desobediência da ordem judicial, tenho que na hipótese dos autos o valor das “astreintes” há de ser limitado à metade da indenização objeto da lide (R$ 20.000,00), sob pena de enriquecimento ilícito da autora, ante a extensão alcançada pela aludida multa.

Outra interpretação importaria atentar contra a própria finalidade do instituto e os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, uma vez que o valor da multa diária atingiu patamares excessivos, ou seja, mais de quatro vezes – aproximadamente R$ 165.000,00 – o importe indicado pela autora na inicial como hábil ao ressarcimento dos prejuízos sofridos em razão da recalcitrância do réu em desbloquear os celulares por esta adquiridos – R$ 40.000,00.

Confiram-se os seguintes arestos:

“CIVIL. PROCESSO CIVIL. CONDENAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ASTREINTES . LIMITAÇÃO. POSSIBILIDADE. CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. 01. A multa fixada para o caso de descumprimento de obrigação de fazer, embora não se limite ao valor da causa, 40 salários mínimos, deve guardar vinculação com a obrigação principal (Enunciado nº 25, do XVI FONAJE), sendo determinada de forma a não ensejar o enriquecimento indevido da parte. Por outro lado, cumpre ao magistrado, a teor do artigo 461, §6º, do CPC c/c artigo 6º, da Lei nº 9.009/95, reduzir a multa quando reputá-la excessiva, atendendo a critérios de razoabilidade e proporcionalidade. 02. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida. (20030710131669ACJ, Relator SANDOVAL OLIVEIRA, Primeira Turma

Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 20/09/2005, DJ 01/12/2005 p. 314)”

“AÇÃO COMINATÓRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ART. 6º E 196 DA CF. ART. 207, INC. XXIV, DA LODF. DISTRITO FEDERAL. CONDENAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. MULTA DIÁRIA. RAZOABILIDADE. PROPORCIONALIDADE. I – (…). II – (…). III – (…). IV – A multa diária tem por finalidade compelir o réu a cumprir a obrigação, e não tem natureza indenizatória, de forma que deve ser fixada observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. V – Apelação e remessa oficial conhecidas e parcialmente providas. Unânime. (20050110276236APC, Relator VERA ANDRIGHI, 4ª Turma Cível, julgado em 17/05/2006, DJ 08/06/2006 p. 103)”


(grifei)

Com efeito, a multa diária constitui meio processual que visa a exercer pressão sobre a vontade do devedor de modo de que este cumpra a obrigação que lhe foi imposta (art. 461, § 4º, do CPC ), devendo seu montante ser compatível ao direito que se almeja proteger e ao fim a que se destina, máxime tendo em vista que a “astreinte” é fixada com base em parâmetros subjetivos. Vale dizer, a multa diária deve inibir o descumprimento da determinação judicial, e não deferir qualquer vantagem pecuniária à autora ou exercer eventual função reparatória, servindo como fonte de enriquecimento sem causa da parte.

Nesse sentido:

“CIVIL E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. INDEFERIMENTO DE INICIAL. APELO. MATÉRIA ANALISADA. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO PARA O RÉU NÃO CITADO. MULTA DIÁRIA (ASTREINTES). ALTERAÇÃO DA PERIODICIDADE OU DO VALOR. CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. (…). A multa diária imposta para o cumprimento da ordem judicial deve se orientar por critérios de proporcionalidade e razoabilidade, não podendo servir como reparação por eventuais danos morais ou como modo de enriquecimento sem causa. Verificando o excesso no valor da multa diária, a instância recursal deve proceder à redução, com base no art. 461, §6º do Código de Processo Civil. (20050110606138APC, Relator NATANAEL CAETANO, 1ª Turma Cível, julgado em 27/09/2006, DJ 17/10/2006 p. 75)”

“PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. FUNÇÃO INTIMIDATIVA. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. As multas por dia de descumprimento do preceito – astreintes, constituem um dos meios sancionatórios de que dispõe o Estado para fazer cumprir a Ordem Jurídica, realizando função intimidativa, de força indireta, para compelir o devedor recalcitrante ao cumprimento da obrigação assumida. (…). Apelação conhecida e parcialmente provida. (APC4453597, Relator ANA MARIA DUARTE AMARANTE, 5ª Turma Cível, julgado em 09/10/1997, DJ 01/04/1998 p. 58)”

(grifo nosso)

No que tange à possibilidade da modificação do valor da multa diária, oportunas as palavras do eminente processualista Luiz Guilherme Marinoni:

“O novo §6º do art. 461, ao permitir que o juiz reduza ou aumente o valor da multa fixada na sentença já transitada em julgado, demonstra claramente que a parte da sentença que fixa o valor da multa não fica imunizada pela coisa julgada material. Como é evidente, se houvesse qualquer desejo de deixar intacto o valor da multa, não teria o legislador previsto a possibilidade de o juiz aumentá-la ou reduzi-la.

