Doutores e excelências

Num país tão desorganizado, só o crime é organizado

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9 de junho de 2006, 23h31

Deputados da Comissão Parlamentar de Inquérito do Tráfico de Armas e os conselheiros federais da Ordem dos Advogados do Brasil travaram um diálogo difícil na última reunião do Conselho da Ordem, na terça-feira (6/6). Os deputados foram à reunião com a intenção de denunciar o envolvimento de profissionais do Direito com o crime organizado. Já os advogados receberam os visitantes prontos para reclamar dos maus tratos que têm recebido dos parlamentares nas CPIs.

Com Roberto Busato, presidente da OAB, e Moroni Torgan (PFL-CE), presidente da CPI, encabeçando a mesa, deputados e advogados sucederam-se ao microfone num longo debate que foi gravado e cujo conteúdo foi remetido para integrar os autos da CPI. Torgan encarregou-se de formar a pauta, apresentando as razões das preocupações e propostas de ação.

Disse que não se referia ao direito que todo réu, ainda que perigoso integrante de organização criminosa, tem de se defender e de contar com um advogado, mas do inverso disso — do advogado que por pressão ou opção econômica se torna cúmplice do crime organizado. “Na verdade, eu os qualifico mais como criminosos do que como qualquer outra coisa.”

Em seguida pediu a opinião da Ordem a respeito de uma suposta resistência dos advogados de se submeterem à revista para entrar nos presídios. Na verdade, aproveitou para relacionar a negativa com a disposição de servir de pombos-correios de criminosos para introduzir armas e celulares nas celas dos clientes. “Infelizmente, muitos advogados, um por intimidação, outros por corrupção mesmo, muitas vezes têm levado aparelhos de celular e outras coisas para dentro do presídio.”

Outra preocupação séria do presidente da CPI era com relação aos honorários de advogados pagos com dinheiro de origem ilícita. “O que a sociedade não entende é porque o dinheiro ilícito volta em vantagem do delinqüente”, disse.

Coube ao conselheiro Sérgio Alberto Frazão do Couto, “preocupado com algumas violências de que os advogados têm sido vítimas, nos plenários das CPIs”, responder ao deputado. E ele foi direto ao ponto. “As CPIs têm sido pródigas em ameaças às prerrogativas dos profissionais, e até mesmo implementando as ameaças com ordens de prisões dadas, depois de provocações em que o advogado responde à altura, numa retorção imediata à ofensa recebida.”

Frazão anunciou que a oposição da classe à revista nos presídios era um mito. “O que nós desejamos é que a dignidade do advogado seja preservada na oportunidade dessa revista. Não é o advogado ser apalpado fisicamente, advogada sendo apalpada”, disse.

A questão da ilicitude da origem dos honorários de advogados dos chefões do crime organizado voltava à baila a cada intervenção. Menos preocupado com a polidez, o conselheiro Reginald Delmar Hintz Felker interpelou o deputado Neucimar Fraga: “Eu perguntaria: e os advogados que defendem os políticos acusados de corrupção por aí, também ficariam no mesmo problema?”

A questão ficou sem uma resposta direta, mas outro conselheiro, Sergio Ferraz, tratou de colocar a questão numa perspectiva técnica: “Pouco importa a natureza da fonte dos honorários que o advogado percebe. Ele tem direito de trabalhar para o chefe de quadrilha organizada e o chefe de quadrilha organizada tem direito a advogado. Os honorários são sempre lícitos na medida em que eles correspondam à prestação de trabalho. O que é ilícita é a fonte de onde a tia do Fernandinho pagou”.

Os deputados fizeram propostas para a criação de varas especializadas em crime organizado, que já estaria sendo encaminhada pelo Conselho Nacional de Justiça, e para implementar as reformas do Código de Processo Penal e da Lei de Execuções Penais. As propostas deverão fazer parte do relatório final da CPI, a ser apresentado no dia 3 de julho, segundo o relator, deputado Paulo Pimenta.

A sessão não terminaria antes que o conselheiro Cezar Roberto Bitencourt externasse sua perplexidade: “Gozado, num país tão desorganizado como o Brasil, só o crime é organizado”.

Leia a transcrição do debate

Presidente Roberto Antonio Busato: Senhores Conselheiros, eu suspendo o julgamento desse processo. Nós temos a honra de ter entre nós os eminentes Deputados, que já foram anunciados, liderados pelo Presidente da CPI, Deputado Moroni Torgan. E eu convido os senhores Parlamentares para tomarem assento à Mesa, o Deputado Paulo Pimenta, o Deputado Neucimar Fraga, o Deputado Colbert Martins, Josias Quintal, Deputado Raul Jungmann.

Senhores Conselheiros, esta Casa recebeu uma comunicação da Comissão de Inquérito referentes às armas, a respeito das atitudes de advogados naquela Casa, e com um requerimento expresso, num primeiro contato, para que o Conselho Federal estabelecesse um procedimento que visasse a representação disciplinar daqueles advogados e, também, a suspensão preventiva do exercício profissional.


Nós, nos termos do artigo 70 do Regulamento, encaminhamos às Seccionais competentes para tal procedimento. Encaminhamos a representação à Seccional do Distrito Federal que, por força do caput do artigo, ela tem a competência para conhecer da representação e mandamos à Seccional de São Paulo o problema da suspensão preventiva, que é estabelecida pelo mesmo artigo, que tem que ser pela Seccional de origem.

A Seccional de São Paulo, estive em São Paulo a semana passada, a Seccional de São Paulo me cientificou que o julgamento já está marcado para o dia 19 de junho. Portanto, a Ordem dos Advogados do Brasil deu uma pronta resposta àquilo que foi oficiado pela CPI.

Posteriormente, o Presidente Moroni Torgan fez um convite para uma audiência pública, convidando a mim, Presidente Nacional da Ordem e, também, o Presidente da OAB de São Paulo — foi amplamente noticiado pela imprensa — para que comparecêssemos à CPI para discutirmos as prerrogativas da advocacia, o sistema presidiário, enfim, os temas que estão sendo abordados dentro da CPI. O Presidente D’Urso entendeu que a competência seria minha, já que falo pela advocacia nacional nesses acontecimentos.

Logo em seguida, no Conselho Nacional de Justiça, na qual oficio, em nome da Ordem, esteve presente o Presidente Moroni Torgan e, também, o relator da Comissão, o Deputado Paulo Pimenta, aqui presente. E lá conversei com o Deputado Moroni Torgan, no sentido de que seria mais útil, talvez, à CPI e ao próprio país, nós estabelecêssemos um diálogo franco e aberto junto com todos os Conselheiros, mesmo porque não tenho, todos sabem, não tenho a especialidade no Direito Penal, não milito na área, e aqui é uma coletividade que representa toda a advocacia nacional, todos os estados presentes, os líderes da advocacia brasileira aqui presentes, que poderiam, com esse debate, contribuir para os trabalhos da CPI, contribuir para a Nação brasileira e por outro lado, também, nós fazermos uma reflexão sobre as prerrogativas profissionais que tanto temos defendido, não como um direito nosso, mas como um dever que temos com a sociedade brasileira, dentro do Estado Democrático de Direito e dentro da ampla defesa. Este é, sempre foi e sempre será o Norte da Ordem dos Advogados do Brasil. Não no sentido de acobertar qualquer tipo de deslize ético, de deslize profissional mas, sim, preservar o Estado Democrático de Direito e, daí, envolve a ampla defesa e o direito que tem o cidadão de ter um advogado absolutamente protegido para que ele possa, não ficar protegido individualmente, mas que ele possa proteger a cidadania brasileira e, aí, se compreende todos: os ricos, os poderosos, os humildes, os fracos, os oprimidos, conforme as lições de Rui Barbosa e de tantos outros luminares da ciência do Direito, ao longo da História.

Portanto, Presidente Moroni Torgan, a Casa agradece a atenção, agradece a deferência de ver os eminentes membros da Comissão aqui presentes. E a Casa da Ordem não é só a Casa do advogado, é a Casa do povo. E como os senhores representam uma boa parcela do povo brasileiro, a Casa também é de vocês, para esse debate absolutamente franco e informal, visando colocar alguns pontos no seu devido lugar.

Eu concedo a palavra ao eminente Presidente, para a sua manifestação inicial.

Deputado Moroni Torgan: Querido Presidente Roberto Antonio Busato, que tem sido sempre um aliado da sociedade, nas causas que visam preservar a ética no nosso país, e junto com a OAB. Eu me sinto muito à vontade na OAB, porque meu pai e minha mãe são advogados, minha irmã é advogada. Eu não sou advogado porque estou impedido, por ser Delegado Federal de profissão, mas meus tios são advogados, sobrinhos, primos, meu avô era advogado. Então, me sinto muito à vontade.

Quero também reconhecer, aqui, a presença do nosso Relator Geral, Paulo Pimenta, do nosso Vice-Presidente, Neucimar Fraga, Deputado Josias Quintal, Deputado Colbert Martins, que são membros, também, da CPI.

Nós até falamos com o Presidente e ele disse: “Olha, porque que vocês não vão lá, na reunião do Conselho?” Muitos até disseram: “Mas vai lá na reunião do Conselho num momento desses?” Eu digo: “Olha, o Conselho da Ordem, ele é um aliado nosso, e sempre será um aliado nosso, da sociedade, nessa guerra contra o crime organizado”. Agora, se um bandido é ferido, ele recebe o atendimento médico, se ele é acusado, ele tem que receber o atendimento jurídico, isso tudo nós entendemos perfeitamente.

Então, nós decidimos vir ao Conselho, e temos alguns pontos que nós queríamos ponderar. Inclusive com a licença do Presidente, eu vou colocar os pontos, porque aí já torna mais objetivo, porque nós vamos, ao término da CPI, o Relator, principalmente, vai fazer várias sugestões de reforma da legislação. E nós não queremos fazer essas sugestões sem ter o parecer da Ordem sobre cada uma dessas sugestões. Nós gostaríamos de ouvir todas as partes, e tentar fazer ações que sejam o mais eficazes possíveis, nesse combate contra o crime organizado. Eu tenho certeza que nenhum de nós gosta da ação do crime organizado.


Com referência — eu vou começar, preliminarmente, sobre o caso dos dois advogados — eu acho que o Brasil inteiro, ficou muito notório que, infelizmente, eles extrapolaram as prerrogativas do Estatuto da Ordem e partiram para uma corrupção que é totalmente reprovada, tanto pelo Estatuto quanto pela Constituição. Então, fizeram um ato que desmerece chamá-los de profissionais da OAB. Na verdade, eu os qualifico mais como criminosos do que como qualquer outra coisa. Como também meus companheiros de polícia que, quando vão para o lado de lá, não são mais meus companheiros de polícia, eles passam a ser membros do crime organizado e deixam de ser meus colegas.

Eu tenho dito sempre que não se esconde atrás da palavra “colega” nenhum bandido. Bandido tem que ficar com os colegas deles. E, infelizmente, o crime organizado se infiltra… O Deputado Raul Jungmann chegou, Presidente, se tivesse um lugar aqui…

Presidente Roberto Antonio Busato: Gostaria que o Deputado tomasse assento à Mesa. Ele que é um companheiro de lutas passadas e presentes da Casa.

Deputado Moroni Torgan: Então, com relação à eles, eu quero parabenizar a Ordem, que o Presidente colocou muito bem que dia 19 já será feita uma audiência disciplinar, eu acredito, na Ordem, justamente para apurar esse tipo de ação. Então, é tudo que nós queremos. Eu acho que não temos, aí, maiores observações a fazer. Eu acho que eles têm que ser punidos pelos atos que praticaram e, infelizmente, atos ilegais que praticaram, como ficou visível para todo o Brasil, que foi tudo feito de forma bem transparente, para todo o Brasil ver.

Agora, existem alguns problemas que eu gostaria de trocar idéias com o Conselho. E eu acredito que toda a CPI, se alguém quiser fazer uma observação, posteriormente, se o Presidente assim o fizer, eu franqueio também a palavra a qualquer observação.

Eu fiz algumas observações aqui, mas eu começo por um problema que eu julgo sério, e nós temos ouvido vários advogados falarem conosco, reservadamente, conseqüentemente eu não posso dizer o nome. Posso até, depois, com o Presidente, se ele assim quiser, eu posso até falar de alguns, mas eu não gostaria de declinar, porque é reservadamente, eu não posso declinar.

Mas eles têm o seguinte problema: o seu cliente comete um delito, e eles são advogados do cliente. A partir do momento que eles são advogados do cliente, o cliente é condenado, vai para o presídio, eles continuam advogados do cliente na fase processual. Só que no presídio o cliente deles entra para uma organização criminosa, ou Comando Vermelho, ou PCC. E, a partir daí, eles começam a pressionar o advogado para o advogado virar mensageiro e fazer qualquer outras coisas para o crime organizado. E, aí, o cliente, que era um delinqüente comum, já não é mais, já é membro da organização criminosa. E, a partir dali, chega para o advogado dele e diz: “Olha, ou tu trabalha para nós, levando mensagem para o presídio tal, levando um dinheiro para o fulano de tal, ou então eles vão me matar aqui dentro do presídio. E, depois, tem mais, e eles conhecem toda a tua família, também”.

