Operação Cerol

Desembargador dá liberdade aos 17 presos na Operação Cerol

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26 de julho de 2006, 12h53

O desembargador federal Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, concedeu liminar em Habeas Corpus para soltar todos os acusados presos na Operação Cerol. O pedido foi ajuizado em favor de oito pessoas, mas o benefício acabou estendido aos outros acusados. Cabe recurso.

“As prisões temporárias exauriram seus fundamentos, cumpriram sua função e, ao perdurarem dessa forma, passam a se converter em mero castigo sem culpa ainda formada ou antecipação de uma pena para a qual o processo penal há ainda que ser instaurado, sendo certo que, no caso, sequer há denúncia do Ministério Público”, considerou Abel Gomes.

O desembargador ressaltou, ainda, que o objetivo da prisão era possibilitar que a investigação se desse de forma ampla, impedindo que os investigados atuassem para impedi-la ou dificultá-la. No entanto, como o procedimento já foi já foi cumprido, não há motivo para manter os acusados presos. Além disso, os acusados estão colaborando com as investigações.

“Nos Habeas Corpus examinados é possível verificar que já foram realizadas várias apurações sobre a existência dos delitos, e colhidos e apreendidos documentos nas repartições e nas casas dos investigados”, afirmou.

Inquérito

O Ministério Público Federal já encaminhou à 6ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro pedido de prorrogação da prisão temporária de todos os 17 presos durante a Operação Cerol. Entre eles estão sete advogados. O documento assinado pelos procuradores da República Marcelo Freire, Orlando Cunha e Fábio Seghese pede mais cinco dias para o recolhimento de provas que possam ser úteis ao processo penal.

A Operação Cerol foi deflagrada na sexta-feira (21/7). O objetivo foi combater fraudes no recolhimento de impostos, sonegação fiscal e contrabando. De acordo com a PF, policiais federais, alguns com cargos de chefia, recebiam promessa de vantagem financeira para beneficiar acusados dos crimes financeiros na condução de inquéritos.

As investigações eram propositalmente falhas para beneficiar empresários. A investigação sobre o esquema durou um ano e dois meses, a partir de denúncias do INSS, do Ministério Público Federal e do setor de inteligência da própria PF.

Leia a íntegra da decisão

DECISÃO

Trata-se de oito habeas corpus, com pedido de liminar, impetrados da seguinte forma:

a) n° 2006.02.01.007658-8, impetrado por GEORGE TAVARES e outros, em favor de MÁRIO JORGE CAMPOS RODRIGUES;

b) n° 2006.02.01.007660-6, impetrado por HUMBERTO DE MATOS MAIOLI e outros, em favor de RENATO PAULA DE ALMEIDA;

c) n° 2006.02.01.007708-8, impetrado por NÉLIO ROBERTO SEIDL MACHADO e outro, em favor de JAIRO HELVÉCIO KULLMANN;

d) n° 2006.02.01.007707-6, impetrado por RICARDO NASCIMENTO E SOUZA, em favor de Mário Roberto Affonso de Almeida;

e) n° 2006.02.01.007706-4, impetrado por MAURO COELHO TSE e outro, em favor de PAULO HENRIQUE VILLELA PEDRAS;

f) nos 2006.02.01.007794-5, 2006.02.01.007795-7 e 2006.02.01.007796-9, impetrados por SIDNEI RICARDO MENDES DA COSTA, respectivamente, em favor de ÁLVARO ANDRADE DA SILVA, ANTONIO XAVIER MENDES e DANIEL LEITE BRANDÃO.

Visam a atacar decreto de prisão temporária do MM. Juízo da 6ª Vara Federal Criminal/RJ, apontado como autoridade impetrada.

No dia 21/07/06 indeferi liminares nos habeas corpus n° 2006.02.01.007658-8 e 2006.02.01.007660-6.

Os habeas corpus, inicialmente distribuídos ao Juízo de Plantão no dia 22/07/2006 tiveram a liminar indeferida pela Exma. Desembargadora Federal VERA LÚCIA LIMA.

Considerando que se trata de prisão temporária decretada em razão da mesma operação da Polícia Federal, denominada “Operação Cerol”, passo a apreciar todos os habeas corpus em uma única decisão, com cópia a ser juntada em cada um deles.

