Inquérito sem causa

Advogado questiona poder de investigação criminal do MP

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23 de janeiro de 2006, 18h20

O desembargador Orlando de Almeida Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, vai julgar nos próximos dias se o Ministério Público pode, ou não, conduzir diretamente investigação criminal, e se pode suspender inquérito civil caso o MP atrase a conclusão da investigação.

Trata-se, no caso concreto, de um pedido de liminar em Mandado de Segurança, de uma advogada do departamento jurídico da extinta Fema — Fundação Estadual do Meio Ambiente.

A advogada foi denunciada pelo Ministério Público estadual, juntamente com o ex-presidente do órgão e outros três funcionários, sob a acusação de conceder licenças para pesqueiros em áreas de preservação permanente. A denúncia já foi rejeitada, mas ainda tramita uma série de inquéritos civis públicos para investigar atos de improbidade.

O advogado da funcionária da extinta Fema, Eduardo Mahon, entrou com o pedido de Mandado de Segurança, sustentando que está claro que o MP quer investigar criminalmente no curso de um inquérito civil, o que alega ser inconstitucional, além de não permitir cópia dos autos aos advogados.

Também afirma que os inquéritos começaram em agosto de 2005 e até agora não foram concluídos. “Por amor à precisão, temos exatos 171 dias, contados do início das investigações”, quando o período previsto é de 90 dias, podendo ser prorrogado para mais 30 (como prevê a Resolução 01/2001 do Conselho Superior do Ministério Público), o que não ocorreu no caso.

“O TJ-MT já analisou o mesmo tema num pretérito recente, com contornos idênticos ao caso ora versado (…). Portanto, à unanimidade do Colegiado, já restaram pacíficas as balizas temporais para o encerramento do inquérito civil donde se dará o arquivamento, ultrapassada a diretiva da Resolução 001/2001/CSMP”, afirma.

De acordo com o advogado, “não pode prolongar-se no tempo sofrimento que abala a moral da impetrante, em descompasso com os próprios prazos fixados pelo MPE”.

Mahon também sustenta a inconstitucionalidade do MP para conduzir a investigação criminal, no curso de um inquérito civil. Segundo alega, já é pacífico no Tribunal de Justiça de Mato Grosso que “o Ministério Público não pode investigar diretamente prescindido da polícia sem atentar contra o princípio republicano do controle”.

A defesa da advogada pede liminarmente a suspensão das investigações e no mérito o trancamento do inquérito.

Poder de investigar

O poder de o Ministério Público conduzir investigações criminais está em julgamento no Supremo Tribunal Federal. Até agora, o placar favorece o Parquet: três votos a favor da investigação e dois votos contra. O julgamento no STF foi suspenso com o pedido de vista do ministro Cezar Peluso, em setembro de 2004.

Os ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Eros Grau entenderam que não é exclusividade da polícia a condução das investigações. Já os ministros Marco Aurélio e Nelson Jobim votaram contra o poder investigatório criminal do MP.

Em julgamento nas Turmas do Supremo, contudo, os ministros Gilmar Mendes e Ellen Gracie já se manifestaram contra o poder investigatório do MP. Se mantiverem o entendimento, são pelo menos quatro votos contra o Ministério Público.

A questão é discutida no inquérito em que o deputado Remi Trinta (PL-MA) é acusado de envolvimento em fraudes contra o Sistema Único de Saúde (SUS). O deputado nega as acusações e questiona a investigação, feita pelo Ministério Público Federal. Ele alega que, ao MP, caberia apenas requisitar diligências e a instauração de inquérito policial. Ainda não há previsão de quando irá ser retomado o julgamento.

