A volta do sinal

Anatel deve desbloquear celular no interior de SP

Autor

8 de junho de 2006, 7h00

O sinal dos telefones celulares no interior de São Paulo tem de ser desbloqueado. A ordem foi dada pelo diretor do Dipo — Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária do Tribunal de Justiça de São Paulo, juiz Alex Tadeu Monteiro Zilenovski, à Anatel e vale para cinco cidades do interior paulista.

No despacho, o juiz argumenta que o bloqueio, válido por 20 dias até esta quarta-feira (7/6), foi uma medida cautelar. Além disso, ele reconhece que o Dipo não tem poderes para resolver, de modo definitivo, o problema do fluxo de comunicações ilegais entre criminosos.

“A medida revelou-se corajosa, útil, adequada e eficaz. Porém, não pode durar para sempre, mesmo porque o dever de impedir a entrada de celulares nos presídios é do Poder Executivo estadual, que conta, inclusive, com uma Secretaria de Assuntos Penitenciários, especialmente criada para gerir a administração do sistema.”

Leia a íntegra da decisão

Vistos, etc…

Aos 17 pp. este Juízo, agindo com base no poder geral de cautela do Juiz, acolheu representação do Ilmo. Delegado de Polícia, Dr. Ruy Ferraz Fontes,da 5ª DELEGACIA DA DISCCPATRIMÔNIO ROUBO A BANCOS/DEIC,pela qual a Digna Autoridade Policial sustentava a necessidade da suspensão dos serviços de telefonia móvel mediante bloqueio das chamadas e recebimentos de ligações originadas ou destinadas aos aparelhos de telefonia celular situados nas ERBs correspondentes às áreas geográficas coincidentes e imediatamente adjacentes às Penitenciárias Paulistas de Avaré; Presidente Wenceslau; Iaras, Araraquara, São Vicente e Franco da Rocha.

Argumentava a Digna Autoridade Policial que tal medida justificava-se como meio de paralisar,senão dificultar, os contatos entre líderes de facções criminosas e seus operadores que, naqueles dias vinham atacando e matando inúmeros policiais militares e civis,agentes penitenciários, pessoas civis,além de danificar instalações do Estado, bancos e um sem-número de coletivos, promovendo,ainda, inúmeros levantes em Penitenciárias em todo o Estado, traduzindo clima de terror na população ordeira.

A autoridade do Estado estava sendo testada.

O Povo estava em pânico.

Inúmeras pessoas estavam morrendo.

O crime organizado estava afrontando o Estado e, de certa forma, testando seus poderes.

Mais, o Estado-Administração, por sua Polícia Judiciária, tinha necessidade de investigar dos crimes que haviam e ainda estavam acontecendo.

E foi neste contexto que este Juízo,decidindo em clima de extrema gravidade e sopesando os elevados bens jurídicos envolvidos,merecedores de cautela e proteção estatal, e à luz da imperatividade dos interesses sociais,acolheu o pedido e determinou à ANATEL a confecção e implantação de um plano técnico juntamente com as Operadoras do Serviço Móvel Pessoal – SMP – objetivando a supressão dos sinais de comunicação entre celulares existentes dentro das Unidades Prisionais e o mundo exterior.

Mais,fixou a duração da medida em 20 (vinte) dias (prorrogáveis) ou até que a questão fosse definitivamente resolvida por outra medida jurisdicional ou legal.

A medida foi tecnicamente planejada e implementada dentro de não mais de 30 (trinta) horas, o que demonstrou o profissionalismo e o espírito público da Agência Reguladora – ANATEL e também das várias Operadoras do Sistema de Telefonia.

A providência tomada visava possibilitar, essencialmente : a) estancar imediatamente o clima de barbárie e violência desencadeado contra agentes do Estado e contra a população ordeira como um todo; b) investigar tais ocorrências e desvendar a autoria imediata e mediata de tais ações criminosas; c) concatenar todos os dados de investigação coligidos a fim de traçar a real dimensão da ação criminosa organizada em São Paulo; d) cortar os meios de comunicação entre os líderes das facções criminosas e os delinqüentes soltos que operam as ações espúrias; e) imobilizar a dinâmica das ações criminosas a fim de poder investigar aquelas que já ocorreram; f) restabelecer o pleno controle do Estado pelo Poder Público; g) não permitir que organizações criminosas conspurquem as Instituições do Estado e a plenitude do regime democrático.