As situações processuais variam. Em alguns habeas corpus o pedido de liminar já foi apreciado, em outros ainda pendem de apreciação e, ainda em outros, já há pedidos de reconsideração do indeferimento de liminar.

Na data da deflagração da operação, o MM Juiz Federal, MARCELO ENES FIGUEIRA, remeteu a meu Gabinete, por solicitação minha, ofício encaminhando documentos básicos relativos à operação.

Na data de hoje, foram encaminhadas informações por meio informático, referentes aos pacientes MÁRIO JORGE CAMPOS RODRIGUES e RENATO PAULA DE ALMEIDA, juntadas nos respectivos autos.

DECIDO:

Num exame liminar da primeira decisão que decretou a prisão temporária do paciente, fundamentada em 51 (cinqüenta e uma) folhas, verifico que a autoridade impetrada efetuou uma análise percuciente das investigações, apontando fatos concretos em relação à materialidade delitiva e à suposta autoria dos investigados.

A própria magistrada separa os fatos em tópicos distintos, que correspondem, ao final, à atuação de cada um dos investigados. Num primeiro momento, destaca os fatos relativos às investigações referentes à DELEPREV e ao interesse de processos do escritório MICHEL ASSEF ADVOGADOS ASSOCIADOS e da empresa VIGBAN. Num segundo, se valendo do liame na pessoa do advogado TARCÍSIO PELÚCIO, passa a estabelecer um gancho para trazer ao contexto as relações entre outras autoridades de cúpula da Superintendência da Polícia Federal e o apontado esquema criminoso.

Ao apreciar os primeiros pedidos de liminar, limitei-me a considerar os pressupostos mínimos que autorizassem a decretação da medida, ocasião em que verifiquei, das cópias remetidas pelo MM. Juízo a quo, e que ora faço juntar ao habeas corpus n. 2006.02.01.007658-8, que havia indícios suficientes a ensejar uma apuração dos fatos. Sobretudo em relação àqueles que dizem respeito aos inquéritos da DELEPREV, onde os indícios são mais do que suficientes. São veementes.

Na ocasião, apreciei ainda o requisito essencial para a prisão temporária, que é a sua imprescindibilidade para as investigações iniciais. E o fiz calcado na idéia de que, se tratando de policiais com cargos e lugares físicos na própria instituição, e à vista da necessidade de reunir provas documentais, executar mandados de busca e apreensão e colher de imediato os depoimentos, até se apresentava razoável a custódia que tem prazo máximo inicial de 05 dias.

Ademais, constatei que pelo um dos crimes investigados, que se apresentava com indícios razoáveis de ocorrência prática, estava capitulado inciso III do art. 1º da Lei de n. 7.960/89, o que também demonstrava o preenchimento desse requisito objetivo.

Contudo, levando em conta que se trata de medida de cerceamento da liberdade e o fato de que os mandados foram cumpridos na sexta-feira, dia 21 de julho de 2006, na data de hoje, 25/07/06, os cinco dias do prazo inicial da medida já estão por se esgotar.

Mesmo não havendo notícias formais sobre o pedido de prorrogação, mas considerando que ainda resta apreciar alguns pedidos de liminar e outros de reconsideração de indeferimento de liminares, é preciso que se faça uma análise da situação processual em curso.

Acontece que, como o próprio título da custódia mostra, trata-se de prisão por prazo determinado. Mas, ainda mais do que isso, uma prisão que tem finalidade bem definida e que, no caso, é possibilitar, no momento inicial em que a investigação é deflagrada de forma ampla e complexa, seja possível colher elementos e impedir que os investigados, uma vez no campo das apurações, atuem para impedi-las ou dificultá-las.

Entretanto, nos habeas coprus examinados é possível verificar que já foram realizadas várias apurações sobre a existência dos delitos, e colhidos e apreendidos documentos nas repartições e nas casas dos investigados.

Ademais, não obstante o princípio nemo tenetur se detegere, que traz ao investigado a possibilidade de permanecer calado diante da autoridade policial, no caso constam dos habeas corpus relacionados, as declarações dos pacientes, ouvidos durante o prazo da prisão temporária. Ou seja, sequer seriam obrigados a prestar efetivamente o depoimento, mas o fizeram.

