Poder de decisão

Juizado Especial pode executar dívida de qualquer valor

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9 de agosto de 2007, 13h53

Os Juizados Especiais têm poder para mandar executar dívidas e determinar a penhora online de contas, independentemente do valor executado. O entendimento foi firmado na sessão desta quarta-feira (8/8), do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Os desembargadores rejeitaram reclamação apresentada pela Telesp — atual Telefônica.

A empresa pretendia que o Tribunal suspendesse ato do juiz Fábio Henrique Falcone Garcia, presidente do Colégio Recursal de Itu (interior paulista), que mandou executar dívida de R$ 318,5 mil em favor do consumidor Luiz Portronieri.

O cliente queria instalar uma linha telefônica em seu imóvel. A companhia alegou que o local estava fora da área de tarifa básica. A Telefônica relutou, negou-se a fazer acordo e foi condenada a instalar o telefone, na cidade de Porto Feliz, no prazo de 15 dias. No caso de descumprimento, o juiz estabeleceu pena de multa diária fixada em um salário mínimo. A empresa não cumpriu a decisão judicial e o valor da multa chegou em R$ 318,5 mil.

Por conta do descumprimento da ordem, o juiz determinou a penhora online das contas da Telesp. A penhora recaiu sobre várias contas da empresa e atingiu um total de R$ 2,5 milhões. Em suas explicações ao Tribunal de Justiça, o juiz Fábio Henrique Falcone Garcia afirmou que a estratégia adotada pela defesa da empresa foi a de ingressar com sucessivos recursos e arrastou o caso por 910 dias. Segundo ele, o processo se alongou por tanto tempo que o interessado, Luiz Poltronieri, morreu antes da conclusão do feito.

Recurso

Com o argumento de que foi vítima de arbitrariedade, a empresa entrou na Justiça de Itu com pedido de Mandado de Segurança. A ordem foi negada. A Telefônica, então, apresentou reclamação, com pedido de liminar, contra o ato do juiz, no Tribunal de Justiça de São Paulo. Com base no Regimento Interno, o TJ concedeu a cautelar para suspender, provisoriamente, a decisão do juiz de Itu, até o julgamento do mérito.

A empresa sustentou, em primeiro lugar, a tese de que o Juizado Especial — no caso o presidente do Colégio Recursal — exorbitou de suas atribuições e invadiu competência da Justiça Comum ao mandar executar dívida em valor superior àquele previsto na Lei 9.099/95. A regra limita em 40 salários mínimos o valor das causas que devem tramitar nos Juizados Especiais.

A Telefônica argumentou ainda que, como a Lei 9.099 não diz a quem cabe o controle jurisdicional das decisões dos Juizados Especiais, seria competência do Órgão Especial do TJ paulista fixar os limites legais de sua atuação. Para a empresa, a lacuna legislativa deveria ser preenchida pelo TJ, porque algumas decisões não poderiam ficar desprovidas de controle dos tribunais superiores, sob o risco de criar situações monstruosas.

“Admitir o contrário conduziria diretamente a uma situação teratológica, ao se permitir que a empresa reclamante arque com uma penalidade pecuniária no montante equivalente a R$ 318.500,00, a qual fora arbitrada em manifesta dissonância com as normas mandamentais vigentes no ordenamento e mantida pelo presidente do Colégio Recursal de Itu”, sustentou a defesa.

Decisão

O Órgão Especial entendeu que compete ao Juizado Especial processar a execução de sentença e que esta não admite prorrogação ou alteração pela vontade das partes. Para o Tribunal, não há correção a ser feita na postura adotada pelo presidente do Juizado Especial de Itu. O colegiado do TJ acrescentou que a Telefônica utilizou de todos os recursos para contestar a decisão e que o bloqueio de suas contas decorreu de sua inércia ou renitência em assegurar o cumprimento da sentença.

“Nada existiu nesse episódio que autorize a conclusão de que o Juizado Especial exorbitou de suas funções”, concluiu o relator, desembargador Renato Nalini. “Ao contrário, evidencia-se a renitência da parte vencida em também ajustar-se ao espírito dos Juizados Especiais e a aceitar a validade dos princípios inspiradores desse pioneirismo que veio para ficar”, completou Nalini.

De acordo com o relator, enquanto as partes — acostumadas ao anacronismo e ao formalismo da Justiça medieval — não se conformarem de que agora devem se orientar por novos critérios processuais, a Justiça especializada continuará a ser um sistema experimental na Justiça brasileira. “Os Juizados Especiais constituem uma realidade cujos princípios básicos deveriam contaminar toda a velha Justiça — oralidade, singeleza, informalidade, preferência pela conciliação — e não poderia ocorrer o inverso”, argumentou Nalini.

O voto do relator aponta que o Tribunal deve prestigiar os Juizado Especial de Itu. Segundo o julgamento, o juiz do caso se manteve atento às decisões tomadas por outros colegiados recursais. Para o relator, o juiz observou as súmulas 2 e 4 do Primeiro Colégio Recursal da Capital e esta orientação deve servir de parâmetros para todos os Juizados Especiais do estado.

Em sua conclusão, Nalini sustentou que nada houve de teratológico (monstruoso) nas decisões impugnadas pelo magistrado de Itu, julgou improcedente a reclamação da Telesp e cassou a liminar que suspendeu, temporariamente, a execução.

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