Profissão indesejada

Prefeitura indeniza servidor por alterar sua função sem elevar salário

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4 de junho de 2006, 7h00

Por ter mudado um servidor da função de pedreiro para a de coveiro, negando-lhe o pagamento de diferenças de salário e adicional de insalubridade (que no caso subiu de 10% para 40%), a Prefeitura de Queimados, na região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, foi condenada acaba de sofrer condenação no Tribunal de Justiça do Rio. A prefeitura terá que pagar R$ 26 mil ao servidor público municipal Geraldo Fagundes.

Os desembargadores da 3ª Câmara Cível acolheram argumento do trabalhador de que sentiu “angústia, repulsa e sofrimento” no exercício da nova atividade profissional. Segundo o relator, Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, nenhum servidor público pode ser obrigado a trocar de atividade compulsoriamente, exceto os militares que ao ingressarem na carreira estão cientes e concordam com as constantes mudanças.

Entre cadáveres

A estranheza de Fagundes com a função a que seus superiores determinaram está clara nos autos, que descrevem seu convívio diário com cadáveres putrefatos e o risco iminente de contrair doenças, uma vez que trabalhava sem luvas, botas e uniformes.

“Angustiado, ansioso e com tremores o réu acabou buscando refúgio na bebida”, diz trecho da apelação, na qual o autor reclamou do não pagamento de dano moral na decisão proferida em primeira instância. A Câmara reconhece os transtornos do ato da prefeitura, quando o desembargador aborda em seu voto a “humilhação e indevida angústia do réu, quando teve violada sua dignidade e estabilidade emocional”.

No exame da matéria, o relator aponta jurisprudência no sentido de que são devidas ao servidor as diferenças de remuneração entre os dois cargos. Ao tratar desse assunto, Luiz Fernando Carvalho faz interessante observação sobre como se dão desvios de função no setor público. “Quando a mudança é para cima, os funcionários subalternos ganham funções de proeminência, muitas vezes, por ingerência de escabroso apadrinhamento. Aí, a mesma força que o içou encarrega-se de assegurar o pagamento das diferenças remuneratórias.”

Já no desvio para baixo, salienta o desembargador, “o servidor não apenas tem prejuízo no bolso, mas vê violado seu próprio direito ao cargo que ocupa, com as funções que lhe são inerentes. Tais situações apresentam-se normalmente como oblíqua e inaceitável punição”.

E segue: “Para se aferir a natureza afrontosa de tal ato de arbítrio, faz-se ilustrativa a invocação, hipotética, de colocar-se um Procurador Municipal no atendimento à clientela de um posto de Saúde, prestando informações, encaminhando doentes ou mesmo executando a limpeza das instalações.

Para o desembargador, é evidente que o descompasso entre as atribuições e as funções do servidor “decorre da mesma ilegalidade básica, que é o desvio de função. De outro turno, seria uma violação à isonomia, além de uma iniqüidade, reconhecer ao cargo de maior expressão melhor direito, neste particular, relativamente aos demais cargos da administração, em especial aos cargos da carreira de apoio, pois se trata de insuperável vício de legalidade”.

E concluiu que a condenação da prefeitura não é absurda por ter o município de Queimados cometido um ilícito — punir o pedreiro colocando-o no cemitério da cidade, sem a contrapartida financeira devida.

Apelação Cível 24.212/05

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