Limites da crítica

Milton Neves deve perder ação que move contra José Trajano

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17 de agosto de 2007, 0h00

O apresentador Milton Neves, hoje da TV Record, vai perder a ação que move contra o jornalista José Trajano, diretor da ESPN Brasil. A derrota deverá ser confirmada na próxima quinta-feira (23/8) pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Milton Neves ganhou o direito de receber R$ 100 mil de indenização, por danos morais. A condenação, de dezembro do ano passado, foi imposta pelo juiz Vitor Frederico Kümpel, da 27ª Vara Cível da Capital. Por dois votos, a turma julgadora está inclinada a julgar a ação improcedente.

Nesta quinta-feira (16/8), Milton Neves compareceu pessoalmente à 3ª Câmara de Direito Privado para acompanhar o julgamento do recurso de Trajano. Saiu com o sabor da derrota depois de ver sua ação ser rejeitada por dois votos. A disputa só não foi concluída porque o terceiro juiz, Francisco Loureiro, pediu vistas do processo para apresentar sua posição na próxima sessão da turma julgadora.

Milton Neves acusa Trajano de ofender e macular sua honra e de ter extrapolado sua função de informar ao fazer comentários “infames” contra ele. De acordo com ação, Trajano teria usado expressões contra Milton Neves num libelo injurioso e difamatório. A defesa do atual apresentador da Record lembrou que o réu foi condenado pelos crimes de injúria e difamação, no mesmo caso.

A briga entre os dois jornalistas aconteceu em junho de 2001, quando Milton Neves estava no estúdio da rádio Jovem Pan de São Paulo. Ele apresentava o programa Plantão de Domingo. Na época, recebeu em seu celular uma ligação telefônica do presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira.

No telefonema, Ricardo Teixeira informou que estava fazendo uma votação informal entre especialistas para saber quem deveria substituir Leão como técnico da seleção brasileira para a Copa do Mundo de 2002. Escolheu sete pessoas supostamente conhecedoras de futebol e ligou para saber o nome que escolheriam, se estivessem em seu lugar.

Depois de seis consultas, o placar estava empatado: três votos para Luiz Felipe Scolari e três para Vanderlei Luxemburgo. O voto de minerva coube a Milton Neves, que escolheu Scolari. Ricardo Teixeira foi fiel ao resultado e convocou o vencedor.

Aí começou a confusão. Em abril de 2002, já com Felipão à frente da seleção e quando a imprensa esportiva discutia a convocação ou não do jogador Romário, Milton Neves revelou em seu programa de rádio na Joven Pan a história da eleição e o voto de desempate. Trajano ficou indignado e criticou a forma de escolha em seu programa na TV: “Na hora que um Milton Neves vira o voto de minerva para ser o cara que vai decidir quem será o técnico da seleção brasileira, nós estamos perdidos minha gente”, alfinetou.

E disse mais: “Ele passa a ter, pelo meu conceito, o rabo preso com esse presidente da CBF, economicamente, porque eu não sei se levou alguma vantagem com esse negócio da Ambev, um dos patrocinadores da CBF, escamoteando uma informação”. À época Milton Neves fazia publicidade da cervejaria Schincariol, concorrente da Ambev, patrocinadora da CBF.

O juiz Vitor Frederico Kümpel entendeu que Trajano fez uma acusação perigosa de irregularidade econômica e passou ao ouvinte do programa a sensação de desonestidade. Segundo ele, o jornalista extrapolou a sua função de informar e causou dano à honra de Milton Neves.

O recurso

O relator do recurso no Tribunal de Justiça, desembargador Maia da Cunha, entendeu de forma diferente do juiz de primeira instância. Para ele, Trajano usou de palavras duras, mas usou seu direito de crítica contra o jornalista da Jovem Pan. Na opinião de Maia da Cunha, a expressão “de rabo preso”, usada por Trajano não foi nenhum ataque pessoal ou teve a intenção de ofender Milton Neves.

De acordo com o relator, Milton Neves não deveria esconder da sociedade brasileira um fato tão importante como a escolha do técnico da seleção brasileira. Ao fazê-lo, segundo Maia da Cunha, feriu o Código de Ética da profissão que determina que o jornalista deve divulgar o fato que é de interesse público e complementa que o profissional não pode se valer do momento para divulgar o caso por interesse unicamente pessoal.

O revisor, desembargador Teixeira Leite, acompanhou o argumento de Maia da Cunha. Teixeira Leite reconheceu que Trajano foi deselegante nas afirmações feitas contra o colega de profissão, mas não ultrapassou o direito de crítica e que, portanto, não estaria sujeito ao pagamento de indenização por dano moral.

A defesa de Milton Neves sustentou que seu cliente sempre se pautou pelo culto da verdade e agindo com absoluta isenção em seus comentários e opiniões sobre fatos e personagens do futebol. O advogado de José Trajano argumentou que o jornalista usou expressões contra seu colega de profissão num contexto de crítica jornalística. Alegou que o cerne da manifestação de Trajano diz respeito à isenção e imparcialidade do jornalista e de que a atividade comercial é incompatível com a profissão.

O terceiro juiz, Francisco Loureiro, pediu vista para analisar o recurso. O voto de Francisco Loureiro não deverá modificar o resultado a favor de Trajano, invertendo o julgamento de primeira instância, mas pode abrir a possibilidade de novo recurso no mesmo Tribunal, no caso do terceiro juiz votar a favor da ação de Milton Neves.

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