Então, o advogado fica praticamente refém do crime organizado, muitas vezes sem saber o que fazer. Alguns talvez tentem de todas as formas, mas com receio de saírem e tornarem expostos todos os seus familiares, outros já pelo contrário, infelizmente deixam as prerrogativas e começam a ganhar mais dinheiro em cima disso, que eu acho que é a minoria, eu acho que a maioria, ela se sente refém do crime organizado.

Essa é uma atitude que nós temos que ver como nós vamos dar garantias ao advogado, para que ele não se torne refém, inclusive contra o desejo dele, muitas vezes. Nós temos que ver que tipo de ação nós podemos ter para que isso não aconteça. E não foi nem um, nem dois advogados que nos falaram isso. Já vários advogados têm nos falado que: “Olha, nós estamos tentando, mas depois que a gente entra, não tem como sair, eles não deixam a gente sair”. Isso são palavras de advogados.

E eu senti na pele, quer dizer, muitas vezes a sociedade critica: “Ah, advogado está trabalhando para os bandidos, não sei o quê”. Mas, muitas vezes, ele está refém, também, dos bandidos. E, aí, é um problema que nós temos que, como instituições, tentar dar a cobertura necessária para que ele não chegue nessa situação.

Outra coisa que todos têm falado, e eu gostaria de ouvir a opinião da Ordem, também, é com relação àquela revista, mesmo que seja eletrônica, nos presídios. Infelizmente, muitos advogados, um por intimidação, outros por corrupção mesmo, muitas vezes têm levado aparelhos de celular e outras coisas para dentro do presídio. E isso de não passar na revista é uma coisa que não entende. Eu acho que uma revista eletrônica não teria maiores problemas para se passar, visto que quando se entra num avião a gente tem que passar pela revista. Eu não sei… É difícil, por isso que eu quero ouvir a Ordem, porque é difícil da gente compreender porque que isso não acontece. Então, esse é um ponto. De repente acontece, porque eu ouvi alguém dizendo: “Acontece”. De repente acontece e não é falado. Então, por isso que eu digo: eu acho que nós viemos para tirar todas essas dúvidas.


Outra coisa que incomoda a população muito: é o crime organizado pagar qualquer profissional com dinheiro ilícito. Quer dizer, o dinheiro fruto do ilícito é uma coisa… Não é profissional da Ordem, qualquer um. Por exemplo, o médico. Aí dizem: “Ah, mas como é que ele vai ser atendido?”. Vai ser atendido pela rede pública, vai ser atendido pelo defensor público. Porque se ele não tem dinheiro lícito para poder pagar um profissional privado, então ele tem que ser atendido pela rede pública.

E o que não entende a sociedade é porque o dinheiro ilícito volta em vantagem do delinqüente. Quer dizer, se o dinheiro é ilícito, ele é para ser confiscado, não é para ser usado. Ele não é para ser usado em razão nenhuma, nem para pagar o médico, nem pagar o advogado, nem para pagar engenheiro, nem para pagar coisa nenhuma. Dinheiro ilícito é para ser confiscado, não é para ser usado. Porque, inclusive, essa seria uma forma de lavar dinheiro sujo, porque pega o dinheiro sujo, paga um profissional aqui e lava o dinheiro. Então, nós temos que pensar que fórmula isso, também, nós poderíamos evoluir, nesse sentido.

Temos, ainda, agora no Conselho Nacional de Justiça, foi aprovado um passo que eu julgo vital. Nós tínhamos especialização na polícia, nós tínhamos especialização no Ministério Público, de combate ao crime organizado, e não tínhamos especialização no Judiciário. Então, o Conselho Nacional de Justiça, por unanimidade, aprovou uma recomendação de serem criadas Varas especializadas de combate ao crime organizado. Eu também gostaria de ouvir a OAB a respeito disso, visto que nós temos agora, no fim do mês, uma reunião com o Colégio dos Presidentes de Tribunais de Justiça, e lá, então, nós tentaremos consolidar essa idéia em todo o Brasil.

Bom, nós estamos, aí, com várias legislações, agora que surgiu o problema, aí, tem várias legislações sobre como coibir meios de comunicação no presídio. Eu gostaria de ouvir, também, a Ordem, sobre isso, sobre as proibições dos meios de comunicação no presídio.

Agora, tem dois itens que eu acho fundamental, e acho que numa reunião como esta não daria para a gente debater com profundidade nenhum dos dois. Mas eu gostaria de ter sugestões da Ordem sobre a reforma do processo penal e sobre a reforma da Lei de Execuções Penais.

Existem muitos itens que estão ultrapassados, tanto no processo penal quanto na Lei de Execuções Penais. Mas eu sei que isso não é uma coisa para se debater aqui em meia hora, uma hora. Isso requer muito mais profundidade. E eu gostaria de receber, aí sim, Presidente, depois, sugestões do Conselho sobre isso, para que nós pudéssemos, então, fazer um estudo sobre a possibilidade dessa reforma, tanto do processo penal… Só gostaria que isso acontecesse até o fim do mês, antes do fim do mês, para que nós pudéssemos apreciá-las, então, essas sugestões da reforma do processo penal e da reforma da Lei de Execuções Penais.

Então, esses são alguns tópicos, eu acho que já tem bastante aqui. E eu devolvo a palavra ao Presidente e, Presidente, se algum componente da CPI gostaria de fazer algum comentário.

Presidente Roberto Antonio Busato: Bom, vamos adotar a seguinte metodologia, já alguns Conselheiros me indagaram: vamos usar a metodologia como o nosso Regulamento Geral determina. Os expositores falarão, depois abriremos o debate. Eu peço a atenção, já temos várias indicações para debates, temos vários Deputados aqui presentes, para nós sermos os mais sucintos possíveis, para que possa render.

Eu vou mandar degravar a presente sessão, transformando esta sessão num procedimento, dentro da Ordem, um processo administrativo, dentro da Ordem, para nós chegarmos a umas conclusões. E, no final, eu vou designar uma Comissão que vai fazer um relatório. O Deputado Paulo Pimenta, a quem vou dar a palavra na seqüência, já se colocou à disposição de receber um relatório da Ordem dos Advogados do Brasil, uma posição da Ordem que possa auxiliá-lo no seu relatório final. Portanto, nós designaremos, no final desta audiência, uma Comissão que formatará alguns pontos sobre isso.

Com relação à modificação, à reforma do processo penal e da Lei de Execuções Penais, nós podemos designar, também, uma Comissão Especial, conforme aquela que nós temos, do Conselheiro Edson Ulisses, do Marcos Vinícius, que trata da reforma do Processo Civil, tratando de alguns temas que podemos, ao longo do tempo, aperfeiçoarmos o posicionamento da Ordem dos Advogados do Brasil.

Eu concedo a palavra ao Deputado Paulo Pimenta, Relator da CPI.

Deputado Paulo Pimenta: Primeiramente, eu quero agradecer ao ilustre Presidente, pela oportunidade que nos concede, enquanto Comissão Parlamentar de Inquérito, de poder estar participando desta reunião. E dizer a todos os senhores e senhoras que, para nós, é uma oportunidade de grande relevância.


Vou ser bastante sucinto e bastante objetivo, Senhor Presidente. A nossa CPI é uma CPI que está buscando, fazendo um trabalho que eu diria eminentemente técnico. Diferente de outras CPIs, esta é uma CPI que nós temos conseguido resguardar, de maneira bastante adequada, inclusive, as nossas divergências de natureza política-partidária. CPI que tem conseguido, durante todo o período do seu funcionamento, tratar de fato do tema para o qual ela foi criada: investigar a questão do tráfico de armas e munições, as organizações criminosas, e apontar proposições no sentido de coibir ou, pelo menos, reduzir este conjunto de facilidades que nós encontramos, para que os criminosos possam constituir verdadeiros exércitos, arsenais, como estes que nós estamos diariamente assistindo, pelos meios de comunicação.

A nossa CPI não tinha como foco, e não tem, uma discussão específica sobre esta ou aquela organização. O fato de nós, no decorrer da investigação, irmos avançando no sentido de percebermos que boa parte daquela arma e daquela munição que entra de maneira ilegal no país se dirigia a um determinado destino, fez com que nós chegássemos a uma investigação mais criteriosa, a respeito de algumas dessas organizações.

Nós já estamos praticamente na fase de conclusão da elaboração do relatório. Eu pretendo, Senhor Presidente, apresentar o relatório no dia 3 de julho. E este relatório será um relatório basicamente aonde nós vamos trabalhar um diagnóstico das fragilidades que nós identificamos. E para cada diagnóstico específico nós vamos apresentar sugestões que envolvem mudanças de procedimentos, redefinição de competências e alteração legislativa para questões que possam, de alguma forma, ter vínculo direto com o debate que nós estamos realizando.

Então, o Presidente já falou, eu quero aqui reafirmar, como Relator, que nós estamos à disposição para recebermos da OAB opiniões a respeito de medidas que possam ser implementadas, de modo a fazer com que a sociedade brasileira tenha mais paz, mais segurança, que é, efetivamente, o desejo de todos.

Eu quero só duas questões, Senhor Presidente, destacar. Pelo que eu tenho percebido, eu creio que há uma diferença na forma de interpretação da legislação, no que diz respeito à gestão do sistema penitenciário e da regulamentação de uma série de questões.

Uma das coisas que chamou a atenção, na nossa CPI, foi o relato que nós recebemos, por parte de advogados, e quando nós solicitamos, dentro do sistema penitenciário, principalmente do estado de São Paulo, a relação de visitas que alguns presos vinham recebendo, nós percebemos que alguns presos recebiam visitas de advogados que não são seus advogados. E chegamos a uma informação que nos pareceu surpreendente: diferente do procedimento adotado em outros estados, e eu tive o cuidado de buscar esta informação lá no nosso estado, Rio Grande do Sul, que tem aqui representantes no Conselho, o procedimento do sistema penitenciário paulista, qualquer advogado pode visitar qualquer preso, sendo ou não advogado daquele preso, tendo procuração ou não. Eu constatei, por exemplo, que em alguns locais isto pode ocorrer quando o advogado visita o apenado com o objetivo de ser constituído como seu advogado.

Então, por exemplo, um líder de uma organização criminosa, preso, no estado de São Paulo, no dia do seu aniversário recebe visita de vários advogados, de diferentes presos. E nós questionamos esses advogados, quer dizer: “O que que vocês foram fazer, visitando fulano de tal, já que o senhor não é advogado dele?”. Ele disse: “Não, o meu cliente está preso no presídio tal e me contratou para que eu fizesse uma diligência, eu fui paga para isso e eu fiz, isso é minha prerrogativa profissional. Eu fui lá visitar o fulano de tal, a pedido do meu cliente, que precisava saber as condições em que ele estava cumprindo a pena, recolhi as informações que eu precisava e levei para o meu cliente”. Nós observamos que isto ocorre, inclusive, às vezes, dentro do mesmo presídio. Visita o preso da cela 13, depois vai na cela 17, depois retorna à cela 13, depois vai na cela 19, sendo que boa parte dessas visitas não são visitas a clientes.

Então, eu gostaria de conhecer a opinião da Ordem a respeito disso. É uma interpretação da Lei de Execuções, a respeito do preso, a qualquer advogado, a qualquer, mesmo não… Então, nós gostaríamos de tentar buscar, de alguma forma, uma padronização desse procedimento, que é diferente, dependendo de cada estado e talvez, inclusive, de cada estabelecimento penitenciário. Então, esta questão é uma questão que me preocupa bastante.

As outras questões, Senhor Presidente, eu acho que foram bem colocadas pelo Presidente. Eu acho que nós recebemos vários relatos de advogados, nos termos em que foi colocado pelo Deputado Moroni: “Eu fui constituído como advogado de um determinado cliente, depois que ele foi preso, ele passou a fazer parte de uma facção, eu quis abdicar da procuração e ele me disse que isso aí não existe, que eu já tenho muitas informações a respeito do trabalho, e passam, inclusive, a me solicitar procedimentos em tom de ameaça, e que se eu não cumprir aquilo que eles estão me pedindo, eu posso ter conseqüências”. Como é que um advogado pode ter um mecanismo de proteção que evite que ele acabe sendo refém ou vítima de uma situação no qual ele foi envolvido?


E a última questão, que é a questão da revista, a questão do detector de metais, da revista eletrônica. Tem muita controvérsia, muita polêmica a respeito disso. Nós vamos tratar desse assunto no relatório, com relação aos presídios que têm presos de maior periculosidade. Nós gostaríamos de ouvir a opinião dos senhores e das senhoras a respeito disso.

Era isso, Senhor Presidente, por hora. Muito obrigado.

Presidente Roberto Antonio Busato: Senhores Conselheiros, o Deputado Raul Jungmann também fará uso da palavra, mas está aguardando um material que será exposto. Nós podemos abrir os debates, para agilizar o andamento da sessão. Deputado Raul Jungmann, na hora que tiver em condições, nós abriremos espaço para sua manifestação.

O primeiro inscrito, e eu gostaria que obedecessem rigorosamente o relógio, é o Conselheiro Sérgio Frazão do Couto, do Pará.

Deputado Moroni Torgan: Presidente, só por uma questão de ordem, o senhor já disse que vai ser transcrita toda a reunião. Então, não precisamos tomar nota, porque vem a transcrição.

Presidente Roberto Antonio Busato: Sim. Eu vou degravar e mandarei para a CPI a sessão.

