Drible na Constituição

Governo não pode brincar de revogar e reeditar MP, diz STF

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12 de dezembro de 2007, 17h53

Quando o governo revoga uma Medida Provisória para desobstruir a pauta de votação nas casas do Congresso, não pode ele reeditar outra MP idêntica no mesmo ano. A decisão é do Supremo Tribunal Federal em Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelos partidos de oposição contra a MP 394, que substituiu a MP 379, dois dias após sua revogação.

Em setembro deste ano, para destrancar a pauta da Câmara para a votação da CPMF, o governo revogou a MP 379, que prorrogava o prazo para registro de armas até dezembro deste ano. Com a retirada da medida, o texto original do Estatuto do Desarmamento, que fixava o prazo até junho, voltou a vigorar.

Dois dias depois, outra MP, a de número 394, foi editada com algumas diferenças. O prazo era estendido, por exemplo, até julho de 2008. Em outras duas MPs, o mesmo estratagema foi usado.

A atitude do governo causou celeuma na oposição e entre algumas entidades. A Federação Nacional dos Policiais Federais chegou a publicar nota reclamando por outra MP sobre o registro de armas. O PSDB, PPS e DEM ajuizaram três ADIs contra a reedição das três MPs.

Para os partidos, houve afronta ao artigo 62, parágrafo 10 da Constituição Federal, que diz ser vedada a reedição, na mesma legislativa, de MP que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido eficácia por extrapolar o prazo.

O advogado-geral da União, José Antônio Toffoli, disse que a MP teve o objetivo de prorrogar o prazo para registro de armas e reduzir as taxas cobradas

No julgamento desta quarta-feira (12/12), o ministro Carlos Ayres Britto concordou com a tese da oposição. Para o ministro, as duas MPs são flagrantemente idênticas.

Ao revogar a MP, o governo enquadra o assunto na norma que impede a reedição de medidas na mesma sessão legislativa. Segundo Ayres Britto, a retirada significa uma antecipação do governo da rejeição pelo Congresso. Deste modo, a MP 394 deve ser suspensa liminarmente. O relator observou que a Constituição prevê outro meio para encaminhar assuntos urgentes: o projeto em regime de urgência. O ministro foi acompanhado pela maioria.

Para o ministro Marco Aurélio, a atitude do governo foi um “drible na Constituição”. O artifício foi também qualificado como fraude pelo ministro Cezar Peluso.

O ministro Gilmar Mendes defendeu a necessidade de uma saída para o parágrafo 10 do artigo 62, afirmando que ele constitui “uma roleta russa com todas as balas do revólver”. Ao pretender acelerar a votação das MPs, determinando o trancamento da pauta, acaba atrasando a votação também de outras matérias de interesse do governo.

Foram vencidos, os ministros Eros Grau e Ricardo Lewandowski. Para Eros, ao aceitar a ADI, a corte está ampliando a interpretação da lei que impede a reedição de MPs. No seu entendimento não houve rejeição do Congresso e nem perda de eficácia, únicos impedimentos para a reedição de MP previstos na Constituição. A ADI terá que ser examinada no mérito.

ADI 3.964

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