Renda do réu

Honorário pago com dinheiro do crime poderá dar cadeia

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27 de novembro de 2006, 17h50

Se vingar a proposta do deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), advogados terão de investigar a origem dos honorários que recebem se não quiserem ficar até quatro anos presos. Um projeto de lei tipifica como crime de receptação qualificada aceitar o pagamento de honorários com “dinheiro do crime”. A proposta faz parte dos 16 projetos de lei apresentados por Pimenta no relatório final da CPI do Tráfico de Armas, na Câmara dos Deputados.

A idéia do deputado é coibir o que ele chama de “profissão eleita” para servir como canal de comunicação entre os chefes das organizações criminosas. “Chegamos a apurar algo imprevisível: membros das quadrilhas cursam faculdades de Direito e vão obter inscrição nos quadros da OAB apenas para facilitar e proteger as ações dos criminosos”, afirma Paulo Pimenta na justificativa do projeto de lei.

Ele propõe que seja inserido no Estatuto da Advocacia como dever do advogado “não aceitar em pagamento por seus serviços numerário oriundo de atos ilícitos”. Caso contrário, o advogado poderá responder pelo crime de receptação qualificada, cuja pena é de um a quatro anos de prisão e multa.

Para os advogados, a proposta transfere um ônus do poder público, de investigar a origem do dinheiro usado para pagar os honorários, ao profissional, que tem o direito de receber pelo seu trabalho. “Não compete à advocacia ou a qualquer outra classe investigar a origem dos recursos que pagam seus honorários porque seu trabalho foi honesto e honrado. A missão de investigar possível origem criminosa do recurso é da competência do poder público”, rebate a presidente em exercício da OAB-SP, Márcia Melaré.

Além disso, os advogados acreditam que, se o profissional puder ser responsabilizado pela origem dos honorários que recebe, isso acabará cerceando o direito de defesa dos cidadãos. “O advogado não tem a obrigação de saber de onde seu cliente tirou o dinheiro para pagar seu trabalho”, argumenta Alberto Zacharias Toron, conselheiro federal da OAB.

Tramitam na Câmara outros projetos que pretendem impedir o uso de dinheiro do crime para pagar advogados. Os Projetos de Lei 5.562/05 e 577/03 propõem que o réu seja obrigado a comprovar a origem lícita do dinheiro usado para pagar os honorários. O PL 577/03 já passou pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. A CCJ se manifestou pela inconstitucionalidade da proposta.

No relatório final da CPI do Tráfico de Armas, o deputado federal Paulo Pimenta defende que outra prerrogativa dos advogados — de não passar pela revista ao entrar em presídios — deveria ser relativizada. Pela sua proposta, contida em dois projetos de lei, o defensor passaria por detectores de metal. “O desvirtuamento da atuação do advogado já não permite que esse profissional seja considerado um cidadão acima de qualquer suspeita”, justifica ele.

A revista eletrônica não é tão atacada pelos advogados, desde que seja aplicada também a todos os que entram nos presídios, inclusive agentes penitenciários e juízes. Para os advogados, a revista eletrônica preserva a dignidade do profissional, diferentemente da revista manual.

Amigos em parte

Se em junho, no início dos trabalhos da CPI do Tráfico de Armas, OAB e deputados sinalizaram uma parceria no combate ao crime organizado, o relatório final de Paulo Pimenta aponta um racha. O presidente nacional da OAB, Roberto Busato, criou a Comissão Especial de Estudo da Colaboração do Conselho Federal da OAB para auxiliar a CPI. Mas as soluções apresentadas pela entidade não agradaram muito o deputado federal.

“A conclusão desta CPI a respeito das questões que envolvem a advocacia do crime organizado é de que sua solução não contará com a colaboração efetiva do órgão representativo da advocacia no país”, escreveu o deputado. “Suas posições são conservadoras no sentido de preservar o status quo que assegura as prerrogativas e o mercado de trabalho de seus associados. A evidência dos prejuízos que desvios de comportamento de advogados podem representar para a segurança da sociedade parece ser considerada irrelevante pelo órgão de classe.”

Ele concluiu: “A complacência com que o órgão trata os profissionais que claramente se decidiram freqüentar o ambiente infracional, usando as prerrogativas da classe em proveito próprio na prática de atividades criminosas”.

No relatório final, o deputado pediu o indiciamento de sete advogados. São eles: Maria Cristina de Souza Rachado, Sérgio Weslei da Cunha, Valéria Dammous, Libânia Catarina Fernandes Costa, Eduardo Diamante, Ariane dos Anjos e Suzana Volpini Micheli.

Clique aqui para ver o relatório final.

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