Ato de discórdia

Justiça paulista não é lenta e não está desacreditada

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20 de junho de 2007, 18h59

Com todo o respeito. Não concordo com a estarrecedora informação trazida pelo desembargador Celso Limongi, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, à sociedade, de que o Judiciário paulista é uma Instituição sucateada e desacreditada. Não fossem o profissionalismo, a competência, a dedicação e a emulação de seus milhares de juízes, centenas de desembargadores e dezenas de milhares de servidores, aí, sim, a Justiça de São Paulo estaria desacreditada e até falida.

Ademais, não podemos esquecer que a competente Justiça paulista sozinha é maior e recebe mais processos que todos os tribunais do resto do país juntos. Ela é gigantesca, tem acumulado um total de mais de 17 milhões de processos e atende a uma população de cerca de 40 milhões de habitantes do Estado, que responde por cerca de 40% do PIB nacional.

O problema é grave e complexo, mas pode ser equacionado: a Justiça paulista carece de mais recursos orçamentários e precisa dispor de maior independência financeira para implementar seu projeto de modernização, de informatização e de reciclagem de seu quadro de servidores, que merecem dispor de uma estimuladora política específica de RH. Eles são heróis. Sem esses remédios, sem dúvida, a médio prazo, o descrédito será inevitável. Hoje, porém, data vênia, a Justiça de São Paulo continua ainda merecedora de admiração e de respeito, considerando a qualidade e a fundamentação das Sentenças e dos Acórdãos diariamente proferidos.

Já no âmbito do Egrégio Tribunal de Justiça, que Celso Limongi preside, em especial, os processos de seqüestro de rendas (precatórios), com toda sinceridade, independentemente da injeção de mais recursos orçamentários, também indispensáveis, há que se adotar procedimentos e rotinas que agilizem a eficácia de suas decisões e por conseqüência a celeridade da prestação jurisdicional buscada.

É o caso, por exemplo, do processo 130.771.0/00. Em 14 de fevereiro passado, há mais de 120 dias, que Celso Limongi deferiu o seqüestro de rendas formulado pelos autores, a respectiva carta de ordem foi expedida e cumprida e o crédito depositado à disposição do Poder Judiciário não foi liberado até agora por conta de conhecidas e inconseqüentes iniciativas protelatórias do executado, useiro e vezeiro em fazer pouco das decisões judiciais.

O executado, espertamente, pleiteou junto ao Tribunal e obteve a substituição das verbas seqüestradas em contas da Prefeitura na Nossa Caixa S/A, por outros recursos supostamente existentes na conta corrente 22.204-6, agência 0925, do Banco do Brasil, para que novo seqüestro fosse promovido “para minimizar o impacto social decorrente do seqüestro de rendas”.

Todavia, para azar do contumaz descumpridor de ordens judiciais, comprovou-se que na mencionada conta, não havia quantia alguma para satisfazer o crédito dos exeqüentes e o que é pior: trata-se de conta bancária com problema de origem vinculada. Portanto, o município executado ofertou informação falsa à Justiça para invalidar o seqüestro de rendas determinado pelo desembargador Celso Limongi há mais de 120 dias e com o de acordo do chefe do Ministério Público Estadual e assim mesmo foi bem sucedido.

Lamentavelmente, há mais de 20 dias os exeqüentes requereram a reconsideração do despacho exarado por Celso Limongi e até agora não obtiveram resposta. Em condições normais, despachos de reconsideração ou de confirmação de decisões do desembargador não têm ultrapassado os dez dias.

Isso é muito preocupante porque daqui a pouco o Congresso Nacional votará a Emenda 12/2006 e, por certo, novo e definitivo calote acabará de vez com os direitos das centenas de milhares de brasileiros titulares de precatórios judiciais, enterrando de vez a sua esperança mais que vintenária de receber a justa indenização que lhes foi assegurada por decisão transitada em julgado, tida como irreversível e irrevogável.

Sua aprovação será a constitucionalização do calote, como muito bem vem advertindo a OAB nacional. E é por isso que a demora no cumprimento de decisão de seqüestro só beneficiará ainda mais as entidades devedoras (Municípios, Estados e União), em detrimento dos jurisdicionados portadores de legítimos títulos judiciais.

Por outro lado, de se lembrar que, “in casu”, se trata de débito judicial pendente há vários anos e cujo pagamento não poderá ser postergado indefinidamente, como com acerto, ressaltou o ex-procurador-geral de Justiça Luiz Guimarães Marrey em processo semelhante: “De fato, se nada for feito agora o problema nunca será solucionado, pois que há muito tempo o Município vem opondo os mais variados obstáculos ao cumprimento da “ordem ou decisão judicial” e, a persistir tal situação, a confiança na Justiça será seriamente abalada”.

No mais, como muito bem decidiu o Supremo Tribunal Federal nos autos do processo número 91.041-6, “o que importa considerar, EM TERMOS DE DECIDIBILIDADE, É QUE OS JURISDICIONADOS, NÃO PODEM PAGAR POR UM DÉBITO A QUE NÃO DERAM CAUSA… O DÉBITO É DA JUSTIÇA E A FATURA TEM QUE SER PAGA É PELA JUSTIÇA MESMA. ELA QUE PROCURE E ENCONTRE — PEÇA ELEMENTAR QUE É DA ENGRENAGEM ESTATAL — A SOLUÇÃO PARA ESSE BRUTAL DESCOMPASSO ENTRE O NÚMERO DE PROCESSOS QUE LHE SÃO ENTREGUES PARA JULGAMENTO E O NÚMERO DE DECISÕES AFINAL PROFERIDAS”… “É O QUE SE TEM CHAMADO DE “JUÍZO NON LIQUET”, A SIGNIFICAR QUE O PODER JUDICIÁRIO ESTÁ OBRIGADO A SOLVER OU LIQUIDAR AS QUESTÕES FORMALMENTE SUBMETIDAS À SUA APRECIAÇÃO. ESTA A SUA CONTRAPARTIDA, DA QUAL NÃO PODE SE EXIMIR JAMAIS”.

Nesse contexto, aguarda-se a pronta decisão do desembargador Celso Limongi, autorizando o levantamento da 5ª. parcela seqüestrada e posta à disposição do Poder Judiciário há mais de 60 dias. Se outro, porém, for o entendimento do desembargador, mantendo, quem sabe, a surrada e oportunista alegação do executado (com orçamento de mais de R$ 500 milhões) de que passa por dificuldades financeiras e que está obrigado a garantir a prestação de serviços públicos essenciais, então, que, no caso, não se deixe de exigir que o mesmo indique em 24 horas e com clareza onde e em que conta não vinculada estarão as verbas seqüestráveis para satisfazer o crédito dos exeqüentes, sob pena de responsabilização penal do chefe do Executivo do município executado, em caso de desobediência ou de obstrução à ação da Justiça.

A Justiça de São Paulo não é lenta e nem está desacreditada. Ela está é sobrecarregada e deve fazer valer suas decisões sobretudo quando condena entes públicos inadimplentes.

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