(…)

Na verdade, tomando-se em consideração a natureza da multa, é fácil perceber que sua fixação é feita sempre em caráter provisório, exatamente porque ela tem por fim apenas garantir a efetividade da tutela jurisdicional, e não um direito de crédito em favor do autor (…).” (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Inibitória (individual e coletiva). São Paulo: RT, 2003, p. 224)

Assim, considerando a finalidade inibitória das astreintes e o direito que se busca resguardar no caso em apreço, entendo excessivo o valor atingido pela multa diária de R$ 165.000,00 (cento e sessenta e cinco mil reais), impondo-se sua redução para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), na forma do §6º ao art. 461 do Código de Processo Civil, em observância ao princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, visto que a metade do valor atribuído à causa já realiza a função intimidatória a que alude a o citado diploma legal sem levar ao enriquecimento ilícito da autora.

Conquanto o descumprimento da aludida decisão concessiva de antecipação de tutela constitua ato atentatório ao exercício da jurisdição, é assente na doutrina e na jurisprudência que as astreintes devem ser revertidas em favor da parte que suporta as conseqüências do inadimplemento ensejador de sua fixação, e não do Estado.

A respeito:

PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO – MULTA DIÁRIA (ASTREINTES) POR DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL – NATUREZA – LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM PARA COBRANÇA DA PARTE ADVERSA. 1- As astreintes constituem um dos meios sancionatórios de que dispõe o Estado para fazer cumprir a ordem judicial, cumprindo função intimidativa com vistas a compelir o devedor recalcitrante ao cumprimento de uma obrigação, não se revestindo de natureza indenizatória. 2- É assente na doutrina e em nossa jurisprudência que a multa cominatória (astreintes) é devida à parte que suporta as conseqüências da recalcitrância e não ao Estado, muito embora, este também reste lesado pelo descumprimento de suas ordens.(20040111011523APC, Relator VASQUEZ CRUXÊN, 3ª Turma Cível, julgado em 06/03/2006, DJ 11/04/2006 p. 154)

De outro lado, a pretensão de condenação do réu a título de danos morais é procedente e expressamente determinada na Constituição da República, artigo 5º, V e X, exigindo-se à responsabilização civil a ocorrência de três elementos: o dano, o nexo causal entre a conduta do agente e o dano sofrido e, finalmente, a culpa do causador do dano.


Na hipótese dos autos a ocorrência do dano moral e do respectivo nexo causal são evidentes: o bloqueio levado a efeito pelo réu impediu que a autora desenvolvesse regularmente suas atividades, causando transtornos inquestionáveis à autora, seja na relação desta com seus clientes ou com seus empregados. Sua honra objetiva foi francamente aviltada.

Ressalte-se haver a Jurisprudência Pátria pacificado entendimento sobre danos morais experimentados por pessoa jurídica, com a edição da Súmula 227 pelo Superior Tribunal de Justiça: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.

A culpa restou devidamente evidenciada pelo fato de que o bloqueio não era devido, pois a autora questionou os valores cobrados pelos serviços prestados pela operadora de telefonia ré, e efetuou o pagamento das quantias corretas nos prazos avençados.

Assim, configurados o dano e o nexo de causalidade, sem que tenha sido provada alguma excludente da responsabilidade civil, surge para o réu o dever de indenizar.

Considerando-se não apenas a situação da autora, pessoa jurídica com capital de R$ 10.000,00 (dez mil reais), mas também, de outro lado, a manifesta solvência da empresa, a gravidade do fato, e a natureza do dano, tenho que o pagamento da quantia de R$15.000,00 (quinze mil reais) é contraprestação pecuniária justa pelo dano moral sofrido, entendendo como assaz elevado o valor pretendido de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

Ressalte-se, por oportuno, que a redução do quantum pretendido não implica em sucumbência parcial do autor, posto que a indicação de valor pecuniário da indenização ao dano moral não é necessária na inicial, cabendo ao Juízo a valoração.

Embora a indenização pecuniária não apague a dor moral ou resgate a honra violada, logra alcançar sua finalidade precípua de amenizar as conseqüências advindas do ato irresponsável do réu.

Oportunas as palavras de Caio Mario sobre o tema:

” … na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos, ou duas concausas:I) punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial;II) pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material (Mazeaud e Mazeaud, ob. cit.,nº419; Alfredo Minozzi, Danno non patrimoniale, nº66) o que pode ser obtido ‘no fato’ de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo de vingança ( Von Thur, Partie Générale du Code Fédéral des Obligations, I, § 106, apud, Silvio Rodrigues, in loc. cit.). A isso é de acrescer que na reparação por dano moral insere-se a solidariedade social à vitima…” (PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 3ª ed.. Rio de Janeiro: Forense. 1992, p. 315 e 316).

Com tais fundamentos, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o réu no pagamento da quantia líquida de R$15.000,00 (quinze mil reais), a título de danos morais, devidamente corrigida e acrescida de juros moratórios a partir da publicação desta sentença, confirmando a liminar anteriormente deferida.

Condeno o réu no pagamento da quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), referente à multa diária fixada na decisão de fl. 76, nos termos da fundamentação deste decisum.

Condeno o réu, ainda, no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação.

O não pagamento voluntário do débito no prazo de quinze dias após o trânsito em julgado importará o acréscimo ao valor devido de multa de 10% (Art. 475-J do Código de Processo Civil).

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Taguatinga, 5 de março de 2007.

SANDRA REVES VASQUES TONUSSI

JUÍZA DE DIREITO

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