Missão impossível

O crime organizado fez do celular sua principal arma

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15 de maio de 2006, 19h10

A arma principal dos ataques comandados pelo PCC, sem dúvida é o telefone celular. Mesmo com toda a aparente rigidez na entrada dos presídios, os aparelhos continuam chegando nas celas dos criminosos que conseguem, mesmo presos, continuar comandando o crime fora das cadeias.

Impedir a comunicação entre os criminosos tem sido uma missão impossível para os órgãos de segurança. Contra esta proposta trabalham, de um lado, a cumplicidade comprada dos funcionários da carceragem e, de outro, a dificuldade técnica de bloqueio de sinais de celular nas áreas de presídios.

Em dezembro de 2002 o Ministério Público de São Paulo elaborou a primeira grande ação contra o PCC. Já nesta denúncia apresentada, os promotores Marcio Sergio Christino e Roberto Porto, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado, afirmavam que “o telefone celular ainda é o recurso primordial utilizado pela organização para firmar sua estrutura e permitir a coordenação, direção e realização de atividades dentro e fora do sistema prisional. Trata-se ao mesmo tempo de sua maior força e sua maior fraqueza, eis que permite a comunicação mas, também, que tal comunicação possa ser interceptada e assim controlada, gerando o fluxo de informações que desvenda o sistema criminoso”, de acordo com os promotores.”

Paradoxalmente, apenas a força do celular tem sido explorada adequadamente pelos criminosos. A fraqueza, ou seja, a possibilidade de interceptação das conversas telefônicas entre os líderes criminosos presos e suas bases de operação em liberdade, não tem produzido resultados.

Para o presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, o delegado André Di Rissio a situação é de extrema urgência. “A Anatel tem que desligar imediatamente os sinais de celular ao redor dos presídios como uma medida patriótica. Estamos vivendo um momento quase de exceção e temos que tomar medidas extremas. Depois o estado de São Paulo tem que pedir por meio de liminar para que os sinais permaneçam cortados. O estado tem que retomar o controle da situação e a prioridade agora é cortar as comunicações.”

Di Rissio também alega que esse quadro caótico foi absolutamente previsível e que o governo do estado vinha sendo alertado da situação desde 2001. “O estado de leniência do Estado no combate ao crime organizado, a falta de profissionalismo do secretário de Administração Penitenciária, Nakashi Furukawa, a falta de investimento na polícia, tudo isso fez com que se perdesse o controle sobre o sistema prisional”. Para o delegado, “estamos colhendo o que plantamos, secretários amadores, promotores de Justiça omissos, juízes benevolentes demais, que deixam os presos passarem dia das mães fora da cadeia.”

Para o advogado criminalista Mario de Oliveira Filho só existem duas maneiras de se introduzir um celular num presídio: por meio de parentes ou por meio de funcionários. Ele aconselha a rigorosa revista dos funcionários como forma de impedir o contrabando de celular para dentro do presídio, Recomenda ainda o rodízio dos empregados encarregados de revistar as visitas como meio de se evitar a corrupção. “Estamos lidando com criminosos profissionais, ninguém é amador. Um desses criminosos pode facilmente ameaçar de morte o funcionário se ele não deixar passar o que ele quer.”

Os presídios devem investir em tecnologia como aparelhos detectores de metais e de Raios X, na opinião de Oliveira Filho. “Mas não podemos esquecer que quem opera todas essas máquinas é um ser humano, por isso é mais do que necessário que haja um rodízio dos funcionários.”

Para combater o uso de celulares no presídio, o advogado criminalista, ex-promotor e ex-delegado Luiz Flávio Gomes acredita que deve haver uma fiscalização rigorosa e diária em cada cela. “O problema é que agentes penitenciários estão envolvidos em corrupção e isso é que deve ser combatido.”

Para Antonio Ruiz Filho, presidente da Aasp — Associação dos Advogados de São Paulo não há a menor possibilidade de advogados levarem celulares para os presídios. “Isso só é possível com ajuda de funcionários da carceragem. Os advogados em regra não têm contato físico com presos. Acusar o advogado por isso é uma falácia.”

O advogado criminalista Eduardo Carnelos diz que não dá para entender “como é que todos os estabelecimentos do sistema prisional de São Paulo estão infectados de telefones celulares em pleno funcionamento.” Para ele, não há como explicar o fato de estarmos em 2006 sem uma tecnologia capaz de bloquear efetivamente os telefones celulares.

A Anatel ainda não se posicionou sobre os fatos recentes. Mas com a demanda da sociedade em relação às rebeliões em massa nos presídios paulistas ocorridas em 2001, foram feitos estudos em relação aos bloqueadores de celular e desenvolvidos equipamentos de bloqueio que já estão no mercado.

A instalação dos bloqueadores, porém, está condicionada à prévia autorização do Depen — Departamento Penitenciário Nacional, da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça. Em São Paulo, oito presídios contam com bloqueador de sinal, no Rio de Janeiro são cinco. O investimento para implantar o bloqueio nos presídios é de R$ 300 mil (R$ 150 mil por cada freqüência).

Para o governador Claudio Lembo “Há uma lenda que tem sido mantida e até pelas autoridades, o do celular. Não é o celular coisa nenhuma. São determinados elementos que entram nos nossos presídios baseados na legislação e coletam informações e levam para o mundo exterior. Nós vamos pedir ao poder judiciário que permita a escuta dos diálogos dos prisioneiros com seus defensores. Celular é um caso e não é o mais grave.” Segundo Lembo, muitos advogados “podem servir de pombo correio entre o interior de presídios e o mundo exterior.”

Segundo o Superior Tribunal de Justiça, em recente decisão de abril deste ano, não é considerado falta grave usar o celular nas penitenciárias, ao contrário das normas da Secretaria de Administração Penitenciária. O entendimento do STJ é de que se não está previsto em lei, como o caso da proibição de usar celular em penitenciárias, não é crime.

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