Conselheiro Sérgio Alberto Frazão do Couto: Senhor Presidente, eminentes Deputados. Eu acho que a Nação brasileira deve muito ao trabalho que Vossas Excelências estão desenvolvendo. Nunca a História da República registrou, ou tem registrado tanta dedicação como Vossas Excelências têm demonstrado, neste terrível trabalho que estão desenvolvendo, em benefício da cidadania brasileira.

E é confiante na honradez de Vossa Excelência, é certo dos altos propósitos que orientam Vossa Excelência que eu, como advogado não criminalista preciso tecer algumas considerações genéricas, relativas às prerrogativas dos advogados nas CPIs. Não se embute nisso nenhum desrespeito à Vossa Excelência, sequer uma descortesia.

Mas é necessário que eu leia um texto à Vossas Excelências, texto de Rui Abreu Sodré, um dos grandes comentadores do Estatuto da Ética dos Advogados. E onde eu ler juiz leia-se deputado, leia-se senador, leia-se presidente de CPI. Dizia Rui Abreu Sodré:

“O advogado precisa da mais ampla liberdade de expressão para bem desempenhar seu mandato. Os excessos de linguagem que porventura cometa, na paixão do debate, lhe devem ser relevados. São, muitas vezes, recursos de defesa que a dificuldade da causa justifica ou, pelo menos, atenua. O juiz” — e aqui leia-se o Deputado, o Presidente, o Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito — “deve ter a humildade necessária para ouvir, com paciência, as queixas, reclamações e réplicas que a parte opõe a seus despachos e sentenças. Apontar os erros dos julgados, porque guarde os deslizes, os abusos, as injustiças, em linguagem veemente, é direito sagrado do pleiteante. Então, há de ser proporcional a injustiça que a parte julgue ter sofrido. Nada mais humano do que a revolta do litigante derrotado. Seria uma tirania exigir que o vencido se referisse com meiguice e doçura ao ato judiciário” — aqui leia-se ato de um Deputado — “e à pessoa do julgador que lhes conheceu o direito. O protesto há de ser, por força de…”.

Excelência, eu gostaria que Vossa Excelência… porque eu estou falando genericamente, só um pouco mais de tempo.

“O calor da expressão há de se proporcionar uma injustiça”, já falei nisso. “O protesto há de ser, por força, em temperatura alta. O juiz é quem tem de se revestir da couraça e da insensibilidade profissional necessárias para não perder a calma e não cometer excessos”.

Li este trecho, Excelências, preocupado com algumas violências que os advogados têm sido vítimas, nos plenários das CPIs. A advocacia é uma atividade tensa, nervosa. O advogado que não vive o problema do seu constituinte não é um bom advogado.

Eu não sou advogado criminalista, e vivo tenso. Para que Vossas Excelências tenham idéia, houve um estudo da Universidade de John Hopkins(?), nos Estados Unidos, que concluiu que a profissão dos advogados é onde mais se encontra alcoólatras, mais se encontram pessoas com problemas emocionais.

Então, é indispensável este primeiro toque, para que Vossas Excelências considerem isso, que muitas vezes o advogado está ali, naquela tensão, às vezes profere uma palavra sem o menor sentido de querer ofender Vossa Excelência. E tem sido, as CPIs têm sido pródigas em ameaças às prerrogativas dos profissionais, e até mesmo implementando as ameaças com ordens de prisões dadas, depois de provocações em que o advogado responde à altura, numa retorção imediata à ofensa recebida.

Quanto às propostas de Vossa Excelência, mais uma vez desejo dizer que, pela primeira vez, assisto tanta honestidade de propósito nesses seis itens que Vossa Excelência colocou aqui à ponderação, e junto aos dois itens acrescentados pelo Relator.


Mas quero dizer uma coisa que está sendo interpretado mal, pela imprensa brasileira: achar que a OAB é contra a revista do advogado. Nós não somos contra a revista. O Presidente Busato nunca falou contra isso. O que nós desejamos é uma dignidade do advogado, preservada na oportunidade dessa revista. Não é o advogado ser apalpado fisicamente. Não é, Vossas Excelências, ou qualquer juiz, esta revista, em qualquer presídio é necessário, tanto para Vossa Excelência quanto para o advogado, até para o Papa, se lá for. Mas tem que ser feita com dignidade, com seriedade. E, para isso, existem aparelhos. Obrigar o advogado a ser apalpado, ou a advogada ser apalpada por quem quer que seja, isso é indigno, isso nós não podemos concordar, isso não há ninguém de bom senso que concorde, neste país.

Poderia eu tecer outras considerações, não é o caso. Estão feitas essas observações, e creio que, sem mandato de nenhum dos Conselheiros e de nenhum dos 500 mil advogados brasileiros, posso dizer que Vossas Excelências estão fazendo um trabalho realmente admirável, realmente digno do maior respeito e dos maiores incomes(?).

Muito obrigado, Senhor Presidente.

Vice-Presidente Aristoteles Atheniense: Nós vamos dar prosseguimento, dentro daquela orientação estabelecida pelo Presidente Busato. Tanto quanto possível, os senhores Conselheiros se limitem a fazer as suas colocações naquele prazo de três minutos. Eu concedo a palavra ao eminente Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro.

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Senhor Presidente. Senhor Deputado Moroni Torgan, Presidente da CPI, em nome de quem saúdo a todos os demais Deputados que nos honram com sua presença.

Anotei, Presidente Moroni, os pontos que Vossa Excelência, enfim, deixa à nossa reflexão. Alguns, obviamente, teremos que refletir bastante sobre como atendê-los. Esta questão do advogado que se torna um refém do crime organizado, é difícil pensarmos em como possamos reduzir a intensidade desse dano que se infringe ao advogado que tem a má sorte de, de boa fé, vir a se transformar num instrumento do crime organizado, mas precisamos, realmente, de pensar em como atendermos a esse lado da questão.

A revista, já disse o meu colega do Pará, o nosso Sérgio Couto, desde a minha época como Presidente, em contatos com Vossa Excelência, em outras CPIs, jamais, que isso fique muito claro, e que a imprensa divulgue isso, com todas as letras, a Ordem foi contra a revista eletrônica. Até porque a ela nos submetemos ao ingressarmos em qualquer Tribunal deste país, ao ingressarmos em aeroportos. Por que teríamos resistência à revista eletrônica, ao ingressarmos em um presídio?

De outro lado… Quanto a isso, portanto, eu acho que é uma questão pacífica e que deve ser amplamente divulgada, para que não haja dúvida alguma de que a Ordem dos Advogados está ao lado, enfim, daqueles que defendem a busca, enfim, de aparelhos eletrônicos ou coisa que o valha, ao ingressar nos presídios.

As Varas especializadas no crime organizado talvez se tenham sido concebidas como instrumento de celeridade da apuração desses crimes. Mas nem sempre isso representa celeridade, e até porque até pode mesmo vir a se transformar num foco de agressão à atuação dos juízes que, como são poucas Varas, esses juízes, hoje, com a organização que se estabeleceu nessas entidades, digamos assim, criminosas, esses juízes ficarão muito expostos. É algo que tem que se pensar um pouco sobre como darmos celeridade a esses processos, mas sem causar mais um problema à apuração rápida desses crimes.

A questão dos meios de comunicação. Não há outra saída para isso, que não seja aplicar o sacrossanto fundo que há, no Ministério da Justiça, que hoje me parece atinge a 600 milhões — não sei se de reais ou de dólares — de reais, 600 milhões de reais, eu tenho certeza que nós resolveríamos 80% desse problema, que estão localizados em São Paulo e Rio de Janeiro, basicamente.

Quer dizer, se construirmos presídios afastados dos grandes centros, para que possamos bloquear as comunicações por rádio ou celular, isso estaria resolvido. Não se pode pensar no bloqueio de comunicações num presídio no centro de uma grande cidade. Isso é impossível fazer, como já está demonstrado, infelizmente, não dá como fazer isso.

De outro lado, as sugestões sobre a reforma do Código de Processo Penal e Lei de Execuções Penais, estamos de acordo, temos que estudar, realmente, porque estão muito ultrapassadas essas legislações. Agora, o ponto fundamental que a meu modesto entender existe a ser discutido e atendido, neste país, é a indignidade com que o sistema penitenciário mantém esta grande massa humana lançada em presídios onde mal conseguem espaço no cimento para dormir. Isto é impossível, isso, realmente, é um foco permanente de construção da criminalidade.


Nós temos o dever de atender a essa questão, não só para atender à dignidade, que também é merecida, dos detentos, mas, sobretudo, para atender à nossa segurança, que está cada vez mais em risco, por omissão e por incompetência do Estado, de resolver bem esse problema.

De forma que isto começa a atingir toda a sociedade, a advocacia, enfim, à medicina, como Vossa Excelência se referiu, todos estão atingidos por uma incompetência do Estado que, de alguma forma, acha que não tem absolutamente nada a ver com isto, basta fazermos leis. Não basta. Nós temos que trabalhar no sentido de fazer com que esses apenados não cumpram além da pena a que foram condenados, que é uma pena privativa de liberdade, a outra pena privativa de dignidade humana que é, na verdade, a mais doída, a mais sofrida do que a outra, que priva da liberdade.

E, no mais, caro Presidente, senhores Deputados, o que penso é que nós temos que adotar o que Beccaria, na Idade Média, sugeria como uma arma de contenção da criminalidade: é fazer com que a pena seja aplicada. É ter o bandido, o delinqüente, a certeza de que cumprirá uma pena, sempre que praticar um crime. Isto, para mim, é o instrumento mais forte que teríamos, de combater esse grave problema que nós vivemos no Brasil, hoje.

Muito obrigado.

Vice-Presidente Aristoteles Atheniense: Vamos dar seqüência, levando em conta aqueles que se inscreveram e estão presentes. Terá a palavra o Conselheiro Luiz Cláudio Allemand, da representação do Espírito Santo.

Conselheiro Luiz Cláudio Silva Allemand: Obrigado, senhor Vice-Presidente. Deputado Moroni Torgan, a qual saúdo todos os integrantes da Mesa.

Inicialmente, eu gostaria de agradecer e parabenizar a iniciativa da CPI em buscar o diálogo e sequer, se possível, o apoio da OAB, do Conselho Federal. Nós temos grandes juristas nesta Casa, Deputado. Como exemplo dos criminalistas, o nosso César Bittencourt e o Zacarias Toron, que muito podem ajudar na elaboração e na ajuda que a CPI necessita.

Sobre a questão da revista, já foi bem colocado, eu acredito que é a opinião da grande maioria dos advogados e das manifestações que virão. Não há uma tendência de se colocar contrário à revista. Mas nós temos meios tecnológicos de permitir que esses maus advogados sejam fiscalizados. E é isso que a sociedade clama, e nós, advogados, também. Nós estamos aqui, nós clamamos pela ética profissional. E não vai ser esta Casa que vai sacramentar esse livre passeio, como foi relatado pelo Relator, Presidente da CPI e Relator, de que advogados ficam migrando para lá e para cá, verdadeiros “pombos correios”. A sociedade clama por uma posição do Executivo, do Legislativo, para que se resolva esse problema.

Eu gostaria de deixar aqui, também, um relato que presenciei, de um professor de uma Universidade privada, um acadêmico de Direito, onde ele me relatou que estaria largando a Cadeira de Direito porque foi ameaçado por um aluno. E isso não é um relato isolado. Eu vou me declinar do estado onde aconteceu, mas o aluno simplesmente disse a ele que não olhasse para ele, para que não tomasse nenhuma atitude contrária a ele, porque ele estava ali com um recado: ele tinha que formar e pegar o diploma dele. Então, isso é um outro problema que está ocorrendo e está gerando uma situação muito grande de insegurança, dentro da própria Academia. E eu gostaria de deixar esse relato para os Deputados, para que possam verificar, porque alguém está pagando essa conta. E, na sua grande maioria, é o próprio Governo Federal, através das bolsas que são concedidas aos alunos. Ainda tem essa: além do crime organizado pagando, e aí o próprio Governo Federal financiando esses alunos, dentro das instituições privadas.

E eu clamo, também, a atenção dos eminentes Deputados, para essa síndrome do pânico generalizada, na aprovação dessas legislações que agora foram retiradas das gavetas e que agora estão sendo colocadas para votação, a toque de caixa. Isso é perigoso, isso é muito perigoso. Nós temos que tomar muito cuidado com essas aprovações atabalhoadas ou nas pressas, justamente por conta dessa síndrome de pânico.

E, no mais, agradecer a presença. A Casa está aberta. Estamos todos, aqui, clamando por justiça. A sociedade muda, a legislação também deve mudar. Muito obrigado a todos.

Vice-Presidente Aristoteles Atheniense: Eu vou conceder a palavra à nossa Conselheira Elenice Carille. Acontece que um dos representantes… Ah, pode? Porque o Deputado Neucimar Fraga, do Espírito Santo, pediu a palavra também. De maneira que eu ia dar a ele a palavra, primeiro. Pode falar, por favor.

Deputado Neucimar Fraga: Eu quero ouvir mais um pouco.

Vice-Presidente Aristoteles Atheniense: Ah, pois não. Então Vossa Excelência está com a palavra, pelo prazo regimental.


