Tortura na Febem

Justiça condena 14 acusados de tortura na Febem, em SP

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4 de outubro de 2006, 15h47

Quatorze funcionários e ex-funcionários da Febem foram condenados, juntos, a mais de 925 anos de prisão pelo crime de tortura. A decisão é do juiz Marcos Alexandre Coelho Zili, de São Paulo, e foi tomada no dia 13 de setembro. Cabe recurso.

De acordo com a denúncia, o espancamento de 35 internos aconteceu em novembro de 2000, no Complexo Raposo Tavares da Febem, no interior de São Paulo, e teria contado com a participação de agentes da unidade de Franco da Rocha.

Francisco Gomes Cavalcante, então assessor da presidência da Febem, e Antônio Manoel de Oliveira, ex-diretor do Complexo de Franco da Rocha, foram condenados a 87 anos, um mês e cinco dias de reclusão em regime inicial fechado. Dez monitores foram condenados, também por tortura, a 74 anos e oito meses de prisão cada um.

Já Margarida Maria Rodrigues Tirollo e Flávio Aparecido dos Santos, na época diretores do Complexo Raposo Tavares da Febem, foram condenados a dois anos, dois meses e 20 dias de detenção por omissão, mas tiveram suas penas privativas de liberdade substituídas por prestação de serviços à comunidade. Todos os réus poderão recorrer em liberdade.

Leia a sentença

Processo n. 050.01.072636-5 (referência 1415/01)

O homem é o único animal que provoca sofrimento aos outros com o objetivo exclusivo de provocá-lo

(Schopenhauer)

Vistos.

O Ministério Público ingressou com a presente ação penal condenatória em face de Francisco Gomes Cavalcante, Antonio Manoel de Oliveira, Francisco Antonio Teodoro, Airton Veríssimo da Costa, Nevair Vital Pimenta, Uderson Ferraz de Jesus, Antonio Fernando da Silva, Marcos Fernando Moreno, Sérgio Ricardo Colombaro, Adilson Tadeu de Freitas, Paulo César Porfírio Vicente, Rubens Alves da Silva, Almir José Caetano Faro, Eduardo de Souza Filho, Ubaldo Pereira de Barros, Marco Aurélio Garcia Montovan, José Luiz Pinto e João Batista Gomes Pereira, todos devidamente qualificados, imputando-lhes a prática do delito tipificado pelo artigo 1o, inciso II e parágrafo quarto, incisos I e II da Lei n. 9.455/97, combinado com o artigo 29 do Código Penal, em razão de terem submetido os adolescentes Rodrigo da Silva Almeida, Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista Fernandes, Cleiton Aparecido Oliveira Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira do Nascimento, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos Feitosa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Erandes Geciunas, Emerton do Prado Floriano, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins, Samuel Belo Caetano e outros, que se encontravam sob sua guarda e autoridade, com emprego de violência e grave ameaça a intenso sofrimento físico e mental, como forma de aplicar castigo pessoal e medida de caráter preventivo, fatos estes ocorridos entre os dias 14 e 22 de novembro de 2000, nas dependências da Unidade Educacional 27, Complexo Raposo Tavares da Febem, situada na Rodovia Raposo Tavares, Km 195.

Outrossim, o Ministério Público ajuizou a presente ação penal contra Flávio Aparecido dos Santos e Margarida Maria Rodrigues Tirollo, ambos devidamente qualificados, imputando-lhes a prática do crime previsto pelo artigo 1o, parágrafo segundo da Lei n. 9.455/97, por terem, no mesmo período e local, se omitido em face das condutas praticadas pelos demais denunciados quando tinham o dever de evitá-las ou apurá-las.

De acordo com o narrado na denúncia, as vítimas, com perfil técnico, “primário grave”, encontravam-se cumprindo medida sócio-educativa de internação na Unidade Educacional 27 da Febem por força de decisões judiciais. Em virtude de sucessivas fugas, duas das quais no dia 14 de novembro de 2000, os réus, Francisco Gomes Cavalcante, Antonio Manoel de Oliveira, Margarida Maria Rodrigues Tirollo e Flávio Aparecido dos Santos, sob pretexto de restabelecer a disciplina, deliberaram, após uma reunião, a realização de uma revista a cargo de funcionários do Complexo Franco da Rocha da Febem. Após terem sido acionados, tais funcionários se aglomeraram nas proximidades da UE-27 por volta das 23:00 horas, fato que acabou despertando a atenção dos internos. Temerosos de que algum tipo de violência poderia ser empregada, os adolescentes se mobilizaram e se encaminharam até o pátio da unidade onde foram negociados os termos e as condições da revista.


Ainda conforme narrado na denúncia, os internos foram divididos em dois grupos, de modo que um representante de cada cela foi escalado para acompanhar a revista, enquanto o restante dos internos permaneceu em uma sala de televisão juntamente com os funcionários Antonio Padrão, Pedro Carlos e Maurício. Todavia, após desentendimento causado pela tentativa de encostar a porta daquela sala, os réus, a exceção de Flávio Aparecido e Margarida Maria, invadiram o cômodo e, empunhando pedaços de pau, barras de ferro e cassetetes de borracha, passaram a agredir todos os adolescentes, sem qualquer distinção. Enquanto tais fatos ocorriam, os representantes escolhidos para acompanhar a revista também foram agredidos nas mesmas circunstâncias.

Segundo ainda exposto pelo Ministério Público, após o primeiro espancamento, os denunciados, a exceção de Flávio e Margarida, determinaram que os adolescentes permanecessem somente de cuecas, sentados com a cabeça entre os joelhos e a mão na nuca. Foram levados, então, até o pátio que se encontrava molhado por conta da chuva, onde permaneceram sentados. Neste local, além de inúmeras ofensas, seguiram-se agressões individuais. Por volta das 03:00 horas, foram levados até os seus quartos, submetendo-se, para tanto, ao chamado “corredor polonês”. Lá, ficaram de cuecas somente recebendo roupas e cobertores no dia seguinte. Nos três dias que se seguiram, permaneceram trancados, sem que tomassem banho, somente tendo autorização para saída por três vezes, o que os obrigou a urinar em frascos de refrigerantes e defecar em baldes.

Por fim, conforme narrado pelo Ministério Público, os réus Margarida Maria e Flávio Aparecido, respectivamente, gerente do complexo e diretor da unidade, permaneceram na sala da administração durante a pretensa revista descurando, assim, de suas funções. Dessa forma, além de não evitarem as agressões, deixaram de tomar qualquer providência concreta para a apuração dos fatos.

Recebida a denúncia (fls. 618/619), após investigações conduzidas em procedimento administrativo instaurado pela Promotoria da Infância e Juventude, os réus foram pessoalmente citados e interrogados: Flávio Aparecido (fls. 665 e 919/925); José Luis Pinto (fls. 694 e 899/902); Margarida Tirollo (fls. 696 e 909/917); Antonio Manoel (fls. 699 verso e 809/816); Francisco Teodoro (fls. 699 verso e 817/822); Francisco Gomes Cavalcante (fls. 699 verso e 800/808); Marcos Fernando Moreno (fls. 729 e 856/861); Ubaldo Pereira (fls. 729 e 969/974); Nevair Pimenta (fls. 729 e 831/835); José Pinto (fls. 729 e 899/902); Sergio Colombaro (fls. 729 e 844/849); Antonio Fernando da Silva (fls. 729 e 850/855); Eduardo de Souza Filho (fls. 729 e 954960); Marco Aurélio Mantovan (fls. 729 e 904/906); Adilson de Freitas (fls. 729 e 872/878); João Batista Pereira (fls. 729 e 894/897); Airton Veríssimo (fls. 729 e 827/830); Almir José Caetano (fls. 729 e 962/967); Paulo Porfírio (fls. 777 verso e 879/884); Rubens Alves da Silva (fls. 777 verso e 866/871) e Uderson de Jesus (fls. 786 e 836/839). No tríduo legal, ofertaram defesas prévias (fls. 886/887, 892, 927/928, 929/930, 931/932, 939/940, 941/942 e 978/979).

Deferida a intervenção do Assistência de Acusação do menor Felipe Martins (fls. 933), no curso da instrução, foram inquiridas as testemunhas de acusação: Rogério Amâncio da Silva (fls. 1083), Nicolau Antonio de Carvalho Neto (fls. 1162/1164), Pedro Carlos Lourenço (fls. 1181/1198), Átila (fls. 1199/1216), Rodrigo da Silva Almeida (fls. 1263/1272), Rogério da Silva Fonseca (fls. 1273/1281), Glayds Rome Pecequillo (fls. 1288/1294), Ana Regina Lambert (fls. 1392/1402), Sônia Abukater (fls. 1403/1414), Silvana Bassi (fls. 1415/1427), Carlos Davidson (fls. 1505), Osmar Praxedes (fls. 1623/1624), Jackson W. Santana (fls. 1681/1689), Ana Elizabeth Meyer (fls. 1716/1744), Antonio Carlos Padrão (fls. 1726/1737) e André Brito da Silva (fls. 1738/1744), bem como as testemunhas arroladas pela defesa: Alexandre Ferreira de Lima (fls. 1798/1799), Erasmo José da Costa (fls. 1856/1863), Sergio Buzzin Machado (fls. 1864/1866), Fausto Couto Sobrinho (fls. 1867/1871), Maurício de Oliveira (fls. 1872/1879), Maria do Carmo de Santana (fls. 1880/1884), Moacir Volpato Sobrinho (fls. 1885/1887), Maria Aparecida da Silva (fls. 1888/1892), Renata Maria Ramos Soares (fls. 1893/1896), Isabel Cristina Oliveira da Silva (fls. 1897/1903), Ana Cristina Caldeira (1904/1909), Luiz Antonio de Maria (fls. 1910/1915), Antonio Crisóstomo Cavalcante (fls. 1946), Marcio Biscuola de Moraes (fls. 1984/1985), José Maria Ferreira Sales (fls. 2006/2013), Carlos Otávio Lacera (fls. 2014/2022), Cleber Fernandes dos Santos (fls. 2023/2032), Wilson Ornaghi (fls. 2028/2032), Josiva Justino dos Santos (fls. 2033/2037), Ronaldo Luiz Vicente (fls. 2038/2041), Domingos Ferreira (fls. 2042/2045), João Bispo dos Santos (fls. 2050/2057), Rogério Luiz da Silva (fls. 2058/2067), Cláudio Nunes dos Santos (fls. 2102), Marcio Tadeu Blota (fls. 2119), João dos Santos Souza (fls. 2183), Maurício da Silva (fls. 2204), Antonio Carlos Pinheiro de Paiva (fls. 2208/2210) e Valdik Lima de Santana (fls. 2246/2247).


Ao ensejo da fase estatuída pelo artigo 499 do Código de Processo Penal, o Ministério Público requereu a juntada de folha de antecedentes e certidões processuais dos réus (fls. 2252/2283). O prazo transcorreu in albis para as demais partes.

Em alegações finais, o Ministério Público postulou fosse a ação penal julgada procedente nos exatos termos constantes na denúncia, com a fixação de regime prisional fechado (fls. 2286/2330). O pleito foi reiterado pelo Assistente de Acusação (fls. 2342/2348).

A defesa da ré Margarida Maria Tirollo pugnou pela improcedência da ação penal, aduzindo, para tanto, não sido demonstrada qualquer conduta omissiva de sua parte. Ao contrário, na condição de gerente técnica e diretora de divisão do Complexo Raposo Tavares, a ré teria levado ao de seu superior hierárquico os sucessivos incidentes ocorridos naquela unidade de modo que a realização da revista foi resolução determinada pelas instâncias superiores da Febem. Negou tivesse acompanhado os procedimentos de vistoria de sorte que não tomou conhecimento de qualquer atividade ilícita. Nos dias subseqüentes, em razão de outras tarefas administrativas, não teve contato com os internos e, dessa forma, não tomou conhecimento de eventuais espancamentos. No seu entender, caso algum abuso tivesse sido cometido, os fatos deveriam ser subsumidos ao crime de maus tratos – artigo 136 do Código Penal -, mesmo porque a intenção que norteou toda a ação foi a de preservar a ordem e não a de infligir sofrimento aos menores. Nessas circunstâncias, a absolvição de ré seria medida imperiosa diante da inexistência de provas que apontassem para qualquer comportamento doloso de sua parte (fls. 2354/2364).

Por sua vez, a defesa dos réus Francisco Gomes Cavalcante, Antonio Manoel de Oliveira, Francisco Antonio Teodoro, Antonio Fernando da Silva, Eduardo de Souza Filho, José Luiz Pinto, Nevair Vital Pimenta, Sergio Ricardo Colombaro Marcos Fernando Moreno, João Batista Gomes Pereira, Rubens da Silva, Uderson Ferraz de Jesus, Airton Veríssimo da Costa, Adilson Tadeu de Freitas, Paulo Cesar Porfírio Vicente, Ubaldo Pereira de Barros, Almir José Caetano e Marcos Aurélio Garcia Mantovan, após fazer detido exame das provas colhidas, reputou-as insuficientes para a sustentação de uma condenação de modo que também propugnou pela improcedência da ação penal. Apontou contradições nas declarações prestadas pelos adolescentes que, ademais, registravam adversidades, tanto com relação aos monitores, quanto ao regime de ordem e de disciplina que era imposto. Observou terem os réus permanecido na unidade por algumas horas na madrugada do dia 15 de novembro de 2000 não retornado ao local posteriormente, circunstância que contrariaria a acusação de prática de tortura entre os dias 14 e 22 daquele mesmo mês e ano. Aduziu, ainda, não ter sido individualizada a conduta de cada um dos acusados. Aliás, os réus Sergio Ricardo, José Luiz Pinto, Antonio Manoel, Marcos Fernando Moreno, Eduardo de Souza Filho, João Batista Gomes, Marco Aurélio Mantovan e Almir José sequer teriam sido apontados por qualquer um dos adolescentes tendo os demais sido indicados apenas por uma das vítimas. Diante de tal quadro de incerteza, a absolvição seria a única solução em razão da máxima in dubio pro reo (fls. 2369/2393).

A absolvição também foi requerida pela defesa de Flávio Aparecido dos Santos. Para tanto, ressaltou a situação caótica e de absoluto descontrole existente na UE-27 nos dias que antecederam a revista, com inúmeros registros de fugas e recapturas. Destacou a atuação equilibrada do réu na condução da direção daquela unidade, em especial o seu trabalho de conscientização dos funcionários e a permanente busca em sensibilizar os adolescentes para a importância do bom comportamento e das atividades escolares, esportivas e culturais. Lembrou que os exames de corpo de delito foram realizados por apenas um médico legista e, portanto, em desacordo com o preceituado pelo artigo 159 do Código de Processo Penal. Afirmou, ademais, serem as lesões pré-existentes e causadas por conta das sucessivas fugas e recapturas. Asseverou não ter acompanhado os procedimentos da revista tendo permanecido em sua própria sala por determinação da Diretoria Executiva da FEBEM. Mesmo assim, externou sua preocupação com o bem estar dos internos, solicitando que não fossem cometidos quaisquer atos de violência, fato que inclusive teria sido por ele observado ao funcionário Antonio Carlos Padrão. Impugnou o valor dos depoimentos prestados pelo funcionário Pedro Carlos Lourenço a quem atribuiu o intuito deliberado de comprometer o réu em razão de punições disciplinares que lhe haviam sido impostas. Ressaltou ter, após os procedimentos, procurado certificar-se do ocorrido não lhe tendo sido comunicada qualquer situação de abuso, quer por parte de funcionários, quer pelos adolescentes ou mesmo por seus familiares. Negou tivesse poderes para apurar diretamente as responsabilidades o que, na verdade, seria incumbência da Comissão Permanente Processante da FEBEM, que, aliás, teria sido devidamente solicitada. Dessa forma, não lhe poderia ser imputada conduta criminosa omissiva. Entendeu ausente qualquer relação de causalidade. E ainda que assim não fosse, eventual omissão teria decorrido de estrita obediência à ordem não manifestamente ilegal, qual seja a de aguardar em outro local enquanto a revista era realizada. Argumentou, ainda, inexistir a figura da tortura para a qual seria necessário o propósito premeditado. Em seu entender, a ação visava restabelecer a segurança e se os desdobramentos levaram a um tumulto não se poderia falar em dolo, mas sim, numa reação legítima. A incidência penal típica seria, portanto, a do artigo 136 do Código Penal, sobre o qual não previu o legislador a forma culposa de modo que o réu deveria ser absolvido. Em caráter subsidiário, pediu o afastamento das qualificadoras que teriam sido aditadas pelo Ministério Público sem que fosse aberta vista à defesa para manifestação nos termos do artigo 384, parágrafo único do Código de Processo Penal. Pleiteou, ademais, o afastamento da circunstância prevista pelo inciso I do parágrafo quarto do artigo 1o da Lei 9.455 por configurar pressuposto para a realização do tipo descrito pelo parágrafo segundo, evitando-se, assim, o bis in idem (fls. 2408/2439).


Eis, em síntese, o relatório.

Passo, em seguida, a fundamentar.

I – Dos fatos imputados

O cerne da acusação repousa em dois fatos distintos, embora interligados.