MS 47.932/05

Leia a íntegra do pedido

xxx, brasileira, solteira, professora universitária de Direito, advogada regularmente matriculada na Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil sob número xxx, aqui representada por si e pelos patronos que ora subscrevem, EDUARDO MAHON, matriculado sob OAB/MT 6363, FÁBIO GASPARELO registrado sob OAB/MT 9800, ULISSES RABANEDA inscrito com OAB/MT 8948 e FRANCISCO ANIS FAIAD, titular da OAB/MT 3520, recebendo intimações de estilo no endereço profissional xxx, xxx, xxx, Cuiabá-MT, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência impetrar:

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR

Em face aos Exmos. Srs. Promotores de Justiça DOMINGOS SÁVIO BARROS ARRUDA e ANA LUÍZA ÀVILA PETERLINE DE SOUZA, titulares da 14ª e 21ª Promotorias de Justiça oficiantes junto ao Juizado Especial Ambiental, ante à omissão em finalizar o inquérito civil público, configurando-se excesso de prazo, ilegalmente constrangedor, além de conduzirem diretamente investigação criminal.

A Impetrante é advogada militante nos foros de Mato Grosso, pós-graduada e especialista em Direito Ambiental, professora universitária e teve seu nome achincalhado na mídia regional frente a uma denúncia liminarmente rejeitada pelo MM. Juiz de Direito titular da Vara Especializada em Meio Ambiente.


Malgrado ter havido imoderados excessos pelo órgão acusador, soube a Impetrante ter havido quebra de sigilo bancário, fiscal e de dados telefônicos, em procedimento preparatório cível, por meio de requerimento ministerial referente ao Inquérito Civil Público 000897-02/2005, ora hostilizado, tudo conforme Certidão do Cartório Distribuidor.

Solicitadas informações pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Mato Grosso, acerca dos cadernos investigativos em trâmite no Ministério Público Estadual, o gabinete do Procurador Geral de Justiça informa a ocorrência de vários procedimentos, “todos localizados no sistema GEAP, são de responsabilidade da 21ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital e dizem respeito à atuação das referidas cidadãs, enquanto servidoras da extinta FEMA”.

Preambularmente, há que se apontar a dependência do presente mandamus àquele outro MS 47932, de relatoria de Vossa Excelência. E, via de conseqüência, insta discernir o objeto daquela ordem de antanho e desta atual impetração: no pretérito, pretendia-se o acesso para cópias de autos de inquérito civil público, a partir da intimação para comparecer à sede do Parquet. Por esta oportunidade, persegue-se a suspensão liminar do caderno investigativo e, no mérito, o trancamento por excesso de prazo e ilegitimidade investigativa.

Impende destacar, nessa quadra, que o objeto da medida liminar anteriormente deferida foi cumprida no sentido de franquear à Impetrante apenas vista dos autos, obstando os Impetrados até a presente data o acesso para cópias aos advogados e à própria investigada. Assim, até o presente momento, após sucessivas petições, resistem os Promotores de Justiça a permitir a reprografia integral dos autos, agudizada a situação em razão do mandado de segurança anteriormente formalizado.

Pitorescos são tantos e tamanhos obstáculos, já que o acesso ao próprio investigado está inscrito na própria Resolução 001/2001 que regula o procedimento do órgão de persecução nas investigações de natureza civil, ipsis literis:

Art. 28 – Aplica-se ao inquérito civil e ao procedimento originado das peças de informação o princípio da publicidade, com exceção dos casos em que recaia sigilo legal ou que a publicidade possa acarretar prejuízo às investigações.

Parágrafo Único – Não ocorrendo as exceções referidas no “caput” deste artigo, é facultado a qualquer interessado obter certidão do inquérito civil ou do procedimento originado das peças de informação, bem como extrair cópias dos documentos constantes dos respectivos autos.

Pergunta-se o porquê da perseverante negativa no fornecimento de cópias. Responda-se: talvez para não delimitar a Impetrante os termos inicial e final da investigação que pende contra si a expor ilegalidade.

Todavia, em que pese a resistência despropositada dos Impetrados em permitir cópias em processos que não podem ser sigilosos ao próprio investigado, outra é a ilegalidade hostilizada por esta ação mandamental constitucional. É que a Portaria 34/2005 data de 05 de agosto de 2005, e objetivava a investigação cível e criminal de atos de improbidade. Pelos documentos colacionados nos presente autos, vê-se claramente o marco inicial apontado pela Impetrante.

