Concorrência televisiva

Cade aprova novas regras para venda de canais da Globosat

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28 de fevereiro de 2007, 0h02

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou, nesta terça-feira (27/2), as propostas da Globosat para tentar solucionar e evitar qualquer impasse no acordo firmado com a Neo TV para quebra de exclusividade na venda de canais. Fechado no ano passado, o Termo de Compromisso de Cessação descreve a regra geral de comportamento entre as empresas, considerando a não discriminação. Ou seja, a Globosat teria de oferecer para as não filiadas os produtos e preços que oferece para as filiadas como a Net.

Para a Neo TV, a Globosat não estava cumprindo o TCC, por isso procurou novamente o Cade. A Neo TV alegava que a Globosat não estava cumprindo o compromisso de oferecer o pacote mini básico, que concedia para suas filiadas, de apenas dois canais.

A Neo TV também argumentava ser praticamente impossível conseguir comprar a programação em condições economicamente competitivas. Ela teria de vender um pacote básico, de cinco canais, para pelo menos 80% dos assinantes para ter o preço oferecido para as filiadas.

De acordo com a proposta da Globosat aprovada pelo Cade, a Neo TV — representante de 54 operadoras independentes de televisão por assinatura — poderá oferecer a partir de agora a 20% de seus assinantes o pacote de canais mini básico da Globosat, que inclui os canais Multishow e Globonews.

Também ficou acordado que a Neo TV terá um ano de carência nos contratos de cinco anos para atingir 80% de adesões do novo pacote. O TCC mencionava o grau de penetração que a Neo TV deveria atingir junto aos seus assinantes, mas não trazia como isso deveria ser feito. Agora ficou definido que o grau de penetração deve ser calculado com a totalidade de canais Globosat sobre a totalidade dos assinantes durante o período de carência. O Cade acertou que as assinaturas não residenciais — lojas, bares, hotéis — devem estar no acordo das mesmas regras de assinaturas residenciais.

De acordo com o conselheiro relator do caso, Paulo Furquim, a proposta comercial da Globosat aprovada atende às preocupações do Cade. Ele lembrou que o TCC pode voltar a ser questionado no futuro, mesmo porque o Cade acompanha constantemente o seu cumprimento.

O caso começou em 2001, quando a Neo TV entrou com um processo administrativo na Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça acusando a Globosat de práticas anticoncorrenciais e discriminatórias. Em janeiro de 2006, a SDE recomendou a condenação da Globosat. No mesmo ano, o Cade fechou o TCC entre as empresas. Caso o Cade venha a concluir no futuro que há quebra de TCC, a Globosat pode voltar a responder processo administrativo.

Leia o despacho do relator

PROCESSO ADMINISTRATIVO nº 08012.003048/2001-31

Representante: Associação Neo TV e outras

Advogados: Fernando de Oliveira Marques, João Sarti Júnior, Vicente Bagnoli e outros

Representadas: Globosat Programadora Ltda e Globo Comunicações e Participações Ltda

Advogados: Simone Lahorgue Nunes, José Américo Pereira dos Santos Buentes, José Carlos Benjó e outros

Relator: Conselheiro Paulo Furquim de Azevedo

DESPACHO Nº 053/2007/GAB/PFA

1. Objeto

Este despacho versa sobre o acompanhamento de cumprimento do Termo de Compromisso de Cessação, estabelecido entre CADE e Globosat no âmbito do Processo Administrativo nº 08012.003048/2001-31.

2. Histórico

Em 12 de setembro de 2006, a Associação NEOTV, por meio de petição protocolizada sob o n.° 08700.002873/2006-75, denunciou o descumprimento do Termo de Compromisso de Cessação (TCC), o qual ensejou a suspensão do Processo Administrativo n.° 08012.003048/2001-31. A referida denúncia se limitou ao descumprimento da cláusula 2.1 do TCC, mais precisamente em relação à proposta apresentada pela Globosat para a negociação de direitos de transmissão dos Canais Globosat em condições não-isonômicas àquelas oferecidas pela Programadora ao Sistema Net. Essa suposta quebra de isonomia refere-se (i) ao empacotamento dos Canais Globosat, e (ii) às regras de formação de preços dos direitos de sua veiculação.

Em 23 de outubro de 2006, a Globosat apresentou sua manifestação, por meio de petição protocolizada sob o n.° 08700.003368/2006-48, no sentido de que o pedido formulado pela NEOTV deve ser rejeitado pela sua absoluta carência de suporte fático e base legal.