Infelizmente, a medida, embora plenamente justificável pelo verdadeiro “estado de necessidade social” vigente, veio a tocar interesses de cidadãos dos municípios em que as penitenciárias estão instaladas, que tiveram seus sinais de celular comprometidos.

No entanto, todo o tempo, as medidas foram tomadas, executadas e acompanhadas pretendendo minimizar os efeitos negativos sobre a população inocente e ordeira daqueles municípios, que quer apenas trabalhar e viver em paz.

A ANATEL municiou este Juízo de relatórios periódicos que davam conta da eficácia da medida e da busca permanente do menor impacto social indesejável da medida.

Aos 02 de junho veio aos autos informação da Secretaria de Assuntos Penitenciários dando conta de que a Penitenciária Dr. Paulo Luciano de Campos, de Avaré, havia sido esvaziada, razão pela qual este Juízo, imediatamente, determinou o restabelecimento dos sinais de comunicação telefônica na região.

Cumpre ponderar que em nenhum momento pretendeu este Juízo Corregedor do DIPO, com jurisdição meramente criminal e com base territorial na Comarca da Capital, dar caráter satisfativo à medida, ou seja, nunca foi intento deste Magistrado, resolver o grave problema do fluxo de comunicações espúrias entre criminosos de modo definitivo, mesmo porque esta não é sua função constitucional e nem tem poderes para tanto.

Não que este não fosse o desejo da sociedade.

No entanto, há que se ponderar que vivemos do Estado Democrático de Direito e uma das conseqüências disto, é que a Carta Magna prevê um estrito regime de repartição de competências entre os Poderes e os Órgãos do Estado Brasileiro.

Assim, o poder geral de cautela, do qual é investido o Poder Judiciário, e do qual a presente medida é um exemplo, há de se restringir aos seus estritos limites e há de cumprir sua estrita finalidade, que, obviamente, é bastante restrita, máxime se considerarmos que existem interesses particulares e de cidadãos envolvidos.

Fato é que a medida revelou-se corajosa, útil, adequada e eficaz, porém, não pode durar para sempre, mesmo porque, o dever de impedir a entrada de celulares nos presídios é dever do Poder Executivo Estadual, que conta, inclusive, com uma Secretaria de Assuntos Penitenciários, especialmente criada para gerir a administração do sistema.

A execução da pena no Brasil, embora jurisdicionalizada, é responsabilidade do Poder Executivo.

Portanto, a presente medida cautelar tem caráter estritamente precário e temporário e foi implantada por ordem da Justiça apenas para resguardar os interesses públicos e estatais acima aludidos, então colocados em xeque.

Assim, não há como conceber uma medida cautelar gestada por um Juízo Criminal que se transformasse em verdadeira solução para uma deficiência que já é de conhecimento do Estado-Administração há muito tempo.

Não pode uma mera medida acautelatória,oriunda do primeiro grau da Justiça do Estado, ser eternizada, mesmo porque, nem é o instrumento jurídico adequado para solucionar definitivamente o problema, nem é da competência do Poder Judiciário, de ofício, ingerir em assuntos da Administração Penitenciária.

A cautelar concedida por este DIPO foi útil e serviu para os propósitos a que se destinava : dar condições ao Estado-Administração, para investigar crimes e para estancar a comunicação nefasta dentro e fora dos presídios.

Aqui cessa o poder deste Juízo.

Mesmo porque a questão é pública e compete aos órgãos adequados do Estado tomar as medidas jurídicas, técnicas e concretas para impedir que celulares entrem nas penitenciárias e, mais, que as cabeças do crime organizado, embora presas, continuem a dirigir e organizar a criminalidade executada pelos soldados do crime que estão soltos (ou presos) e que investem contra a sociedade pacífica, os cidadãos de bem e os próprios interesses do Estado Democrático.

As ricas experiências técnicas alcançadas com a implementação da presente medida estão no bojo destes autos e já foram encaminhadas aos órgãos estatais a quem cumpre colocá-las em prática : Poder Executivo do Estado de São Paulo (por sua Secretaria da Administração Penitenciária); Ministério Público (detentor da legitimidade para ações constitucionais adequadas) e Juízos Corregedores dos Estabelecimentos Penitenciários ora tratados.