Sobre os réus Francisco Gomes Cavalcante, Antonio Manoel de Oliveira, Francisco Antonio Teodoro, Airton Veríssimo da Costa, Nevair Vital Pimenta, Uderson Ferraz de Jesus, Antonio Fernando da Silva, Marcos Fernando Moreno, Sérgio Ricardo Colombaro, Adilson Tadeu de Freitas, Paulo César Porfírio Vicente, Rubens Alves da Silva, Almir José Caetano Faro, Eduardo de Souza Filho, Ubaldo Pereira de Barros, Marco Aurélio Garcia Montovan, José Luiz Pinto e João Batista Gomes Pereira pesa a imputação de prática de tortura, consistente na submissão dos adolescentes Rodrigo da Silva Almeida, Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista Fernandes, Cleiton Aparecido Oliveira Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira do Nascimento, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos Feitosa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciunas, Emerton do Prado Floriano, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva Felipe Martins, Samuel Belo Caetano – que estavam recolhidos na UE-27 do Complexo Raposo Tavares da Febem -, mediante violência e grave ameaça a intenso sofrimento físico e mental, como forma de aplicar castigo pessoal e medida de caráter preventivo.

Os fatos por eles praticados, segundo a acusação, iniciaram-se tarde da noite do dia 14 de novembro de 2000 e teriam consistido na agressão indiscriminada de todos os adolescentes que estavam no interior de uma sala de TV localizada nas dependências daquela unidade, mediante o uso de pedaços de pau, barras de ferro e cassetetes de borracha. Nesse mesmo momento, outros adolescentes que haviam sido indicados como representantes para acompanhar a revista nos quartos, também teriam sido agredidos e nas mesmas circunstâncias. Após, todos teriam sido obrigados a se despir, permanecendo apenas de cuecas no interior daquela sala. Foram levados, então, até o pátio, que ainda estava molhado em razão da chuva, e obrigados a permanecer sentados enquanto ouviam diversas ofensas, seguindo-se novas agressões de forma individual. Por volta das 03:00 horas do dia 15 de novembro, os adolescentes teriam sido encaminhados até os seus quartos quando então foram submetidos ao denominado “corredor polonês”, com novo espancamento generalizado. Lá teriam ficado de cuecas até o dia seguinte quando receberam roupas e cobertas. Nos três dias que se seguiram, os adolescentes permaneceram trancados, privados de banho e com autorização para três saídas diárias o que fez com que fizessem as suas necessidades fisiológicas em garrafas e baldes.

Já sobre os réus Flávio Aparecido dos Santos e Margarida Maria Rodrigues Tirollo pesa a acusação de omissão consistente em não evitar e apurar as condutas praticadas pelos demais réus. Na condição respectivamente, de Diretor da unidade 27 e de Gerente Técnica do Complexo Raposo Tavares, os acusados, além de não evitaram as agressões ocorridas nos dias 14 e 15 de novembro de 2000, deixaram, nos dias seguintes, de tomar qualquer providência concreta para a apuração daqueles fatos.

II – Da prática da tortura

1. Antecedentes

Conforme apurado ao longo da persecução penal, nos dias que antecederam os fatos tratados nestes autos, a unidade 27 do Complexo Raposo Tavares da FEBEM era exemplo ilustrativo da incapacidade do aparato estatal em promover, com eficiência, a recuperação de adolescentes infratores. Fugas em massa, depredações do patrimônio público, insubordinações, confrontos entre grupos rivais e entre estes e alguns funcionários, constituíram realidade, de triste memória. Nesse aspecto, as declarações prestadas por Ana Regina Lambert, quando de sua oitiva perante a Promotoria da Infância e Juventude (fls. 204/208), fornecem um retrato bastante rico dos antecedentes daquela unidade, notadamente, das dificuldades enfrentadas, desde o início do ano 2000, na implementação de uma nova filosofia de trabalho. Com efeito, a unidade, que até então funcionara para o acolhimento provisório, teve sua destinação alterada para unidade educacional, o que implicou, dentre outras coisas, uma maior permanência dos adolescentes no local. Silvana Bassi, que na época dos fatos trabalhava como psicóloga naquela unidade, também apresentou narrativa detalhada sobre o período de transição, destacando a implantação de novas atividades – dentre as quais a escola formal – e a proibição do emprego de violência pelos funcionários. De acordo com o seu relato, as dificuldades teriam sido desencadeadas quando um grupo de adolescentes de perfil mais agressivo foi para lá transferido. A partir de então, cresceram os atos de indisciplina, culminando com fugas em massa ocorridas entre os meses de outubro e novembro de 2000. É, note-se, o que se infere do teor de suas declarações apresentadas perante a Promotoria da Infância e Juventude, merecendo ser destacado o seguinte trecho:


… Depois que a Unidade foi alterada a sua destinação de Unidade Acolhimento Provisório para Unidade Educacional (época que a depoente ali ingressou), passou-se por uma fase adaptação quando o corpo de funcionários teve alguns problemas de indisciplina pelos internos. Destaca que quando ingressou na Unidade a mesma havia acabado de ser transformada em Unidade Educacional, mas a disciplina era semelhante a de UAP, ou seja, os jovens ainda tinham que andar com mãos para trás, cabeça baixa, roupas da Unidade e estavam começando a ser implantadas as atividades ali, principalmente a escola formal. Por volta de junho, na rotatividade de jovens na Unidade, entrou um grupo mais exaltado que causou certa indisciplina no local. A situação piorou um pouco em agosto/setembro pois chegaram alguns internos que não eram típicos do perfil da casa (…). Como a unidade era tranqüila, os funcionários que não adotavam a política de violência, este grupo mais estruturado começou a querer se impor sobre o corpo de funcionários, querendo que estes aceitassem as regras ditadas pelos próprios internos. (…) esclarece que esse grupo se mostrou resistente a esta postura educacional e passaram a interferir na dinâmica da casa, sendo certo que entre outubro e começo de novembro foram promovidas algumas tentativas de fuga em massa e levantes na Unidade. (fls. 222/223).

Nesse contexto, no dia 14 de novembro de 2000, duas fugas em massa ocorreram: uma pela manhã e outra no final da tarde. Os fatos, noticiados pela imprensa (fls. 16), tornaram-se incontroversos tendo sido confirmados em diversos depoimentos e, inclusive, pelos próprios réus. Naquela mesma data, uma reunião de caráter administrativo foi realizada nas dependências daquela unidade com o propósito de estabelecer uma linha de ação. Estiveram presentes, dentre outros: o réu Francisco Gomes Cavalcante, diretor técnico interino da FEBEM, a ré Margarida Rodrigues, diretora de divisão do Complexo Raposo Tavares e o réu Flávio Aparecido dos Santos, diretor da Unidade 27. Pelo que se infere dos autos, após conversa telefônica mantida entre Francisco Gomes e o Presidente da Febem à época, Benedito Duarte, restou deliberada a realização de uma imediata revista nas dependências daquela unidade e que seria, como de fato foi, concretizada com o auxílio de funcionários então lotados no Complexo de Franco da Rocha. É, note-se, o que relatou Francisco Gomes nos autos do processo administrativo instaurado perante o Juízo de Execuções da Infância e da Juventude:

Que o representado Francisco Cavalcante chegou na unidade por volta das 20:00 horas do dia 14 de novembro, e ali sucedeu-se uma reunião entre ele, o depoente e a representada Margarida Tirollo, que tentavam uma solução para o problema, primeiramente tendo sido cogitada a intervenção de outros funcionários do Complexo Raposo Tavares o que não foi possível uma vez que aquelas unidades também tinham desfalque de funcionários e poderiam ensejar a ampliação do tumulto. Ao mesmo tempo, o Sr. Cavalcante manteve contato telefônico com o chefe de segurança do Complexo Tatuapé, com o diretor de segurança da FEBEM e em seguida com a própria Presidência da FEBEM, quando então foi comunicado que a UI-27 receberia a intervenção de funcionários de Franco da Rocha. (fls. 1516).

Relato semelhante foi apresentado pela ré Margarida quando de sua oitiva naquele processo administrativo. Com efeito, assinalou naquela ocasião:

Ocorre que a depoente, na condição de responsável pelas unidades da Raposo Tavares já havia comunicado ao diretor da divisão técnica da FEBEM, Sr. Francisco Gomes Cavalcante, a respeito da problemática envolvendo as constantes fugas que vinham ocorrendo na UI 27. Em decorrência, o Sr. Cavalcante, no próprio dia 14 de novembro de 2000, compareceu na UI 27 por volta das 21 horas. O Sr. Cavalcante comunicou a depoente que a situação da unidade era bastante instável e não iria aguardar até a manhã do dia seguinte para realizar a revista, argumentando que o adiamento da revista poderia provocar mortes no local. A depoente notou que o Sr. Cavalcante conversava ao telefone com o Sr. Benedito Duarte, então presidente da FEBEM, tendo o Sr. Cavalcante afirmado que convocaria funcionários de Franco da Rocha para participar da sessão de “revista”. (fls. 1526).

As determinações superiores para a realização da revista foram confirmadas pelo próprio Francisco Gomes Cavalcante, que na época ocupava, interinamente, a diretoria técnica da Febem. Com efeito, por ocasião de seu depoimento pessoal, também prestado nos autos do processo administrativo instaurado perante o Departamento de Execuções da Infância e Juventude, admitiu ter recebido ordem expressa dos então Secretário de Estado e Presidente da Febem para que efetuasse uma revista nas dependências da UI-27 diante das denúncias de que os internos estariam em poder de diversas armas brancas. É o que atesta o seguinte trecho:


… assumiu a responsabilidade pela diretoria técnica da Febem no período compreendido entre 1o a 30 de novembro de 2000, em substituição à diretora técnica, Sra. Laura Keiko, que então estava de férias. O depoente esclarece que o cargo que efetivamente exercia, antes da substituição na diretoria técnica em novembro de 2000, era o de diretor da Divisão do Complexo de Franco da Rocha (…). Afirma que tinha conhecimento das várias fugas que vinham ocorrendo na UI-27 e, por ordem do Sr. Secretário de Estado, Dr. Edson Ortega, e do Sr. Benedito Duarte, então Presidente da Febem, compareceu na UI-27 no dia 14 de novembro, por volta das 20h00min. Que o depoente chegou desacompanhado. Afirma que a revista foi entendida como necessária pois havia denúncias que os internos tinham em seu poder armas brancas e outros artefatos. Recorda-se que aproximadamente, na data dos fatos, a UI-27 contava com cerca de setenta e sete adolescentes, que tinham ali permanecido após inúmeras fugas até então ocorridas. (…) Afirma assim que por volta das 22h00min do dia 14 de novembro telefonou para o Sr. Benedito Duarte e então lhe foi comunicado sobre o apoio de Franco da Rocha. Aproximadamente quinze funcionários de Franco da Rocha se dirigiram até a UI-27 na data dos fatos, dentre os quais os então diretores Francisco Antonio Teodoro e Antonio Manoel de Oliveira. Na época dos fatos, o Sr. Teodoro era diretor de uma das unidades de Franco da Rocha, sendo que Antonio Manoel de Oliveira respondia pela direção do Complexo de Franco da Rocha. (fls. 1533/1534).

O ambiente de descontrole reinante na UI-27 na noite do dia 14 de novembro de 2000 era evidente tendo sido referido por diversas testemunhas, inclusive pelos próprios réus. Pelo que se infere dos autos, alguns dos internos teriam notado a chegada dos funcionários do Complexo de Franco da Rocha o que desencadeou um princípio de tumulto. Foi necessária, então, uma negociação, realizada ainda nos portões de entrada daquela unidade, para que os funcionários pudessem lá ingressar. Daí o acordo estabelecido de que representantes dos adolescentes, previamente escolhidos, ficariam encarregados de acompanhar a revista em cada um dos quartos, enquanto os demais permaneceriam aguardando no interior de uma sala de televisão em companhia de funcionários da própria unidade. Nesse sentido, asseverou o adolescente Felipe Martins:

…logo em seguida, os adolescentes que estavam no quarto 1 que tem visão da entrada do pátio interno, perceberam a presença de vários homens que depois souberam que eram monitores de outras unidades, preparados para adentrarem no pátio interno. O depoente acredita que um dos “faxinas” conseguiu abrir as portas de todos os quartos, porque tinha receio de que esses monitores pudessem agredir indiscriminadamente todos os internos. Todos os adolescentes foram para o pátio e souberam que aqueles monitores estavam na Unidade para procederem uma revista. Antes, porém, foi feito um acordo entre os internos e os funcionários, no sentido dos internos permanecerem na sala de TV, enquanto outros adolescentes foram escolhidos como representante de cada quarto para acompanharem a revista. O depoente ficou com o grupo dos demais internos na sala de TV… (fls. 214/215).

No mesmo sentido, note-se, foi o relato apresentado pelo adolescente Carlos Davison quando de sua oitiva perante a Promotoria da Infância e Juventude:

…o depoente se encontrava no quarto 2 juntamente com outros 6 colegas, quando todos perceberam, através da janela, um grande movimento de vigilantes e funcionários de outras unidades da FEBEM se posicionando no portão principal para invadirem o pátio da Unidade. Um adolescente que estava fazendo a faxina ao perceber essa movimentação logrou êxito e se apossou da chave que abre as portas de todos os quartos, que esta em poder do Coordenador Sr. Padrão. Em seguida este adolescente, que não sabe declinar o nome, conseguiu abrir as portas de todos os quartos, possibilitando que os demais internos ganhassem novamente o pátio interno da Unidade. Os internos, inclusive, o depoente, se aproximaram do portão que dá acesso a entrada dos quartos e, se dirigindo àqueles funcionários perguntaram o que eles pretendiam fazer na Unidade? Eles responderam que iriam fazer a revista de praxe, pois naquele dia ocorreram fugas na EU-27. Foi combinado com esses funcionários que os internos da Unidade iriam para a sala de TV, enquanto os outros internos seriam escolhidos como representantes de cada quarto para acompanharem a revista, o que efetivamente aconteceu. (fls. 258/259).


2. Das agressões perpetradas na sala de televisão

Nos termos do acordo estabelecido, os adolescentes foram divididos em dois grupos. O maior deles permaneceu em uma sala de televisão assistindo um programa musical. Em dado momento, três funcionários da UE-27, Pedro Carlos Lourenço, Antonio Carlos Padrão e Maurício ali ingressaram e passaram a conversar com os internos. Por serem conhecidos, tinham a intenção de acalmá-los, esclarecendo como se processaria a revista. Foi quando iniciou-se um desentendimento entre alguns adolescentes e funcionários das outras unidades que estavam do lado de fora, próximos à porta, o que culminou com a invasão da sala. A partir deste instante, os adolescentes foram agredidos, indistintamente, com golpes de porretes de madeira. Não houve, conforme apurado, qualquer tentativa de tomada dos funcionários Pedro, Padrão e Maurício como reféns. Aliás, em poder daqueles adolescentes não foram apreendidas quaisquer armas brancas que pudessem justificar tal receio. Muitos deles estavam simplesmente ouvindo os funcionários da UE-27, de costas para a porta de entrada e em aparente estado de tranqüilidade. O funcionário Pedro ainda tentou impedir a ação, mas acabou sendo golpeado na mão. Todos os adolescentes foram obrigados, então, a se despir permanecendo na sala, agachados e de cuecas.

Nesse sentido, os sucessivos depoimentos prestados pelo funcionário Pedro, além de coesos, uniformes e detalhados, são altamente ilustrativos dos abusos cometidos naquela ação. Não permaneceram isolados. Muito pelo contrário. Foram confirmados pelo funcionário Padrão, bem como pelas sucessivas declarações dos internos. De qualquer modo, seus relatos foram coerentes, o que lhes confere credibilidade suficiente a ponto de assumir importante valor probatório. Com efeito, por ocasião da apuração preliminar pelo Ministério Público, asseverou:

Os jovens ficaram na sala de televisão tranqüilos, um pouco apreensivos com a revista, mais nenhum deles estava com qualquer tipo de arma. O depoente entrou naquela sala juntamente com o “Sr. Padrão” e o “Sr. Maurício”. A intenção do depoente era acalmá-los pois sendo funcionários da Unidade e tendo contato diário no pátio com eles tinha um bom entrosamento com eles. (…) Informa que a porta da sala estava aberta e dá para um pátio. Esta porta fica na lateral da sala, de frente com as janelas, as quais ficam na outra parede. A televisão fica no lado oposto ao da porta, nos fundos da sala, em cima de uma mesa, sendo que a mesma estava ligada e os jovens estavam alguns conversando e outros assistindo televisão. O depoente passou pela porta, atravessou entre os jovens, foi até os fundos da sala onde estava a televisão, desligou a mesma, e pediu para que todos se aproximassem e se sentassem para poderem conversar. Os jovens prontamente atenderam, se chegaram próximo a mesa de televisão onde o depoente estava, sentaram-se para prestar atenção no que foi dito e, portanto, ficaram de costas para a porta. Só um pequeno grupo de aproximadamente 10/15 garotos ficou em pé conversando. Do lado de fora os funcionários estavam na porta para que eles não deixassem aquele ambiente. O depoente sentou na mesa de televisão e ao seu lado ficaram os funcionários “Maurício” e “Padrão” (fls. 330).