Em 04 de outubro de 2006, a CAD-CADE solicitou informações complementares à NEOTV e à Globosat, por meio dos ofícios n.2486/2006/PRES/CAD-CADE e 2485/2006/PRES/CAD-CADE, os quais foram respondidos tempestivamente.

A CAD-CADE, às fls. 3571-3582, emitiu Nota Técnica n.° 94/2006, a qual suscitou preocupações relativas à: (i) oferta do pacote mini-básico (Globonews e Multishow) às operadoras de TV por assinatura que desejarem adquirir os Canais Globosat (Globonews, Multishow, GNT, SportTv e SporTv 2) e (ii) aplicação do grau de penetração sobre a base de assinantes.


Na 386a Sessão Ordinária, realizada em 27 de novembro de 2006, foi referendado pelo Plenário Despacho da Presidência nº 106/2006, que determinou a intimação da Compromissária para sua manifestação acerca da Nota Técnica CAD-CADE nº 94/2006, de acordo com a Resolução CADE nº 40/05. Por sua vez, a Compromissária, em 07 de dezembro de 2006, apresentou manifestação requerendo a não imposição de quaisquer ônus adicionais a ela, tendo em vista “(i) não haver qualquer fundamento fático para a denúncia de descumprimento do TCC por parte da Compromissária e (ii) a inexistência de qualquer fundamento, jurídico ou comercial, para a adoção das sugestões propostas na Nota Técnica CAD-CADE n.° 94/2006”.

Às fls. 3597-3607, consta Despacho n.° 03/2007/PG/CADE, do Procurador-Geral do CADE, o qual aderiu às conclusões constantes na Nota Técnica CAD/CADE n.° 94/2006.

Com base no art. 3°, inciso III, da Lei n.° 9.874/99, a Representada requereu (fl. 3623) que fosse concedida oportunidade para se manifestar sobre o conteúdo do parecer da D. Procuradoria do CADE (ProCADE). À fl. 3629, consta Despacho PRES/CAD-CADE n.° 008/2007, deferindo referido pedido. Às fls. 3682-3704, a compromissária apresentou sua manifestação. Desse modo, fica caracterizado o exercício do contraditório e da ampla defesa.

A CAD-CADE emitiu Nota Técnica n.° 05/2007, às fls. 3624/3626, a qual indicou preocupação acerca da distribuição dos Canais Globosat aos assinantes não-residenciais. Em 11 de fevereiro de 2007, a ProCADE emitiu Despacho n.° 13/2007/PG/CADE, às fls. 3706-3712, adotando as conclusões da Nota Técnica CAD-CADE acima mencionada.

Em 23 de fevereiro de 2007, a compromissária apresentou petição às fls. 3727-3730, protocolizada sob o n.° 08700.000644/2007-05, referente à apresentação de Proposta Comercial para a distribuição dos Canais Globosat e Pay-Per-View de conteúdo esportivo de futebol (fls. 131/141, do apartado confidencial).

3. Da adequação das propostas comerciais ao Termo de Compromisso de Cessação

Acolhe-se neste despacho as observações constantes nas notas técnicas da CAD-CADE n.ºs 94/2006 e 05/2007. Em sua primeira nota técnica, a CAD-CADE concluiu que a obrigação de não-discriminação, constante na cláusula 2.1 do TCC, tem como implicação inequívoca o oferecimento do chamado ‘pacote mini-básico’, o qual contém apenas os canais Globonews e Multishow, nas mesmas condições que são oferecidas às operadoras filiadas ao Sistema NET. Ademais, a nota técnica da CAD-CADE, também com correção, observa que o TCC deliberadamente separou a base de assinantes anterior à contratação junto à Globosat, ‘base antiga de assinantes’, da base de novos assinantes, ‘nova base de assinantes’. Esta separação decorre, conforme detalhadamente exposto no despacho de apresentação do TCC, da existência de um grupo de operadoras – e, subseqüentemente, de seus assinantes – que havia sido objeto de recusa de venda dos canais Globosat até o inicio de vigência do TCC. Foi, portanto, necessário criar condições específicas para tratamento da base antiga de assinantes, conforme detalhado na clausula 2.1B do TCC.