Conselheira Elenice Pereira Carille: Senhor Presidente, senhores Deputados. Na questão da Vara Especializada, muito bem abordou o Conselheiro Membro Nato Reginaldo Oscar de Castro, Mato Grosso do Sul tem uma experiência muito desagradável, que é o caso da Vara Especializada da Justiça Federal, ocupada pelo Juiz Odilon de Oliveira, que todos os dias está nas páginas, na mídia, ameaçado de morte e acompanhado diariamente por quatro policiais federais, ou oito, já nem me lembro mais. Em que ele não tem nem a privacidade do seu lar. Então, essa proposta, realmente, acaba caindo na situação muito bem focada pelo Conselheiro Reginaldo Oscar de Castro.

A política penitenciária séria e eficiente, uma política permanente, política penitenciária efetiva é que poderia pôr cobro a esses atos que nós estamos assistindo. E, aí, nós voltaríamos, como também lembrou o Presidente Reginaldo, a Beccaria, à finalidade da pena. Se a pena tem como finalidade recuperar o indivíduo, como é que nós vamos admitir o que nós assistimos hoje, no Brasil, onde um preso dorme, em algum horário para, depois, desocupar a vaga para o outro dormir, no cimento. Então, não há como você prever essa recuperação.

A questão dos celulares nos presídios, Mato Grosso do Sul vai ter inaugurado uma penitenciária federal junto a um bairro populoso. Como é que você vai ou fazer bloqueio ou, até, para questão de segurança da população, uma vez que um presídio federal vai abrigar presos de alta periculosidade. Então, não há um pensamento, não há um planejamento antes da elaboração desses atos, como a construção de um presídio.

A outra política penitenciária muito necessária é a questão do salário do agente penitenciário. O agente penitenciário estadual ganha uma miséria, uma miséria, e fica à mercê dos bandidos, com o bolso cheio do dinheiro. E, o pior, que ameaçados e sem condição de trabalho. Eu cheguei a constatar, em Mato Grosso do Sul, num presídio, a presença de apenas quatro policiais para cuidar de um número infinito de presos, se não me engano, 400 presos. Quer dizer, não há a menor condição. Um agente me confidenciou que os agentes penitenciários não adentram mais à penitenciária, pelo risco de vida. Eles trabalham sem arma, como é o correto que se faça, mas eles ficam expostos. Então, não adentram mais nem aos corredores dos presídios, quanto mais às celas.

Esse trabalho que nós vimos agora, que as PMs fizeram, de busca dentro dos presídios, é um trabalho que tem que ser permanente. O deslocamento de uma tropa de elite para Mato Grosso do Sul é uma vergonha, é um gasto excessivo e desnecessário. Esses policiais de elite estão nas ruas, à toa, porque Mato Grosso do Sul não vive a situação que viveu São Paulo ou que viveu o Rio de Janeiro. Ainda chegou lá para desfazer da nossa PM, dizendo que eles não iriam para os presídios porque se trata de uma tropa de elite, que não é o caso da PM de Mato Grosso do Sul.

E, mais, finalmente, a questão das… quero dizer que estou de pleno acordo com a revista eletrônica, até porque até nos Tribunais já existe, hoje, em alguns Tribunais, e que nos coloca a todos a salvo, em segurança, porque quando se coloca um detector de metais não está só assegurando o magistrado, mas a todos nós, no risco que nós corremos, no exercício da profissão.

Era isso que eu tinha a dizer, e parabenizo a esse grupo importantíssimo de parlamentares. E vamos rezar para que possa acontecer alguma coisa de bom no país, porque, ao contrário do Professor Comparato, eu ando muito desalentada com a questão moral. E já disse outro dia, numa entrevista, que também é necessário que se roube menos no país, para que sobre dinheiro para a política penitenciária.

Era isso que eu queria dizer.

Presidente Roberto Antonio Busato: Eu vou passar a palavra ao Deputado Neucimar Fraga, do Espírito Santo e, depois, ao Deputado Raul Jungmann, continuando, na seqüência, com os debates, com o Conselheiro Paulo Afonso.

Deputado Neucimar Fraga: Boa tarde a todos. Quero, primeiramente, cumprimentar o Presidente da Ordem, quero cumprimentar os demais Conselheiros. Agradecer pela oportunidade de estarmos aqui e realizarmos esse debate, onde a Comissão Parlamentar de Inquérito, a CPI do Tráfico de Armas que, durante um ano, está investigando o tráfico de armas no país, durante um ano trabalhando firme. E através do trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito a Polícia Federal já desencadeou diversas operações, no combate ao tráfico de armas no Brasil.

Durante esse período de investigação, nos deparamos com a atuação das organizações criminosas, as facções criminosas, que realmente são responsáveis pelo tráfico de drogas e o tráfico de armas no Brasil, que tem feito com que a violência avance sobre a sociedade brasileira.


O Presidente da CPI, Deputado Moroni Torgan, dividiu o grupo de parlamentares e dividiu o trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito em diversas subrelatorias. Nós temos subrelatores, eu sou subrelator do item “depósito de armas institucionais”. A CPI está mapeando todos os problemas relacionados à sustentação do crime no Brasil. E eu sou subrelator do item “depósito de armas institucionais”. Nós estamos fazendo um levantamento de todas as armas acauteladas no Brasil, nós estamos fazendo um levantamento sobre a segurança dessas armas que deveriam ser mantidas pelo Estado, são apreendidas e voltam novamente ao crime.

Ou seja, a Comissão está trabalhando em diversas áreas, em diversas ações nós temos investigado. E nós nos deparamos, também, com um problema, e um dos problemas que a CPI está se deparando, durante o processo de investigação foi o que foi relatado pelo nosso Presidente aqui, na Ordem, que é a atuação de alguns advogados, em comportamentos que não são comportamentos que correspondem à prerrogativa de um advogado que tem uma carteira de OAB, deixa de cumprir o seu dever constitucional de direito da defesa para extrapolar suas funções e se tornar um agente do crime.

E nós agradecemos à Ordem por nos receber aqui. E tem um item que foi relatado pelo Presidente, está pautado, no item dois dessa relação, que nós queríamos também fazer esse debate, discutir com a Ordem: é provar a origem ilícita dos honorários, quando o cliente é do crime organizado.

Alguns podem perguntar: como comprovar se o dinheiro é lícito ou ilícito? Ora, Fernandinho Beira-Mar está preso há mais de cinco anos, ele não é funcionário público aposentado, não tem pai rico, não tem outras rendas. Nós sabemos que a origem do dinheiro dele é tráfico de armas e tráfico de drogas, e ele continua pagando um exército de advogados no Brasil.

O senhor Marcola está preso há mais de… praticamente quase 10 anos, ou mais, não é funcionário público, não tem outras fontes de renda, e tem 19 advogados. Uma advogada que esteve conosco, na CPI, ela chegou a dizer que o honorário dela era pago pela tia do Marcola. Eu até perguntei quantas tias Marcola tem, porque só advogado tem 19.

Então, nós queremos discutir. E eu acho que esse item também é um item importante e não pode fugir dessa pauta que nós estamos aqui.

Conselheiro Luiz Cláudio Silva Allemand: Me permite um aparte, nobre Deputado?

Deputado Neucimar Fraga: Pois não.

Conselheiro Luiz Cláudio Silva Allemand: Essa questão dos honorários advocatícios, isso é um tema polêmico, porque os honorários, ele não tem carimbo. O honorário é alimento do advogado. Mas tem um detalhe: existe uma possibilidade, sim. A Receita Federal tem meios de vasculhar essa origem. Porque, se a tia está pagando, vamos verificar se a tia tem renda para isso. Hoje, o Governo Federal tem o COAFI, hoje o Governo Federal tem a CPMF, que ele consegue rastrear tudo.

Então, essa colocação, ela é fundamental para nós, mas também vai, aqui, uma proposta de que se coloque mais atenção a essas fontes de renda, de onde vem, como vem. Mas o Governo Federal, através dos seus órgãos, da Receita Federal, ela tem meios como fiscalizar. Existe o COAFI e existe a CPMF.

Como é que uma tia, que é dona de casa, tem meios de pagar honorários ao advogado? Você não pode prejudicar o recebimento dos honorários. Agora, você tem que matar a fonte, você vai lá na fonte de quem está pagando. Agora, o advogado receber, isso aí já tem um problema, já, que realmente afeta a classe. Muito obrigado.

Deputado Neucimar Fraga: Ok, eu agradeço. Mesmo que esse debate seja difícil de ser feito, devido às complicações, mas eu acho que nós poderíamos avançar pelo menos nos líderes de facções criminosas já identificados, no Brasil. Nós temos alguns líderes, são facilmente identificados pela polícia, que são líderes de facções, de organizações, alguns estão presos. Esses, nós já sabemos, que estão presos há 5, 10, 15 anos, que não teria possibilidade nenhuma de manter, aí, 2, 3, 4, 5, 10, 15, 20 advogados.

Conselheiro Reginald Delmar Hintz Felker: Vossa Excelência me permite um aparte?

Deputado Neucimar Fraga: Pois não.

Conselheiro Reginald Delmar Hintz Felker: Eu perguntaria: e os advogados que defendem os políticos acusados de corrupção por aí, também ficariam no mesmo problema?

Deputado Neucimar Fraga: O nobre Deputado, Deputado Moroni Torgan, já disse que nós estamos aqui fazendo…

________________: É crime organizado, igual.

Deputado Neucimar Fraga: Crime organizado. Já estão identificados, se tiver a comprovação, não pode advogar. Nós estamos questionando aqui o seguinte: nós não estamos fazendo, aqui, uma pressão em cima da OAB. A CPI atua em diversas ações, nós temos vários grupos, discutindo vários problemas. Então, nós temos que identificar a licitude do dinheiro: é lícito ou não. E como é que está sendo mantido.


Eu, por exemplo, questionei, no Parlamento, durante a CPI, durante as CPIs, eu questionei a posição da OAB, me permita, aqui, o Presidente, só trazer à tona, porque alguns advogados que foram punidos pelo Parlamento, continuam advogando.

Nós tivemos advogados que receberam dinheiro do “valerioduto” e não receberam processo de abertura de investigação, foi declarado na CPI, também, entendeu? Então, esse…

Conselheiro Sergio Ferraz: Nobre Deputado, me permite também um aparte?

Deputado Neucimar Fraga: Pois não. Então, esse ponto eu acho que nós temos que aprofundar também, no debate, porque ele é importante, porque ele é a coluna da sustentação dos maus advogados, de alguns maus advogados que se deixaram enveredar pelo caminho do crime e não pelo direito da defesa.

Conselheiro Sergio Ferraz: Nobre Deputado, me permite um aparte? O problema me parece muito grave, e é um problema de foco. Esta questão da indagação da licitude dos honorários, inclusive, é um problema internacional. Começa nos Estados Unidos, irradia-se para a Europa e chega, agora, a todo o Continente Sul-Americano. Lá começa com o problema de terrorismo, com o problema de lavagem de dinheiro, e com essa tônica também permanece e aparece aqui, inclusive com a feição do crime organizado.

Onde está, a meu ver, o equívoco? O equívoco está em que, salvo erro de minha parte, os honorários do advogado, pouco importa a natureza da fonte, os honorários que o advogado percebe, e ele tem direito de trabalhar para o chefe de quadrilha organizada, o chefe de quadrilha organizada também tem direito a advogado, os honorários são sempre lícitos, os honorários jamais são ilícitos, na medida em que eles correspondam à prestação de trabalho que pode até ser antipática a nós. O que é ilícita é a fonte de onde a tia do Fernandinho pagou, a tia de não sei o que.

Mas isso, se for feito sem cuidado e sem foco, vai levar ao que está acontecendo na Europa, qual seja, o de considerar o advogado co-autor nos delitos. Isso é absolutamente inadmissível para nós, advogados, e apara a OAB como entidade. Os honorários correspondentes a trabalho são sempre lícitos, pouco importa de onde venham. É esse o foco que me parece que os nobres Deputados e os senhores Senadores também têm que ter em mente.

Conselheiro Afeife Mohamad Hajj: Senhor Deputado, me dá um aparte ?

Deputado Neucimar Fraga: Pois não. Eu não sei se eu posso. Eu quero perguntar ao Presidente se eu posso ficar dando aparte.

Conselheiro Afeife Mohamad Hajj: Não, não, só nessa esteira, eu gostaria. Senhor Deputado, não é necessário os senhores imediatamente sugerirem à Casa dos senhores que aprovem uma Lei, ou uma Medida rápida que, como o senhor identificou a fonte dos marginais que vivem neste país, que atuam, que fazem, desfazem, ameaçam, matam, como está acontecendo lá no meu estado, em Mato Grosso do Sul. Na cidade do interior, vizinha ao Paraguai, que é Dourados, 120 quilômetros da fronteira do Paraguai, que entra arma com a maior facilidade, droga, enfim, tudo.

E, falando em honorários advocatícios, que eu acho que colocou muito bem o eminente Conselheiro Sérgio Ferraz e o do Espírito Santo, Allemand, de que não é mais fácil, Deputado, fechar a fonte dos marginais, o Governo desapropriar ou seqüestrar ou ver as tias, o dinheiro das tias, as propriedades e cercar uma medida rápida, Senhor Presidente Torgan, na medida em que eles não tenham mais esses recursos porque, lá em Dourados, por exemplo, o comando do PCC mandou gravar, fazer a gravação na casa do Juiz Corregedor de Execuções Penais, saiu no cenário nacional esses dias. Se pagou para um agente, contratou um agente da penitenciária de Dourados, capacidade 500 presos, tem 1.500, contratou-se um agente e esse agente pegou um profissional e gravou a telefonia particular do Juiz do Presídio, por 50 mil reais. De onde vem esse dinheiro? De dentro do presídio, dentro desses elementos que o senhor citou, senhor Deputado, porque o senhor tem o nome deles.

