Supressão de denúncia

Advogados do Rio são denunciados por fraudar processo

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14 de agosto de 2007, 11h11

Ao fazer um pedido de Habeas Corpus no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, um grupo de advogados do Rio de Janeiro suprimiu da denúncia, anexada ao processo, a parte que incriminava seu cliente. A denúncia por fraude processual foi feita à Justiça Federal no Rio de Janeiro pelos procuradores da República Marcelo Freire e Orlando Cunha. Nela são citados os advogados R.C., C.H.L.R., T.M.A.N. e o estagiário L.G.P.L.A.F.

Os três advogados e o estagiário — pertencentes ao mesmo escritório — tinham procuração para defender um escrivão da Polícia Federal aposentado, um dos 15 réus denunciados na chamada Operação Hurricane III (Furacão, em inglês), protocolada na 6ª Vara Federal Criminal do Rio no dia 25 de junho. O escrivão, mesmo antes da denúncia recebida — por ser funcionário público teve direito à defesa preliminar como prevista no artigo 514 do CPP — foi um dos 13 acusados que teve prisão preventiva decretada “para garantia da ordem pública, com fulcro no artigo 312 do CPP”, pela juíza Ana Paula Viera de Carvalho.

Seus advogados decidiram então recorrer ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio e Espírito Santo) com pedido de Habeas Corpus. Alegaram, entre outros argumentos, “ser a acusação desprovida de elementos mínimos que autorizassem a persecução penal em desfavor do então paciente, por não descrever a sua participação na empreitada delituosa”, como descreveram depois os dois procuradores. Ao pedido, juntaram cópia da denúncia provando o que historiavam no HC.

O caso foi distribuído ao desembargador federal Abel Gomes, da 1ª Turma Especializada. Apesar de na 6ªVara Federal a juíza ter o hábito de dar divulgação aos processos, mantendo em segredo, através de autos apartados, as quebras de sigilo, no TRF o caso está sendo mantido em segredo de Justiça. Conforme relatam os procuradores, “amparado na documentação levada aos autos pelos denunciados, acolhido os argumentos formulados, concedendo a ordem para determinar a liberdade de Sebastião Miranda Monteiro”.

No dia seguinte, porém, ao receber o pedido de Habeas Corpus em nome de outro réu no mesmo processo — J.L.C.R. — o desembargador “constatou que a denúncia acostada naqueles autos era diversa” daquela apresentada pelos patronos de Monteiro.

Conforme o próprio desembargador salientou na decisão que revogou a liminar concedida, os advogados “deixaram deliberadamente de acostar à inicial do referido writ inúmeros trechos da denúncia – fls. 47 a 53 – oferecida em face de Sebastião e dos demais investigados na Operação Hurricane”.

O trecho suprimido, como descrevem os procuradores na denúncia que apresentaram contra os três advogados e o estagiário, “continha descrições pormenorizadas da conduta típica praticada pelo paciente e sua supressão tinha por intuito evidente induzir o Julgador a erro, servindo de suporte para a tese adotada no habeas corpus, que jamais se sustentaria ante o verdadeiro teor da peça acusatória apresentada por esta procuradoria ao Juízo da 6ª Vara Federal Criminal”.

Os procuradores reproduziram o comentário do desembargador nos autos: “Seja como for, é evidente a má-fé processual com que se pugnou nos presentes autos, haja vista que os impetrantes suprimiram a parte das cópias da denúncia onde estão descritos os fatos praticados pelo paciente, ao mesmo tempo em que toda a argumentação deduzida às fls. 02 e 03 da inicial é exatamente em decorrência da tese de que a denúncia não faz qualquer referência expressa a Sebastião Miranda Monteiro senão nos únicos trechos cuja cópia suprimida traz a estes autos. (…) É grave a forma como se postula o direito de liberdade, enganando o juiz.”

O advogado R.C. afirmou à revista Consultor Jurídico que tudo não passou de um descuido. "Faltaram de cinco a seis folhas na cópia da denúncia que anexamos ao pedido de Habeas Corpus, páginas que falavam alguma coisa do nosso cliente. Foi um acidente, um descuido. No dia seguinte em que o desembargador cassou a liminar concedida, ele esteve com Gomes “dando explicações”. Mas, àquela altura, o desembargador já havia remetido cópia do caso para o Ministério Público Federal tomar as providências devidas.

Os procuradores, entretanto, não concordaram com a tese do acidente. Conforme narram na denúncia enviada à Justiça para livre distribuição, “resta clara, portanto, a consciente atuação dos denunciados. Afinal, as ilações contidas no Habeas Corpus impetrado jamais poderiam encontrar amparo se respaldadas na peça acusatória original, não sendo admissível atribuir a supressão do referido trecho a mero descuido ou esquecimento dos acusados”.

Encaminhada na quinta-feira, dia 9, até a segunda-feira 13, a distribuição da denúncia não aparecia no sistema informatizado da Justiça Federal do Rio. Os advogados deixaram a defesa de Sebastião Monteiro na ação penal. Foram substituídos por T.M.L.S. e M.C.M.S.

O presidente da seccional fluminense da OAB, Wadih Damous, tomou conhecimento da denúncia contra os advogados pela reportagem da ConJur. Disse que não pode se pronunciar sobre o caso antes de ser formalmente comunicado dos fatos. Damous conhece o escritório dos advogados e informou que os advogados devem encaminhar o caso à Comissão de Prerrogativas.

*Texto alterado às 15h16 do dia 29 de setembro de 2016 para supressão de nomes e às 19h23 do dia 26 de dezembro de 2016 para inclusão de link na notícia.

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