Essa observação da CAD-CADE tem também implicações inequívocas sobre o modo de cálculo do grau de penetração, variável legitimamente admitida como parâmetro para discriminação de preços, conforme estabelecido no TCC, em sua cláusula 2.1.C. Em se tratando de bases de assinantes reconhecidamente distintas, cujos direitos, conforme detalhado na cláusula 2.1B, são também distintos, é correta a conclusão constante na nota técnica da CAD-CADE de ser necessária a definição do grau de penetração em cada base, em separado. A interpretação diversa levaria à assimetria indesejável entre operadoras contratantes que contassem com número distinto de clientes em sua base antiga. Apenas como ilustração, se o grau de penetração fosse tomado para a totalidade dos assinantes, uma operadora já consolidada, não pertencente ao sistema NET, inevitavelmente teria um grau de penetração relativamente baixo, encarecendo a oferta de canais mesmo para os novos assinantes, os quais são obrigados a adquiri-los por conta da necessidade de sua inclusão junto ao pacote básico. Em contraposição, uma nova operadora, sem base de assinantes antiga, pela mesma restrição quanto à comercialização junto a novos assinantes, teria necessariamente grau de penetração de 100%, o que levaria a um preço desproporcionalmente inferior em relação à sua concorrente. Uma definição de grau de penetração que provoque tamanha assimetria, ademais prejudicando a empresa que foi objeto de recusa de venda anterior, obviamente não está de acordo com o TCC. Por este motivo, a nota técnica da CAD-CADE concluiu pela necessidade da definição do grau de penetração em cada base de assinantes.


Em sua segunda nota técnica, a CAD-CADE manifestou-se com relação à comercialização de canais Globosat para clientes não-residenciais, concluindo que sua oferta era também objeto do TCC, em sua cláusula 2.1, que literalmente afirma que a Compromissária “compromete-se a negociar e contratar, de boa-fé, em termos e condições transparentes, objetivos e não-discriminatórios […] a distribuição da programação denominada genericamente no mercado de televisão por assinatura como “Canais Globosat” (SporTv, SporTv 2, GNT, Multishow e Globonews)”.

Em resposta aos conteúdos das duas notas técnicas da CAD-CADE, a Globosat manifestou-se nos autos por meio de três petições, bem como por meio de diversas reuniões, cujos participantes, locais e horários encontram-se discriminados na agenda pública do CADE1.

Embora manifestasse discordância com relação aos pontos centrais levantados pelas notas técnicas da CAD-CADE, a Globosat, em clara disposição de buscar o entendimento com as autoridades de defesa da concorrência, peticionou proposta comercial de venda dos Canais Globosat, com o expresso propósito de contemplar as observações constantes nas notas técnicas da CAD-CADE e aqui sintetizadas. Conforme se extrai do texto da petição de 23 de fevereiro de 2007, às fls. 3727-3730:

“a Compromissária submete, para homologação do e. Plenário do CADE, minuta de Proposta Comercial a ser utilizada nas referidas contratações a serem celebradas com as operadoras de televisão por assinatura não filiadas ao Sistema NET, no pressuposto necessário de que ela sana, de forma clara e inequívoca, as preocupações aventadas pela CAD-CADE” (grifo no original).

Tendo em vista o dinamismo das relações comerciais, particularmente em sua fase de negociação dos termos contratuais, este despacho toma esta minuta de Proposta Comercial, anexa à petição de 23 de fevereiro de 2007 (fls. 131-141 do apartado confidencial), como referência para análise, denominando-a por ‘proposta comercial vigente’. Com a finalidade de verificar a sua adequação com relação ao TCC, a exposição que se segue trata separadamente de cada um dos três pontos levantados pela CAD-CADE.

A proposta comercial vigente permite às operadoras contratantes a comercialização do chamado ‘pacote mini-básico’ aos clientes finais, a exemplo do que ocorre com as operadoras filiadas ao Sistema NET. Como tal, são estabelecidas restrições verticais cujos objetivos são assegurar que o empacotamento junto ao consumidor final preserve a característica do pacote de canais oferecido e, com isso, reduza o grau de substituição entre os pacotes básico e mini-básico da Globosat. Desse modo, as operadoras devem compor o pacote mini-básico com uma quantidade e perfil de canais previamente determinados na proposta comercial vigente, que preservam o posicionamento de mercado desse produto da Globosat. Ademais, a distribuição do pacote mini-básico é limitada a 20% do total de assinantes que tenham aderido aos Canais Globosat. Ambas as restrições verticais são comuns às operadoras filiadas ao Sistema NET e, portanto, atendem ao princípio de não-discriminação.