É certo que ao tentar encostar a porta para que pudesse conversar com os internos com mais tranqüilidade, Pedro percebeu uma animosidade por parte dos funcionários que estavam do lado de fora. Seguiu-se, então, um desentendimento que culminou com a invasão do local. Foi quando percebeu que os funcionários estavam munidos com pedaços de pau e cassetetes de borracha. Tentou, em vão, impedir a ação, mas acabou sendo agredido. É, note-se, o que se infere do seguinte trecho do mesmo depoimento:

…Ato contínuo, quando os garotos deixaram a porta, aqueles funcionários invadiram a sala e já foram puxando de dentro das vestes, principalmente dentro das blusas e camisas, vários objetos como pedaços de pau, cassetetes de borracha, etc. Quando o depoente percebeu aquilo e vendo que a maioria dos adolescentes estavam sentados de frente para o depoente e de costas para os funcionários e que os mesmos seriam espancados, tentou evitar e pulou sobre os internos que estavam sentados a sua frente e abrindo os braços começou a gritar para aqueles funcionários: “Pára, pára, não tem necessidade disso”. Nesse momento o depoente acabou apanhando junto com os rapazes. Logo de cara levou uma paulada na mão direita (…) Assim que recebeu a paulada na mão o depoente tentou reagir e investir para cima do funcionário que o agrediu. Mas como aquele grupo era muito grande, agarraram o depoente pelos braços e o arrastaram para fora da sala até o pátio. (fls. 331).


Como observado, a narrativa não permaneceu circunscrita à apuração preliminar. De fato, sob o crivo do contraditório, reiterou os seus termos oportunidade em que reconheceu, ainda, os réus Adilson, Rubens, Eduardo, Ubaldo e João Batista (fls. 1196):

…os funcionários se aglomeraram na porta, e para não entrar na sala, eu pedi para um dos meninos, estava no canto, sentado na mesa, onde tinha TV, e pedi para um dos meninos encostar a porta para evitar xingamentos e insultos entre ambas as partes. Foi quando um dos funcionários, que estava na porta, não gostou que fechasse a porta e empurraram a porta. E pedi de novo, mas não deixou o moleque fechar a porta. E eu falei para ele: “já que vai haver problema, não vai fechar a porta”. Foi quando os funcionários vieram à sala de TV onde estavam os adolescentes e foi uma pancadaria. Eles bateram em mim também. (fls. 1182/1183).

Como mencionado, a uniformidade de seus depoimentos, somada ao grau de detalhamento das informações prestadas, empresta-lhe importante valor probatório. Ademais, trata-se de funcionário da própria FEBEM. A expectativa natural era de que os acontecimentos fossem por ele amenizados até mesmo para que alguns colegas fossem preservados diante das notórias dificuldades da função e da precariedade das condições fornecidas pelo Estado. Diversamente, todavia, não se deixou levar por sentimentos corporativistas. Ao contrário, em demonstração de coragem e apego a sólidos princípios éticos manteve a coerência de suas assertivas o que, inclusive, lhe causou profundos dissabores tais como perseguições e ameaças – BO 8395/02 do 1o DP e BO 1323/04 do 6o DP (fls. 2077). Nesse sentido, as tentativas de desqualificar suas assertivas restaram infrutíferas. Aliás, as agressões foram confirmadas e referidas por outros funcionários da instituição assim como pelas sucessivas declarações dos próprios adolescentes.

Com efeito, o funcionário Antônio Carlos Padrão, que também se encontrava na sala de televisão juntamente com Pedro Lourenço, ao ser ouvido perante o Ministério Público, confirmou o clima de animosidade que se estabeleceu entre os adolescentes e os funcionários das outras unidades o que culminou com a invasão daquela sala. A partir de então, os primeiros passaram a ser agredidos. Como conseqüência, caíram ao chão e inclusive sobre a testemunha. Embora não tivesse conseguido ver bem os fatos em razão do tumulto instalado, negou qualquer tentativa de tomada dos funcionários como reféns. Nesse sentido, vale registrar o seguinte trecho:

O depoente afirma que quando os funcionários entraram sua atitude instintiva foi proteger a cabeça com as pernas e braços e que muitos internos caíram por cima do depoente, por isso, não viu direito a cena. Perguntado se em algum momento o interno tentou agredir o depoente (…) o declarante afirma que em nenhum momento os internos tiveram qualquer atitude para agredir o depoente. O que aconteceu foi que quando alguns deles caíram, chegaram a bater com a cabeça ou cotovelo no depoente, mas de maneira acidental. (fls. 456).

A forma pela qual o funcionário Antonio Carlos Padrão procurou proteger-se denota um comportamento natural e instintivo de quem se vê a mercê de uma situação extremamente adversa contra a qual não tem capacidade ou mesmo condições para ofertar qualquer defesa. Foi, note-se, a mesma reação descrita pelo adolescente Jackson que também se encontrava no interior da sala de televisão.

…os funcionários invadiram aquela sala e espancavam a todos, indiscriminadamente, desferindo pauladas e ferradas. O depoente levou vários golpes, não sabendo especificar de quem porque ficou com a cabeça baixa. Diz que ficou com as mãos muito machucadas, na parte de cima, porque tentava proteger a cabeça daqueles golpes. Que acabaram acertando várias pauladas em suas mãos, sendo que a mão direita foi a mais machucada. Depois que bateram bastante em todo mundo mandaram tirar toda a roupa, ficando somente de cuecas. (fls. 382).

Ora, a coincidência entre os relatos apenas denota que não houve reação à agressão injusta. Ademais, a invasão da sala não foi pautada pelo emprego de meios moderados. Ora, de acordo com o relatado pelos funcionários que lá estavam juntamente com os adolescentes a situação estava tranqüila e sob controle tanto que não foram ameaçados e tampouco sentiram algum receio de serem tomados como reféns. Na verdade, as agressões, além de indiscriminadas, foram intensas, covardes e desproporcionais. Com efeito, mesmo rendidos, os adolescentes continuaram sendo alvos de agressões perpetradas com pedaços de madeira e ferro. Nesse ponto, os adolescentes confirmaram de modo contundente e sistemático a tomada da sala pelos funcionários das outras unidades, bem como as agressões físicas a que foram submetidos. Após, todos foram obrigados a se despir e lá permanecerem por algum tempo até serem levados ao pátio externo. É o que observou Rogério Amâncio da Silva perante o Ministério Público:


…Seu Pedro pediu para que encostassem a porta de novo e, aquele grupo de funcionários que veio de outras unidades, invadiram a sala e começaram a tirar pedaços de ferro e madeira que estavam escondidos nas roupas e passaram agredir violentamente todos os internos que estavam na sala de televisão. Deixa claro que não houve nenhum tipo de confronto, que todos foram pegos de surpresa por aquela invasão de funcionários que já foram desferindo ferradas e madeiradas em todos, mesmo aqueles que já caíam ao chão. (fls. 195).

Em juízo, manteve o seu relato, oportunidade na qual reiterou o apontamento do réu Porfírio como um dos agressores. (fls. 1083). As agressões também foram narradas, com detalhes, pelo adolescente Rogério da Silva Fonseca (fls. 197/199) e reiteradas quando de sua oitiva sob o crivo do contraditório ocasião em que reconheceu os réus Francisco Antonio Teodoro, Airton Veríssimo da Costa, Paulo César Porfírio, Rubens Alves da Silva, Eduardo de Souza Filho, Ubaldo Pereira de Barros e Marcos Aurélio Mantovan (fls. 1273/1281). O adolescente André Brito da Silva também reconheceu, em audiência, os réus Rubens Alves e Paulo Cesar Porfírio (fls. 1738/1740). Jackson Santana relatou ter recebido diversos tapas e forçado e engolir uma chave. Reconheceu “Porfírio” e “Pimenta” (Nevair Vital Pimenta) como aqueles que mais o agrediram. (fls. 1681/1682). Por sua vez, o ex-interno Nicolau Antonio de Carvalho Neto, ouvido na comarca de Ibirataia/BA (fls. 1162/1164), embora não tivesse conseguido identificar os agressores, forneceu relato coerente reforçando, assim, o quadro delineado pela denúncia. É o que atesta o seguinte trecho:

Que os internos se dirigiram até a sala de televisão, onde permaneceram acompanhados de funcionários da unidade 27; Que os funcionários que estavam na sala de TV foram Antonio Carlos Padrão, Pedro Carlos Lourenço e Maurício, sendo que alguns foram escolhidos como representantes para acompanhar a revista nas celas; Que não houve qualquer resistência a revista por parte do declarante aos internos, entretanto um dos internos não aceitou que a porta da sala de TV fosse fechada que então os denunciados invadiram as salas com pedaços de pau, barras de ferros e cacetetes de borracha e começaram a agredir os menores e o declarante (…) Pedro Carlos terminou sendo também agredido pelos demais denunciados a pauladas; Que todos os menores ficaram apenas de cueca com a [cabeça] entre os joelhos enquanto ocorria o espancamento; Que depois da sessão de espancamento foram colocados no pátio… (fls. 1162).

Há que se destacar, outrossim, o depoimento judicial prestado por Silvana Bassi (fls. 1415/1427). Embora não estivesse na unidade quando das agressões, delas tomou conhecimento quando retomou o expediente no primeiro dia útil imediato. Assim, em conversas mantidas com alguns dos internos, ficou sabendo de detalhes da operação. Segundo o por eles informado, o que era para ser uma revista acabou se transformando em um espancamento generalizado promovido por funcionários de outras unidades. Nesse sentido, asseverou (fls. 1420):

… eles disseram que vieram pessoas que eles não conheciam. Se eu me lembro, era uma revista e eles teriam que ser revistados nos quartos, mas foi tirado todo mundo dos quartos e eles foram levados para uma sala, que nem tem mais hoje, era uma sala que tem uma porta só, no começo. A sala é grande, então todo mundo ficou nos fundos, a pedido do (…) como chamava aquele rapaz (…) era um funcionário (…) “Japonês”, que eles falavam (…), eu não lembro o nome. O “Japonês” que eles falavam (…) acho que é Pedro. Ele estava junto, ele era da Unidade. Diz que foi combinado que eles saíssem dos quartos e ficassem nessa sala e um de cada quarto iria acompanhar a revista. Em princípio parecia que ia proceder assim, aí parece que fecharam a porta, ele mandou fechar de fora, aí acharam que não devia fechar e nisso entraram pessoas de fora e começou a pancadaria.


3. Das agressões perpetradas durante s revista nos quartos

Concomitantemente, uma detida revista foi realizada nos aposentos da unidade. Levada a efeito por um grupo de funcionários, foi acompanhada por alguns adolescentes que haviam sido previamente escolhidos, dentre os internos, como representantes. Eram estes, aliás, os termos do acordo celebrado nos portões da unidade. Entretanto, em dado momento da revista, sem motivo aparente, estes adolescentes também passaram a ser agredidos. Alguns tentaram escapar. Todavia, foram detidos e agredidos. Encaminhados à sala de televisão, depararam-se com os demais internos, já despidos e agachados. Foram obrigados a se juntar a eles. Seguiram-se, então, novas agressões. Ao final, todos foram levados, apenas de cuecas, até o pátio externo. Nesse sentido merecem destaque as declarações prestadas por Reginaldo Carneiro Vilar por ocasião de sua oitiva perante a Promotoria da Infância e Juventude:

…informa que os funcionários aceitaram a proposta, e que o depoente era o representante do seu xadrez, o de n. 8, mas que durante a revista, alguns monitores disseram que a revista agora seria do jeito deles, ocasião em que começaram a quebrar alguns pertences dos internos e a agredir o depoente com golpes efetuados com cassetete nas costas, na cabeça e nas mãos. Que durante as agressões foi levado para o corredor onde haviam vários monitores e vigilantes, alguns usando toca “ninja” na cabeça, mas que as mesmas não estavam abaixadas. Que pôde ver que haviam dois cachorros da raça “Rottweiller”, com os vigilantes e, que, estes cachorros receberam ordem de seus donos para atacarem os internos que se encontravam no corredor, mas que os cachorros não obedeceram. Em certo momento o declarante saiu correndo em direção a sala de televisão e foi trazido de volta para perto do seu xadrez, mas assevera que pôde ouvir uma gritaria de internos sendo agredidos na referida sala de TV. Esclarece que foi apanhando do seu xadrez até a sala de televisão por monitores e vigilantes com pedaços de madeira e barras de ferro. Logo em seguida foi levado apanhando para a sala de televisão onde todos os internos que lá estavam nus, inclusive, sem cuecas e sendo agredidos pelos funcionários que vieram de outra unidade, bem como pelos vigilantes da UE-27. No interior da sala de televisão, o depoente foi obrigado a “descascar”, ou seja, tirar toda a roupa, inclusive a cueca, ocasião que voltou a ser “espancado” por monitores e vigilantes. Acrescenta que, pelo que viu, nenhum dos funcionários da UE-27 participaram das agressões e, que, soube através de outros internos que dois monitores da referida unidade tentaram impedir que os funcionários que chegaram agredissem os jovens internos, ocasião em que também foram agredidos pelos funcionários da outra unidade. (fls. 200/201).

O relato não permaneceu isolado. Ao contrário, foi sustentado pelos demais adolescentes. Cléber de Oliveira, por exemplo, após acompanhar a revista no quarto 3, permaneceu ali trancado quando, então, passou a ouvir gritos vindos da sala de televisão. Presenciou um interno ser agredido por um dos monitores no pátio. Pediu que sua porta fosse aberta. Foi submetido, então, ao denominado “corredor polonês” até que chegasse à sala de TV. Nesse sentido, asseverou:

…após a revista o funcionário deixou o quarto e manteve o depoente trancado. Passados alguns minutos, o depoente ouviu uma gritaria da sala de TV e pediu ao colega de apelido “Motoca” que estava correndo pelo pátio, fugindo de um monitor que o agredia, que abrisse a porta pelo lado de fora, o que efetivamente aconteceu. Agora, já no pátio interno, o depoente se apoderou de um colchão para se defender de um cachorro que estava sendo insuflado contra ele por um vigilante. Nesse momento, o depoente foi agredido com uma paulada nas costas e compelido a se dirigir até a sala de TV onde se encontravam alguns internos. Antes, de ingressar no interior da sala, quando passava por um “corredor polonês” formado pelos monitores, foi novamente agredido com pauladas nas costas, braços e pernas… (fls. 219).


Antes que fosse colocado na sala de TV, Cléber conseguiu escapar refugiando-se no quarto 16. Foi perseguido e detido uma vez mais quando nova sessão de agressões foi contra ele infligida. Durante este tumulto conseguiu ver um interno conhecido pela alcunha de “Gordinho” ser duramente espancado. Esta narrativa, note-se, foi confirmada pelo funcionário Pedro Carlos que presenciou várias agressões logo após ser retirado da sala de televisão. Tentou intervir mas acabou sendo impedido pelo próprio diretor da unidade, Flávio Cavalcante. Nesse ponto destacou:

Aqueles diretores viram que o depoente fora arrastado para fora da sala, mas, em momento algum, foram em sua defesa. Antes de se dirigir a estes diretores cobrando uma posição percebeu que no quarto n. 3 o adolescente Jackson Oliveira estava sendo espancado com um pedaço de pau por um daqueles funcionários que veio de fora. Vendo que o jovem estava apanhando muito, o depoente correu para tentar intervir e impedir o procedimento daquela agressão, até porque o adolescente gritava o nome do depoente pedindo ajuda. Contudo, o depoente não conseguiu parar aquela agressão pois foi contido pelo próprio Diretor da EU-27, o “Sr. Flávio”, o qual chegou junto ao depoente na porta do quarto n. 3 e falou para o depoente: “Não se intromete, deixa que eles resolvem isso daí”. Ante aquela ordem do Diretor e o depoente vendo que estava isolado contra aquele grupo enorme de funcionário resolveu ficar quieto. Percebeu que as ações ali eram comandadas pelo “Sr. Cavalcanti” e pelo “Sr. Antônio Manoel” (…) Pode ver, ainda, que aqueles jovens que haviam ficado fora da sala de televisão, nos quartos, como representantes para acompanharem a revista, também foram muito agredidos por aqueles funcionários e foram obrigados e entrarem na sala de televisão onde estavam os demais. (…) O adolescente Cléber de Oliveira Costa tentou se esconder no quarto, num lugar chamado “colméia” que é um armário de alvenaria, onde guardam as roupas. O próprio “Padrão” apontou onde o adolescente estava e ele acabou sendo muito agredido pelos funcionários sem esboçar qualquer reação. O adolescente Samuel Belo Caetano, vulgo “Gordinho” é um dos internos mais antigos da casa e que nunca deu problema. Soube que ele acompanhava a revista do quarto n. 16 como representante e foi muito agredido (fls. 332/333).

Este depoimento foi por ele confirmado em juízo (fls. 1184/1186). Mas não é só. A agressão perpetrada contra os adolescentes que estavam nos quartos foi igualmente referida pela funcionária Átila. Nesse sentido:

Eu saí correndo, cheguei lá, cheguei na primeira grade que tem pra o quarto e tinha um menino saindo do quarto, sendo puxado, meio encolhido, se defendendo do monitor que estava dando murro, chutes, nesse adolescente, Ficou um tempo de gritaria, eu na grade, não lembro quem, mas um homem chegou: “sai daí, isso não é coisa para você ver”. E entrei. E os meninos apanhando… (fls. 1201).

