Trabalho em campanha eleitoral não gera vínculo de emprego
31 de março de 2006, 12h04
Trabalho em campanha eleitoral não gera vínculo empregatício com o candidato ou o partido. O entendimento é da 10ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas, SP). Os juízes livraram o vereador José Antero de Paiva Grilo (PFL), do município de Jacareí, de pagar as verbas trabalhistas a Silvana Aparecida da Silva. Cabe recurso.
Depois de ter trabalhado para a campanha eleitoral do vereador, Silvana entrou com reclamação na 1ª Vara do Trabalho de Jacareí. Pediu o reconhecimento do vínculo empregatício com o candidato, registro na carteira de trabalho, férias, 13º salário, Fundo de Garantia e recolhimento do INSS.
A primeira instância negou o pedido. No recurso ao TRT de Campinas, a autora da ação alegou que ficou comprovada a prestação diária de serviço com remuneração mensal, além de ter sido “peça importante na reeleição do candidato”.
O juiz José Antonio Pancotti, relator da matéria, esclareceu que “não houve prova documental quanto a existência da relação jurídica definida pela CLT, seja no período eleitoral, seja nos demais períodos. Os fatos narrados afastam a existência de subordinação entre as partes, considerando-se subordinação como o estado de sujeição do empregado ao empregador, aguardando ou executando suas ordens”.
Para o relator do recurso, a contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido, conforme previsto no artigo 100 da Lei 9.504/97. “Para que o vínculo empregatício fosse reconhecido, indispensável que a trabalhadora comprovasse que seu trabalho tenha se desenvolvido fora do período da campanha eleitoral.”
Como a autora da ação somente trabalhou como cabo eleitoral e não provou prestação de serviços fora desse período, o TRT não acolheu o recurso, mantendo a decisão da primeira instância. “O repasse de valores para cobrir despesas não se confunde com salário; portanto, inapto para autorizar o reconhecimento do vínculo empregatício”, conclui Pancotti.
Processo 00445-2005-023-15-00-4 ROPS
Leia a íntegra da decisão
ACÓRDÃO Nº
PROCESSO TRT 15ª REGIÃO Nº 00445-2005-023-15-00-4
RECURSO ORDINÁRIO – RITO SUMARÍSSIMO
1ª VT DE JACAREÍ
RECORRENTE: SILVANA APARECIDA DA SILVA
RECORRIDO: JOSE ANTERO DE PAIVA GRILO
VÍNCULO EMPREGATÍCIO – TRABALHO VOLUNTÁRIO EM CAMPANHA ELEITORAL. O trabalho em campanha eleitoral não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido, nos exatos termos do art. 100, da Lei 9.504/97. Trata-se de restabelecimento, por lei especial, de disciplina de relação de trabalho subordinado, do velho regime de locação de serviço, estranho à normatização da relação de emprego. Recurso não provido.
Contra a r. sentença de fls. 40/41, que julgou improcedente a ação, recorre a reclamante (fls. 43/48), pretendendo, em síntese, a reforma da r. sentença, para concessão dos benefícios da justiça gratuita e reconhecimento do vínculo empregatício, por entender que restou comprovado a prestação diária de serviços com remuneração mensal e ser “peça importante na reeleição do recorrido”.
Contra-razões pela às fls. 52/57.
Não houve remessa ao Ministério Público.
É o relatório.
V O T O
Conheço do(s) recurso(s), porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
Carece de interesse jurídico o pleito de concessão de benefícios da justiça gratuita, pois a r. sentença já os concedeu.
No tocante ao vínculo empregatícios, busca a reclamante a reforma da decisão que julgou improcedente.
Antes de analisarmos os requisitos do contrato de trabalho e, por entendermos ser oportuno, teceremos algumas considerações sobre o ônus da prova, quando o objeto é o reconhecimento de vínculo empregatício.