No que se refere à forma de cálculo do grau de penetração, a sua interpretação literal, conforme proposto pela nota técnica da CAD-CADE, poderia gerar custos indesejáveis de monitoramento, visto que seria necessário identificar com precisão a composição de ambas as bases de assinantes, nova e antiga, em separado, prática esta que não é corrente no mercado de televisão por assinatura. A solução inclusa na proposta comercial vigente, para contemplar as observações da CAD-CADE relativas ao grau de penetração, foi a concessão de um período de carência, entre 20% a 25% da duração do contrato, conforme detalhado na minuta de Proposta Comercial, em que o preço pago pelos canais Globosat corresponde àquele de grau de penetração máximo – isto é, o preço mais baixo – independentemente do grau de penetração efetivamente observado. Como conseqüência, durante o período de carência, mesmo os assinantes vinculados à base antiga terão acesso aos Canais Globosat ao preço equivalente a um grau de penetração máximo, preço este inferior ao que seria esperado se adotado o grau de penetração para cada base de assinantes. Em contrapartida, ao final do período de carência, a proposta comercial passa a utilizar o grau de penetração, tendo por referência a soma das duas bases de assinantes, nova e antiga, como critério de precificação.

Considerando que

a) há um custo de monitoramento evidente em se adotar o grau de penetração em separado para cada base de assinantes, nova e antiga;

b) o período de carência permite a adaptação de potenciais contratantes, de tal modo que aqueles que têm em sua base clientes propensos a contratar os canais Globosat – e que, justamente por isso, eram relativamente mais prejudicados pela recusa de venda – poderão ajustar seu grau de penetração na base antiga, de modo a contratar em condições equivalentes às empresas vinculadas ao sistema NET; e

c) a cláusula 2.1 do TCC tem o término de sua vigência prevista para 31 de dezembro de 2008, período este inferior à duração dos contratos constantes na proposta comercial vigente e que será parcialmente coberto pelo período de carência; considero que a proposta comercial vigente, conforme consta na minuta de Proposta Comercial, anexa à petição da Globosat de 23 de fevereiro de 2007, está, também no que se refere à definição do grau de penetração, adequada ao Termo de Compromisso de Cessação.

Finalmente, a proposta comercial vigente, em sua cláusula 10.2, inclui a distribuição dos Canais Globosat para assinantes não-residenciais, tais como hotéis, flats, entre outros, e comerciais, tais como bares, restaurantes e clubes, em termos não-discriminatórios. Desse modo, também essa observação da CAD-CADE é contemplada na proposta comercial vigente.

Por todo o exposto, conclui-se que a proposta comercial vigente, conforme consta na minuta de Proposta Comercial, anexa à petição da Globosat de 23 de fevereiro de 2007, atende às preocupações manifestadas pela CAD-CADE, estando, portanto, em consonância com o TCC. Esta conclusão não é extensiva a outras propostas comerciais, distintas daquela que foi aqui objeto de análise, sejam elas já apresentadas pela Globosat a potenciais interessados, sejam propostas de desenhos distintos a serem oferecidas futuramente.

Os termos da proposta comercial devem ser disponibilizados pela Compromissária a toda e qualquer pessoa legitimamente interessada na contratação dos Canais Globosat, mediante solicitação. Essas propostas, mesmo que de caráter confidencial, podem ser submetidas ao CADE por aqueles legitimamente interessados, com a finalidade de verificar sua aderência aos termos homologados por meio deste Despacho.

Frise-se que o interesse coletivo não está sendo negligenciado na medida em que eventuais efeitos lesivos à concorrência poderão ser objeto de repressão em sede de processo administrativo, seja em processo futuro a ser instaurado para este fim, seja no presente processo administrativo, qual seja, PA nº 08012.003048/2001-31 – já instaurado em face da Compromissária e atualmente suspenso em razão do cumprimento do TCC –, sem prejuízo da execução judicial de que trata o § 4°, do art. 53, da Lei n.° 8.884/94.

Ao Plenário, para homologação.

Brasília, 27 de fevereiro de 2007.

PAULO FURQUIM DE AZEVEDO

Conselheiro

ELIZABETH M. MERCIER QUERIDO FARINA

Presidente

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