4. Das agressões realizadas no pátio da unidade e das privações ocorridas nos dormitórios

Todos os internos foram recolhidos à sala de televisão. Ali permaneceram despidos, apenas de cuecas, e agachados. Foram insultados e alguns ainda continuaram a ser agredidos com golpes de pedaços de pau e barras de ferro. Em seguida, foram encaminhados até o pátio submetendo-se, no caminho, a um “corredor polonês”. Na área externa, foram obrigados a permanecer sentados no chão molhado – em decorrência da chuva – e compelidos a repetir frases de ordem. Já de madrugada, foram levados aos seus aposentos onde foram recolhidos apenas de cuecas. Permaneceram trancados, com as atividades suspensas, por vários dias. Saídas somente foram autorizadas por três vezes ao dia o que obrigou muitos a fazerem suas necessidades fisiológicas em garrafas plásticas e baldes que eram simplesmente deixados nos dormitórios. Nesse sentido, assinalou Rogério Amâncio:


Depois de baterem bastante nos internos, mandaram todos tirarem as roupas e entrarem em formação. Os funcionários, então, mandaram todos irem para o pátio e eles formaram uma espécie de “corredor”. De um lado a parede e de outro a fila de funcionários. Quando os internos passavam no meio, em direção ao pátio, muitos ainda foram agredidos recebendo pauladas e ferradas. No pátio foram colocados nus, um sentado junto a outro, no chão, o qual estava todo barrento. Ficaram muito tempo pelados, de cabeça baixa naquela posição, até que alguém chegou com uma lista com o nome dos internos e, conforme iam chamando o nome, tinham que levantar e ir para sua cela. Alguns, antes de entrar no xadrez, ainda levaram alguns golpes daqueles funcionários. (…) Depois desse dia, ficaram por volta de duas semanas trancados direto nas celas e tinham que urinar em garrafas de refrigerante, porque só podiam sair três vezes por dia para ir ao banheiro. (fls. 195).

Em sentido semelhante observou Rogério da Silva:

Aqueles funcionários depois de baterem bastante nos menores mandaram todos tirarem a roupa, colocaram todos em formação, uns sentados em fila uns colocados nos outros. Saíram daquela sala e ficaram sentados no barro, sem roupas, no pátio central por bastante tempo, sendo que aquele grupo de monitores ficava gritando: “Quem manda aqui?”, e os jovens tinha (sic) que responder que eram eles: perguntavam “Vocês são bandidos?”, e todos tinham que responder: “Não senhor”, e outras coisas deste tipo. Quem não respondia apanhava mais. (fls. 198/199).

As palavras e as frases de ordem que os internos foram obrigados a repetir, assim como as agressões efetuadas no pátio foram confirmadas por Flavio Martins (fls. 215), bem como por Osmar Praxedes (fls. 325) que, inclusive, apontou o adolescente Danilo como uma das maiores vítimas das agressões o que fez com que fosse levado, ainda naquela noite, ao pronto-socorro. A narrativa foi confirmada pelo próprio Danilo de Oliveira (fls. 269/270) que, ademais, questionou a autenticidade do histórico do boletim de ocorrência n. 3978/2000 (fls. 82/83), onde lhe foi atribuída a liderança do tumulto, em conjunto com Leandro da Silva e Carlos Deivison.

O funcionário Pedro Carlos Lourenço também presenciou os lamentáveis acontecimentos que se sucederam no pátio. Além das agressões, destacou a extrema violência empregada contra um adolescente de prenome Daniel que foi compelido, pelos funcionários, a raspar o bigode e o cavanhaque:

Os internos foram obrigados a entrarem em formação, sentados lado a lado, só de cuecas, cabeças baixas, no pátio central. Alguns funcionários passavam ainda pelos meninos e davam tapas principalmente na cabeça. Não chegou a ver algum jovem ser destacado da formação para apanhar. Nesta hora da formação lembra-se que o jovem de prenome Daniel, e que tem um forte físico mais avantajado e que usava bigode e cavanhaque foi intimidado por aqueles funcionários que achavam que ele era maior de dezoito anos. Na base da agressão, obrigaram o referido adolescente a fazer a barba raspando o bigode e o cavanhaque, na frente de todos os funcionários. (…) O depoente pode ver que quase todos os internos estavam machucados em razão daquelas pauladas que levaram, principalmente com marcas nas costas. Depois de um certo tempo os adolescentes foram encaminhados nos quartos e trancados só de cuecas. (fls. 333/334).


Idêntica narrativa foi por ele apresentada por ocasião de depoimento colhido nos autos do procedimento administrativo instaurado pelo Departamento de Execuções da Infância e Juventude da Comarca da Capital (fls. 1566) e, também nestes autos sob o crivo do contraditório (fls. 1186/1187):

MP: Presenciou ou tomou conhecimento de um adolescente que usava bigode e cavanhaque e foi obrigado a raspar sob vigilância?

D: Ocorreu na minha frente. Ele foi obrigado a raspar na minha frente pelos funcionários.

MP: Depois da sessão generalizada de pancadaria foram obrigados a ficar de cueca?

D: Foi. Isso aconteceu na sala de TV. Depois que dominaram os adolescentes, fizeram ficar de cueca, para que fizessem fila e saíssem para o pátio e sentassem no pátio.

MP: No pátio tiveram que ficar abaixados com as mãos na cabeça, dominados?

D: Foi.

MP. Foi feito corredor polonês?

D: Foi.

MP: O pátio estava molhado onde foram colocados?

D: Não me recordo.

MP: Lembra se estava frio?

D: Estava frio.

MP: Foram dirigidas ofensas morais, xingaram?

D: Alguns xingaram.

Vários dos funcionários que exerciam atividades na unidade 27 da Raposo Tavares e que não mais se encontravam no local quando das agressões em razão do encerramento do turno de trabalho, ao retornarem no dia 16 de novembro – após o feriado do dia 15 – depararam-se com uma situação atípica. Os adolescentes estavam trancados em suas celas com suas atividades regulares suspensas e impedidos de manter qualquer contato. Mesmo assim, alguns funcionários conseguiram conversar com alguns internos pelas grades dos dormitórios. Foi quando então tomaram conhecimento do incidente ocorrido no dia 14 e de todas as agressões perpetradas pelos funcionários de outras unidades.


É o que assinalou Glayds Romeo (fls. 1288/1304) que, na época ocupava o cargo de assistente técnica na Febem. De acordo com o seu relato, várias das roupas recolhidas dos adolescentes por outras funcionárias apresentavam vestígios de sangue e fezes o que despertou a preocupação e desconfiança de um espancamento generalizado. Somente durante a vistoria efetuada pelos Promotores de Justiça é que ela pode ingressar nos dormitórios quando, então, viu os baldes e as garrafas com urina e fezes. Foi nessa mesma oportunidade que tomou conhecimento de maiores detalhes do incidente. Observou que todos os menores apresentavam versão harmônica o que fez acreditar na veracidade de seus relatos. É o que asseverou quando de seu depoimento perante o Departamento de Execuções da Infância e Juventude:

Depois da intervenção ministerial, a depoente conseguiu ter acesso aos quartos e conversar com os internos, notando que todos eles apresentavam versões harmônicas sobre os fatos que haviam ocorrido. Todos eles de forma uníssona, relataram terem sido agredidos e espancados por funcionários da Febem, sobretudo os funcionários de Franco da Rocha. A depoente convence-se da veracidade dos depoimentos dos internos porque eles não haviam ainda, naquela altura, conversado entre si, de sorte que a versão harmônica apresentada reforçou a veracidade dos fatos por ele contados. Além disso, a depoente pessoalmente constatou que vários adolescentes apresentavam ferimentos graves, inclusive na região das costas. (fls. 1578).

Fez importante referência sobre o comportamento dos funcionários da unidade de Franco da Rocha os quais eram notoriamente conhecidos pela truculência com que atuavam em situações semelhantes. É o que se infere do seguinte trecho destacado de seu depoimento prestado durante a instrução (fls. 1294/1295):

…não se chama os monitores de Franco da Rocha para fazer revista, chama-se com esse propósito, é um grupo preparado para isso.

P: Esse grupo de funcionários é preparado para essa punição?

D: Sim, pela incidência de casos que tenho ouvido no Tatuapé.

P: O grupo de Franco da Rocha está presente para resolver?

D: Sim, esses meninos citam muito os nomes, uns que eu não conhecia, Cavalcante, Porfírio. É uma prática na fundação chamar o pessoal de Franco da Rocha que eles chamam assim: “O Cavalcante e seus capangas.”

Idêntica informação foi por ela fornecida em depoimento judicial prestado perante o Departamento de Execuções da Infância e da Juventude:

Reitera a depoente que não havia a necessidade alguma da intervenção noturna na UI-27, muito menos de serem convocados funcionários de Franco da Rocha, que sabidamente são “truculentos”, notoriamente conhecidos dentro da própria Fundação Estadual como pessoas dadas à práticas de agressões e sessões de tortura contra os adolescentes. Havia uma visível “vontade de punir” os adolescentes da UI-27 diante das freqüentes fugas porque passavam então aquela unidade (fls. 1577).


A anormalidade reinante na unidade após o incidente também foi constatada por Ana Regina Lambert (fls. 1392/1402) que, na época, exercia as funções de psicóloga na unidade de Raposo Tavares. Assim que retornou à unidade no dia 16 notou que as atividades educativas haviam sido suspensas e que os adolescentes estavam recolhidos em seus quartos. Observou, em alguns deles, ferimentos próprios de agressão. No mesmo sentido foi o depoimento prestado por Ana Elizabeth Meyer que também ocupava o cargo de psicóloga (fls. 1716/1717). Ferimentos também foram notados por Silvana Bassi, que desobedecendo a ordem de não manter contato com os internos, acabou conversando com alguns deles pelas janelas. Foi quando tomou conhecimento dos detalhes da agressão. Vale destacar, nesse sentido, o seguinte trecho:

Na sexta-feira a depoente acabou por desobedecer aquela ordem de não conversar com eles porque quando passou pela área externa os adolescentes gritaram pela janela pedindo a presença da depoente. A depoente se aproximou de algumas janelas dos xadrezes e aí os internos começaram a contar que haviam sido agredidos durante aquela revista da madrugada e que eles haviam sido “quebrados”. A depoente chegou pela janela a ver um adolescente, salvo engano, Rodrigo de Almeida, com uma tala no braço e com os olhos meio arroxeados. Pode citar ainda Vagner Ribeiro que chegou a mostrar os braços que apresentavam lesões e hematomas e ele disse que estava todo machucado. (fls. 225).

Sônia Abukater, coordenadora pedagógica, além de confirmar a suspensão das atividades informou que o primeiro contato mantido com os internos ocorreu somente durante a inspeção do Ministério Público. Foi quando, então, viu os ferimentos e os sinais de que as necessidades fisiológicas estavam sendo feitas em invólucros nos próprios dormitórios. Nesse sentido, destaca-se o seguinte trecho (fls. 1404/1405):

J: A senhora percebeu alguma anormalidade?

D: Eu só fui vê-los para perceber alguma coisa, depois que o Ministério Público veio para a Unidade. Foi por volta do dia 22 (…) Eles não tinham ido do dia 16 que eu os encontrei até o dia 22, eles não tinham saído do quarto. Nesse dia eu pude entrar no ambiente, porque eles não ficavam próximos. Nesse dia eu pude entrar e perceber como eles estavam e aí vi que eles tinham marcas.

J: A senhora constatou ali no local onde eles ficavam internos, se havia sinais de micção no local, de feitura de necessidades, no próprio local de dormitório?

D: Sim.

A inspeção do Ministério Público a que fez alusão sobredita testemunha foi realizada oito dias após o evento, mais precisamente, no dia 22 de novembro, após denúncia anônima dando conta do espancamento generalizado dos internos. O ato foi formalizado em ata (fls. 18/21) na qual foi consignado um quadro detalhado da situação encontrada na unidade educacional 27, em especial os ferimentos em alguns adolescentes e a utilização de recipientes plásticos para que as necessidades fisiológicas pudessem ser feitas. Quanto a estes, aliás, as fotografias de fls. 101, 113/114 e 117 constituem retrato fiel. Pelo apurado ao longo da instrução, nenhum outro incidente teria ocorrido por aqueles dias de modo que as constatações registradas constituem importante fonte de prova sobre as possíveis conseqüências das agressões. É o que se infere do seguinte trecho:


…10) que 38 internos apresentavam equimoses e escoriações por diversas partes do corpo. Informalmente, de forma uníssona, os adolescentes André Brito da Silva, Nicolau Antonio de Carvalho Neto e os demais internos relataram que no dia 14.11.pp, por volta das 23:30 h, no interior da sala de TV, estavam reunidos com os monitores Pedro e Padrão, avaliando os acontecimentos que culminaram com as fugas e recapturas de internos naquela dia, quando observaram a chegada no local de vários monitores oriundos de outras unidades educacionais sediadas no município de Franco da Rocha. Os internos reconheceram alguns monitores integrantes deste grupo (como por exemplo, o Sr. Porfírio, Sr. Hudson, Sr. Cavalcante, entre outros) como sendo espancadores de adolescentes em outros episódios ocorridos no Complexo Imigrantes, nos Cadeiões de Santo André/Pinheiros e em algumas unidades educacionais do circuito grave do Complexo Tatuapé, pelo que se recusaram a atender o pedido dos dois monitores para fecharem a porta da sala de TV, quando, então, foram surpreendidos com a invasão daquele recinto pelos monitores de Franco da Rocha, os quais, armados com pedaços de ferros e madeiras que traziam escondidos por debaixo das vestes, passaram a agredir todos os que se encontravam na sala, indiscriminadamente, inclusive o monitor Pedro que tentou intervir em favor dos internos; 11) que os internos estão confinados nos quartos há 7 dias e utilizam garrafas e baldes plásticos para urinarem. Vários internos disseram que haviam defecado nos recipientes acima, pois não estavam sendo atendidos pelos monitores quando estes eram chamados para levá-los ao banheiro.

5. Da subsunção dos fatos ao tipo penal

Como é assente, a tortura, pelos meios que a cercam, representa um grave ataque à dignidade do ser humano. Sempre esteve associada à imposição de agudos sofrimentos físicos e psicológicos, no mais das vezes – embora não exclusivamente -, àqueles sobre os quais recaia uma aura de suspeição de envolvimento em ilícitos penais. Nesse sentido, tinha por escopo a obtenção da confissão, reputada prova fundamental para o deslinde do processo. O repúdio a tais práticas galgou a arena internacional somente em meados do século XX após a humanidade ter sido palco das barbáries cometidas por ocasião da Segunda Guerra Mundial. A partir de então, multiplicaram-se os documentos internacionais de proteção dos direitos humanos. Assim, os valores da dignidade humana, da vida e da liberdade – dentre outros – deixaram de constituir interesse meramente doméstico passando a integrar uma moral universal sob a qual todos os Estados nacionais deveriam estar jungidos. Inicialmente, os instrumentos jurídicos tinham natureza meramente declaratória. Constituíam uma afirmação de valores que deveriam ser perseguidos pelos diversos Estados. Posteriormente, o sistema ganhou força e efetividade. Foi o momento da instituição de Tribunais Internacionais voltados para o resguardo da obediência dos direitos humanos em nível regional. São os exemplos da Corte Européia e da Corte Americana de Direitos Humanos. A proibição da tortura sempre foi objeto de preocupação do legislador interacional. Atestam-na a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 [1], o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966 [2] a Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica) [3] e a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes de 1984 [4], apenas para citar alguns exemplos.

No plano interno, a tortura posta-se em flagrante confronto com os fundamentos do Estado brasileiro (art. 1o, III da CF) tanto que foi expressamente coibida pelo legislador constitucional, proibição esta erigida à condição de cláusula pétrea porquanto inserida no rol dos direitos e garantias fundamentais (art. 5o, III da CF). A importância dada ao tema mereceu do constituinte ainda o estabelecimento de um regime jurídico rigoroso no qual foi vedada a possibilidade de concessão de fiança, de graça ou indulto aos envolvidos na prática da tortura (art. 5o, XLIII da CF). O sistema é, portanto, coeso. Tortura não convive, e jamais poderá conviver, em um Estado que se auto-intitule de Direito. É o que leciona Celso Ribeiro Bastos[5]:


A tortura é, portanto, algo degradante da condição humana e não reúne condições de poder ser aplicada dentro do Estado de Direito que respeite as garantias individuais. É por isso que o texto constitucional no art. 5o, III, deixa claro que ninguém será submetido a tortura: portanto, exclui a tortura como meio possível de se utilizar, nem que seja com vistas ao atingimento de um fim desejável, como a descoberta de um criminoso ou, mesmo, de uma vítima de seqüestro.