A autora que se diz empregada, enquanto que o réu diz que houve trabalho voluntário em sua campanha eleitoral.
O art. 3º da CLT, identifica como elementos caracterizadores da relação de emprego a habitualidade, a onerosidade, a pessoalidade e a subordinação.
Não houve prova documental concludente quanto a existência da relação jurídica tal como definida pelo citado artigo, seja no período eleitoral, seja nos demais períodos.
A prova testemunhal, como se verá, também não conduz à ilação da existência de vínculo empregatício, mormente quando se verifica que os fatos narrados afastam a existência de subordinação entre as partes, considerando-se subordinação como o estado de sujeição do empregado ao empregador, aguardando ou executando suas ordens.
Por outro lado, o trabalho dos chamados cabos eleitorais não resulta em vínculo empregatício, por prévia disposição legal.
Com efeito, o art. 100, da Lei 9.504/97 dispõe que:
“A contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido contratantes”.
Em face do disposto na legislação transcrita, a admissão de que houve trabalho voluntário, na campanha para as eleições de 2003, não transfere para o recorrido o ônus probatório, nem autoriza o reconhecimento do vínculo empregatício.
Para que o vínculo empregatício fosse reconhecido, indispensável que a recorrente (reclamante) comprovasse que seu trabalho ultrapassou os liames eleitoreiros ou seja, que tenha se desenvolvido fora do período da campanha eleitoral, em moldes diferentes.
Em sua vestibular a reclamante afirma ter desempenhado as funções de gerente de projetos, mas não diz o objeto do trabalho.
A testemunha da reclamante (fl. 20), afirmou que “trabalhavam juntas, nos bairros; … a depoente não recebia nada, apenas ajudava a recte; … a recte. trabalhava todos os dias para o recdo., de 2ª a 6ª feira, entregando folhetos, fazendo eventos para a companha do recdo. na sua propaganda eleitoral; … o recdo. era “ídolo” da recte. e esta queria muito que este ganhasse a eleição; a recte. fazia parte do PFL “mulher” e ficava no comitê para ajudar.”
A primeira testemunha do reclamado (fl. 20/21) afirmou que “quando conheceu a recte esta trabalhava na campanha do Amagai, juntamente com a esposa deste; a reclamante fazia parte do comitê feminino; … a depoente viu a recte apenas na época da eleição.”
A segunda testemunha do reclamado (fl. 21) afirmou que “desconhece se a mesma trabalhou em campanhas para o recdo …; a recte comparecia na Câmara para visitar tanto o recdo quanto para visitar outros gabinetes, para visitar outros vereadores no ano de 2003, como por exemplo o Sr. Genésio.”
Disso se extrai ter a reclamante trabalhado como cabo eleitoral, inexistindo qualquer prova da prestação de serviços fora do período eleitoral, a não ser visitas da reclamante à Câmara Municipal (docs. 28/35), fato que não enseja o reconhecimento do vínculo, por serem esporádicos e a diversos vereadores.
O repasse de valores para cobrir despesas não se confunde com salário, portanto, inapto para autorizar o reconhecimento do vínculo empregatício.
Em face do conjunto probatório e da disposição do art. 100, da Lei 9.504/97, não há como reconhecer o vínculo empregatício pretendido.
Note-se que os serviços admitidos pelo reclamado como prestados pela reclamante são todos ligados a atividade eleitoral. É certo que este fato não seria óbice ao reconhecimento do vínculo, acaso comprovada a existência dos elementos descritos acima como caracterizadores da relação de emprego.
Observando-se o princípio da primazia da realidade, onde se defere maior relevância ao que se sucede no terreno dos fatos, é de se concluir que no caso em apreço os fatos comprovados nestes autos se subsumem ao disposto no art. 100 da Lei 9.504/97.
Em face do exposto, nego provimento ao recurso.
Por tais fundamentos, decide-se: conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
JOSÉ ANTONIO PANCOTTI
Juiz Relator
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