É possível que alguns elementos de investigação ainda mereçam resguardo, e que consistem naqueles que podem ainda estar nas repartições públicas. Mas, nesse caso, também entendo que medidas menos drásticas do que a manutenção da prisão temporária por mais prazo, podem ser aqui aplicadas, com base no poder geral de cautela do juiz criminal, como aliás, já foi precedente em minha decisão, lançada nos habeas corpus da denominada “Operação Paralelo”.

Diante de tudo isso, a meu sentir, as prisões temporárias exauriram seus fundamentos, cumpriram sua função e, ao perdurarem dessa forma, passam a se converter em mero castigo sem culpa ainda formada ou antecipação de uma pena para a qual o processo penal há ainda que ser instaurado, sendo certo que, no caso, sequer há denúncia do Ministério Público.

Seguindo por essa linha, nos casos dos pacientes funcionários públicos da Superintendência da Polícia Federal e do INSS, investigados por atos praticados por meio de suas funções, e como parte das investigações se processam mediante pesquisa junto à repartição onde trabalham, o cumprimento do alvará de soltura fica condicionado à assinatura de termo de compromisso, no ato de cumprimento da soltura, de que, além de não se ausentarem da Cidade sem autorização judicial; manterem endereço atualizado perante o juízo e comparecerem a todos os chamados da Polícia e da Justiça, ainda se manterão afastados, fisicamente, da repartição de trabalho, exceto com prévia autorização judicial, enquanto durar o inquérito e até deliberação ulterior da autoridade administrativa superior hierárquico, que os designe para outra função. Aos demais pacientes, que não sejam funcionários públicos, também serão apresentados termos de compromisso, sem a vinculação ao afastamento de repartição pública.

Os afastamentos são determinados por essa decisão judicial e deverão ser comunicados à repartição de trabalho dos pacientes, para que dele não resulte sanções administrativas aos investigados, cabendo à mesma repartição informar ao Juízo da 6ª Vara Federal, caso os pacientes insistam em adentrar a repartição durante esse período, quando, então, as providências cabíveis poderão ser adotadas.

Ante o exposto, nos termos acima, defiro a liminar aos pacientes MÁRIO JORGE CAMPOS RODRIGUES (n° 2006.02.01.007658-8), RENATO PAULA DE ALMEIDA (n° 2006.02.01.007660-6), JAIRO HELVÉCIO KULLMANN (n° 2006.02.01.007708-8), MÁRIO ROBERTO AFFONSO DE ALMEIDA (n° 2006.02.01.007707-6), PAULO HENRIQUE VILLELA PEDRAS (n° 2006.02.01.007706-4), ÁLVARO ANDRADE DA SILVA (n° 2006.02.01.007794-5), ANTÔNIO XAVIER MENDES (n° 2006.02.01.007795-7), DANIEL LEITE BRANDÃO (n° 2006.02.01.007796-9), nos termos acima.

Expeçam-se alvarás de soltura, imediatamente, a serem cumpridos mediante termo de compromisso acima indicado, a serem juntados a estes autos, com cópias ao Juízo de 1º Grau.

Considerando que alguns dos investigados presos não impetraram habeas corpus, mas levando em conta que os fundamentos dessa decisão são de caráter objetivo, estendo aos demais: MAURO DE MIRANDA MONTENEGRO, JORGE MAURÍCIO MENDES DE ALMEIDA, JOSÉ MILTON RODRIGUES, PAULO SÉRGIO BALTAZAR, CLÓVIS MAURÍCIO ALVES PFALTZGRAFF, MONCLAR EUGENIO GAMA, JORGE ANTONIO DUARTE DELDUQUE, PATRÍCIA ESTEVES DE PINHO e TARCÍSIO DE FIGUEIREDO PELÚCIO, sendo que, em relação a eles, como não disponho de dados qualificativos para a expedição de alvarás, deve ser encaminhado à 6ª Vara, imediatamente, fax desta decisão, determinando ao MM. Juízo que expeça, por ordem deste Relator, os alvarás de soltura e os compromissos acima referidos.

Oficiem-se como determinado.

Traslade-se cópia para todos os demais habeas corpus.

Remetam-se os autos encaminhados a este Gabinete para verificar correlação à DIDRA, para que faça a distribuição a este Relator, à vista da prevenção no tocante aos autos n° 2006.02.01.007658-8.

Rio de Janeiro, 25 de julho de 2006.

ABEL GOMES

Desembargador Federal

Relator

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