Nesse cenário, a Lei n. 9.455/97 preencheu o que até então constituía uma indesculpável lacuna para o princípio da legalidade penal, qual seja, a tipificação do crime de tortura. Fê-la em seis condutas denominadas pela doutrina como: tortura-prova, tortura como crime-meio, tortura racial ou discriminatória, tortura-pena ou castigo, tortura do encarcerado e omissão frente à tortura[6]. No caso posto a julgamento, a questão volta-se para o exame da ocorrência das elementares da tortura-castigo (art. 1o, II)[7].

Seja como for, o fator característico da tortura, e que a distingue de outros ilícitos tais como o da lesão corporal e dos maus tratos, repousa no evento produzido: intenso sofrimento físico ou mental. A expressão, considerada por alguns exageradamente ampla, na verdade apenas consagra ditames internacionalmente estabelecidos. Veja-se a propósito a definição dada pela Convenção contra a Tortura de 1984[8]. O preenchimento de tal elementar deve, portanto, ser aferido em cada caso, mediante criteriosa análise judicial fundada na apreciação da intensidade dos atos praticados e da condição pessoal da vítima ou vítimas. É, aliás, o critério consagrado pela Corte Européia de Direitos Humanos no caso Irlanda versus Reino Unido (1978)[9].

O intenso sofrimento é, portanto, o sofrimento excessivo, extremamente rude e que excede os limites do suportável, tendo em vista o fim perseguido pelo agente e as condições pessoais de cada vítima[10]. Ou ainda como bem aponta João José Leal[11]: Na verdade, do ponto de vista ético-cultural, a tortura tem um significado que vai além do seu sentido semântico, expresso na ação de constranger com violência ou grave ameaça capaz de causar sofrimento físico ou mental. É que a tortura tem sido concebida como uma categoria perversa de conduta humana, caracterizada pela intenção de causar dor e suplícios insuportáveis e despropositados na pessoa da vítima. Geralmente pressupõe a reiteração de atos marcados pela crueldade, e seu autor, quando não atua por motivos de ordem política, ou com fins policialescos, revela com freqüência ser portador de personalidade psicopática. Em qualquer caso, a tortura será sempre marcada subjetivamente pela vontade de causar um sofrimento extremo e insuportável na pessoa da vítima.

É importante ressaltar não ser necessário que dela resultem lesões corporais visíveis. Aliás, muitos dos métodos da tortura são infligidos de tal maneira que a vítima não apresenta, posteriormente, vestígios daquela prática. Em realidade, o legislador contentou-se, nas figuras simples, com a provocação de uma dor intensa. Como anota Heráclito Mossin[12]: de outro lado, é oportuno deixar advertido que, para a configuração da violência física a que faz alusão o preceito penal, não se torna imprescindível que a vítima tenha suportado lesões corporais. Qualquer alteração anatômica provocada na integridade física da vítima ou quando houver ofensa à sua saúde é conseqüência imediata da vis corporalis motivo pelo qual sua ausência não descaracteriza a violência em apreço. É suficiente para transgredir o preceito penal a violência física, independentemente de sua conseqüência imediata.


É nesse exato ponto que reside, fundamentalmente, o traço distintivo entre o crime de maus tratos e o de tortura. Com efeito, o primeiro é delito de perigo. Ou seja, a vontade do sujeito ativo volta-se para maltratar alguém, expondo a perigo sua vida ou saúde. É a clássica lição de Nelson Hungria[13]: o crime de maus tratos, em qualquer de suas modalidades, é crime de perigo: necessário e suficiente para a sua existência é o perigo de dano à incolumidade da vítima. Segundo observa Hafter (…) “o agente deve ter criado para a vítima uma situação que faça esperar ou temer a superveniência de um dano à saúde”. Se ocorre efetivo dano cumpre distinguir: se se trata de lesão corporal de natureza leva (excluído, é claro, o animus vulnerandi), o crime persiste como maus tratos na sua forma simples; se se trata porém, de lesão corporal de natureza grave ou de morte, o crime é qualificado, na conformidade dos parágrafos primeiro e segundo do art. 136. (…) O elemento subjetivo ou dolo específico do crime em questão é a vontade consciente de maltratar o sujeito passivo de modo a expor-lhe a perigo a vida ou saúde.

Por sua vez, na tortura-castigo, crime de dano – exige, pois, o resultado naturalístico -, a vontade do agente está dirigida à produção de um intenso sofrimento que é causado em virtude do ato de “submeter” – dominar, vencer ou subordinar – “alguém” – pessoa determinada – “mediante emprego de violência ou grave ameaça” – a um agudo sofrimento – físico ou mental – como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. É o que observa Alberto Silva Franco[14] ao depurar, com a precisão característica, as várias elementares do delito: os dois verbos (constranger e submeter) necessitam ser complementados. O objeto direto de um e de outro é designado pelo vocábulo alguém. Destarte, o constrangimento ou a submissão devem ser exercidos sobre “alguém”, isto é, sobre uma certa pessoa. A determinação do objeto direto não se revela contudo, suficiente para expressar os contornos dos comportamentos delituosos. É mister que se efetue a complementação das ações tipificadas com a referência ao objeto indireto. Não basta, portanto, “constranger” ou “submeter” “alguém” (…) Ora, o “sofrimento físico ou mental” constitui o elemento necessário de complementação das ações enunciadas. (…) não representam, contudo, o esgotamento da estrutura típica comum às duas formas de tortura. Há ainda um adjunto adverbial de modo que deve, necessariamente acompanhar os procedimentos executados, ou seja, o emprego de violência ou grave ameaça.

Dessa forma, além do critério objetivo representado pela intensidade do sofrimento causado, a diagnose do elemento psicológico é crucial para delimitar a linha divisória entre o delito de maus tratos e a tortura. Quando a intenção do agente tiver sido dirigida à imposição de um sofrimento cruel e não de simples correção e disciplina, o fato estará subsumido ao tipo penal da tortura. É, aliás, o que já restou decidido:

A questão dos maus-tratos e da tortura deve ser resolvida perquirindo-se o elemento volitivo. Se o que motivou o agente foi o desejo de corrigir, embora o meio empregado tenha sido desumano e cruel, o crime é de maus-tratos. Se a conduta não tem outro móvel senão o de fazer sofrer, por prazer, ódio ou qualquer outro sentimento vil, então pode ela ser considerada tortura (TJSP. AC. Rel. Canguçu de Almeida, RJTJSP 148/280).

Pois bem. O caso em apreço não pode ser decomposto em várias partes independentes entre si. Na verdade, as sucessivas agressões que foram descritas de maneira uniforme pelas vítimas e praticadas na sala de televisão, nos dormitórios quando da revista, no trajeto para o pátio e deste de volta para os aposentos estão interligados e compõe um único contexto. A forma como os atos foram seguidamente praticados denotam uma vontade comum, que extrapolou o senso do mero resgate da disciplina. Em realidade, os lastimáveis acontecimentos ocorridos na noite do dia 14 de novembro de 2000 e na madrugada do dia 15 na UE-27 do Complexo da Raposo Tavares da Febem compõem um fato que encontra perfeita adequação ao tipo penal previsto no artigo 1, inciso II da Lei n. 9.455/97 não se podendo cogitar de meros maus tratos ou de simples lesões corporais.


É inegável que a situação da unidade nos dias anteriores aos fatos e no próprio dia 14 era de total descontrole. Fugas em massa, confrontos e atos de indisciplina constituíam o quadro reinante. Por esse prisma, de fato, se fazia necessária a adoção de medidas eficazes e urgentes que pudessem restabelecer o senso de ordem. Mas ainda que a intenção inicial fosse de apenas efetuar uma revista, é certo que o reforço recaiu justamente sobre funcionários afamados, dentro dos próprios quadros da FEBEM, pela truculência (depoimento de Glayds Romeo – fls. 1294/1295). Muitos deles, aliás, foram reconhecidos pelos internos em razão de incidentes ocorridos em outras unidades (declarações de Rogério Amâncio – fls. 194 -, de Rogério da Silva – fls. 197 -, de Reginaldo Carneiro – fls. 200 -, Felipe Martins – fls. 214 – e Cléber de Oliveira – fls. 218). Daí o receio que algo mais grave pudesse ocorrer. Os acontecimentos que se sucederam demonstraram que o temor de alguns internos tinha total procedência. Aglomeraram-se, então, no portão de entrada daquela unidade. Em realidade, foi esta a única situação mais tensa verificada naquela ocasião e que acabou sendo contornada após um acordo onde foram estabelecidos os termos da revista. No mais, não houve qualquer tentativa de tomada dos funcionários que estavam na sala de televisão como reféns. A questão foi amplamente rechaçada, tanto pelos adolescentes como também pelos próprios funcionários Pedro Carlos Lourenço (fls. 332 e 1185) e Antonio Carlos Padrão (fls. 1729). Ambos mencionaram que a situação estava tranqüila e que apenas dialogavam com os internos já que eram monitores daquela unidade. Não havia, portanto, razão para que a sala fosse invadida e os internos espancados. Não estavam armados. E ainda que fosse possível imaginar uma errônea percepção da realidade – o que não era sustentado pelas evidências -, qualquer tentativa de justifica-la resta totalmente fragilizada diante das agressões concomitantemente realizadas contra os adolescentes destacados para acompanharem a revista nos aposentos e, portanto em outro local daquela unidade.

Na sala, as agressões foram indiscriminadas e efetivadas com golpes de pedaços de pau e de ferro. Todos os adolescentes fizeram menção ao uso de tais instrumentos. Há coerência e uniformidade em seus relatos o que desqualifica as afirmações em sentido contrário. Aliás, o funcionário Pedro Carlos acabou sendo uma das vítimas. Ao tentar impedir a ação foi golpeado em sua mão (fls. 331). Este fato foi referido, também, por Glayds Romeo (fls. 1296) e por Sônia Abukater (fls. 1409) que o viu sendo medicado na enfermaria. A absoluta desarazaoabilidade no emprego dos meios restou caracterizada pelo funcionário Antonio Carlos (fls. 456) e pelo adolescente Jackson (fls. 382) o que desqualifica qualquer versão de confronto mútuo. Ambos, instintivamente, procuraram defender-se dos sucessivos golpes colocando as mãos na cabeça. Aliás, Antonio Carlos mencionou que vários adolescentes caíram sobre ele após os golpes o que é sinal claro da intensidade das agressões. A intenção, portanto, não era de restabelecer a ordem, mesmo porque, naquele instante não havia qualquer perigo à integridade dos funcionários da unidade que apenas conversavam com os internos naquela sala.

O fato é que estes acontecimentos não foram isolados. Com efeito, o outro grupo menor de adolescentes que acompanhava as revistas nos aposentos juntamente com os funcionários destacados das outras unidades também foi sistematicamente agredido e também com golpes de madeira e ferro, sem que, para tanto, qualquer sinal de rebeldia tivesse sido demonstrado. Tais circunstâncias apontam para uma ação orquestrada e não acidental. Aliás, o exagero e a covardia da ação foi objeto das narrativas dos adolescentes Reginaldo Carneiro Vilar (fls. 200/201) e Cléber de Oliveira (fls. 219) e testemunhados por Pedro Carlos (fls. 332/333 e fls. 1184/1186) e por Átila (fls. 1201). Na verdade, alguns internos foram resgatados do interior de seus aposentos e levados, sob agressões, até a sala de televisão. Foram inclusive submetidos ao chamado “corredor polonês”. Definitivamente, não são atos que possam ser subsumidos aos maus tratos ou ao crime de lesões corporais. Não se pretendia expô-los, apenas, a uma situação de perigo ou de ofender suas integridades físicas. Em realidade, inconformados pelo clima de indisciplina dos dias anteriores, os funcionários das outras unidades, mediante tais expedientes, pretenderam restabelecer o que para suas óticas correspondia ao senso de ordem e hierarquia. Para tanto, adotaram a tática da imposição da força e do sofrimento. Daí a forma pela qual as agressões foram executadas. Fica aqui bem evidente o especial fim de agir representado pelas elementares “como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo”. Queriam castigá-los pelos incidentes anteriores. Queriam também evitar que as ações se repetissem nos dias subseqüentes.


Os fatos que se seguiram reforçam sobredita conclusão. Com efeito, todos foram despidos e apenas de cuecas levados até o pátio externo onde foram obrigados a permanecer sentados no chão molhado. Ali foram obrigados a gritar palavras e frases de ordem expressivas de uma relação hierárquica entre os internos e o corpo funcional da FEBEM. Aqueles que se recusavam a pronunciá-las eram novamente agredidos também com golpes de madeira. Em seguida, foram encaminhados aos seus aposentos sendo submetidos, uma vez mais, ao “corredor polonês”. Lá foram trancados apenas com as roupas de baixo e molhadas.

Esta sucessão de agressões, que não podem ser partilhadas entre si, demonstram que o objetivo não era o da mera contenção de ânimos. Em realidade, a intenção foi a de impor um sofrimento físico que pela forma de execução – golpes de madeira e ferro nas costas, braços, mãos e pernas, tapas, “corredor polonês”, permanência no chão molhado – e condições pessoais das vítimas – adolescentes entre os quinze e os dezessete anos – os qualifica como intenso. A intensidade, esclareça-se, não está vinculada, exclusivamente, ao fator temporal. Também a indica o modo de execução. Ou seja, um meio extremamente doloroso pode subsumir-se ao crime de tortura ainda que tenha sido empregado por ínfimos minutos. De qualquer modo, no caso em tela, os funcionários lá permaneceram na unidade por várias horas – entre as 23:00h do dia 14 de novembro até as 03:00h da madrugada do dia 15. Ainda que as agressões não tenham sido verificadas durante todo este tempo, certamente o expediente – agressões na sala e nos aposentos, condução mediante agressões até o pátio, permanência em um chão molhado apenas com vestes íntimas e retorno aos dormitórios, também sob agressões – tomou boa parte dele.

É, note-se, a versão que emerge da prova colhida. Os relatos dos adolescentes convergem para o mesmo sentido. Obviamente, a riqueza de detalhes das narrativas foi consideravelmente maior na fase preliminar em razão da proximidade temporal com os fatos. De qualquer modo, as narrativas não foram infirmadas em juízo. Muito pelo contrário. Tome-se como exemplo as declarações de Rogério Amâncio (fls. 1083), Nicolau Antonio (fls. 1162/1164) e Rogério da Silva (fls. 1273/1281). Caso os internos estivessem imbuídos por sentimentos desprezíveis de desforra e vingança teriam feito acusações a esmo incluído nelas os funcionários da própria unidade em que estavam recolhidos. No entanto, jamais fizeram qualquer afirmação nesse sentido. Seguidamente apontaram os funcionários destacados de outras unidades como os responsáveis pelos atos. Esta uniformidade e coerência são importantes fatores para assegurar a credibilidade de suas assertivas. Ou seja, as agressões não foram produto de uma imaginação coletiva. Assim como não foi obra de imaginação os fatos presenciados pelo funcionário Pedro Carlos e por ele corajosamente relatados em sucessivos depoimentos (fls. 1181/1198). Não foram produto de devaneio, igualmente, os gritos ouvidos e as agressões presenciadas pela testemunha Átila (fls. 1189/1216). Tampouco foram obra de alucinação os relatos ouvidos dos adolescentes e os ferimentos vistos pelas funcionárias Silvana Bassi (fls. 225), Ana Regina Lambert (fls. 1392/1402), Sônia Abukater (fls. 1404/1405) e Ana Elizabeth Meyer (fls. 1716/1717), assim como pelos representantes do Ministério Público quando da visita de inspeção. Por sua vez, não constituem miragem as fotografias de fls. 115/116 e 118 e as imagens constantes na fita de vídeo de fls. 99.

A bem da verdade, são as negativas dos réus e os depoimentos prestados por José Maria Ferreira (fls. 2006/2013), Carlos Otávio (fls. 2014/2022), Cléber Fernandes (fls. 2023/2032), Wilson Ornaghi (fls. 2028/2032), Josiva Justino (fls. 2033/2037), Domingos Ferreira (fls. 2042/2045) e Rogério Luiz da Silva (fls. 2058/2067) que não se harmonizam com o restante da prova colhida. Estes depoimentos, aliás, devem ser examinados com reservas. Afinal, integravam eles o grupo de funcionários destacados de Franco da Rocha e que juntamente com os réus efetuaram a “revista” na UE-27. Não seria natural que admitissem a prática da sessão de espancamentos. Aliás, se assim procedessem estariam, de forma indireta, se auto-incriminando. É justamente este fator que impede seja aqui determinada qualquer providência contra eles para a averiguação de falso testemunho. Com efeito, não podem ser tratados com os rigores de uma testemunha sobre a qual recai o compromisso de dizer a verdade. Qualquer providência nesse sentido poderia resvalar na violação da garantia da não auto-incriminação. Em realidade, sobre eles pesaram suspeitas que não foram erigidas à condição de indícios por não terem sido reconhecidos quando da apuração preliminar. Nesse ponto, vale lembrar ter o próprio Ministério Público, quando do oferecimento da denúncia, requerido a continuidade das investigações para apuração da participação dos outros funcionários não denunciados (fls. 617). Este estado de coisas somado à absoluta desconexão de suas narrativas frente aos outros elementos de convicção é que enfraquecem a credibilidade que poderia ser outorgada às suas afirmações.