Não é mais fácil vocês fazerem e fecharem o cerco a eles, com relação de onde vem essa fonte de dinheiro, e não prejudicar os profissionais do Direito, como disse o Sérgio, que declaram, bonitinho, seus honorários, trabalham, é direito constitucional. Inclusive está na Constituição.

É essa sugestão que eu faço aos senhores, que estudem uma medida na Casa dos senhores, para se acabar com essas impunidades, bem colocadas pelo nobre Deputado. E desejo sucesso aos senhores, e que sirva como uma sugestão, para cercar os recursos desses marginais.

Deputado Neucimar Fraga: Permite concluir, Presidente?

Presidente Roberto Antonio Busato: Vossa Excelência tem a palavra.

Deputado Neucimar Fraga: …colaborações, inclusive as sugestões. Eu acho que o debate, ele sendo feito um debate profundo, todas as sugestões, inclusive que o nobre Conselheiro está fazendo, pode ser, inclusive, já vai ser taquigrafado e a CPI vai ter essas informações.


Eu quero apenas discordar do Conselheiro do Acre, dizendo o seguinte, só vou citar o exemplo do Marcola, tem 19 advogados. Ele, no mínimo, tem uma folha, aí, de mais de 50 a 100 mil reais por mês. Cada mês ele tem que fazer um assalto novo, um seqüestro novo, para pagar os advogados.

_____________: (inaudível)

Deputado Neucimar Fraga: Bem, então, vamos trazer o debate à tona. Obrigado.

Deputada Zulaiê Cobra: Senhor Presidente, eu queria…

Presidente Roberto Antonio Busato: Eu gostaria de registrar a presença de Vossa Excelência, eminente Deputada Zulaiê Cobra, grande advogada, amiga da Casa, sempre parceira da Ordem dos Advogados do Brasil, e o meu querido Ministro do Superior Tribunal Militar, Flávio Bierrenbach, também, que já honrou o Congresso Nacional com a sua atuação brilhante e sempre cívica, principalmente cívica e de cidadão.

Vossa Excelência tem a palavra. Depois eu vou passar a palavra ao Deputado Raul Jungmann.

Deputada Zulaiê Cobra: Eu só queria, senhor Presidente, para mim é uma honra muito grande estar aqui e não posso continuar aqui. Eu sou a única membro da CPI das armas que não poderia participar dessa audiência, até porque eu sou PSDB e o PSDB, nessa Mesa, está ausente.

_____________: Mas o PFL também.

Deputada Zulaiê Cobra: Mas eu gostaria… Eu não sou PFL, eu sou PSDB e adoro o Moroni Torgan. Embora eu tenha paixões na minha vida, isso independe de partidos.

Agora, eu gostaria de concordar com o nosso grande, esse grande Conselheiro, esse grande advogado Sérgio, porque é o seguinte: nós não estamos aqui falando dos juízes. Quem fala mal dos advogados não são os membros do Legislativo, quem não gosta de nós são os juízes. E quem fala que o dinheiro de bandido não pode ser honorários legais são os juízes. Os juízes que dão as suas sentenças falando que… já houve vários casos em São Paulo, que eu, como Conselheira da OAB, defendi, juízes que mandam processar advogados porque acham que os honorários advocatícios pagos por um bandido, por um assaltante — e eu não cheguei nem no crime organizado, ainda — isso, na década de 70, na década de 80, na década de 90. Eu defendi vários advogados, pela OAB de São Paulo, porque o juiz colocava na sentença que o advogado tinha que devolver os honorários, porque os honorários eram produtos de furto, de assalto, enfim, de origens ilegais. Isso, nós temos muito, na nossa vida de advocacia. Por quê? Porque os juízes não gostam de nós. Juiz não gosta de advogado, essa é a grande verdade. E acham sempre que os nossos honorários são suspeitos.

E quando nós defendemos bandidos, eles acham que nós somos suspeitos. Agora, o que eu admiro muito é o que o Marcola falou. Ele está preso, mas nós temos muitos bandidos defendidos, aí, por grandes advogados, que não estão na cadeia. E nós temos aí grandes advogados defendendo, aí, ou vários, para as pessoas do Governo Lula. Está aqui o Paulo Pimenta, que não me deixa mentir. E grandes advogados defendendo com honorários, que também são de origens ilegais, que eu não sei daonde está surgindo tanto pagamento de advogados, que estão sendo chamados, que eu morro de inveja, eu até morro de inveja, eu queria defender o Delúbio, eu queria defender o Marcos Valério, eu queria defender todo mundo, porque estão ganhando muito dinheiro, principalmente no meu estado de São Paulo. Grandes advogados que vieram aqui defender todo mundo. Todos têm direito à defesa, independentemente de quem seja.

Agora, eu quero dizer bem claro, Senhor Presidente, é um prazer muito grande, meu caro Presidente Busato, eu estar aqui, neste Conselho, para mim é uma honra muito grande estar aqui. E eu não vou poder participar dessa audiência, mas eu tenho, aqui, gente das melhores qualificações, que compõem esta CPI das Armas.

Portanto, eu só queria fazer essa colocação, porque eu não vejo, na imprensa, e eu debato no rádio e na televisão, ninguém falando mal de juízes corregedores dos presídios, juízes que têm obrigação de tomar conta da pena, tomar conta do preso. O preso é responsabilidade da Justiça, não é do Governo. O Governo entra com a parte material, com a cadeia, com a comida, com aquilo que é a vida do preso, em termos materiais. Mas, em termos jurídicos, quem tem responsabilidade com a cadeia, com a prisão e o cumprimento da pena são os juízes corregedores que, hoje, inventaram um tal de “juiz sem rosto”. Só porque mataram um juiz em Presidente Prudente, inventaram essa história que o juiz criminal não pode ter rosto. Então, não pode ser juiz, então não vai ser juiz criminal, não vai ser juiz corregedor dos presídios, vai ser outra coisa na vida. Porque o juiz que tem medo de bandido não pode ser juiz.

Então, Senhor Presidente, era só isso, para eu não me estender mais, porque eu tenho, aqui, uma colocação que é a colocação da realidade: promotores e juízes corregedores dos presídios. Nós estamos, aqui, fazendo mudanças, acabei de vir de uma reunião com a minha bancada, com a liderança do PSDB, são os projetos sobre segurança pública. Mas isso tudo nós vamos aprovar depois que chegar do Senado, porque está no Senado ainda.


Agora, o mais importante, e eu quero debater aqui, a questão do Judiciário e do Ministério Público, na responsabilidade que nós temos com o Marcola, com o Beira-Mar, com todos os bandidos do crime organizado.

Muito obrigada, Senhor Presidente. Desculpa essa maneira impetuosa. Eu sou assim, sempre fui e morrerei assim.

Presidente Roberto Antonio Busato: E nós não esperaríamos outra manifestação, se não fosse desse tom, de Vossa Excelência. Obrigado, eminente Deputada.

Gostaria também de destacar a presença da Ministra Cristina Peduzzi, do Tribunal Superior do Trabalho. Hoje nós temos uma reunião, daqui a pouco, para tratarmos de quinto constitucional. Deputado Raul Jungmann.

Deputado Raul Jungmann: Muito obrigado, Presidente. Gostaria de dizer que me encontrar, mais uma vez, nesta Casa, Presidente, participando de uma Mesa sob a sua Presidência, me faz recordar as muitas, não foram poucas vezes que aqui vim, Presidente, muitas vezes angustiado, preocupado, trocar idéias com o senhor a respeito de problema de conjuntura, a respeito de crise, a respeito do andamento dessa República que, muitas vezes, nos inspira tantos cuidados.

E quero reiterar que todas as vezes que nos sentimos aflitos recorremos a esta Casa, pela sua experiência, pela sua honradez e, também, particularmente, pela figura do seu Presidente, em nome do qual saúdo a todos os advogados e advogadas aqui presentes.

Acredito, Senhor Presidente, que acho que tem uma norma de validade geral que é a seguinte: a melhor maneira que nós temos, de defender a nossa liberdade, por assim dizer, corporativa, é exatamente na medida em que nós somos capazes de exercitá-la internamente, a partir daqueles, ou punindo aqueles que se desviam exatamente da norma que se espera de uma determinada corporação.

E isso vale muito, hoje, para a Câmara dos Deputados, isso vale muito hoje para o Congresso Nacional, que tem, indubitavelmente, um grande déficit, em termos de exercer as suas funções e prerrogativas, inclusive constitucionais, no que diz respeito à investigação, ou à auto-investigação dos seus membros.

Portanto, eu defendo que, independentemente da grei, nós temos que ter um compromisso, no sentido de resguardar qualquer corporação, que é de procurar sempre seguir o padrão da lei e aquilo que prescreve a ética e a moral.

Quando nós tivemos aquele problema, Presidente Busato, que se originou com aquela famosa sessão reservada, Presidente Moroni, que me permita também saudar, e aos demais membros da Mesa, eu me dei ao trabalho de pedir um levantamento à Polícia Penitenciária de São Paulo, se nós tínhamos correlações positivas, ou seja, se nós encontrávamos uma certa relação, que nós poderíamos identificar, acima da média, ou acima de determinados padrões, entre determinados juristas, advogados e membros ou líderes do PCC. E nós começamos, então, a identificar que existem, sim, algumas correlações positivas.

Eu acho que aqui já foi bastante bem explanado e situado as origens desse problema, então eu não vou me deter nisso, nem vou voltar, não vou regredir, vou apenas expor uma situação de fato e pedir apoio, pedir ajuda, exatamente à OAB, a nos ajudar a compreender e encontrar saídas para esse problema.

Nós temos, aqui, nessa relação — eu acho que eu vou ter que me deslocar um pouquinho para cá, porque senão eu não consigo ver direito. Também não está dando para ver, não é? Então, chega um pouco mais para cá.

Presidente Roberto Antonio Busato: Eu já mandei baixar as cortinas, para ficar mais visível. Mas a questão, aí, é da… Vossa Excelência já não tem mais idade para ler daí (risos). Vossa Excelência pode chegar mais para cá.

Deputado Raul Jungmann: Vamos… O senhor chega um pouco mais para cá.

Deputado Raul Jungmann: Já que eu não consigo… Muito obrigado, agradecido pela atenção.

O que que nós temos aqui? Basicamente, nós temos aqui uma carteira de um advogado da OAB. Aqui nós temos, nessa coluna, os dias e que ocorreram visitas. Aqui nós temos os horários em que as visitas se deram. Aqui nós temos as penitenciárias, Franco da Rocha, Presidente Bernardes, Valparaízo, Mirandópolis, Avaré, etc. etc. Aqui, eu chamo a atenção, nós temos o apenado, que foi visitado por este advogado específico. Entretanto, todos esses que aqui se encontram têm uma característica: são líderes do PCC.

Então, foi feita uma crítica, exatamente, das visitas que foram feitas, e apenas, exclusivamente, este advogado aqui, esteve com todos esses líderes e, muitas vezes, mais de uma vez, como se pode ver aqui: dia 9, dia 9, dia 9, o dia 13, que tem vários dias. Aqui os senhores têm exatamente as alcunhas de alguns deles, outros você não tem. Pode passar.

Bom, aqui… Não, não, é a continuidade daquela planilha anterior. É só descer. Então, se os senhores fizerem um somatório das visitas, elas somam, só em 2006, Reginaldo, 106 visitas exclusivamente a líderes do PCC.


Evidentemente que não nos cabe, e eu não estou aqui fazendo, nenhum tipo de ilação. Mas evidentemente, também, que uma situação como essa preocupa. E embora não vá cansá-los, porque tenho apenas mais uma única planilha, não mais do que isso, para também fazer uma pequena observação, eu quero dizer, Senhor Presidente, que existe uma relação de 34 advogados que se encontram nessa situação.

E, aqui, há uma questão que nos preocupa, ainda, um pouco mais, Reginaldo, que é o seguinte: no caso específico deste profissional, ele está visitando não só os seus constituintes como também outros que não são, embora dentro da mesma facção criminosa, dentro da mesma quadrilha.

Então, a pergunta que se faz e, evidentemente, sem querer adiantar qualquer tipo… Pois não? É o mesmo advogado, exclusivamente. São 106 só esse ano, tudo referente a esse ano, e todos que aqui estão, todos que aqui estão são líderes do PCC.

E se você prestar atenção, Reginaldo, você vai ver que, por exemplo, dia 7, uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete visitas. São dados oficiais do sistema penitenciário, sete visitas num único dia.

_____________: Único dia?

Deputado Raul Jungmann: Num único dia, de um único advogado.

Conselheiro Guaracy da Silva Freitas: Ampla defesa, Excelência. Ampla defesa do advogado.

Deputado Raul Jungmann: Claro. Então, eu não estou… eu trago isso como um problema para todos nós. Evidentemente, como um problema. Agora, também a gente não pode deixar de fazer algum tipo de pergunta: será — e aí os senhores são doutos na matéria, e eu sou um amador — será que o exercício, efetivamente, da ampla defesa, como foi bem dito, aqui, exige esse tipo de freqüência?

Conselheiro Guaracy da Silva Freitas: Pode exigir.

Deputado Raul Jungmann: Pode exigir. Inclusive para todo esse número que nós temos aqui, por exemplo, especificamente, de líderes. Pois não.

