Ligações retroativas

Vivo não pode cobrar ligações feitas há mais de 90 dias em SC

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26 de fevereiro de 2007, 14h35

A Vivo, empresa de telefonia móvel, está impedida de cobrar de todos os seus usuários de Santa Catarina ligações nacionais feitas há mais de 90 dias e ligações internacionais há mais de 150 dias. A determinação é do juiz Domingos Paludo, da Vara da Fazenda Pública de Florianópolis. Cabe recurso.

A operadora deverá, ainda, devolver em dobro os valores cobrados nas faturas. Além disso, informar em juízo o número de usuários lesados pela cobrança indevida no estado e o total dos valores devolvidos.

O pedido do Instituto de Defesa do Cidadão (IBDCI), representado pelo advogado Walber Pydd, do Johnson Sade Advogados Associados, foi amparado na resolução 85/98, da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em seu artigo 61. O artigo prevê que as cobranças para as ligações locais e interurbanas devem ser efetuadas no prazo máximo de 90 dias e as ligações internacionais no prazo de 150 dias.

Assim, a entidade argumentou que o limite previsto na norma também se aplica à telefonia móvel, em relação às chamadas originadas ou recebidas em “roaming” (serviço que permite o uso do celular fora da áreas da respectiva operadora). O argumento foi aceito e a operadora obrigada a ressarcir os usuários.

Leia a determinação:

AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICA TELEFONIA CELULAR ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, PARA VEDAR A COBRANÇA, NAS CONTAS TELEFÔNICAS, DE LIGAÇÕES NACIONAIS EFETUADAS HÁ MAIS DE NOVENTA DIAS E DAS LIGAÇÕES INTERNACIONAIS, REALIZADAS HÁ MAIS DE CENTRO E CINQÜENTA DIAS APURAÇÃO UNILATERAL DOS DÉBITOS PELA PERMISSIONÁRIA RETARDAMENTO QUE DIFICULTA O CONTROLE PELO USUÁRIO ADICIONAIS EXIGIDOS, TAMBÉM, PELAS LIGAÇÕES RECEBIDAS FORA DA ÁREA DE REGISTRO, DIFICULTANDO SOBREMANEIRA A VERIFICAÇÃO AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO, APENAS PARA RESTRINGIR O ALCANCE DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL AOS USUÁRIOS HABILITADOS NO ESTADO DO PARANÁ.

A limitação temporal da cobrança de ligações telefônicas a 90 ou 150 dias (nacionais ou internacionais), aplica-se também à telefonia móvel celular, em relação às chamadas originadas ou recebidas em “roaming” (serviço que permite o uso do celular fora da áreas da respectiva operadora). (TAPR, Agravo de Instrumento nº 234680-7, Rel. Miguel Kfouri Neto, 17. nov. 2003).

Faz-se mister destacar o teor do voto do relator no referido agravo:

Raros são aqueles que mantêm registro cuidadoso desses telefonemas, ainda mais porque também incide cobrança sobre as ligações recebidas fora da área de registro do usuário (no caso da GLOBAL, dentro ou fora do Paraná e Santa Catarina). Dificilmente se saberá, com certeza, tanto tempo depois, se aquela ligação tardiamente cobrada corresponde à realidade.

Nada impede então, que o usuário pague por chamadas realizadas há mais de 90 dias, no caso das interurbanas, ou 150 dias, no caso das internacionais, desde que delibere fazê-lo por livre e espontânea vontade, não podendo ser compelido a isso. O próprio Ofício Circular nº 319/2000 da Anatel, prevê tal possibilidade quando dispõe que “as cobranças de serviços prestados após os prazos estabelecidos no item anterior devem ser objeto de negociação entre a prestadora e o assinante”.

Assim, verificado que tal cobrança retroativa vai de encontro às disposições aplicáveis a prestação serviço de telefonia móvel, resta configurada a cobrança indevida. Faz-se, então, necessário clamar pela devolução em dobro dos valores cobrados, na forma do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.

Quanto à pretensão do Instituto autor para que a empresa demandada promova contra-propaganda, nos moldes do art. 60 do Código de Defesa do Consumidor, a nosso sentir, não merece prosperar.

Não existem nos autos indícios de verossimilhança dando conta que a ré teria veiculado publicidade relativa ao prazo de faturamento das chamadas. Assim, não caberia aqui a inversão do ônus probandi, ficando afastada, portanto, a pertinência do pedido de veiculação de contra-propaganda.

