Crise em cadeia

Para superar crise, SP precisa construir dois presídios por mês

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29 de julho de 2006, 7h00

Se o número de presos do estado de São Paulo se mantiver estável nos próximos quatro anos, o futuro governador terá de inaugurar duas novas penitenciárias por mês para livrar os 144 presídios da superlotação que os entope. É o que mostram os números do Decrim — Departamento Técnico de Apoio ao Serviço de Execuções Criminais e da Secretaria de Administração Penitenciária.

São Paulo tem, hoje, de 145 mil presos distribuídos em 144 presídios: média de pouco mais de mil presos por unidade prisional. Só que cada unidade foi construída para abrigar, em média, 600 presos. Na ponta do lápis, o déficit é de 98 presídios. Em 48 meses de mandato do próximo governador, ainda vai faltar construir duas cadeias.

A construção de presídios pode resolver o problema de alojamento dos presos, mas não resolve todos os problemas do sistema prisional. Esta é uma simplificação tanto quanto aquela que atribui a explosão da criminalidade unicamente à ausência do Estado. Para Carlos Fonseca Monerat, juiz corregedor dos presídios de São Paulo, atribuir a culpa da lotação dos presídios e da criminalidade apenas à falta de planejamento estatal é omitir a realidade. Para ele, sem a participação de toda a sociedade, não há saída.

“Não posso admitir a afirmação de que as organizações criminosas crescem no vácuo da falta de assistência do Estado. A sociedade é que teria de estar de braços abertos para receber quem está saindo da prisão” afirma Monerat. Para o juiz, as empresas teriam de dar mais chances para quem já cumpriu a pena. “Se isso fosse feito, o nível de reincidência seria infinitamente menor.”

Monerat cita o exemplo do presídio de Araraquara, no interior de São Paulo onde enfiaram 1.443 detentos num espaço em que cabiam 600 e os presos acabaram destruindo tudo. “Até o mês de maio, quando havia uma rebelião e as instalações da prisão eram danificadas, os presos eram levados para outro lugar. Mas agora, com quase a metade dos estabelecimentos quebrados pelos próprios presos, onde é que vou colocá-los?”

Monerat acredita que o sistema tem sido eficiente na missão de punir o culpado, mas que fracassou na tentativa de ressocializar o preso. “Grande parcela de presos não se ressocializa porque não tem trabalho, porque fica longe da família, porque réus primários se misturam com presos de elevada condenação. A única função que a pena tem cumprido é de caráter retributivo, porque coloca a pessoa em situação de castigo, numa situação muito mais dura do que teria se estivesse em liberdade”, finaliza Monerat.

Controle de condenados

Segundo dados do Decrim, só na capital paulista são 56 mil condenados. Destes, 13 mil estão presos em regime fechado, 1,2 mil no semi-aberto e 6 mil cumprem pena em livramento condicional. Há, ainda, quase 7 mil prestando serviços comunitários ou presos em albergues. Vários outros estão em tratamento ambulatorial, internação, pagam multa, entre outras penalidades.

O tempo na fila de espera do pedido de progressão de regime pode levar meses. Até um ano. Isso porque, tecnicamente, todos os presos condenados, depois de cumprir parte da pena, podem pedir o benefício. Há um grande número esperando. Outros já têm o direito, mas não foram orientados a fazer o pedido. O último censo presidiário constatou que 90% dos presos não conhecem sua situação penal.

São 309 Varas de Execuções Criminais. Existem as que cuidam de meia dúzia de apenados, numa comarca pequena. Outras tratam do processo de execução da pena de milhares de presos, alguns de altíssima periculosidade.

“Trata-se de uma situação complexa porque são muitas modalidades de cumprimento da pena. Só no regime de prisão, temos o fechado, o semi-aberto e o aberto. Temos ainda as pessoas que estão em livramento condicional. Cada apenado precisa ser acompanhado individualmente”, explica o juiz.

Monerat é juiz há 17 anos e passou a maior parte da carreira tratando das execuções penais. Ele explica que a competência da Vara de Execuções criminais vai muito além da prisão: “Temos de cuidar do preso condenado, ainda que solto. Se é cometido um delito de menor potencial ofensivo e o acusado é condenado a prestar serviços à comunidade, isso também é pena e também vai ser acompanhada pela Vara de Execuções.”

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