Na fila do hospital

Doente mental deve ser transferido de prisão imediatamente

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1 de outubro de 2006, 7h00

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminar em Habeas Corpus, nesta sexta-feira (29/9), determinando que a Secretaria de Administração Penitenciária paulista transfira um doente mental para o Hospital de Custódia e Tratamento, independentemente da ordem da lista de remoção.

O pedido de Habeas Corpus foi feito pelo defensor público do estado de São Paulo Ricardo Mantovani. Segundo informações da Coordenadoria de Assistência Jurídica ao Preso da Defensoria da Região Metropolitana, há 714 doentes mentais no estado aguardando vaga para transferência para hospital psiquiátrico e aproximadamente metade deles está em distritos policiais e em centro de detenções provisórias.

Segundo Mantovani, foi imposta medida de segurança que deveria ser cumprida em hospital psiquiátrico. O mandado de prisão foi cumprido em janeiro e o rapaz foi encaminhado ao Centro de Detenção Provisória de Diadema. A juíza da Vara das Execuções Criminais de Diadema solicitou vaga no hospital e o Departamento de Execuções Criminais 5 informou que o rapaz foi incluído na lista de espera. Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária, ele está na posição 692 da lista.

A Defensoria Pública do estado entrou, nesta sexta (29), com um novo pedido de Habeas Corpus para que seja analisado mais outros 15 casos da Grande São Paulo.

Leia a íntegra do pedido.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR 2O VICE-PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO.

RICARDO LUIZ MANTOVANI, Defensor Público, inscrito junto à OAB/SP sob nº. 97.008, em exercício na Coordenadoria da Assistência Judiciária ao Preso da Região Metropolitana, vem perante Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII da Constituição Federal e art. 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de HABEAS-CORPUS com pedido de liminar em favor de ROBERTO NUNES FERREIRA, brasileiro, natural de São Paulo, Estado de São Paulo, onde nasceu aos 31/08/70, filho de José Nunes Ferreira e Rosalina Nunes Ferreira, portador do RG nº. 27.637.696, indicando como Autoridade Coatora o Juízo de Direito das Varas de Execução Criminal da Comarca de Diadema, na pessoa da Exma. Sra. Juíza de Direito responsável pela execução autuada sob nº. 654.657, pelos motivos a seguir expostos:

1. O Paciente infringiu o art. 157, “caput”, c.c. o artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, tendo sido imposta a medida de segurança, consistente em internação, pelo período mínimo de 01 (um) ano, em hospital de custodia e tratamento psiquiátrico, em 25 de julho de 2000.

2. Em 19 de janeiro de 2006 foi cumprido o mandado de prisão, tendo o paciente sido recolhido ao CDP de Diadema.

3.Foi determinado em 30 de maio de 2006, pela MM Juíza da Vara das execuções que fosse encaminhado ao DECRIM V ofício solicitando vaga em Casa de Tratamento e Custódia.

4.O DECRIM 5 informou que foi autorizado que o paciente fosse incluído na LISTA CRONOLÓGICA ÚNICA, aguardando remoção para Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, sendo que o gerenciamento das vagas seria de responsabilidade da Coordenadoria da Saúde do Sistema Penitenciário/SAP, isto em 26 de junho de 2006.

5.Ante tais informações a MM. Juíza da Vara das Execuções solicitou informações à SAP a respeito da ordem de classificação para remoção do paciente, além de solicitar junto ao IMESC exame para verificar a possibilidade de tratamento ambulatorial ao mesmo.

6.A resposta ao ofício verificou-se que o nome do paciente encontra-se na posição de nº. 692, pela listagem cronológica de remoções.

O paciente encontra-se desde janeiro de 2006 em Estabelecimento Prisional de forma ilegal. O inimputável não pode cumprir pena, todavia, deveria estar em Hospital de Custódia a fim de iniciar o tratamento psiquiátrico, conforme dispõe o art. 99 da Lei de Execução Penal.

A medida de segurança não tem caráter de retribuição, mas sim de prevenção de acordo com a periculosidade do inimputável, não podendo ser cumprida em Estabelecimento Prisional.

O art. 66 da Lei de Execução Penal, inciso VI, prevê:

“Art. 66 – Compete ao Juiz da execução:

(…)

VI – zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de segurança;”

Cabe a essa Autoridade Judicial impor o cumprimento da lei, não podendo ter entendimento contrário ao ordenamento jurídico.

Deixar um paciente inimputável em Centro de Detenção Provisória é uma aberração jurídica. O sentenciado encontra-se recolhi

do em local inadequado, onde sua situação psiquiátrica poderá agravar.

O paciente, que está sob o segregamento estatal, não pode mais suportar a violação de seus direitos em razão de desídia do Estado.

Constitui-se, ainda, a manutenção de doente mental em presídio em pena cruel e degradante; em desrespeito a preceitos legais e constitucionais.

O constrangimento ilegal é nítido e não há desculpa aceitável para que essa situação perdure.

O entendimento jurisprudencial desse Egrégio Tribunal em caso análogo é de que o paciente aguarde vaga em liberdade, ou, seja transferido para Hospital Psiquiátrico da rede estadual. Com a devida vênia, trazemos a colação:

“Medida de segurança se cumpre em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou em regime ambulatorial, mas nunca em cadeia. Manter preso que foi absolvido, à espera indefinida de vaga em estabelecimento adequado, é constrangimento ilegal. Se não houver vaga, a solução é determinar que o agente a aguarde em liberdade, que todavia não deve ser ampla, mas vigiada, por aplicação analógica do art. 178 da Lei 7.210/84. (TJSP – RA p Rel. Barreto Fonseca – JTJ – LEX 140/284).”

“O legislador, prevendo a falta de hospitais, ou seja, de manicômios, já previu que a internação poderia ser em outro estabelecimento adequado. A superlotação do manicômio justifica a transferência do internado para outro estabelecimento psiquiátrico da rede estadual (TACRIM-SP – RA – Rel. Raul Motta – RJD 7/35).” (grifamos)

Diante do exposto, havendo flagrante violação de lei federal e submissão do paciente e constrangimento ilegal, vez que se encontra preso e não internado como determinado na sentença, requer o impetrante a concessão de liminar para permitir que o paciente aguarde, em liberdade a existência de vaga em Hospital de Custódia de Tratamento Psiquiátrico, ou em Estabelecimento Psiquiátrico da rede Estadual, e ao final, que conceda a ordem de “habeas corpus” em definitivo determinando-se, que o paciente aguarde em liberdade a vaga do hospital psiquiátrico ou que seja imediatamente incluído em Hospital de Custódia de Tratamento Psiquiátrico, independente de lista de espera, para que cessa o grave constrangimento ilegal sofrido, como expressão da lídima JUSTIÇA!

São Paulo, 27 de setembro de 2006.

RICARDO LUIZ MANTOVANI

DEFENSOR PÚBLICO

COORDENADOR ADJUNTO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA AO PRESO DA REGIÃO METROPOLITANA

OAB/SP 97.008

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