Necessário, sim, a nosso sentir, divulgação da sentença, para dar conhecimento aos eventuais interessados de seu teor. Com efeito, apesar do veto ao art. 96 do CDC, que contemplava a obrigação de publicação de edital de eventual sentença condenatória, não há como se dar efetividade aos interesses e direitos dos consumidores se tal diligência não for praticada.

Sobre o tema se manifesta a mais abalizada doutrina:

Mas o que o art. 96 colocava obrigatoriamente, de maneira didática, ainda se sustenta, pela interpretação sistemática dos demais dispositivos do Código. O art. 100 fixa prazo de um ano, após o que, se não houver habilitações em número compatível com a gravidade do dano, proceder-se-á à liquidação e execução da sentença condenatória, para o recolhimento ao fundo da fluid recovery…Ora, é evidente que o juiz deverá proceder à intimação da sentença e esta, no caso em tela, só poderá dar-se por meio de editais, devendo ao juiz socorrer-se, por analogia, do disposto no art. 94.

Além do mais, cabe ao juiz dar efetiva aplicação ao princípio da publicidade dos atos processuais (art. 5º, inc. LX e art. 94, IX, da CF), utilizando as técnicas que mais se coadunam com as ações coletivas. E, se assim não fizer, caberá ao autor coletivo zelar pela observância do princípio da ampla publicidade da sentença, providenciando inclusive a divulgação da notícia da condenação pelos meios de comunicação de massa, nos termos do art. 94, sob pena de a condenação tornar-se inócua. (Ob. cit., pág. 689).

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, assim se posicionou:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA E COLETIVA. PROIBIÇÃO DE ESTABELECIMENTO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS CAUSADOS. PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA E EXTENSÃO AOS CONSUMIDORES NÃO IDENTIFICADOS NA AÇÃO.

A divulgação da sentença de procedência da ação civil pública e coletiva, por meio de edital, se faz imprescindível para conhecimento das vítimas em geral, a fim de que, em liquidação, provada a lesão, possam habilitar-se no processo a fim de receber o valor da indenização devida. (Apelação Cível nº 599.262.870, relator Des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick; data do julgamento: 05/08/99).

Apesar do requerimento de prosseguimento do feito, entendemos que o caso é de julgamento antecipado da lide, porquanto desnecessária a produção de outras provas.

Com efeito, os documentos já juntados, inclusive pela demandada não deixam qualquer dúvida quanto ao teor da resolução nº 85/98 e do Ofício Circular nº 319/2000, ambos da Anatel. A contestação, da mesma forma, admite a cobrança retroativa das ligações em tela. Assim, a questão, a nosso sentir, limita-se à matéria de direito.

Diante do exposto, é o Ministério Público pelo afastamento das preliminares suscitadas e pela procedência parcial do pedido, para condenar a demandada a:

1 devolver em dobro, a todos os clientes de todos os planos de serviços da empresa, todos os valores cobrados nas faturas telefônicas referentes às ligações interurbanas realizadas há mais de 90 (noventa) dias e ligações internacionais realizadas há mais de 150 (cento e cinqüenta) dias num prazo a ser fixado por Vossa Excelência, sob pena de incidência de multa;

2 a suspensão de toda e qualquer cobrança retroativa referente à ligações interurbanas realizadas há mais de 90 (noventa) dias e ligações internacionais realizadas há mais de 150 (cento e cinqüenta) dias sob pena de incidência de multa;

3 – Informar ao juízo o número de usuários lesados pela cobrança retroativa em Santa Catarina e o total dos valores devolvidos.

4 Divulgar a sentença para conhecimento de eventuais interessados.

Estando de par com tais colocações, inclusive quanto aos temas de preliminar, às quais não vejo necessidade de aditar, de modo que ficam servindo de razões de decidir, por economia de tempo, observo que o caso pede se acolha o pedido formulado na inicial, com as ponderações e esclarecimentos do Ministério Público, inclusive quanto à materialização final da condenação.

JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial da presente ação civil pública, nos termos do parecer que acolho como parte integrante desta.

Custas e honorários, estes de 10% sobre o valor da causa, pelo réu.

Publicar o edital a que se refere o art. 94 do CDC.

P. R. I.

Florianópolis (SC), 05 de fevereiro de 2007.

Domingos Paludo

Juiz de Direito

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