Quanto à materialidade, como já observado, os sinais visíveis não constituem conseqüência automática e natural da tortura. Isso porque muitas vezes são empregados métodos que infligem agudo sofrimento à pessoa sem que vestígios possam ser detectados em um exame ocular. De qualquer modo, os exames periciais realizados por requisição do Ministério Público, dez dias após os fatos, e firmados por dois peritos oficiais apuraram inúmeros ferimentos absolutamente compatíveis com o histórico das agressões narradas pelos adolescentes, tais como escoriações, equimoses e hematomas na região lombar, dorsal e nos braços. É o que restou confirmado em Vanderlei Ferreira (fls. 151), Rony Peterson (fls. 150), Ricardo Alves (fls. 148), Jorge Luiz Batista (fls. 146), Reginaldo Carneiro Vilar (fls. 144), Leandro da Silva (fls. 145), Paulo Henrique Vieira (fls. 153), Kleber de Oliveira Costa (fls. 154), Eduardo Francisco dos Santos (fls. 155), Rogério da Silva Fonseca (fls. 143), Roberto Maurício Correia (fls. 156), Jackson de Oliveira Batista (fls. 142), Jonathas Rodrigues dos Santos (fls. 158), Fábio Aparecido Soares (fls. 159), Osmar Praxedes da Silva (fls. 160), Danilo de Oliveira Silva (fls. 161), Jackson Willy Moreira Santana (fls. 162), Dorival Rodrigues da Mata Filho (fls. 163), Patrick Ernandes Geciunas (fls. 165), Thiago Carlos dos Anjos Brito (fls. 166), Adauto Bezerra da Silva Filho (fls. 167), Rogério Amâncio da Silva (fls. 168), Andrey Aparecido dos Santos (fls. 170), Ronaldo Caetano Ribeiro (fls. 172), Felipe Martins (fls. 140) e Samuel Belo Caetano (fls. 174).

Nesse ponto, a tentativa de vinculá-los aos procedimentos de recaptura não vingou. De fato, funcionários daquela unidade mencionaram que vários dos adolescentes feridos não haviam tomado parte nas fugas anteriormente ocorridas. Veja-se, a propósito, o depoimento de Pedro Carlos Lourenço (fls. 1183), de Glayds Romeo (fls. 1291) e de Ana Regina Lambert (fls. 1397/1398).

Por conseguinte, o fato de não terem sido apuradas lesões em José Augusto do Prado (fls. 149), Cleiton Aparecido Uliani (fls. 147), Rodrigo Leite de Oliveira (fls. 157), Reginaldo Rodrigues Dias (fls. 169), Michel Alves dos Santos (fls. 171), Renato D´Avila da Silva (fls. 173) e Cleiton Davidson Ramos Alves não pode ser significativo de que não tenham sido submetidos às sucessivas agressões. Afinal, conforme amplamente apurado, todos os adolescentes que estavam internados foram indistintamente submetidos as mais variadas formas de agressão. Uns na sala de televisão. Outros nos aposentos. Houve ainda o emprego do denominado “corredor polonês” em duas oportunidades – quando eram encaminhados ao pátio e posteriormente quando retornaram aos aposentos. Além disso, todos foram compelidos a permanecerem sentados de cuecas no chão do pátio externo que se encontrava molhado pela chuva.

A acusação, todavia, comporta uma correção no que se refere à prática de tortura em desfavor dos adolescentes Rodrigo da Silva Almeida e Everton do Prado Floriano. Com efeito, de acordo com o apurado nos autos o primeiro encontrava-se no pronto socorro quando do evento por conta de lesões sofridas quando de sua fuga na tarde do dia 14 de novembro. Somente retornou à unidade no dia seguinte quando tomou conhecimento, pelos outros internos, do lamentável incidente (fls. 1263/1268). Já o segundo, quando foi ouvido perante a Promotoria da Infância e Juventude (fls. 217), disse ter pernoitado no 75o Distrito Policial após ser recapturado por policiais militares. Retornou à unidade no dia seguinte quando as agressões já haviam sido executadas.

A alegação de que as condutas não foram individualizadas não merece prosperar. Ao contrário, a denúncia narrou, com suficientes detalhes obtidos após rigorosa apuração preliminar, toda a cronologia dos acontecimentos, bem como o meio e o modo pelos quais as sucessivas agressões foram realizadas. Outrossim, foram indicadas nominalmente as vítimas. Ora, não seria possível, dada à dimensão dos fatos – quantidade de funcionários envolvidos e dos adolescentes internados – discriminar, com exatidão, a quantidade de golpes desferidos em cada uma das vítimas. Uma exigência de tal magnitude conduziria à impossibilidade de exercício da ação penal e, por conseguinte, da efetivação do poder-dever punitivo estatal. De mais a mais, não guardaria qualquer respaldo com as circunstâncias que cercaram o presente caso. Com efeito, as “pauladas” foram generalizadas, indiscriminadas e realizadas em diferentes ocasiões. A denúncia já fazia menção a tal circunstância o que restou confirmado ao cabo de regular instrução.


De qualquer modo, no curso do processo judicial, foram os acusados submetidos, em diferentes oportunidades, a reconhecimento pessoal que resultou positivo para os seguintes réus: Francisco Antonio Teodoro, Airton Veríssimo da Costa, Nevair Vital Pimenta, Adilson Tadeu de Freitas, Paulo César Porfírio Vicente, Rubens Alves da Silva, Eduardo de Souza Filho, Ubaldo Pereira de Barros, Marco Aurélio Garcia Montovan e João Batista Gomes Pereira. Nesse ponto, foram confirmados os reconhecimentos fotográficos realizados quando da apuração preliminar o que confere o estado de certeza necessário quanto à autoria. O mesmo não foi verificado com os demais réus. Contra eles pesa apenas o reconhecimento fotográfico que embora tenha servido de sustentáculo para a configuração do fumus comissi delicti e ajuizamento da ação penal não é suficiente para fixar um juízo de convicção segura sobre a autoria. Em favor deles deve prevalecer a máxima in dubio pro reo.

O raciocínio não se aplica aos réus Francisco Gomes Cavalcante que, à época respondia pelo Gabinete de Diretoria Técnica, e a Antonio Manoel de Oliveira, Diretor do Complexo de Franco da Rocha. Ora, de acordo com o apurado, o primeiro foi um dos grandes responsáveis pela articulação do grupo de funcionários que ingressou na UE-27 sob o pretexto de fazer uma revista. O segundo, por sua vez, era o superior hierárquico imediato daqueles funcionários. Ambos estavam no interior da unidade quando todas as agressões foram efetuadas. É o que assinalou Pedro Carlos Lourenço (fls. 327/335 e fls. 1193) e Átila (fls. 1202). Sob argumento de que uma suposta “intervenção” estava ali sendo efetuada impediram que os funcionários daquela unidade agissem. No mínimo, em razão dos altos cargos que ocupavam deram suporte moral para que o espancamento generalizado fosse executado. Seus subordinados sentiram-se amparados certos de que não sofreriam punições pelos abusos. Assim agindo concorreram ambos para a prática da tortura.

Das diversas ações praticadas somente não pode ser atribuída aos réus a privação de condições mínimas para a higiene pessoal, verificada nos dias que se seguiram ao evento. Com efeito, conforme apurado nos autos, os sobreditos réus saíram daquela unidade na madrugada do dia 15 de novembro após os adolescentes terem sido recolhidos aos seus aposentos. Não retornaram posteriormente. Não há, ademais, certeza sobre quem teria partido tal ordem. Por outro lado, não se pode presumir tenha ela sido determinada por Francisco Gomes Cavalcante simplesmente porque era ele o responsável pelo Gabinete de Diretoria Técnica. De qualquer modo, as diversas ações que remanescem são mais do que suficientes para subsumirem-se ao tipo penal da tortura.

Com efeito, assim agindo os réus submeteram – dominaram, subjugaram e sujeitaram – os internos da UE-27 da FEBEM, mediante violência física, a intenso sofrimento. Tinham sobre eles uma relação de autoridade – poder de mando decorrente de normas de direito público. Afinal, eram monitores e funcionários graduados de instituição pública estabelecida em lei para a internação e recuperação de menores infratores. Objetivaram impor castigo pessoal – punição e penalidade – em razão das sucessivas fugas e revoltas ocorridas anteriormente. Aliás, como observa Heráclito Mossin[15], o castigo pessoal pode ser instrumentalizado de várias maneiras: espancamento, surras, choques elétricos, privação de alimentos, privação de higiene, tormentos psicológicos, sempre voltado à correção de quem dele é vítima. Se a vontade do agente não está direcionada no sentido de propiciar castigo, correção ou emenda pessoal, o delito em questão não estará caracterizado, podendo o agente responder por outra figura delituosa. Pretenderam, ainda, evitar que aquelas ações se repetissem o que representa a medida de caráter preventivo aludida também pelo legislador penal como o especial fim de agir. Estão presentes, portanto, todas as elementares do crime previsto pelo artigo 1o, II da Lei n. 9.455/97.


Há que se afastar, por outro lado, a incidência da causa de aumento relativa à especial condição do sujeito ativo – agente público. Isso porque, o tipo em apreço, diferentemente da hipótese contemplada no inciso I, é crime próprio justamente por prever em sua descrição a relação de autoridade que é inerente ao exercício de função pública. Ou seja, o reconhecimento, nesta situação, da exacerbação implicaria dupla agravação. No mesmo sentido é o credenciado magistério de Alberto Silva Franco[16]: A primeira causa de aumento de pena refere-se à qualidade do sujeito ativo. Se for ele agente público, a pena deve ser necessariamente aumentada. Tal característica do sujeito ativo, como já foi anteriormente enfatizado, deveria constituir-se em elemento essencial do tipo de tortura e, não apenas, uma circunstância acidental destinada exclusivamente à exacerbação punitiva. Em duas situações, no entanto, a condição de agente público é imprescindível para a própria caracterização típica, criando-se, obliquamente, um crime próprio: a) quando o agente tortura alguém sob sua autoridade, desde que se atribua à “autoridade” o conceito legal dado pelo art. 5o da Lei de Abuso de Autoridade; b) quando o agente omite a apuração da tortura tendo o dever, obviamente, legal de realizá-la. Nesses dois casos, o sujeito ativo deve necessariamente ser agente público, não se podendo valorar, novamente, essa qualidade para efeito de agravação de pena, pois se teria, então, um verdadeiro bis in idem.

No mais, por serem as vítimas adolescentes que se encontravam internadas em cumprimento de medidas sócio-educativas impostas pelo Juízo da Infância e Juventude, incide no caso, a causa de aumento prevista pelo parágrafo quarto, inciso II, última figura. Excepcionam-se as vítimas Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva Filho que segundo registros nos laudos de exame de corpo de delito (fls. 147, 145, 156, 159, 160, 161 e 167) já contavam com dezoito anos.

Como exposto, vários foram os adolescentes submetidos à tortura. Aliás, daqueles referidos pelo Ministério Público na denúncia foram excluídos Rodrigo da Silva Almeida e Everton do Prado Floriano que, comprovadamente, não estavam na unidade quando as agressões foram cometidas. É evidente, portanto, o concurso de crimes. Os fatos foram praticados em um único contexto que se prolongou no tempo. Os réus ingressaram na unidade, praticaram as sucessivas agressões e foram embora. Trata-se, portanto, de concurso formal. Não há como ser descaracterizada, todavia, a autonomia de desígnios. Com efeito, a intenção era de infligir agudo sofrimento a cada um dos internos. Ora, foram eles espancados indiscriminadamente com golpes de madeira, submetidos a “corredor polonês” e obrigados a permanecer sentados no chão molhado apenas de cuecas. Ainda que objetivamente estes fatos tenham se processado em um único contexto, obviamente que no plano psicológico os réus desejavam submeter – e estavam plenamente conscientes disso – cada um dos internos a intenso sofrimento. Nesse sentido vale lembrar a lição de Heleno Cláudio Fragoso[17]:

Ação é comportamento voluntário dirigido a um fim. Não se confunde com ato, que é o movimento corpóreo. Uma só ação pode ser constituída de vários atos, que ganham unidade por serem uma só manifestação de vontade. Assim, quem efetua vários disparos para matar a vítima pratica uma só aça, embora realize diversos atos. (…) Se a ação ou omissão for dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, as penas se aplicam cumulativamente (art. 70, in fine). Nesse caso, uma ação única corresponde a diversas ações, pelo componente subjetivo que a inspira. A solução jurídica é aqui a mesma do concurso material, com a soma das penas. Entendeu o legislador que, havendo desígnios autônomos, ou seja, vontade deliberadamente dirigida aos diversos fins, não se justifica a diminuição da pena, porque subsiste íntegra a culpabilidade pelos fatos diversos. A expressão desígnio exclui o dolo eventual.


Ou seja, no caso posto a julgamento, a intenção dos agentes era de atingir diferentes bens jurídicos ainda que dentro de um único contexto. Não podem ser beneficiados com o tratamento mais brando previsto para o concurso formal perfeito onde à unidade objetiva projeta-se, também, uma unidade subjetiva. Em verdade, a intenção do legislador foi a de retirar o benefício daquele que, tendo por fim deliberado e direto atingir dois ou mais bem jurídicos, comete os crimes com uma só ação ou omissão.[18]

III – Da prática da omissão

Muito embora o legislador constitucional tivesse estabelecido uma diretriz jurídica comum aos executores dos delitos hediondos e àqueles que em face de suas práticas tivessem se omitido, a solução dada pelo legislador infra-constitucional foi mais branda. Tipificou, é certo, a omissão frente à tortura mas somente por parte daqueles que tivessem o dever de evitá-las ou apurá-las (art. 1o, parágrafo segundo). Trata-se, segundo entendimento doutrinário prevalente, de um crime omissivo impróprio, no qual o agente não tem apenas uma obrigação de agir, mas também, o dever de evitar que um determinado evento ocorra. Como observa Cezar Roberto Bitencourt[19], nos crimes comissivos por omissão, pode existir uma norma de dever de segundo grau, que é dirigida a um grupo restrito de sujeitos. Norma esta que impõe um dever de agir para impedir que processos alheios ao sujeito, estranhos a ele, venham a ocasionar um resultado lesivo. Esta norma, mandamental, é dirigida a um grupo restrito de sujeitos, enquanto que a norma proibitiva dirige-se a todos aqueles que podem ser sujeitos ativos do crime. Esta norma de mandato de segundo grau, dirige-se apenas àquelas pessoas que têm uma especial relação de proteção com o bem juridicamente tutelado. Devem, em primeiro lugar, logicamente, abster-se de praticar uma conduta que o lese, como qualquer outro; em segundo lugar, devem também agir para evitar que outros processos causais possam ocasionar esse dano. Estes sujeitos relacionados assim de maneira especial, com determinados interesses jurídicos, são chamados de garantidores que, segundo Sauer, devem prevenir, ajudar, instruir, defender, proteger, etc. o bem tutelado ameaçado. São a garantia de que um resultado lesivo não ocorrerá pondo em risco ou lesando um interesse tutelado pelo Direito.

Quanto à relação de causalidade, obviamente não se pode interpretá-la nos crimes omissivos tal e qual nos crimes comissivos. Vale a parêmia segundo a qual o “nada nada causa”. È por isso que a relevância da omissão é normativa e não naturalística. A causalidade não reside na simples conduta omissiva, mas sim, na violação do especial dever de agir que é dado pela norma. Ou seja, recaindo sobre o agente uma obrigação de atuar, ao deixar de cumpri-la, empresta a sua contribuição para o desfecho do processo causal. São felizes, nesse sentido, as palavras de Paulo José da Costa Júnior[20]:

É precisamente a norma, enquanto erige um sujeito em contracausa, que transmuda a possibilidade em realidade. São os deveres oriundos da vida em comum que, elegendo determinadas pessoas como garantidoras de que certos resultados não venham a verificar-se, dão relevo ao crime omissivo. O causar é conceitualmente diverso do não impedir. Como, entretanto, o legislador não fala a linguagem crítica do conhecimento e sim aquela da vida prática, pode promover a omissão à categoria causal. E o faz assentado na obrigação contida na norma jurídica ou extrajurídica. Quem empresta sopro vital à omissão, para que adquira valor causal, é a própria norma. Graças a ela o não impedir é equiparado ao causar.


Logo, a conduta omissiva penalmente relevante não pode ser focada na idéia de causa por conta do forte teor naturalístico que esta expressão carrega. Na verdade, a questão deve ser destrinchada na identificação de um dever específico de agir o que conduz uma vez mais a um critério normativo. É o que assinala sobredito autor[21]:

…o não impedimento do evento só poderá ser equiparado à sua causação, quando houver a obrigação específica (não apenas genérica) de atalhá-lo. Permanecerão fora da relação causal omissiva todos os casos de deveres genéricos, que impliquem uma simples movimentação e não um impedimento efetivo do resultado, mesmo que a conduta omissiva se revele uma condição indispensável ao evento.

Mais adiante, conclui o autor:

No crime comissivo, uma única violação se perpetra: da norma principal. No crime comissivo-omissivo, duas: da principal e da acessória, que estabelece o dever de agir. Quando se diz, portanto, que a omissão só tem sentido quando coligada a uma norma (jurídica ou extrajurídica), pretende-se referir à acessória, que estabelece a obrigação específica de agir. Em outros termos: a omissão exige, afora a norma principal, outra, secundária, em que se contém o dever específico de impedir o evento. A norma principal é comum aos crimes comissivos e aos comissivos-omissivos. A norma acessória é privativa desses últimos.