Mais, a questão demonstrou-se muito mais ampla e grave do que a comunicação clandestina por meio de celulares.

Há que se analisar os outros meios de que se valem os criminosos profissionais para passar suas ordens aos seus soldados soltos ou presos : a comunicação oral por interpostas pessoas; as “rádios piratas”;os radiocomunicadores tipo “talkabout”.; os telefones sem fio de longo alcance; os outros tipos de comunicação eletrônica, etc … .

Há, ainda, que investigar e reprimir os eventuais focos de corrupção (ou coação) que, porventura, facilitem a movimentação indevida de presos ou mesmo o incremento da veiculação da comunicação entre o mundo exterior e o interior dos cárceres.

Assim, a solução da questão passa por ações sérias,concretas, efetivas e definitivas, quiçá,legislativas, e acima de tudo, pela seriedade que é dever de todo aquele que recebe do Povo a nobre missão de representá-lo, defendê-lo e tratar de seus interesses.

O Poder Judiciário é eminentemente técnico-jurídico,de modo que a gestão e a concretização das ações governamentais é de responsabilidade dos outros Poderes da República, em especial, do Executivo.

Cumpre também ao elemento pessoal do Estado : o Povo, por meio dos instrumentos da cidadania, cobrar a efetiva e definitiva solução para o problema, pois o Estado Brasileiro, detentor da Soberania,não pode tolerar a afronta que têm lhe feito os transgressores da ordem jurídica e dos limites da civilização.

Cumpre ponderar que avizinham-se imperativas as providências no sentido de : a) impedir a entrada de equipamentos de comunicação nos presídios; b) manter a efetiva vigilância sobre os líderes do crime organizado e sobre as pessoas que com eles mantêm contato; c) manter a efetiva segregação daqueles mais perigosos ; d) efetivar a instalação de sistemas completos de bloqueio de sinais de radiocomunicação com sub-faixas de radiofreqüência destinadas aos mais diversos sistemas de telecomunicação, com módulos de bloqueador, pelo menos em cada unidade prisional destinada a receber os líderes do crime profissional; e) manter a concentração da liderança do crime organizado em presídios afastados de áreas urbanas e,efetivamente, “bloqueados” eletronicamente, etc … .

Considerando que existem novos elementos informativos, alguns de natureza técnica, outros advindos da rica experiência vivida nesta época,ambos juntados a estes autos nestes últimos 20 dias, e dado o caráter de interesse público e o ineditismo da matéria, determino a extração de cópias de todo o processado com remessa, (para alguns novamente): a) ao Poder Executivo do Estado de São Paulo,por sua Secretaria da Administração Penitenciária e por sua Secretaria de Segurança Pública; b) ao Ministério Público Estadual,por seu Chefe,o Procurador Geral da Justiça – legitimado para propor as ações que darão definitividade à questão; c) ao Ministério Público Federal, por seu Procurador Geral da República – legitimado para propor as ações que darão definitividade à questão no âmbito nacional ; d) ao Presidente do Congresso Nacional,dotado do poder constitucional de criar normas jurídicas para todo o país ; e) ao Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, dotada do poder constitucional de criar normas jurídicas em sua esfera de poder ; f) ao Poder Executivo Federal, por seu Ministério da Comunicações, dotado do poder de regular e fiscalizar as telecomunicações e Agência Reguladora e g) aos Juízos Corregedores das Penitenciárias ora abrangidas, diretamente interessados na efetiva e duradoura solução da questão.

Posto isto, há que se compreender que o Poder Judiciário deu sua colaboração para a compreensão e para a solução desta tormentosa questão,porém, aqui cessa sua ação, eis que seguir adiante seria transbordar de seu poder constitucional e invadir ceara alheia.

Oficiem à ANATEL e às Operadoras do Sistema de Celulares determinando o imediato restabelecimento da plenitude dos sinais diminuídos ou suprimidos por obra da decisão deste Juízo.

São Paulo, em 07 de Junho de 2006.

ALEX TADEU MONTEIRO ZILENOVSKI

Juiz de Direito Corregedor do DIPO

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!