Questão de nível

Promotor ao lado de juiz no juri não ofende direito de defesa

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31 de janeiro de 2007, 10h41

O fato de o promotor ficar ao lado e no mesmo nível do juiz que preside o Tribunal do Júri não ofende a garantia constitucional da isonomia das partes no processo. O entendimento é do ministro Francisco Peçanha Martins, presidente em exercício do Superior Tribunal de Justiça. O ministro negou o pedido de Medida Cautelar ajuizado no STJ pela OAB de Guarulhos (SP).

A OAB entrou com ação para mudar a composição do plenário do Tribunal do Júri do município. Atualmente, o promotor de Justiça fica à direita do presidente do júri, ocupando a mesma bancada. Segundo a OAB Guarulhos, isso coloca o Ministério Público em vantagem com relação ao réu e ao seu defensor e ofende o artigo 6º da Lei 8.906, de 1994. A regra prevê que não há hierarquia entre advogados, membros do MP e juízes.

Tanto a primeira instância quanto o Tribunal de Justiça de São Paulo negaram o pedido. Houve um recurso ao Supremo Tribunal Federal, ainda não analisado e a Medida Cautelar proposta ao STJ.

No Superior Tribunal de Justiça, o argumento da OAB foi o de que o fato de o promotor ficar no mesmo nível do juiz, ofende o princípio da isonomia. Para a entidade, o MP até pode ficar à direita, mas não na mesma bancada.

O Ministério Público de São Paulo se manifestou contra o pedido. Afirmou que o tema já foi julgado pelo STJ e que a Corte considerou que o simples fato de o representante do Ministério Público se sentar ao lado do juiz não causa constrangimento ilegal. Também afirmou que seria duvidar da inteligência dos jurados considerar que esse fato tivesse qualquer influência nas suas decisões.

Peçanha Martins acolheu o parecer do MP. Afirmou que o pedido não apresentaria nem periculum in mora nem fumus boni iuris. Para o ministro, promotores ficarem em assento à direita dos juízes decorre da própria legislação e não mostra nenhuma ilegalidade.

Defesa prejudicada

A prerrogativa de o promotor tomar assento à direita do juiz está prevista na Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/93). A norma causa protestos entre os advogados. Para o secretário-geral adjunto do Conselho Federal da OAB, o criminalista Alberto Zacharias Toron, simbolicamente a defesa é colocada em desvantagem.

“A regra prejudica a defesa porque o jurado tende a dar mais credibilidade a quem está ao lado do juiz, que representa a isenção. O ideal seria que defesa e acusação se colocassem à frente do juiz”, afirma Toron. Segundo o advogado, o Conselho Federal da OAB deve estudar medidas para modificar a regra.

Leia a decisão:

MEDIDA CAUTELAR Nº 12.417 – SP (2007/0011037-7)

REQUERENTE: QUINQUAGÉSIMA SÉTIMA SUBSEÇÃO DE GUARULHOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SECCIONAL DE SÃO PAULO

ADVOGADO: EDSON PEREIRA DA SILVA E OUTROS

REQUERIDO: JUIZ DE DIREITO CORREGEDOR PERMANENTE DA VARA DO JÚRI DE GUARULHOS – SP

DECISÃO

Cuida-se de medida cautelar intentada pela 57ª Subseção de Guarulhos da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de São Paulo, com pedido de liminar, objetivando a concessão de efeito suspensivo ativo ao recurso ordinário n. 965.963.3/6-02, este interposto em face de acórdão exarado pela 5.ª Câmara da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que denegara a segurança pleiteada pela ora requerente ao fundamento de que a prerrogativa de o Ministério Público ocupar assento à direita dos magistrados decorre da própria legislação, inexistindo, in casu, ato ilegal ou abusivo a exigir reparação.

A requerente sustenta que a atual disposição física do Plenário do Júri, na qual o membro do Ministério Público assenta-se à direita do juiz que preside o julgamento, ofende a igualdade entre as partes e induz os jurados a pensarem que “(…) magistrado e promotor são uma só pessoa ou órgão, ou se trata da mesma equipe, situação absurda que viola gravemente o sagrado e consagrado princípio constitucional da isonomia ” (fl. 5). Alega estar presente o periculum in mora, na medida em que, quase todos os dias úteis, os advogados precisam participar de julgamentos em desvantagem (fl. 12).

O recurso ordinário, ao qual se busca a concessão de efeito suspensivo ativo, recebeu juízo positivo de admissibilidade no Tribunal de origem (fl. 202).

É firme o entendimento desta Corte Superior no sentido de que a atribuição de efeito suspensivo ativo a recurso ordinário em mandado de segurança, requerida mediante cautelar incidental, exige, além da admissão do apelo pelo Tribunal a quo, a satisfação dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora.

No caso em apreço, contudo, ao menos em um juízo de cognição sumária, entendo estar ausente a fumaça do bom direito necessária à concessão da liminar pleiteada.

Com efeito, a prerrogativa de os membros do Ministério Público tomarem assento à direita dos Juízes de primeira instância ou do Presidente do Tribunal, Câmara ou Turma decorre da própria legislação de regência (art. 41, XI, da Lei n. 8.625/93), a qual leva em conta a importância das funções desempenhadas pela instituição (arts. 127, caput; e 129, da Constituição Federal), inexistindo qualquer ofensa à igualdade entre as partes.

Não bastasse isso, a jurisprudência deste Sodalício firmou entendimento em sentido “CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO. PLEITO DE ALTERAÇÃO DO POSICIONAMENTO DA ACUSAÇÃO E DEFESA NO JULGAMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI. PRINCÍPIO DA IGUALDADE. EQÜIDISTÂNCIA ENTRE O JUIZ E AS PARTES. POSIÇÃO DO PROMOTOR E DO ADVOGADO QUE CONFIGURARIA CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA DE AMEAÇA À LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

O fato de o defensor do réu não estar assentado ao lado do Juiz Presidente por ocasião de julgamento na Sessão Plenária do Tribunal do Júri não configura constrangimento ilegal à liberdade de ir e vir.

A igualdade entre as partes, defesa e acusação, no Tribunal Popular, é verificada pelo mesmo tempo de que dispõem para que, em pé, da mesma forma, diante dos jurados, possam proferir suas alegações, sustentando a tese defensiva ou acusatória.

A posição do patrono ao lado do réu possibilita a melhor comunicação entre eles, facilitando eventuais orientações e obtenção de informações para a promoção da defesa.

O posicionamento do Ministério Público, que se coloca sentado ao lado do Magistrado Presidente do Tribunal do Júri, decorre da Lei 8.625/93, não significando superioridade em relação ao defensor.

Não se configura constrangimento ilegal a ser reparado na via eleita do writ, já que não evidenciada qualquer ameaça ao direito de locomoção do paciente, por abuso de poder ou ilegalidade – o que impende atentar-se aos termos da previsão constitucional que institucionalizou o habeas corpus como meio próprio à preservação do direito de locomoção, quando demonstrada a ofensa ou a ameaça referidas. Recurso desprovido. ” (RHC 13720/SP, Min. Relator: Gilson Dipp, DJ 06.10.2003).

Em face do exposto, indefiro a liminar.

Após o período de férias, conclusos ao Ministro Relator.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 24 de janeiro de 2007.

MINISTRO FRANCISCO PEÇANHA MARTINS

Vice-Presidente, no exercício da Presidência

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