Conseqüentemente, somente uma parte do tipo acha-se legalmente descrita. A outra incumbe ao juiz construir, complementando o tipo.

Pois bem. No caso em tela, os réus Flávio Aparecido dos Santos e Margarida Maria Rodrigues Tirollo ocupavam à época dos fatos, altos cargos na estrutura funcional da FEBEM. O primeiro, diretor da unidade 27 do Complexo da Raposo Tavares, palco das torturas. E a segunda, gerente deste mesmo complexo e, portanto, superiora daquele. Nesta condição, participaram da reunião em que foi deliberada a realização da revista. Não se lhes imputa a responsabilidade por esta decisão. Aliás, ela não constitui o cerne do julgamento, mas sim a conduta omissiva. Quando da revista, Margarida, que havia recentemente sido submetida a uma intervenção cirúrgica, permaneceu no setor administrativo da unidade, o que não impediu que ouvisse alguns gritos. Diferentemente, Flávio acompanhou, de perto, os procedimentos. De acordo com as narrativas prestadas pela testemunha Pedro, o réu Flávio presenciou várias das agressões:

Em momentos distintos, os representados Francisco Cavalcante, Francisco Teodoro, Antonio Manoel de Oliveira e Flávio Aparecido dos Santos fora, chegando ao pátio e todos eles, em algum momento, presenciaram os adolescentes sendo agredidos por funcionários da FEBEM. (fls. 1566).

Mais adiante, no mesmo depoimento prestado perante o Juízo das Infância e Juventude asseverou:

Depois que os adolescentes deixaram a sala de TV e rumaram ao pátio, ali chegaram os funcionários Francisco Cavalcante e o diretor Flávio. Nenhum dos representados tentou impedir as agressões. (…) Que os dirigentes Flávio, Antonio Manoel, Francisco Cavalcante e Francisco Teodoro presenciaram quando os jovens passaram pelo “corredor polonês” e foram agredidos, sendo que nada fizeram para impedir as agressões. (fls. 1567/1568).


O fato da ação ter sido coordenada pelo réu Francisco Gomes Cavalcante que na ocasião respondia pelo Gabinete da Diretoria Técnica a FEBEM não os auxilia. Com efeito, não deixaram, por tal circunstância, de ocuparem os altos cargos nos quais estavam investidos. Além de poderes, tinham deveres, ônus e responsabilidades que eram inerentes ao exercício da função pública. Eram representantes do Estado. Estavam, portanto, umbilicalmente comprometidos com os seus princípios vetores dentre os quais o respeito intransigente da dignidade humana. Jamais poderiam comprometer-se, ativa ou passivamente, com atos que atentassem contra estes valores. Ou seja, além do dever de procurar impedi-los a qualquer custo tinham o dever, igualmente, de apurar ou ao menos provocar a apuração de todo e qualquer desvio.

Ora, Flávio era o diretor da UE-27. Nesta condição era o responsável direto pela preservação da integridade física e mental dos adolescentes que estavam ali internados por determinação da Justiça. A sua obrigação primária era a de zelar pelo cumprimento estrito das decisões judiciais. Margarida, por sua vez, na condição de sua superiora, também era destinatária da mesma responsabilidade que ainda era partilhada com outras unidades do complexo Raposo Tavares.

Como já exposto, a tortura é um ataque frontal aos princípios fundamentais que norteiam o Estado brasileiro e, portanto, absolutamente incompatível com os valores que cercam a noção de Estado de Direito. É e sempre será, ato manifestamente ilegal. Por consegüinte, ninguém poderá invocar obediência hierárquica frente a uma ordem a tal ponto odiosa. Da mesma forma não poderá permanecer inerte, sobretudo quando tiver sido outorgado pelo próprio Estado com poderes para evitá-la. Ainda que tivessem recebido ordem para permanecerem em uma sala, a determinação jamais poderia conduzir a um estado de letargia. O respeito da dignidade humana põe-se acima de qualquer relação hierárquica.

Nesse ponto, admirável o comportamento de Pedro Carlos Lourenço. Mesmo ocupando um cargo menor na estrutura hierárquica da FEBEM procurou evitar o espancamento generalizado. Em uma das intervenções foi golpeado. Em outra, foi impedido pelo próprio réu Flávio (fls. 1185). A sua coragem e apego a sólidos princípios éticos rendeu-lhe, ainda, perseguições e ameaças. Mesmo assim não se calou. Ao contrário, sempre apresentou narrativas coesas e uniformes que confirmaram aquelas prestadas pelas vítimas. O seu comportamento é claramente o reverso da medalha da omissão com que se pautaram Flávio e Margarida que, aliás, ocupavam posições muito mais estratégicas na FEBEM. Na realidade, por ocasião do incidente, não expressaram eles qualquer atitude, mínima que fosse, de preocupação, de suspeita ou de inconformismo pela forma com a qual se processaram as coisas. É o exemplo mais notório e cristalino da abstenção do dever de agir, ou seja da omissão pura e simples.

Margarida por diversas vezes afirmou que se encontrava em outra sala na unidade. A desculpa, na verdade, acabou lhe sendo bastante conveniente. Ainda que tivesse recebido alguma determinação para que lá permanecesse, o que seria de todo absurdo, tal não afastaria as suas responsabilidades como Gerente do Complexo. Dessa forma, assim que ouviu os gritos e os barulhos no mínimo deveria ter procurado cientificar-se do que estava ocorrendo ainda que no seu entender tal não tivesse durado muito tempo. Não poderia simplesmente fingir que nada de anormal havia ocorrido, sobretudo após ver alguns adolescentes feridos tal como narrado em seu próprio interrogatório (fls. 909/917). Na verdade, não quis intervir. A permanência da sala acabou servindo de bom pretexto. Certamente, caso tivesse demonstrado irresignação efetiva à altura de seu cargo, os fatos não teriam atingido a proporção que assumiram.


Aliás, a testemunha Glayds Romeo informou ter procurado a ré Margarida nos dias que se seguiram relatando-lhe a preocupação com o fato dos adolescentes terem sido agredidos naquela noite. Estranhamente ouviu dela comentários a respeito de alguns “tapinhas”. Chegou, inclusive, a demonstrar irritação com a insistência da testemunha para que providências administrativas fossem tomadas. É o que se depreende do seguinte trecho:

…quando os educadores narraram que houveram indícios de espancamento eu fui até a gerência e falei: “eu estou muito preocupada – e eu estava realmente angustiada – parece que os adolescentes apanharam” e ela disse o seguinte: “eu permaneci até quatro horas da madrugada e fiquei o tempo todo lá, eles levaram apenas uns tapinhas com a mão mesmo, não se chegou nem a usar algum instrumento. Eu não fiquei no pátio, fiquei na parte administrativa.” Eu falei: “então eles chegaram a apanhar?” Ela ficou muito irritada com a minha insistência, porque eu queria uma sindicância, e ela falou que foi com a mão, nem pau usaram. Agora, uma das assistentes dela, a Átila, me garantiu que da parte que estavam dava para ouvir os gritos. Ela foi até a porta e pediu pelo amor de Deus para que pararem com aquilo. (fls. 1294).

Como se não bastasse, nos dias que se sucederam, os adolescentes permaneceram trancados em seus aposentos período no qual foram privados de condições mínimas para que efetuassem a higiene pessoal. Não é crível que tais fatos pudessem passar despercebidos pelo Diretor da própria unidade, o ora réu Flávio, a menos que não quisesse, de fato, tomar conhecimento da situação dos internos. Da mesma forma, por força da situação excepcional enfrentada naquela noite, não poderia a ré Margarida simplesmente proferir determinações sem se preocupar com o efetivo cumprimento delas. Já que era responsável também por aquela unidade deveria ter se dirigido pessoalmente ou então encaminhar funcionário de sua confiança para certificar-se que haviam sido obedecidas. Nesse sentido, reuniões com os familiares não constituem providência excepcional. Na verdade, dadas as circunstâncias do caso, sobretudo a limitação de visitas, o mínimo que poderia ser feito era cientificar os genitores do ocorrido. De mais a mais, a reunião não é medida que pode ser equiparada à adoção de providências tendentes à apuração de eventuais abusos.

Nada foi feito todavia. Tampouco foram os adolescentes submetidos a exames de corpo de delito. As providências somente foram tomadas quando o Ministério Público – e não os réus – fizeram visita de inspeção naquela unidade após ter sido provocado para tanto. Não é admissível que providências para a apuração dos graves fatos não tenham sido adotadas por aqueles que diretamente ocupavam importantes funções na estrutura administrativa na FEBEM. Não é admissível que somente tenham tomado conhecimento das agressões oito dias após o ocorrido. Certamente, caso uma denúncia não tivesse sido levada ao conhecimento do Ministério Público, importantes elementos probatórios teriam sido perdidos em razão da omissão dolosa dos réus. Sabiam que abusos haviam sido cometidos. Não adotaram medidas eficazes para a apuração na crença de que os fatos pudessem passar despercebidos por outras autoridades.

Quanto às causas de aumento, não se trata de hipótese de mutatio libelli que justificasse a aplicação do disposto no artigo 384 do Código de Processo Penal. Em realidade, a denúncia já havia narrado serem os réus agentes públicos e as vítimas adolescentes. Ou seja, os fatos, subsumíveis às causas de aumento, já haviam sido descritos. Constituíam, também, o objeto da acusação. E, como é cediço, a defesa é exercida em face dos fatos e não em face da definição jurídica imputada. Aliás, ao juiz é permitido dar ao fato referido na denúncia classificação diversa da aí feita, o que significa, segundo a terminologia do artigo em exame atribuir-lhe uma definição jurídica diferente. O caso será de inovação da classificação delituosa, sem que tenha havido inovação da espécie de fato. E, por isso mesmo, não se pode alegar surja, em rigor uma surpresa para o acusado, pois tomou a si, no processo, fazer a defesa a respeito da ação violadora da lei penal, que a denúncia lhe imputa, e, não do delito aí capitulado.[22]


A questão, na verdade, é esclarecida pela exposição de motivos do Código de Processo Penal, nos seguintes termos: Inteiramente diversa é a solução dada pelo projeto, que distingue duas hipóteses: o fato apurado no sumário é idêntico ao descrito na denúncia ou queixa, mas esta o classificou erradamente; ou o fato apurado ocorreu em circunstâncias diversas não contidas explícita ou implicitamente na peça inicial do processo, e estas deslocam a classificação. E os dois casos são assim resolvidos: no primeiro, é conferida ao juiz a faculdade de alterar a classificação, ainda que para aplicar pena mais grave.

De qualquer modo, pelos mesmos motivos expostos, a especial qualidade do sujeito ativo já integra o tipo penal omissivo. Com efeito, o dever de agir imposto aos réus decorre da função pública por eles exercida. Reconhecer a exasperação implicaria em bis in idem por já representar elemento constitutivo do tipo penal. Diversa é a solução com relação às vítimas que na sua maioria eram adolescentes quando os atos de tortura foram cometidos. Aqui, incide a causa de aumento.

Passo, então, à individualização da pena.

1. Francisco Gomes Cavalcante – O réu não registra antecedentes criminais, não podendo ser reputado para estes fins o processo-crime 897/2003 da 2a Vara Criminal de Franco da Rocha (fls. 2253) que se encontra, ainda, em andamento. Nesse sentido, há que prevalecer o princípio constitucional da presunção da inocência que impede qualquer consideração prévia de culpabilidade enquanto não transitada em julgado a sentença condenatória. No entanto, à época dos fatos, o réu ocupava importante cargo na estrutura administrativa da Febem. Exercia as funções no Gabinete da Presidência. Foi sua a responsabilidade pela intervenção na unidade UE-27. Acompanhou várias das agressões efetuadas dando, pois, suporte para que os abusos fossem cometidos. Sua presença conferiu aos subordinados a segurança e a certeza que não seriam adotadas punições disciplinares. O comportamento foi incompatível com a confiança outorgada pelo Estado para o exercício de nobre função. Mais do que todos os demais funcionários, dele esperava-se um compromisso sólido com os princípios inerentes ao Estado de Direito. Afinal, ainda que estivessem internados em razão da prática de atos infracionais, as vítimas ali estavam para incorporar valores sociais adequados dentre os quais o da respeitabilidade à lei. A conduta em nada contribuiu para este fim. Dessa forma, em razão, pois, da maior reprovabilidade de seu comportamento, a pena base será exasperada em 1/6 (um sexto) para cada uma das condutas criminosas cometidas contra o seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, obtendo-se, por conseguinte, a pena, para cada qual, de 2 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada, para cada qual, uma vez mais, em 1/6 (um sexto), o que resultará na pena de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.


Como exposto, a hipótese é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 87 (oitenta e sete) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

2. Antônio Manoel de Oliveira – O réu não registra antecedentes criminais (fls. 2254) o que faz presumir ser o presente caso fato isolado em sua vida pregressa. Todavia, ocupava, à época dos fatos, alto posto na estrutura hierárquica da Febem, qual seja, o de Diretor do Complexo de Franco da Rocha. Nessas circunstâncias, coordenou e acompanhou a ação de seus subordinados diretos os quais eram conhecidos pelo grau de truculência empregado em situações que tais. A par desta circunstância, obviamente que sua presença conferiu a todos a certeza de que medidas disciplinares não seriam tomadas. Aderiu, portanto, subjetivamente, ao crime cometido, concorrendo para a sua prática. Seu comportamento foi absolutamente incompatível com o grau de confiança depositado pelo Estado que lhe outorgara importante função. Esperava-se dele o cumprimento dos princípios inerentes ao Estado de Direito dentre os quais o respeito à dignidade humana. Assim agindo, em nada contribuiu para a reinserção social dos internos. Além deles, a sociedade foi, uma vez mais, a grande prejudicada. Nesse contexto, o grau de reprovabilidade de sua conduta é indubitavelmente mais alto. Dessa forma, a pena base é exasperada em 1/6 para cada uma das condutas criminosas cometidas contra o seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, obtendo-se, por conseguinte, a pena, para cada qual, de 2 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada, para cada qual, uma vez mais, em 1/6 (um sexto), o que resultará na pena de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.


Como exposto, a hipótese é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 87 (oitenta e sete) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

3. Francisco Antonio Teodoro – O réu registra absolvição anterior proferida em processo outrora em curso perante a Vara de Taquarituba. Nos termos do princípio constitucional da presunção de inocência, não pode ser reputado para a caracterização de antecedente de natureza criminal. Não há, ademais, circunstâncias especiais que justifiquem uma exasperação da pena base além daquela estabelecida pelo legislador penal. Dessa forma, a pena base é estabelecida no mínimo legal para cada crime cometido contra os seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.


Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

4. Airton Veríssimo da Costa – O réu não registra antecedentes criminais. Não há, ademais, circunstâncias especiais que justifiquem a exasperação da pena base além do patamar estabelecido pelo legislador para o tipo penal que, dessa forma, permanecerá no mínimo legal para cada crime cometido contra o seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.


Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

5. Nevair Vital Pimenta – O réu registra apenas um inquérito policial já arquivado que, obviamente, não pode ser reputado para efeito de caracterização de antecedente criminal. Nesse sentido, há que se reconhecer a supremacia do princípio constitucional da presunção da inocência que impede qualquer consideração de culpabilidade enquanto não transitada em julgado a sentença penal condenatória. É o que já foi assentado em numerosos julgados: (TRF da 3a R, Ap. 22.732, TACrimSP, RT 697/326, STF, RTJ 136/627). Não há, por outro lado, circunstâncias que justifiquem a exasperação da pena além do patamar estabelecido pelo legislador, que, dessa forma, permanecerá no mínimo legal para cada crime cometido contra o seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.


Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

6. Adilson Tadeu de Freitas – O réu não registra antecedentes criminais (fls. 2268), o que faz presumir ser o presente caso fato isolado em sua vida pregressa. Não há, por outro lado, circunstâncias que justifiquem uma exasperação da pena base que, dessa forma, permanecerá em seu patamar mínimo para cada crime cometido contra os seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.


7. Paulo César Porfírio – O réu registra dois processos em andamento: 897/2003 da 2a Vara Criminal de Franco da Rocha (fls. 2270) e 95/2000 da 1a Vara Criminal de Franco da Rocha. Não podem ser considerados para efeito de caracterização de antecedentes criminais no âmbito da análise das circunstâncias judiciais. Com efeito, há que se reconhecer a supremacia do princípio constitucional da presunção da inocência que impede qualquer consideração negativa enquanto não transitada em julgado a sentença condenatória por fato anteriormente praticado. É o que já foi assentado em numerosos julgados: (TRF da 3a R, Ap. 22.732, TACrimSP, RT 697/326, STF, RTJ 136/627). Não há, por outro lado, elementos que justifiquem a exasperação da pena além do patamar estabelecido em lei. Dessa forma, a pena base permanecerá em seu limite mínimo para cada crime cometido contra os seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.


