Depois do fim

Mulher pode manter sobrenome do ex-marido após divórcio

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11 de maio de 2006, 15h51

O sobrenome do ex-marido pode ser mantido pela mulher mesmo após o divórcio. O entendimento é do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, mantido pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Os ministros consideraram que decidir o contrário causaria grave dano à personalidade da mulher e prejuízo à identificação por ter convivido durante 45 anos com o nome do ex-marido. Outro fato que chamou a atenção foi a idade da ex-mulher — quase 80 anos.

Da sentença que decretou o divórcio, o casal recorreu à segunda instância. O ex-marido, autor da ação, com a intenção de mudar a parte da sentença que autorizou a mulher a usar o nome de casada. Já a ex-mulher pediu a improcedência do pedido do divórcio, porque a partilha ainda não havia sido feita.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não acolheu nenhum dos pedidos. Para os desembargadores, a mulher pode continuar usando o nome do marido mesmo após o divórcio, pois, com tanto tempo de casado, o nome se incorporou à sua personalidade. O TJ fluminense também decidiu que a partilha pode ser feita na fase de execução.

O ex-marido entrou com Recurso Especial no STJ. Explicou que, quando pediu o divórcio, solicitou que a ex-mulher voltasse a usar o nome de solteira e que esse fato, especificamente, não foi contestado. Por isso, a sentença não poderia ter determinado o uso do nome de casada. Além disso, caberia à ex-mulher provar as situações que permitiram usar o nome de casada.

Já a defesa da ex-mulher afirmou que os argumentos do ex-marido não foram apreciados pelas instâncias ordinárias, assim não caberia ao STJ fazê-lo. No mérito, destacou que ela tem quase 80 anos e que o sobrenome integra a sua personalidade há 45 anos.

O relator do processo, ministro Aldir Passarinho Junior, manteve a decisão do TJ fluminense. Verificou que, ao contrário do que sustenta o ex-marido, houve o expresso entendimento do Tribunal de Justiça de haver grave dano à personalidade da ex-mulher, assim como prejuízo à sua identificação.

Resp 241.200

Leia a íntegra da decisão

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR : Adoto o relatório de fl. 139, verbis:

“Da sentença de fls. 78⁄81, que decretou o divórcio do casal, apelaram ambas as partes.

O varão (fls. 84⁄94), autor da ação, mostra-se inconformado com a parte da sentença que facultou à mulher a continuação do uso do nome de casada.

A mulher (fls. 98⁄103), por sua vez, pleiteia a reforma integral da sentença, com a improcedência do pedido, pelos seguintes fundamentos: o autor não logrou demonstrar a separação do casal há mais de dois anos; foi ele quem abandonou o lar conjugal; a presente ação é uma represália à propositura de ação de alimentos; o apelado pretende o divórcio sem a devida partilha dos bens do casal, em frontal prejuízo aos interesses da apelante.

Os recursos foram contra-arrazoados a fls. 109⁄114 e 115⁄120.

O parecer do Ministério Público, em ambas as instâncias, foi no sentido do desprovimento dos recursos (fls. 122⁄123 e 130⁄133)”.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro negou provimento a ambas apelações, em acórdão assim ementado (fl. 138):

“DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO DIRETO. USO DO NOME DO MARIDO PELA MULHER, APÓS O DIVÓRCIO. PARTILHA DOS BENS.

Demonstrado o decurso do prazo legal, é cabível a decretação do divórcio direto.

A mulher pode continuar a usar o nome do marido, mesmo após o divórcio, se foi casada durante 45 anos e, já com 70 anos de idade, o nome se incorporou à sua personalidade.

Possibilidade de a partilha dos bens do casal ser deixada para a fase de execução.

Desprovimento de ambos os recursos.”

Opostos embargos declaratórios às fls. 144⁄149, foram eles rejeitados às fls. 152⁄154.

Inconformado, A. G. de M. interpõe recurso especial alegando, em síntese, que o recorrente ajuizou ação ordinária de divórcio pedindo que, decretado o divórcio, a ré voltasse a usar o nome de solteira; que a ré não se insurgiu na contestação contra tal postulação; que nos termos do art. 285 do CPC, não impugnada a ação, presumem-se verdadeiros os fatos articulados pelo autor, o mesmo estabelecendo o art. 302.

Todavia, aduz, a sentença decretou o divórcio mas manteve o uso do nome de casada pela ex-exposa, decisão mantida em grau recursal.

Salienta que também foi contrariado o art. 25, parágrafo único, da Lei n. 6.515⁄1977, na redação dada pela Lei n. 8.408⁄1992, posto que competia à ré provar as situações excepcionais que lhe permitiriam permanecer usando o nome de casada, o que não fez, eis que sequer contestou esta parte do pedido.

Por fim, pede a nulidade do aresto estadual, pelo não-enfrentamento das questões propostas.

Invoca precedentes jurisprudenciais.

Contra-razões às fls. 181⁄187, acenando com a ausência de prequestionamento, e que as questões atinentes aos arts. 285 e 302 somente foram suscitadas nos aclaratórios, inovando-se o julgamento.

No mérito, diz que a recorrida tem quase 70 anos de idade, de sorte que os pressupostos que autorizariam a retirada do nome de casada não se justificam, destacando que o patronímico do recorrente integra a sua personalidade após 45 anos de matrimônio.

Lembra a incidência da Súmula n. 7 do STJ.

