Jogo da verdade

Eduardo Jorge leva melhor na briga contra a imprensa

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15 de novembro de 2006, 6h00

Na última segunda-feira (13/11), o leitor de O Globo se deparou com informações incomuns publicadas numa página inteira do primeiro caderno do diário fluminense: uma sentença da 10ª Vara Cível de Brasília que condenou o jornal a pagar R$ 200 mil de indenização por danos morais a Eduardo Jorge Caldas Pereira, ex-secretário-geral do governo Fernando Henrique Cardoso.

O episódio ilustra como poucos o processo de transposição de uma investigação judicial para as manchetes de jornais e o risco que isso implica. Meras suposições de policiais e promotores acabam se transformando em coisa julgada. Muitas vezes, a investigação dá em nada e a bomba fica nas mãos da imprensa.

Eduardo Jorge moveu sete ações contra jornais e revistas e contra seus acusadores, os procuradores Luiz Francisco de Souza e Guilherme Schelb. Por enquanto, ele ganha nas cinco que já têm sentença — em uma delas, já recebeu a indenização. Em todas, ele se diz vítima de ataques infundados da imprensa.

O ex-secretário de FHC foi acusado pelo Ministério Público de participar do esquema de desvio de dinheiro na construção do prédio do Fórum Trabalhista de São Paulo, junto com o juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto.

A imprensa noticiou. Mas ao contrário do juiz, que foi condenado pela Justiça, nada ficou provado contra EJ. Agora, chega a fatura da guerra declarada por ele contra veículos de comunicação.

Jogo de palavras

Se é certo que a liberdade de imprensa é garantida pela Constituição, também é certo que muitas vezes se abusa do direito e dever de informar. O limite que define o que é informar e o que é difamar é muito tênue. Um tempo de verbo pode fazer toda a diferença.

No caso de EJ, por exemplo, a imprensa se defendeu dizendo que apenas informou aos leitores as acusações feitas pelo Ministério Público Federal. Ou seja, cumpriu com o seu dever de informar. Para o ex-secretário, não foi bem isso que ocorreu. Alguns jornais e revistas se limitaram a informar, considerou. Outros, no entanto, extrapolaram.

Nas ações que moveu, EJ garante que fez questão de separar o joio do trigo. Quem apenas informou o leitor se livrou da fúria do ex-secretário. Quem apelou para adjetivos, na opinião de EJ, foi alvo de ações. Neste grupo, estão os jornais Correio Braziliense, O Globo, Folha de S. Paulo, Estado de Minas e Jornal do Brasil e as revistas Veja e IstoÉ.

Por enquanto, o ex-secretário embolsou R$ 150 mil, referente à indenização de R$ 80 mil que o Correio Braziliense foi condenado a pagar mais juros e correção monetária. Na quinta-feira (16/11), deve ganhar mais R$ 100 mil, primeira parcela dos R$ 200 mil que O Globo tem de pagar.

Outras três ações já têm sentenças, mas ainda aguardam julgamentos de recursos. Para a Folha de S. Paulo, foi fixado um valor de R$ 200 mil. As revistas Veja e IstoÉ terão de pagar R$ 50 mil e R$ 100 mil, respectivamente, se não conseguirem reverter as decisões. Os processos contra os jornais Estado de Minas e Jornal do Brasil ainda não têm sentença.

Nas circunstâncias jurídicas atuais, EJ receberia R$ 700 mil de indenização por ter visto seu nome divulgado perto de fatos e adjetivos nada agradáveis. O valor é muito distante do que ele pediu. Para cada jornal e revista, R$ 1 milhão pelos danos que alega ter sofrido.

O debate que o caso EJ provocou no Judiciário brasileiro é mais importante do que o valor das indenizações. Trata-se de uma discussão que ainda está muito distante de um consenso: o limite entre a liberdade de imprensa de informar as acusações feitas pelo MPF e pela Polícia e o resguardo da honra de quem, até prova ao contrário, é inocente.

Culpa da perseguição

Além de processar a imprensa, o ex-secretário levou ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a sua briga com os autores das acusações, os procuradores Luiz Francisco de Souza e Guilherme Schelb. Para EJ, os procuradores promoveram uma verdadeira caça às bruxas contra ele e devem ser, portanto, punidos.

Ele acusa os procurados de ilícitos administrativos e criminais. Em junho de 2004, ele fez o mesmo pedido à Corregedoria-Geral do Ministério Público Federal. O corregedor à época, Wagner Gonçalves, arquivou a representação, segundo Eduardo Jorge, injustificadamente, alegando que ela abordava as mesmas denúncias de três representações anteriores que já haviam sido arquivadas. Agora, o CNMP deve reapreciar o pedido.

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