Conselheiro Lauro Fernando Zabetti: Deputado…

Deputado Raul Jungmann: Segundo, são os horários.

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Ele visitou 8:29 e às 11:45, vários presos ao mesmo tempo? Como é que foi isso?

Deputado Raul Jungmann: Bom, esse é o dado que eu tenho, no dia 07.04, pelo menos é colocado, é o dado que eu recebi do sistema penitenciário. Se existe alguma…

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Então, ele fez uma reunião com os presos.

Deputado Raul Jungmann: Não sei. De tal sorte que esses dados são os dados que eu recebi direto, eu não fiz crivo. É de responsabilidade do sistema penitenciário.

Conselheiro Lauro Fernando Zabetti: Deputado…

Deputado Raul Jungmann: Pois não.

Conselheiro Lauro Fernando Zabetti: Sabe se a polícia, porventura, chegou a investigar os motivos ou o próprio advogado?

Deputado Raul Jungmann: Eu desconheço. Eu, efetivamente, desconheço. Apenas o que eu pedi, o seguinte, foi: considerando as principais lideranças, intermediárias e superiores, do PCC, por favor, me dê… e busquei, isso aqui é um caso, como existem muitos outros, aí, de uma alta freqüência ou de uma alta incidência. É exclusivamente isso que eu estou trazendo como um problema. E, evidentemente, vou pedir ao Presidente da Ordem que procure, na medida em que ele entenda que é o caso de fazê-lo, e conto com a anuência dos senhores, que abram uma sindicância que busque, efetivamente, procurar entender isto. Por quê?

Porque eu quero só dar seqüência a uma preocupação do Presidente Moroni. A verdade é, quero crer, que quando… e, de novo, eu estou fazendo, aqui, uma suposição, então, não me julguem por uma suposição, eu estou querendo trabalhar, estou querendo construir algumas hipóteses. Mas o meu sentimento é que o que diferencia o crime organizado do chamado crime comum é que a relação continuada, ao que tudo indica, leva à tentativa, da organização criminosa, de capturar, não só advogados, captura qualquer coisa.

A organização criminosa precisa, exatamente pelo fato de que uma parte dela está nas ruas, mas uma outra parte se encontra na penitenciária e, sobretudo, neste caso, ela vai tentar capturar qualquer agente. Então, não é um problema do advogado. O problema é que quem se aproxima desta organização — agente penitenciário, seja juiz, seja deputado… Ou seja, a tendência é que a relação continuada, ele precisa, não é uma relação — eu acho, de novo, estou supondo — que se dá exclusivamente de um modo sadio, Presidente, entre um cliente e um advogado. A organização criminosa precisa de algo mais.

Então, a exposição, em certa medida, continuada, poderia levar a problemas. Pedimos ajuda. Porque, a ser verdade uma situação como essa, então nós precisaríamos introduzir, Presidente, algumas diferenciações para resguardar a Ordem, porque essa é inatacável, porque essa é o nosso grande patrimônio, não apenas dos senhores, mas de todo o Brasil.


Eu me formei, e a minha consciência se estruturou, na resistência à ditadura. E esta Casa era a referência maior que nós tínhamos. Até reminiscências pessoais, o afeto que a minha mãe, assistente judiciária e, depois, defensora pública, que tinha, pela sua carteira da Ordem, é uma coisa que eu nunca esqueci. Então, desde casa.

Então, é isso que eu estou querendo dizer. Do mesmo jeito que luto lá, para instalar uma CPI das Sanguessugas — os senhores estão ouvindo isso, não é? E, às vezes, a gente tem que vir aqui pedir ajuda, como já fiz várias vezes, ao Presidente, eu também coloco isso como um problema. Será, Reginaldo, será que essa prestação continuada, e dadas as características da organização, não pode levar a uma situação como essa? Eu coloco como pergunta, como hipótese. E peço ajuda. E peço que a gente busque ter uma reflexão a esse respeito.

Eu queria, agora, para encerrar e não me alongar mais, apenas mostrar uma outra planilha. Cadê aquela outra planilha? Olha, aqui são mais de um advogado, é aquele mesmo advogado, um outro e um outro. Agora, aqui, você tem exatamente esse cidadão, que é o GG do Mangue. O GG do Mangue, ele é um sentenciado, está certo? E ele é um sentenciado relacionado ao PCC, ao contrário do Marcola. A principal tese de defesa do Marcola, até aqui, é de que ele não faz parte do PCC. O GG do Mangue, sentenciado, já se sabe que faz parte.

Então, o que que se acredita? E vejam o número, o grande número de visitas que, exclusivamente, ele tem. É porque se acredita que o GG é uma espécie de difusor, ele é uma espécie de pombo-correio interno. Na medida em que ele já estaria numa situação, digamos assim, que não há redução, não há desconto, não há o que fazer, o GG é o segundo na hierarquia do PCC. Então, ele recebe, por isso mesmo, um grande número, individualmente, não é? Porque lá são muitos outros, mas vejam como ele recebe, inclusive, acima da média.

Então, Senhor Presidente, eu queria trazer esse problema à reflexão, pedir ajudar, lembrar, apesar de desnecessário, que a Ordem é mais do que um patrimônio dos advogados, dos 520 mil, 200 mil criminalistas, e com pouquíssimos casos, raríssimos casos de punição, é bom lembrar isso, também. Portanto é uma comunidade, digamos assim, que tem um comportamento que prima pela observância das normas e das regras. Mas, entretanto, eu acredito que, Presidente, nós estamos diante de um problema.

Então, eu vou lhe passar todos esses dados, dos 34 advogados, como também da freqüência com que isso aconteceu, e pedir que os senhores Conselheiros, esse órgão supremo desta Casa se debruce sobre esse problema como se debruça sobre os problemas do Brasil e da democracia e do Direito, para nos ajudar a encontrar uma saída, a respeito desse ponto. Era isso que eu tinha…

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Deputado…

Deputado Raul Jungmann: Pois não.

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Vossa Excelência poderia solicitar informações sobre a razão pela qual se admite reuniões de vários detentos com o mesmo advogado, no mesmo horário?

Deputado Raul Jungmann: Eu acho que a primeira coisa é saber se aqueles advogados, realmente, eles estão, digamos, eles não…

Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro: Porque é uma freqüência. Todos os dias…

Deputado Raul Jungmann: Claro, é. Não, que existe uma recorrência altissimamente intensa, existe. Por exemplo, se comenta, embora eu não tenha os dados, de que você, por exemplo, num presídio como Avaré, você teria um advogado que ficaria 24 horas à disposição do Marcola, na medida em que qualquer tentativa de mudança dele, de restrição administrativa, ele pudesse entrar, efetivamente.

Eu estou citando o caso para dizer o seguinte: o que eu acho que é o cerne da questão, Reginaldo, é que, exatamente, a organização criminosa, pela sua envergadura, complexidade, logística, poder, ela é alguma coisa que ninguém está infenso, nenhum de nós.

Eu, por exemplo, posso lhe dizer que eles estão pensando, vejam vocês, em lançar dois Deputados Federais e vários estaduais. É verdade, vão lançar. Então, a penetração no aparelho de Estado e nas corporações é uma coisa decisiva para uma instituição como essa.

Então, por favor, eu não quero mais me alongar e tomar tempo dos senhores. Era esse pedido de ajuda que nós tínhamos a fazer.

Muito obrigado, Presidente. Vou deixá-los todos, agora.

Presidente Roberto Antonio Busato: Deputado Josias Quintal, do Rio de Janeiro.

Deputado Josias Quintal: Presidente, eu vou tentar incorporar, aqui, o Enéas, para ser bem rápido. O foco da nossa Comissão, e da discussão, é o tráfico de armas. Todavia, essa discussão, ela nos remeteu a outros temas, a outros temas recorrentes.


Então, nesse sentido, Presidente, eu, com a brevidade que pretendo fazer as minhas colocações, eu faria um convite aos senhores Conselheiros da OAB a uma reflexão. Eu faria até mesmo uma provocação, acerca de um tema que eu acho por demais importante.

Nas discussões, aqui, se falou de Beccaria, Idade Média, da impunidade. E, nesse sentido, eu faço uma pergunta aos senhores: Os senhores acreditam nesse modelo policial brasileiro? Os senhores acham lícito mantermos um modelo de um aparelho policial que não elucida nem 6% dos homicídios que aqui são praticados e, quando não se tem autoria conhecida? Nem 6%, uma das mais baixas taxas do mundo. É lícito mantermos, a sociedade manter esse modelo estrutural de polícia aqui, no Brasil? Até quando?

Outra questão: aonde um Plano Nacional de Segurança Pública? Quais são os resultados que nós alcançamos, com essas políticas de segurança instituídas aqui, no Brasil? Aonde uma política nacional para o sistema penitenciário, quando sequer uma lei que se votou neste Congresso, e que existe há 15 anos, a Lei dos Crimes Hediondos, que obriga a União a construir unidades prisionais federais, e até agora não se tem uma unidade prisional. Vão fazer, agora, a primeira, em Mato Grosso, pequena unidade, e num centro urbano.

Então, meus senhores, eu acho que toda essa discussão, ela é válida, há necessidade de se mudar a legislação, o Código de Processo, a Lei de Execuções, mas não podemos imaginar que vamos chegar a algum lugar em mantermos esse modelo estrutural, desse sistema policial brasileiro.

E eu termino indagando aos senhores: eu desafio aos senhores a dizer qual o país, no Globo, tem o modelo similar ao nosso, de polícias partidas, ineficientes e que não são capazes, cuja eficiência não chega, no caso da elucidação do delito maior, que é o homicídio, não chega sequer a 6%. Então, fica essa colocação para os senhores, para uma reflexão aos senhores.

Conselheiro Francisco de Assis Camelo: Vossa Excelência me permite um aparte?

Deputado Josias Quintal: Pois não.

Conselheiro Francisco de Assis Camelo: Eu, na verdade, louvo a OAB, o Conselho Federal, por esta reunião extraordinária, que trouxe, na verdade, uma Comissão de muita importância, que está desenvolvendo um trabalho.

Eu ouvi, aqui, com muita atenção, falando do advogado, do contato do advogado com o criminoso. Falou-se dos juízes. Mas Vossa Excelência entra no tema propriamente dito, que são as armas.

O Brasil ficou estarrecido, no mês passado, com aquela ação criminosa que São Paulo foi vítima. O criminoso, na verdade, usou as armas mais modernas. Ele não atacou de estilingue, ele não foi de faca peixeira, ele foi com armas poderosas.

Então, o que eu estou vendo aí, e pergunto à Comissão se já tem algum projeto, já se afunilaram nesse assunto, onde nós vamos, na verdade, detectar o contrabando, o fornecedor e o receptor dessas armas. Porque leis são muito bonita de serem feitas no papel, mas eu quero saber se a Comissão já tem, na verdade, o seu projeto para este problema, que eu considero o maior e crucial. Eu agradeço a atenção do Deputado.

Deputado Josias Quintal: Senhor Conselheiro, a Comissão, ao término dos trabalhos, a Comissão está fazendo um diagnóstico de toda essa questão, no Brasil. Está buscando comprovar a ocorrência desse tráfico de armas e, ao final dos seus trabalhos, o Relator, certamente, ele vai, tendo havido o consenso da Comissão, ele haverá de apresentar um conjunto de normas que possam aprimorar aquelas já existentes, ou possam suprir as lacunas porventura também existentes, nesse sentido.

Então, ao término da Comissão, que é a primeira Comissão do gênero que se instala aqui, no país, nós teremos, certamente, sugestões legislativas importantes, para minimizar esse problema.

E eu quero terminar chamando a atenção dos senhores, novamente, acerca dessa provocação que fiz, acerca dessa reflexão que devamos fazer, sobre o modelo policial brasileiro, ímpar no mundo e, portanto, também, ineficaz, de uma ineficiência a toda prova. Então, até quando devemos manter esse modelo?

Presidente Roberto Antonio Busato: Eu vou conceder a palavra ao Deputado Arnaldo Faria de Sá. Depois eu vou ao Conselheiro César Bitencourt, pela ordem.

Deputado Arnaldo Faria de Sá: Senhor Presidente, apenas um minuto, um breve comentário…

Conselheiro Edson Ulisses de Melo: Presidente, eu estou inscrito, Presidente, só para…

Presidente Roberto Antonio Busato: Se houver tempo, Vossa Excelência falará, mas Vossa Excelência está um pouquinho abaixo e o Deputado Moroni Torgan já está me avisando que os Deputados têm um compromisso de votação daqui a pouco. Se houver possibilidade, sim. Se não, nós podemos continuar a discussão entre nós.


Conselheiro Edson Ulisses de Melo: Serei rapidíssimo.

Presidente Roberto Antonio Busato: Vossa Excelência tem que respeitar a ordem.

Deputado Arnaldo Faria de Sá: Só queria fazer uma colocação. Eu acho que o que foi abordado aqui, com todo respeito ao companheiro Nelsimar, a questão dos honorários, não é questão para ser discutida aqui, agora. Acho que nós devemos discutir a questão do pombo-correio. Isso, realmente, é uma coisa que preocupa. Até porque se formos discutir questão de honorários suspeitos, vários parlamentares também teriam contribuições suspeitas para suas campanhas. Então, eu acho que nós não temos que entrar nesse mérito dessa discussão. Essa questão do pombo-correio é, realmente, um agravante.

