Agora é lei

Lei permite recurso em liberdade a condenado por crime hediondo

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9 de abril de 2007, 17h04

O dispositivo da Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90) que dá ao réu o direito de aguardar o julgamento em liberdade “enaltece, revigora e fortalece o papel do juiz”. A opinião é do advogado criminalista e secretário-geral do Conselho Federal da OAB, Alberto Zacharias Toron.

A nova regra, publicada no dia 29 de março no Diário Oficial da União (leia abaixo), foi uma das propostas votadas às pressas durante o clamor popular provocado pela morte do garoto João Hélio Veites, no Rio de Janeiro. Só que, enquanto se esperava uma lei muito mais rigorosa, o novo dispositivo, segundo especialistas, é bem dosado e merece ser comemorado. Além de estabelecer novos critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos, permite a liberdade provisória para os acusados.

“A estipulação do tempo mínimo para a conversão de regime de cumprimento da pena no caso dos crimes hediondos ameniza o que estava no texto original, sem, entretanto, igualar o tratamento aos demais crimes, considerados menos graves. Na verdade, o texto da lei vem corroborar o que os tribunais superiores já vinham entendendo — a inconstitucionalidade do regime de cumprimento da pena integralmente fechado”, afirma o advogado criminalista Jair Jaloreto Junior.

Para Jaloreto Júnior, “a nova lei é uma saída honrosa do legislador, que admitiu a inconstitucionalidade do texto original sem perder de vista a necessidade de tratamento diferenciado aos crimes assim considerados hediondos”.

O criminalista Luis Guilherme Vieira ressalta que o que o legislador fez foi manter o que os tribunais já tinham decidido. “A nova lei não é nada além do que a jurisprudência já consagrou.”

Para Alberto Zacharias Toron, a lei propicia que a prisão deixe de ser automática, fazendo com que o juiz tenha que examinar e fundamentar, caso a caso, se o acusado tem ou não direito de ficar em liberdade. “A lei dá mais força à decisão do juiz. Não é o legislador quem vai dizer se todo mundo tem ou não que ficar preso, mas sim o juiz, ao examinar cada caso concreto.”

O Conselho Federal da OAB tem posição clara sobre a matéria desde a data em que o governo enviou o projeto para apreciação pelo Congresso Nacional. A OAB apóia tanto o aumento do prazo em que o condenado deva permanecer preso em regime fechado em caso de crime hediondo, quanto a possibilidade de o juiz decidir se o juiz deve conceder ou não a liberdade provisória.

“Isso porque a lei de crimes hediondos vetou completamente a possibilidade de o juiz permitir liberdade provisória e agora, com a nova lei, restitui-se ao juiz a possibilidade de avaliar a possibilidade de o sujeito ficar ou não em liberdade”, explica Toron.

A decisão, ainda segundo o secretário-geral da OAB Nacional, se harmoniza não só com a Constituição Federal, que presume a inocência do cidadão, mas também com o Pacto de San José da Costa Rica (do qual o Brasil é signatário), representando um avanço. Para Toron, só deve ficar preso quem realmente precisa estar e ninguém melhor que o juiz para avaliar, concretamente, quando a prisão se faz necessária.

Voz contrária

O desembargador aposentado Sebastião Luis Amorim, presidente da Associação Paulista de Magistrados, considera positiva a regra que aumentou o período para que o condenado possa pedir a progressão de 1/5 para 2/5 para réus primários e para 3/5 para reincidentes, mas acredita que o legislador não foi correto ao estabelecer a liberdade provisória.

“A nova lei vai prejudicar o trabalho do juiz, que terá de examinar caso a caso. Tem juiz mais tranqüilo e outros exacerbados. Ou seja, o mesmo réu pode ser tratado de maneiras diferentes, por causa dos princípios do magistrado. E isso me parece uma falha. Seria mais fácil que a lei estabelecesse condições”, afirma o presidente da Apamagis.

No Supremo

Em fevereiro de 2006, o Supremo Tribunal Federal, por seis votos a cinco, declarou que condenados por crimes hediondos têm direito à progressão de regime. Os ministros consideraram inconstitucional o parágrafo 1º, do artigo 2º, da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos).

O entendimento foi firmado em julgamento de pedido de Habeas Corpus em favor de Oseas de Campos, condenado por atentado violento ao pudor. O relator do processo foi o ministro Marco Aurélio.

O dispositivo derrubado pelos ministros previa regime integralmente fechado de cumprimento da pena para condenados por homicídio, latrocínio, extorsão qualificada pela morte, extorsão mediante seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Ou seja, vedava a possibilidade de os juízes analisarem pedidos de progressão nesses casos.

Depois da decisão do STF, agora a permissão de progressão virou lei.

Conheça o novo dispositivo

LEI Nº 11.464, DE 28 DE MARÇO DE 2007.

Dá nova redação ao artigo 2º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º O art. 2º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2º ………………………………..

II – fiança.

§ 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado.

§ 2º A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente.

§ 3º Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.

§ 4º A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.” (NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 29 de março de 2007;

186º da Independência e 119º da República

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Tarso Genro

Este texto não substitui o publicado no DOU de 29.3.2007 — edição extra.

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