8. Rubens Alves da Silva – O réu registra em seu nome o processo de autos n. 095/2000 em curso perante a 1a Vara da Comarca de Franco da Rocha (fls. 2273). Todavia, por se encontrar em andamento não pode ser reputado para fins de evidenciar antecedente criminal. Reconhece-se, assim, a supremacia do princípio constitucional da presunção da inocência que impede qualquer consideração de culpabilidade enquanto não transitada em julgado sentença condenatória anterior. É o que já foi assentado em numerosos julgados: (TRF da 3a R, Ap. 22.732, TACrimSP, RT 697/326, STF, RTJ 136/627). No mais, não há elementos que justifiquem a majoração da pena além do patamar estabelecido pelo legislador. Dessa forma, a pena base permanecerá em seu mínimo legal para cada crime cometido contra o seguintes internos: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.


9. Eduardo de Souza Filho – O réu registra em seu nome processo-crime em andamento perante a 1a Vara Criminal da Comarca de Franco da Rocha, autos de n. 095/2000 (fls. 2276). Por força do princípio constitucional da presunção da inocência não pode ser reputado para fins de caracterização de antecedente criminal. É o que já foi assentado em numerosos julgados: (TRF da 3a R, Ap. 22.732, TACrimSP, RT 697/326, STF, RTJ 136/627). Não há, ademais, elementos que permitam reconhecer a necessidade de exasperação da pena além do patamar estabelecido pelo legislador. A pena base permanecerá, dessa forma, em seu limite mínimo para cada crime cometido contra as seguintes vítimas: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.


10. Ubaldo Pereira de Barros – O réu não registra antecedentes criminais o que faz presumir ser o presente caso fato isolado em sua vida pregressa (fls 2277). Não há, ademais, elementos que justifiquem a exasperação da pena além do patamar previsto pelo legislador para o tipo penal. Dessa forma, a pena base permanecerá em seu limite mínimo para cada crime cometido contra as seguintes vítimas: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

11. Marco Aurélio Garcia Montovan – O réu não registra antecedentes criminais o que faz presumir ser o presente caso fato isolado em sua vida pregressa. Ademais, não há elementos que justifiquem a exasperação da pena para além do patamar estabelecido pelo legislador, razão pela qual permanecerá ela em seu limite mínimo para cada crime cometido contra as seguintes vítimas: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.


Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.

No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

12. João Batista Gomes Pereira – O réu foi absolvido em processo no qual se viu acusado pela prática da contravenção prevista pelo artigo 28. Obviamente, não pode ser reputada para a caracterização de antecedentes criminais. Por outro lado, não há elementos que justifiquem a necessidade da exasperação da pena base que permanecerá em seu patamar mínimo para os crimes cometidos contra as seguintes vítimas: Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Cleiton Aparecido Uliani, Reginaldo Carneiro Vilar, Leandro da Silva, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos Rogértio da Silva Fonseca, Roberto Maurício Correa, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva, Jackson Willy Moeira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Geciundas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Adauto Bezerra da Silva Filho, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Beto Caetano, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes e agravantes.


No tocante à causa de aumento, como assinalado, há registro de que os internos Cleiton Aparecido Uliani, Leandro da Silva, Roberto Maurício Correa, Fábio Aparecido Soares, Osmar Praxedes da Silva, Danilo de Oliveira Silva e Adauto Bezerra da Silva já contavam com dezoito anos, de modo que a pena-base com relação a eles é a definitiva.

No que se refere às demais vítimas (Vanderlei Ribeiro Ferreira, Roney Peterson Leal, Ricardo Alves, José Augusto do Prado, Jorge Luiz Batista, Reginaldo Carneiro Vilar, Paulo Henrique Vieira, Kleber de Oliveira Costa, Eduardo Francisco dos Santos, Rogério da Silva Fonseca, Jackson de Oliveira Batista, Rodrigo Leite de Oliveira, Jonathas Rodrigues dos Santos, Jackson Willy Moreira Santana, Dorival Rodrigues da Mata Filho, Cleiton Davidson Ramos Alves, Patrick Ernandes Greciunas, Thiago Carlos dos Anjos Brito, Rogério Amâncio da Silva, Reginaldo Rodrigues Dias, Andrey Aparecido dos Santos, Michel Alves dos Santos, Ronaldo Caetano Ribeiro, Renato D´Avila da Silva, Felipe Martins e Samuel Belo Caetano), a pena será exasperada para cada qual em 1/6 (um sexto), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Como exposto, a hipótese dos autos é de concurso formal imperfeito de crimes (ações resultantes de desígnios autônomos), o que, nos termos preceituados pelo artigo 70 do Código Penal, impõe a aplicação cumulativa das sanções. Dessa forma, a pena final é de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “a” do Código Penal e artigo 1o, parágrafo sétimo da Lei n. 9.455/97, o réu iniciará o cumprimento da pena privativa no regime fechado.

Incabível a substituição por pena restritiva ou mesmo o sursis.

13. Margarida Maria Rodrigues Tiro – Por ocasião dos fatos a ré era Diretora do Complexo da Raposo Tavares. Tinha, portanto, sob sua direta responsabilidade algumas unidades dentre as quais a UE-27, palco dos incidentes aqui julgados. Exercia, portanto, cargo de confiança. Justamente por força desta confiança que lhe foi outorgada pelo Estado, estava profundamente comprometida com os valores inerentes do Estado de Direito tais como a intransigente respeitabilidade da dignidade humana. Nesse contexto, sua omissão carrega um alto grau de reprovabilidade que é reforçada a se considerar o número de vítimas que foram, naquela data, submetidas ao tratamento degradante. Milita a seu favor, por outro lado, a ausência de antecedentes criminais e os registros prestados por diversas testemunhas dando conta do zelo e cautela com que imprimia as suas atividades. Por tais motivos, a exasperação da pena base não será efetuada em seu grau máximo, mas sim, no importe da ½ (metade), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de detenção.

Não há circunstâncias agravantes e atenuantes.

Reconhecida a causa de aumento relativa à condição pessoal da maioria das vítimas (adolescentes), será a pena aumentada em 1/3 (um terço), resultando, assim, na pena final de 2 (dois) anos de detenção.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “c” do Código Penal cumprirá a ré a pena privativa inicialmente em regime aberto.


Presentes os requisitos favoráveis do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa por duas restritivas de direitos: prestação de serviços à comunidade (art. 46 do Código Penal) que serão especificados por ocasião da execução penal e ao pagamento de prestação pecuniária à entidade pública ou privada com destinação social (art. 45, parágrafo primeiro do Código Penal) no valor de 15 (quinze) salários mínimos. O valor leva em consideração não só a dimensão dos fatos e o grau de reprovabilidade da conduta, mas também, o fato de exercer a ré atividade remunerada.

14. Flávio Aparecido dos Santos – Por ocasião dos fatos, o réu exercia a função de Diretor da UE-27 do Complexo de Raposo Tavares da Febem. Segundo apurado presenciou várias das agressões e nada fez. Chegou, inclusive, a impedir que subordinado direto impedisse as agressões. Como se não bastasse, nos dias que se seguiram nenhuma providência adotou para a apuração dos eventuais abusos deixando, inclusive, de submeter os internos a exame de corpo de delito. Nada fez para impedir que os internos fossem privados das condições mínimas para a higiene pessoal. São comportamentos totalmente incompatíveis com a confiança nele depositada pelo Estado para o exercício de nobre função. Não podia desrespeitar os valores próprios do Estado de Direito com os quais estava profundamente comprometido. Tais circunstâncias somadas à dimensão do evento, sobretudo a quantidade de vítimas, torna imperiosa a exasperação da pena base no importe de 2/3 (dois terços) o que resulta na pena de 1 (um) anos e 08 (oito) meses de detenção.

Não há circunstâncias atenuantes ou agravantes.

Reconhecida a causa de aumento relativa à condição pessoal da maioria das vítimas (adolescentes), será a pena aumentada em 1/3 (um terço), obtendo-se, por conseguinte, a pena de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de detenção.

Nos termos do artigo 33, parágrafo segundo, alínea “c” do Código Penal cumprirá a ré a pena privativa inicialmente em regime aberto.

Presentes os requisitos favoráveis do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa por duas restritivas de direitos: prestação de serviços à comunidade (art. 46 do Código Penal) que serão especificados por ocasião da execução penal e ao pagamento de prestação pecuniária à entidade pública ou privada com destinação social (art. 45, parágrafo primeiro do Código Penal) no valor de 20 (vinte) salários mínimos. O valor leva em consideração não só a dimensão dos fatos e o grau de reprovabilidade da conduta, mas também, o fato de exercer o réu atividade remunerada.

Decido.

Com supedâneo no exposto, julgo parcialmente procedente a presente ação penal promovida pelo Ministério Público, para:

1. Condenar, como de fato condeno, os réus: Francisco Gomes Cavalcante, portador de RG 12.562.681-2, filho de Expedito Cavalcante do Nascimento e de Maria G. do Nascimento e Antônio Manoel de Oliveira, portador de RG 7.278.078, filho de Manoel Severino de Oliveira e de Maria Nazinha de Jesus, cada qual à pena de 87 (oitenta e sete) anos, 1 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão em regime inicial fechado, como incursos no artigo 1o, inciso II da Lei n. 9.455/97, combinado com o artigo 29, caput e 70, caput, segunda parte (por sete vezes) do Código Penal e, também, como incursos no artigo 1o, inciso II, parágrafo quarto, inciso II, última figura da Lei n. 9.455/97, combinado com o artigo 29, caput e artigo 70, caput, segunda parte (por vinte e seis vezes).


2. Condenar, como de fato condeno, os réus: Francisco Antônio Teodoro, portador de RG 12.803.069, filho de Aníbal Teodoro e de Zilda Carvalho Teodoro, Airton Veríssimo da Costa, portador de RG 17.745.607-3, filho de Cassiano da Costa Netto e de Bernadette da Costa, Nevair Vital Pimenta portador de RG 12.181.875, filho de Luiz Vital Pimenta e de Alice Pererira dos Santos Pimenta, Adilson Tadeu de Freitas, portador de RG 13.102.527-2, filho de Sebastião Arruda de Freitas e de Maria Helena Pereira de Freitas, Paulo César Porfírio, portador de RG 21.289.312-9, filho de Valdir Porfírio Vicente e de Orazília de Lordes Ferras Vicente, Rubens Alves da Silva, portador de RG 18.231.588-5, filho de Benedicto Firmino da Silva e de Aparecida de Jesus Bruno, Eduardo de Souza Filho, portador de RG 9.676.413, filho de Eduardo de Souza e de Miranda Zelindro de Souza, Ubaldo Pereira de Barros, portador de RG 10.990.886-7, filho de Luiz Pereira de Barros e de Luiza de Andrade Barros, Marco Aurélio Garcia Montovani, portador de RG n. 25.970.990, filho de Antonio Pedro Mantovani e de Rose Cleire Garcia da Silva e João Batista Gomes Pereira, portador de RG 12.226.270, filho de Benedito Gomes da Silva e de Aldenora Gomes Pereira, cada qual à pena de 74 (setenta e quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão em regime inicial fechado, como incursos no artigo 1o, inciso II da Lei n. 9.455/97, combinado com o artigo 70, caput, segunda parte (por sete vezes) do Código Penal e, também, como incursos no artigo 1o, inciso II, parágrafo quarto, inciso II, última figura da Lei n. 9.455/97, combinando com o artigo 70, caput, segunda parte do Código Penal (por vinte e seis vezes).

3. Condenar, como de fato condeno, a ré Margarida Maria Rodrigues Tiro, portadora de RG 6.027.659, filha de José Rodrigues Silva e de Oranides Dionísia Aredes Silva, à pena de 2 (dois) anos de detenção em regime inicial aberto como incursa no artigo 1o, parágrafo segundo, combinado com o parágrafo quarto, inciso II, última figura da Lei n. 9.455/97.

4. Condenar, como de fato condeno, o réu Flávio Aparecido dos Santos, portador de RG 12.613.496, filho de Arthur Alves dos Santos e de Helena Alves dos Santos, à pena de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de detenção em regime inicial aberto, como incurso no artigo 1o, parágrafo segundo, combinado com o parágrafo quarto, inciso II, última figura da Lei n. 9.455/97.

5. Absolver os réus Uderson Ferraz de Jesus, portador de RG 18.884.144-1, filho de João de Jesus e de Dirce Ferraz de Jesus, Antonio Fernando da Silva, portador de RG 7.946.259-5, filho de Possidonio Pereira da Silva e de Josefa Teodora da Silva, Marcos Fernando Moreno, portador de RG 16.761.111, filho de Benedito Moreno e de Adelaide Cuenca Moreno, Sergio Ricardo Colombaro, portador de RG 17.131.094-9, filho de Orlado Colombaro e de Neide Evangelista Colombaro, Almir José Caetano Faro portador de RG 30.574.250-4, filho de José Caetano de Faro e de Inez Bottoni Faro e José Luiz Pinto, portador de RG 24.619.535-6, filho de José Pinto e de Nancy Bloch Pinto da imputação da prática do delito tipificado no artigo 1o, inciso II e parágrafo quarto, incisos I e II da Lei n. 9.455/97 com fulcro no artigo 386, inciso VI do Código de Processo Penal.

A perda do cargo ou função e a interdição para o seu exercício é efeito da condenação sendo, pois, desnecessária qualquer declaração judicial nesse sentido (artigo 1o, parágrafo quinto da Lei n. 9.455/97).


Substituo as penas privativas de liberdade impostas aos réus Margarida Maria Rodrigues Tiro e Flávio Aparecido dos Santos por restritivas de direitos. À primeira pela prestação de serviços à comunidade (art. 46 do Código Penal), que serão especificados por ocasião da execução penal e ao pagamento de prestação pecuniária à entidade pública ou privada com destinação social (art. 45, parágrafo primeiro do Código Penal) no valor de 15 (quinze) salários mínimos. Ao segundo também prestação de serviços à comunidade (art. 46 do Código Penal) que serão especificados por ocasião da execução penal e ao pagamento de prestação pecuniária à entidade pública ou privada com destinação social (art. 45, parágrafo primeiro do Código Penal) no valor de 20 (vinte) salários mínimos.

Os réus são primários e não registram antecedentes criminais. Responderam ao processo em liberdade e não prejudicaram o bom andamento da marcha processual. Por outro lado, não restou esclarecida a autoria das ameaças à testemunha Pedro Carlos Lourenço de modo que tal circunstância não pode a eles ser atribuída. Ao menos por ora não restou configurado o periculum libertatis. Reconheço o direito de apelarem em liberdade.

Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados.

Custas na forma da lei.

Audiência de advertência será oportunamente designada.

P.R.I.C.

São Paulo, 13 de setembro de 2006.

Marcos Zilli

Juiz de Direito


[1] Art. 5o Ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel , desumano ou degradante.

[2] Art. 7o Ninguém poderá ser submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas.

[3] Art. 5o 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito à dignidade inerente ao ser humano.

[4] Art. 2o 1. Todo Estado-parte toma medidas legislativas, administrativas, judiciárias e outras medidas eficazes para impedir que atos de tortura sejam cometidos em todo o território sob sua jurisdição. 2. Nenhuma circunstância excepcional, qualquer que seja, o estado de guerra ou de ameaça de guerra, de instabilidade política interna ou qualquer outro estado de exceção, não pode ser invocado para justificar a tortura.

[5] Dicionário de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 211.


[6] GOMES, Luiz Flávio. Revista CEJ. Da tortura: aspectos conceituais e normativos. Brasília: Conselho da Justiça Federal, n. 14, mai./ago., 2001, p. 28.

[7] Submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

[8] Art. 1o 1. Para fins da presente Convenção, o termo “tortura” designa todo ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido, ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou pressionar uma terceira pessoa, ou por qualquer outro motivo fundado em formas de discriminação, qualquer que seja, quando uma tal dor ou tais sofrimentos são impostos por agente da função pública ou qualquer outra pessoa agindo oficialmente ou com sua instigação ou com seu consentimento expresso ou tácito. Este termo não aplica-se à dor ou aos sofrimentos resultantes unicamente de sanções legítimas, inerentes a estas sanções ou provocadas por elas.

[9] MELLO, Vanessa Vieira de. O direito à vida e o crime de tortura. Regulamentação do inc. III do art. 5o da constituição federal. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 7, n. 28, jul./set., 1999, p. 92.

[10] MACHADO, Nilton João de Macedo. Da tortura: aspectos conceituais e normativos. Revista CEJ. Brasília: Conselho da Justiça Federal, n. 14, mai./ago., 2001, p. 20.

[11] Tortura como crime hediondo especial. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 771, p. 461.

[12] Crime de tortura. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 90, v. 786, abr. 2001, p. 487.

[13] Comentários ao código penal. V. V. [s.l.], [s.d], p. 441.

[14] Tortura. Breves anotações sobre a lei 9.455/97. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 5, n. 19, jul/set., 1997, p. 57.

[15] Op. cit., p. 490.

[16] Op. cit, p. 66.

[17] Lições de direito penal. Parte geral. 10. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 366-367.

[18] NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 6. ed, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 399.

[19] Teoria geral do delito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 60-61.

[20] Comentários ao código penal. Parte geral. V. 1. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 123-124.

[21] Op. cit., p. 129.

[22] ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal brasileiro. V.4, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, p. 75.

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