O recurso especial não foi admitido na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 193⁄195, subindo ao STJ por força de provimento dado ao AG n. 212.835⁄RJ (apenso).

Parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República às fls. 254⁄264, pelo Dr. Ronaldo Bomfim Santos, no sentido do improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Trata-se de recurso especial aviado pelas letras “a” e “c” do autorizador constitucional, em que se alega ofensa aos arts. 535, II, 285 e 302, do CPC, 25, parágrafo único, da Lei n. 6.515⁄1977, na redação dada pela Lei n. 8.408⁄1992, além de dissídio jurisprudencial.

Inicialmente, rejeito a nulidade do acórdão, porquanto o mesmo enfrentou as questões essenciais ao deslinde da controvérsia, apenas que desfavoravelmente, em parte, ao autor.

Efetivamente, inobstante já houvesse a sentença determinado a continuidade do uso do nome de casada pela ex-esposa, a apelação teceu fundamentação que não tocava na tese alusiva a tais dispositivos, pelo que inexistiu omissão alguma do acórdão objurgado quanto a tais temas. Os aclaratórios é que inovaram, como se fosse possível – e não é – aditar-se uma apelação posteriormente ao seu julgamento pelo Tribunal.

Destarte, não prospera nem a tentativa de nulificar o decisum de 2o grau, nem, tampouco, e por conseqüência, tem-se como aperfeiçoado o prequestionamento dos arts. 285 e 302 da lei adjetiva civil.

Quanto ao art. 25, parágrafo único, da Lei n. 6.515⁄1977, a redação dada pela Lei n. 8.408⁄1992, é a seguinte:

“Art. 25. A conversão em divórcio da separação judicial dos cônjuges existente há mais de um ano, contada da data da decisão ou da que concedeu a medida cautelar correspondente (art. 8°), será decretada por sentença, da qual não constará referência à causa que a determinou.

Parágrafo único. A sentença de conversão determinará que a mulher volte a usar o nome que tinha antes de contrair matrimônio, só conservando o nome de família do ex-marido se alteração prevista neste artigo acarretar:

I – evidente prejuízo para a sua identificação;

II – manifesta distinção entre o seu nome de família e dos filhos havidos da união dissolvida;

III – dano grave reconhecido em decisão judicial.”

A respeito, assim se manifestou o voto proferido nos aclaratórios do aresto a quo, de relatoria da eminente Juíza convocada Cássia Medeiros, litteris (fl. 154):

“O acórdão, entretanto não necessitava enfrentar todos os argumentos apresentados pelo recorrente, se já dispunha de elementos suficientes para julgar o recurso, até porque entendeu que, no divórcio direto, a continuação do uso do nome de casada pela mulher constitui uma faculdade. Ademais, como assinalado na ementa do acórdão impugnado, a ora embargada foi casada durante 45 anos e, já com 70 anos de idade, o nome se incorporou à sua personalidade”.

Verifica-se, portanto, que ao inverso do que sustenta o recorrente, houve o expresso entendimento do Tribunal de Justiça de que haveria dano grave a sua personalidade, bem assim prejuízo a sua identificação, em face do longo tempo em que adotou o patronímico do recorrente, ainda considerando a sua idade avançada, presentemente quase oitenta anos.

Essas conclusões da Corte recorrida são tiradas da apreciação fática dos elementos informativos dos autos, que não têm como ser revistas em sede especial, ao teor da Súmula n. 7 do STJ.

Nesse sentido:

“CIVIL. SEPARAÇÃO CONSENSUAL. MULHER. NOME DE CASADA. MANUTENÇÃO. ART. 25, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO II DA LEI Nº 6.515⁄77.

1 – Reconhecida pela instância originária (ordinária) que ao deixar a mulher de usar o nome de casada ocorrerá manifesta distinção entre o seu nome de família e dos filhos havidos da união dissolvida, não tem força bastante o fundamento da maioridade da prole, invocado pelo acórdão para reformar a sentença, porquanto trata-se de requisito não contemplado pela lei de regência. Precedente da Quarta Turma – Resp 358.598-PR.

2 – Recurso especial conhecido em parte e, nesta extensão, provido.”

(4ª Turma, REsp n. 247.949⁄SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, unânime, DJU 31.05.2004)

“CONVERSÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL EM DIVÓRCIO. SUPRESSÃO DO NOME DE CASADA. EXCEÇÕES PREVISTAS NO ART. 25, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISOS I E II, DA LEI Nº 6.515, DE 26.12.1977. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA.

– Em princípio, cabe ao Tribunal de 2º grau, sopesando os termos do contraditório e os elementos probatórios coligidos nos autos, decidir sobre a necessidade ou não da produção de prova em audiência.

– Acórdão recorrido que conclui acarretar a supressão do nome da ex-mulher prejuízo à sua identificação. Matéria de fato. Incidência da Súmula nº 7-STJ. Preservação, ademais, do direito à identidade do ex-cônjuge.

– Distinção manifesta entre o sobrenome da mãe e o dos filhos havidos da união dissolvida, não importando que hoje já tenham estes atingido a maioridade.

Recurso especial não conhecido.”

(4ª Turma, REsp n. 358.598⁄PR, Rel. Min. Barros Monteiro, unânime, DJU 02.12.2002)

Por fim, observo que o dissídio não foi apresentado na forma exigida regimentalmente, faltando-lhe o confronto analítico que pudesse permitir a rigorosa identificação das situações fático-jurídicas trazidas à colação.

Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

É como voto.

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