Juízes vistos por advogados

Alguns juízes padecem da síndrome do poder e do mando

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28 de novembro de 2006, 14h16

Advogar hoje em dia é bem diferente do que era décadas atrás. As informações sobre andamento de processos podem ser obtidas no computador da casa ou do escritório do advogado da causa. Ir à secretaria de alguma vara de primeira instância ou à de algum tribunal para acompanhar os feitos, como era o que tinha que fazer regularmente o advogado, tornou-se tarefa quase em desuso.

A enfadonha e tortuosa leitura das publicações oficiais para saber o resultado das decisões ou despachos proferidos pelos órgãos judicantes praticamente cedeu lugar aos avanços tecnológicos. A notícia direta que o interessado colhe em seu computador, enviada pelos serviços de informática dos tribunais, por pouco não eliminou esse maçante ritual dos escritórios de advocacia.

A parte, mesmo independente de seu procurador, pode, esteja ou não no Brasil, se informar sobre o andamento de seu processo em quaisquer das instâncias do Poder Judiciário nacional. Fica por conta do procurador da causa apenas a verificação exata dos prazos que fluem a partir da publicação ou do conhecimento oficial que tiver do ato ordenado pelo juiz para a interposição de recursos ou para a prática de expedientes que dependam dessa formalidade.

Embora a vida do profissional do direito tenha melhorado com novos serviços introduzidos no sistema judiciário, não se pode negar que as coisas continuam muito difíceis. Com o crescente número de ações propostas diariamente nos juízos de primeira instância, bem como dos recursos que delas se originam, pode-se dizer que a situação ficou presentemente bem pior do que era naqueles tempos em que não se dispunha do computador e da internet.

O fenômeno da massificação de demandas levadas ao Judiciário tem lá sua razão de ser. A Constituição Federal de 88 se responsabiliza em grande parcela por essa procura constante de justiça. Ampliadas as garantias individuais na nova ordem constitucional, passou o país a conviver com incessante busca pela implementação dos direitos assegurados à cidadania.

Apesar de haver aumentado progressivamente o número de ações ajuizadas perante os órgãos judiciais, não se pode negar que o quadro revela induvidosa integração do cidadão no contexto constitucional. Tal se dá cada vez mais na medida em que as pessoas se apercebem de que de suas relações com outras pessoas, inclusive com órgãos estatais, decorrem direitos que podem ser vindicados judicialmente, se porventura as obrigações a que têm direito não são satisfeitas.

Ademais, o próprio desenvolvimento econômico do país, ainda que tenha se dado acanhadamente, o crescimento demográfico e os resíduos deixados pelos planos econômicos, além de outras medidas ilegais patrocinadas por governos irresponsáveis, qualificam-se como os grandes vilões do congestionamento de feitos nos juízos brasileiros.

Nossos códigos, pelo próprio conteúdo romanístico, instrumentaliza a marcha dos feitos judiciais com invulgar morosidade. Sabe-se que o processo é lento pela prodigalidade de recursos e rituais previstos, em total descompasso com o mundo atual. O advogado sabe que tem de conviver com essa dura realidade. Mas do que eles mais se assustam é com os juizes que acham que são os donos do mundo, uma minoria, felizmente. Não gostam de receber advogados, não toleram despachar com eles, nem tampouco ouvi-los. Demoram imotivadamente uma eternidade para julgar suas ações ou recursos.

Posam como senhores da verdade. Há uns que logo pegam o vírus da juizite, doença forense dos juízes que se colocam acima do bem e do mal. São potestades que detestam ser contestadas. Se contrariadas, ameaçam. Se agravadas, representam contra os advogados à OAB, quando não ao Ministério Público. Padecem da síndrome do poder e do mando. Executam até prisões de advogados, ainda que estejam no exercício da causa.

Há juízes, e aqui se incluem os de segunda instância e até de tribunais superiores, que também não apreciam receber advogados. Quando o fazem, apressam-se para vê-los pelas costas. Se o advogado chega a pedir preferência para um processo que está em condições de ser julgado, às vezes um pedido de vista que se perpetua em seu poder, não dão a mínima. Carlos Veloso dizia para os colegas, quando juiz do STF, que atendia sempre os pedidos de preferência de advogados. Se nos pedem preferência é porque têm suas razões, dizia, e se não os atendemos, certamente serão candidatos a falar mal da gente.

Veloso está certo. Aliás, não é à toa que o grande Calamandrei em Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados, precisa ser lido. O advogado deve ser respeitado. Forma um dos tripés do Judiciário. Se até Napoleão temia sua língua, é bom que na democracia os juízes se resguardem desse órgão viperino dos advogados.

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