E um detalhe que a questão, no primeiro momento, foi tratada rapidamente, no Senado, vários projetos foram votados a toque de caixa, e até hoje não chegaram à Câmara. Por que não chegaram à Câmara até hoje? Porque o Ministro da Justiça, advogado criminalista, não quer que esses projetos sejam votados rapidamente na Câmara.

Então, esse é um detalhe que precisa ser observado, e a OAB Nacional tem tido um grande trabalho na campanha do “nepotismo não”, e até hoje, também, o Congresso não encarou de frente esse problema, que é uma outra finalidade. Eu queria cumprimentar a OAB Nacional por estar preocupada com esse problema.

Presidente Roberto Antonio Busato: Conselheiro César Bitencourt. E eu gostaria já de dizer à Vossa Excelência que será um dos membros da Comissão que eu vou anunciar, no encerramento desta sessão, para produzir um parecer, solicitado, inclusive, pelo eminente Relator, o Deputado Paulo Pimenta, desta reunião, como sugestão da Ordem à Comissão.

Conselheiro Cezar Roberto Bitencourt: Obrigado, Senhor Presidente. Eminentes Deputados. Eminente Relator. Deputado Moroni Torgan. Prezados colegas.

Eu estou um pouco mal na posição, porque estava no Supremo, fui chamado para retornar aqui, então eu perdi muito da exposição, Senhor Presidente, não tenho condições de fazer uma avaliação mais adequada.

Presidente Roberto Antonio Busato: Nós vamos degravar a sessão e vou lhe mandar o texto.

Conselheiro Cezar Roberto Bitencourt Muito obrigado. Pois bem, eu apenas falar alguma coisa, rapidamente. Os projetos de emergência, que o ilustre Deputado falou, por último, realmente, eu acho que o Ministro da Justiça tem razão. O Congresso Nacional não pode ficar querendo legislar sempre em cima da emergência, em cima do fato posto. Isso é sempre perigoso, nós não trazemos solução, nós não tratamos as causas, nós trabalhamos em cima de um problema.

Então, é importante que se tenha tomado a consciência do caos, que é o sistema penitenciário. E, em cima disso, o Congresso Nacional refletir, com a sociedade, com debates como esse que está fazendo aqui, com as Organizações Não-Governamentais e etc.

Agora, não pode ser de afogadilho, atacando pontos aqui e ali, para resolver o problema. Na realidade, o nosso problema, do sistema penitenciário, é muito mais antigo e muito mais grave. E é tão sério e tão antigo que um dia ia explodir. E esse fato que ocorreu em São Paulo foi a explosão dramática, de 20 anos. Há 20 anos que os nossos governantes têm se omitido, em termos de sistema penitenciário nacional, têm se omitido em termos de segurança nacional.

Os maiores estragos, os maiores danos, teve no Rio de Janeiro, e todo mundo começou a achar que era só o Rio de Janeiro, olhando só para o umbigo. Evidentemente que tudo isso é conseqüência de omissões, falta de vontade política, falta de dotação orçamentária, falta de uma seriedade no tratamento da questão. Isto é velho, antigo. Todos os especialistas, que não são ouvidos, de repente não se sabe porque não são ouvidos, conhecem esse problema, conhecem as causas, sabem que um dia ia acontecer, sabem que um dia ia estourar.

Então, nós temos um problema muito sério, muito grave, que veio sempre pelo abandono. Todas as campanhas, todas as plataformas de campanha sempre têm, dentre elas, saúde, segurança, educação e transporte. Mas eleitos os nossos governantes, esquecem sempre da segurança pública.

A imprensa noticiou que foi reduzido, de novo, o Orçamento da segurança pública nesse ano, nesse exercício. Sistematicamente isso tem acontecido. Então, foi deixando a um segundo, quarto, quinto plano, esquecendo a segurança pública.

Já na década de 70, o Boaventura Souza Santos, lá, português, fez um lançamento, fez um livro, fez uma pesquisa de campo aqui, na Rocinha. Tem um livro fantástico, “O Discurso e o Poder”, trazendo o Estado paralelo que já tinha na Rocinha, na década de 70. E esse Estado paralelo cresceu. E, evidente, eles se organizam, eles são excluídos, estão fora e criam o seu próprio Estado, a sua própria organização.


Então, esse é o caos. O resultado, esse dali, do PCC, foi só uma amostra, a coisa vai piorar. E Vossa Excelência acha que nós criando mais prisões, nós botando mais gente na prisão, nós vamos melhorar ? Vamos piorar. Nós já temos gente empilhada no sistema penitenciário, que é um caos. Nós estamos sendo denunciados na Anistia Internacional, nos organismos internacionais, como desrespeitosos aos direitos humanos. Todos os dias nós temos que ouvir isso.

Nós, brasileiros, nós verificamos nas manchetes dos jornais, na Globo, o problema de Vitória, o problema que tem em São Paulo, tem em Minas, tem no Pará, tem em toda parte: a desumanidade. Então nós precisamos antes disso, também, investir na infra-estrutura, investir no Orçamento. Nós precisamos vontade política, precisamos dotação orçamentária, precisamos criar condições, condições para o regime fechado, mas também para o regime semi-aberto, para o regime aberto, para o livramento condicional.

Por que a gente não cria, por exemplo, de repente, Comissários Vigilantes? Faz, como faz nos Estados Unidos. Nós precisamos ter gente em livramento condicional, nós precisamos ter gente em semi-aberto, precisamos ter em regime aberto. Mas nós precisamos de fiscalizar.

Essa estrutura, criando, por exemplo, os vigilantes, os Comissários Vigilantes, é muito mais barato, senhores Deputados, do que criar mais penitenciárias, que também precisamos. Nós não vamos resolver, nós precisamos de uma política global.

Então, que Vossas Excelências façam uma Comissão e reflitam, com profundidade, com serenidade, com tempo, com espaço, com especialistas, com técnicos. Depois tragam um pacote, como tem os 11 projetos para ir. Mas não de afogadilho, isto não vai resolver.

Nós agora estamos preocupados com o crime organizado. Qualquer coisa que acontece no país é culpa do crime organizado. Da noite para o dia, nós viramos, no país, a existência maciça de crime organizado. E eu tenho dito, nas universidades, por aí: “Gozado, num país tão desorganizado, como o Brasil, só o crime é organizado”. Coisa incrível, não parece à Vossa Excelência? A polícia é desorganizada, o Judiciário é desorganizado, a sociedade é desorganizada, o país é desorganizado, só eles são organizados. Quem sabe a gente não aprende uma lição com eles, então. Quem sabe a gente vai lá e eles ensinam à gente, como é que a gente se organiza.

Pois bem, então eu sugiro, quem sabe nós começamos combatendo o crime desorganizado. Já seria uma grande coisa. Já seria um primeiro passo. Este crime violento que assola o país, que assolam as capitais, Rio, São Paulo, Minas, Porto Alegre, tudo isto — sou gaúcho, Deputado Moroni Torgan, como Vossa Excelência — todos esses crimes são crimes massificados. O que violenta a rua, que está por aí, é o crime de massa. Crime massificado não é crime organizado, é o desorganizado. O crime organizado já está nos porões dos presídios, já está lá dentro, e pouca coisa aqui fora.

E nós temos problemas muito sérios, muito graves, efetivamente, e a OAB, sim, está preocupada, nós também estamos preocupados, nós não queremos impunidade, nós queremos o Estado Democrático de Direito sendo respeitado. Nós queremos a Constituição sendo respeitada, nós queremos que o cidadão que vá no Congresso seja respeitado como cidadão, se é advogado, como advogado, se é cidadão como cidadão comum, se é palestrante, como for.

Mas nós precisamos disso, nós precisamos que Vossa Excelência esteja preocupado com essa Constituição, com essa sociedade, com esses problemas todos. É muito importante que Vossa Excelência esteja preocupado, o Deputado Moroni Torgan, que é gaúcho, para satisfação nossa, que é delegado de polícia, deve ter sido um grande delegado, como é um grande parlamentar. A Polícia Federal tem grandes delegados, tem… Mas nós precisamos de organização.

Presidente, é só uma palha, porque eu não sou palestrante, não quero ficar falando disso (…). Então, a proposta existe…

Presidente Roberto Antonio Busato: É porque Vossa Excelência está falando muito rápido e não vai nem conseguir degravar. Gaúcho, quando fala corrido…

Conselheiro Cezar Roberto Bitencourt: Engole as palavras, não é?

Presidente Roberto Antonio Busato: Mas, bah!

Conselheiro Cezar Roberto Bitencourt: O tempo é curto, mas, enfim, a gente está preocupado, realmente, com isso. Nós queremos a solução, queremos compartilhar, queremos participar. E o Presidente parece que está nos designando, será uma honra, também, contribuir com Vossas Excelências. Muito obrigado.

Presidente Roberto Antonio Busato: Senhores Conselheiros, eu gostaria da compreensão de todos. Nós não podemos mais permanecer muito tempo em sessão, em função de que os nossos Deputados têm compromisso agora, no Congresso.


Eu combinei com o Deputado Moroni Torgan que mais dois falariam, no máximo por três minutos. Pela ordem está o Paulo Afonso e o Delosmar. Depois, pela ordem, está o Guaracy, o Sebastião, o Manoel Cruz e o Edson Ulisses. Os demais poderiam encaminhar, como nós vamos nomear uma Comissão, encaminhar o seu posicionamento à Comissão, que colocaria dentro dos debates, nesse parecer que nós vamos produzir. Paulo Afonso.

Conselheiro Paulo Afonso de Souza: Senhor Presidente. Senhores Deputados. Colegas Conselheiros.

Dizem que desde que o homem é homem, acaba, cadeado inventado, um patife cria um pé-de-cabra capaz de rompê-lo. E um desses pés-de-cabra eu acredito que seja o que disse o Deputado Raul Jungmann: a inserção de atores, no cenário estatal, ou a cooptação de atores já insertos no cenário estatal, por parte do crime organizado.

Me preocupou muito esse episódio protagonizado no Parlamento, por dois advogados, de compra de informações sigilosas produzidas no âmbito secreto e reservado do Parlamento, ao qual muitos atribuem a potencialização da ação criminosa desencadeada em São Paulo.

E não me parece razoável que serviços tão importantes e estratégicos, como a gravação e guarda de áudio e vídeo, no Parlamento, em especial de reuniões e de sessões reservadas, seja confiado a agentes externos. A banalização da terceirização, na prestação de serviços, é um perigo. E expõe demasiadamente as instituições.

Daí porque a sugestão talvez seja que repensemos, inclusive, a estrutura organização da própria Câmara, do próprio Parlamento, para que possamos, com medidas pequenas, mas sucessivas, fechar essas portas abertas, escancaradas e tão perniciosas. É apenas isso, Senhor Presidente.

Presidente Roberto Antonio Busato: Conselheiro Delosmar Mendonça, o último Conselheiro a se manifestar ao vivo, nesta sessão, e a cores.

Conselheiro Delosmar Domingos de Mendonça Junior: Senhor Presidente. Egrégio Conselho. Senhores Deputados. Senhor Presidente.

Ouvi atentamente as colocações dos colegas que me antecederam. E quero, de logo, Presidente Moroni Torgan, parabenizar a Vossa Excelência, os membros da Comissão, pelo trabalho. E o exemplo de Vossas Excelências faz com que nós possamos utilizar, inclusive para raciocínio do deslinde dessa complexa matéria.

Ora, Vossas Excelências estão se destacando, e representam o lado bom do Parlamento, e o Parlamento do Mensalão. Então, nós não podemos confundir pessoas, condutas específicas, com instituições. Não podemos, por conta de episódios, como o Mensalão, Sanguessuga, falar mal do Congresso Nacional como instituição.

A mesma coisa na advocacia. E, aí, nós temos que olhar, e é essa a sugestão que nós damos, na questão dos princípios, do contexto de princípios que hoje, inclusive, faz parte de todas as manifestações de pensamento modernas. Temos, de um lado, o direito à advocacia; do outro lado, a segurança pública e o interesse público, no sentido de evitar que advogados se desviem de condutas e levem à associação com a bandidagem, que será o desvio de finalidade.

O que me preocupa, e faço como sugestão a Vossa Excelência e aos membros da Comissão, é que haja o vetor cultural, uma harmonização de princípios. Ou seja, o que que a Ordem dos Advogados do Brasil pede? Respeito ao advogado. Se há advogados que servem de pombos-correios, eminente Deputado, nós não podemos dizer que os advogados são pombos-correios.

E, nas medidas de exceção, ou medidas de força, ou medidas de restrição — e algumas terão que ser tomadas — nós devemos ponderar uma atitude de proporcionalidade, de harmonização desses princípios, no sentido de que não criemos essa preocupação, Presidente. Não criemos uma cultura contra a manifestação, a participação dos advogados.

Porque, se não tivermos cuidado com essas medidas de restrições, elas vão ser aplicadas por aí, no país, gerando distorções. E nós temos um exemplo: a ditadura militar, não faz tanto tempo, os historiadores agora estão falando de sargentos de polícia, do Exército, de cabos, que agiam nos porões da ditadura, muitas vezes com uma maior dimensão do que os seus comandantes.

Então, me preocupa se não tivermos essa colocação, esse posicionamento, esse princípio adotado. Ora, a advocacia, as prerrogativas da advocacia não podem ser negociadas, em razão da necessidade de segurança. As medidas de restrição devem partir desse princípio: a sociedade deve exigir, das autoridades constituídas que, mediante os seus serviços de fiscalização, os seus serviços de inteligência, ajam, diante desses casos concretos, de advogados que estão desviando.

E a OAB, e isso o nosso Presidente vem dizendo e espelhando, faço parte, inclusive, da câmara disciplinar aqui, do Conselho Federal, e a OAB vai fazer a sua parte. Ou seja, todas as denúncias que chegarem até esta Casa terão a devida atenção e a pronta resposta à sociedade.


Essas medidas deverão ser feitas diante desses princípios, daí o apelo que faço a Vossas Excelências: ponderem os valores. O valor da prerrogativa da advocacia é muito caro, inerente ao Estado Democrático de Direito, e nós não podemos, diante da necessidade que toda a sociedade hoje clama, de evitar as condutas do crime organizado, nós cercearmos as prerrogativas do advogado, e criando uma cultura do desrespeito, de qualquer agente penitenciário, por esse Brasil afora, possa chegar, ao se deparar com o advogado exercendo o seu mister dignamente, e, muitas vezes, advogados dos mais humildes, possa ser confundido, apenas por trabalhar perante uma penitenciária, uma delegacia de polícia, com alguém que está apenado, como se fosse um bandido.

Então, são essas as dimensões e os princípios que Vossas Excelências terão que ponderar. Agradeço, Presidente.

Presidente Roberto Antonio Busato: Obrigado, Delosmar. Eu passo a palavra, agora, para encerrar os trabalhos dessa sessão, ao Deputado Moroni Torgan.

Deputado Moroni Torgan: Senhor Presidente Roberto Antonio Busato. Em primeiro lugar, aqui, expressar não só a minha gratidão, mas a de todos os membros da CPI. E dizer que eu ouvi alguns comentários, antes de vir aqui, ao Conselho, dizendo: “Olha, não vai ter o risco de pensarem que estão botando muita culpa em advogados?”. Eu digo: “Não, porque nós falamos com a polícia, e botamos a culpa na polícia. Nós falamos com o Judiciário e botamos a culpa no Judiciário. Nós falamos com as Forças Armadas e botamos a culpa nas Forças Armadas”. Enfim, a culpa é de toda a sociedade, se nós chegamos nesse ponto.

O que eu quero dizer é que não tem, e não me interessa muito saber de culpas. O que me interessa e, eu acho, a toda a CPI, é saber como nós vamos unir as nossas forças nesse combate ao crime organizado. Então, se alguém pensa que o advogado é o “bicho papão” do crime organizado, está errado. O “bicho papão” é o conjunto das omissões que nós temos feito, é o conjunto, por exemplo, das omissões dos países vizinhos, que deixam o tráfico de armas no países deles prosperar livremente, que não tomam nenhuma atitude como contra membros de polícia e Forças Armadas, lá, que são traficantes de armas explícitos, e não tomam atitude.

Nós temos tudo mapeado. Fizemos uma reunião em que os países vizinhos lá, no Ministério de Relações Exteriores, todos vieram para cima de nós: “Está nos acusando de tráfico de armas?”. Nós tivemos que dizer: “Olha, não estamos acusando, logicamente, as instituições, mas estamos acusando membros das instituições, que facilitam e participam do tráfico de armas. E aqui estão as provas. Nós temos, aqui, onde é feito o tráfico, de que forma é feito. Só não podemos dar o nome para vocês porque nós não podemos ir no seu país para investigar”. Mas é isso que está acontecendo: do Uruguai até o Suriname, a nossa fronteira é um supermercado de armas. De armas e, muitas delas, de drogas.

E o que nós pedimos para eles? Nós dissemos: “Olha, antes de ver culpa, vamos pedir socorro, vamos trabalhar juntos. Não é questão de ver culpa, aqui, é questão de ver como nós podemos evoluir no trabalho”. Aí eu disse: “Se quiserem, a culpa maior é do Brasil, porque nós não botamos um efetivo suficiente nas fronteiras para coibir isso. Infelizmente, nós não temos um efetivo, nesse sentido”.

O nosso sistema de controle de armas, no país, é um sistema que não está abastecido de dados. As polícias estaduais não mandam os dados para o Sigma e o Sinar. Então, o Sigma e o Sinar estão com dados totalmente incompletos. Quer dizer, é um conjunto de medidas.

Nós temos uma sociedade organizada? Temos. E a democracia, e os direitos de cidadania são a base dessa organização. E que nós lutaremos, podem ter certeza, eu acho que todos os membros da CPI, com as nossas vidas, para defender isso. Como os senhores também o farão.

Agora, o que precisa é nós nos unirmos contra o crime organizado. Porque bandido se une. Bandido infiltra agente na política, na polícia, no Judiciário, no Ministério Público, na OAB, no Conselho de Engenharia, enfim, em todos os locais, no Conselho de Medicina, eles infiltram em todo canto. E eles são unidos. O colega deles é outro bandido. E usam, muitas vezes, um falso espírito de corpo, para se acobertarem.

Eu canso de dizer, eu mesmo denunciei vários Deputados, quem sabe, sabe disso, no Espírito Santo, no Maranhão, no Acre e em vários outros estados, denunciei e banquei a denúncia. Porque bandido não é meu colega, não, e não vai ser nunca. Como denunciei, também, delegados, oficiais, porque bandido não é meu colega, e eu não vou acobertar isso nunca.

Eu saio daqui, hoje, muito feliz com algumas coisas. Por exemplo, vai cair esse negócio da revista, esse mito de que a OAB é contra a revista. Isso era um mito que tinha criado, em todo o país, vai cair hoje, hoje caiu esse mito.


_____________________: Revista eletrônica… senhor Deputado.

Deputado Moroni Torgan: Desde que seja feita com dignidade, não tem ninguém contra, não é?

Vejam uma observação sobre Varas especializadas, talvez não entendam, mas o juiz singular é que está exposto ao crime organizado. Um juiz singular de São Paulo dizer que o Marcola não é líder de facção nenhuma! O país todo sabe quem é o líder do PCC, só o juiz não soube, foi o único que não soube. Quer dizer, o que que é isso? Isso é intimidação, pura. Já se tiver uma Vara, pelo menos ali vão estar, primeiro, os juízes que são vocacionados para isso; segundo, não vai ser um juiz, geralmente são dois, três, quatro, cinco, seis juízes na Vara, o poder de intimidação é muito menor. Terceiro, a visão de crime organizado vai ser preservada na Vara.

Porque o que o crime organizado mais gosta é da pulverização processual. Na pulverização processual, a Justiça perde a visão de crime organizado e fica o lavador de dinheiro, tesoureiro do PCC, vira um sonegador fiscal, lá, porque não tem a visão do crime organizado. E tendo a Vara específica, veja que nós já temos específico na polícia e no Ministério Público. São setores específicos de combate ao crime organizado. Tendo, na Justiça, essa visão de crime organizado vai ser preservada, eu tenho certeza disso.

Eu vi, aqui, uma coisa que me chamou a atenção, e eu vou procurar saber, essa ameaça a professores universitários. Porque, eu não posso afirmar, mas é contundente saber, por exemplo, que aquele advogado que nós recomendamos a prisão preventiva, o histórico dele é de crime. Ele responde a 155, ele responde a outro, 157, e ele responde a um 344, ele responde a 171. O histórico desse advogado, antes de formar, é de crime. Antes de formar, é de crime.

E, aí, que que dá idéia? Chegam notícias a nós, eu não posso afirmar que assim o seja, mas chegam notícias a nós que o PCC está formando gente. E, aí, vem confirmar com essa informação de que tem alunos intimidando os professores, compreendeu ?

Deputado Paulo Pimenta: Presidente, Vossa Excelência me permite só um detalhe?

Deputado Moroni Torgan: Pois não.

Deputado Paulo Pimenta: Não sei se é do conhecimento de todos os senhores. Há pouco tempo atrás foi realizado um concurso público para contratação dos agentes penitenciários federais, os carcereiros das novas penitenciárias federais. Esse concurso foi anulado, porque a investigação da Polícia Federal, da Polícia Civil do Distrito Federal, comprovou que pelo menos em cinco estados os gabaritos haviam sido adquiridos previamente. E as interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça dá, do trabalho desenvolvido pela polícia, revela claramente a ligação de uma quadrilha que atuava aqui, no Distrito Federal e que teve contatos com as lideranças do PCC, e também com organizações do Rio de Janeiro, oferecendo e comercializando, previamente, o gabarito.

E a polícia estima que 90 dos aprovados, desse concurso que foi anulado, poderiam ter, previamente, recebido o gabarito. Então, nesta própria investigação da polícia, eles levantaram a suspeita de que alguns daqueles profissionais que estavam realizando o concurso já teriam tido o seu curso pago por membros dessas organizações. Esse é um fato que está aí.

Deputado Moroni Torgan: Obrigado, Relator. Eu queria, só para concluir, dizer o seguinte: nós não temos que legislar em emergência. Agora, quantas vezes nós vamos falar isso, na questão da violência. Porque a violência, agora, não é mais emergência, é cotidiano. A violência, infelizmente, virou um cotidiano, para nós.

Então, essa é a razão que nós não queremos legislar em emergência, mas queremos ouvir todas as categorias envolvidas, para podermos fazer um esboço de legislação nova. Eu acho que não é uma legislação para aprovar esse mês, mas nós temos, o Código de Processo Penal, eu ouço, há quatro anos, dizendo… há quatro anos que eu ouço que nós não podemos fazer porque é muito complexo. Quer dizer, nós vamos levar mais 40 anos para fazer um novo Código de Processo Penal, porque é muito complexo? Porque é muito complexo, a gente não faz, deixa tudo como está.

Ou uma Lei de Execuções Penais. Há quatro anos que eu ouço o mesmo discurso no Congresso: “Ah, isso é uma coisa muito complexa, não pode ser…”. Mas, daí que é complexo? Vamos ouvir todo mundo e vamos chegar numa conclusão, e vamos fazer um aparato legal que seja mais adequado aos nossos dias.

Quer dizer, nós precisamos evoluir nisso. E, por isso, nós estamos pedindo as sugestões. Nós não queremos fazer nada de afogadilho. Por isso que nós estamos aqui, na OAB, para ouvir todas as sugestões dos senhores, nesse sentido.

O crime se organizou, sim. A sociedade é organizada, ela não é unida, no combate ao crime organizado. Nós precisamos nos unir, no combate ao crime organizado. Não temos nada a aprender com o crime organizado. Nada. O crime organizado não tem nenhum senso de cidadania, não tem nenhum senso de direitos humanos, não tem nenhum senso de sociologia. O crime organizado só pensa numa coisa: qual é o lucro que eu vou ter com essa ação criminosa? É só isso que ele pensa.

Nós temos é que nos unir. Nos unir, todas as instituições. Acho que a ética é importante em todos os momentos. É importante ética na política, é importante ética no Judiciário, é importante ética no Executivo, é importante ética em todos os setores profissionais, em todos os setores. Mas, geralmente, sempre é mais fácil a gente falar da ética do outro. A ética mais difícil de ser cumprida, muitas vezes, é a minha, de me olhar no espelho e ver se eu estou cumprindo. Eu faço isso todos os dias. Porque, se eu não conseguir cumprir essa ética, eu não consigo olhar para os meus filhos.

Nós estamos pedindo ajuda à OAB. Estamos pedindo ajuda e colocando em risco, muitas vezes, as nossas famílias. Já muito a minha família passou, por causa disso. Mas eu acredito numa sociedade unida e organizada, combatendo o crime organizado, esfacelando o crime organizado e dando uma chance de vida melhor para os nossos filhos. E eu tenho certeza que essa é a crença de todos os membros da CPI.

Então, essa ajuda nós estamos pedindo à OAB. E eu sou muito grato por todo o apoio que nós recebemos aqui, hoje. Muito obrigado.

Presidente Roberto Antonio Busato: Pode ter certeza, caro Deputado Moroni Torgan, que a Casa vai responder ao seu apelo, dentro da sua tradição histórica de batalhar por um país mais justo, por um país mais digno. É isso que nós estamos nos batendo. E nos somamos a esta força, que esses Deputados estão fazendo, no sentido de mostrar uma outra cara para este país.

Realmente, aquilo que eu falei, na Tribuna do Supremo Tribunal Federal, nós temos que agir na prática. Nós não podemos perder a compostura, como cidadãos, e devemos procurar, de toda forma, mudar, digo novamente, a cara deste país.

Eu designo, para apresentar um parecer, baseado nas discussões desta sessão, os Conselheiros Cezar Bitencourt, do Rio Grande do Sul; o Conselheiro Sebastião, do Amapá; o Conselheiro Alberto Zacharias Toron, de São Paulo, pela sua experiência e por seu notório saber, dentro da área; com a coordenação do Diretor Secretário Adjunto, Hercílio Bezerra, de Tocantins, para produzirem um parecer desta sessão, para ser apresentado ao eminente Deputado Paulo Pimenta, antes da divulgação do seu relatório, que está marcado para o dia 3 de julho.

Posteriormente, estaremos combinando com o eminente Deputado a entrega desse documento, e encaminharemos à CPI uma degravação de tudo que foi aqui debatido, a pedido, inclusive, do Presidente Moroni Torgan.

Senhores Conselheiros, está levantada a sessão. Obrigado pela atenção de todos.

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