Antes de prosseguirmos, imprescindível verificar como começa o texto da mencionada Portaria 034/2005: “O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, através dos Promotores de Justiça abaixo assinados, com atribuições perante a 21ª e 14ª Promotoria Cível de Defesa do Meio Ambiente, com fulcro no art. 127 e 129, III da Constituição Federal, arts. 25, 26 e 27 da Lei 8625/93, art. 8º, parágrafo 1º da Lei 7347/85 E COM FUNDAMENTO NA RESOLUÇÃO 01/2001/CSMP, visando apurar irregularidades administrativas e ambientais cometidas por xxx, no exercício do cargo de chefe de gabinete e assessora jurídica da extinta FEMA, atual SEMA, entre os anos de 2003 e 2005, RESOLVEM instaurar o presente INQUÉRITO CIVIL com o objetivo de colher informações, depoimentos, certidões, perícias e outras diligências que se fizerem necessárias para a elucidação dos fatos e posterior propositura das ações civis e penais cabíveis. (…) Considerando que a prática desta conduta configura, em tese, o ato de improbidade administrativa previsto no art. 9º, inciso VIII da Lei 8429/92 e o crime previsto no art. 321 e 355 do Código Penal, além dos crimes contra a Administração Ambiental, previstos no art. 66 da Lei 9605/98 (…)”

O que se verifica?

i) Os Impetrados têm pleno conhecimento dos termos da Resolução 001/2001/CSMP, à qual devem obediência;

ii) O inquérito civil está sendo usado, também, para apurar diretamente pelo Ministério Público delitos de ordem ambiental.

De outro giro, ao estudarmos a inteligência do próprio Ministério Público Estadual que, internamente, disciplinou o andamento e o deslinde dos inquéritos civis, emergirá a ilegalidade com superficial análise.


Vejamos a dicção da RESOLUÇÃO 001/2001, expedida pelo CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO:

RESOLUÇÃO Nº 01/2001 – CSMP Dispõe sobre a atuação dos Órgãos de Execução do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, nos inquéritos civis e demais procedimentos administrativos correlatos.

O CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, no uso das atribuições que lhes são conferidas pelo artigo 9º, § 3º, da Lei no. 7.347/85

RESOLVE:

(…)

Seção III

Do Prazo de Conclusão

Art. 9º – O inquérito civil deverá ser concluído no prazo de 90 (noventa) dias, prorrogável, quando necessário, por até 30 (trinta) dias, cabendo ao Órgão de Execução motivar a prorrogação nos próprios autos.

Art. 10 – O procedimento instaurado em virtude das peças de informação mencionadas no art. 8º, deverá estar concluído no prazo de 60 (sessenta) dias.

Parágrafo único – Ao final do prazo, o Órgão de Execução proporá a ação cabível, convertê-lo-á em inquérito civil ou promoverá o seu arquivamento.

De forma que o próprio Conselho Ministerial, prezando a celeridade e garantindo o prazo razoável no que tangencia ao direito do cidadão de não ser investigado indefinidamente, determinou aos promotores de justiça que lhe são subordinados a acuidade na observância de tal prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogáveis por peremptórios 30 (trinta) dias, quando autorizado o investigador de forma expressa, fundamentando-se convincentemente a prorrogação como medida excepcional.

Tal não se deu no caso sob exame. Na cronologia apresentada, temos a instauração inquestionavelmente comprovada por meio da já citada Portaria 034/2005 em 05 de Agosto de 2005, que dista da atual impetração por tempo superior ao do determinado pelo Conselho Superior do Ministério Público. Por amor à precisão, temos exatos 171 dias, contados do início das investigações, ressalte-se, sem a prorrogação de 30 dias, medida de exceção, prevista no art. 9º da Resolução 001/2001/CSMP. Ou seja, desconsiderada a prorrogação que não há, o prazo excedeu-se em quase o dobro do determinado pelo Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso.

Excelência, casos há em que o Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso resiste em conceder a tutela de urgência vindicada, em razão ou da carência comprobatória das peças que instruem as exordiais ou diante das questões de fundo que podem se confundir com a medida de urgência. Não é o caso. Justifica-se a seguir:

a) primeiro, que a tutela mandamental de urgência estampada apenas em sede liminar e sumaríssima está a buscar apenas a suspensão (e não o trancamento) do inquérito civil público instaurado e excessivamente prolongado no tempo – frente a dois fundamentos concisos – a.1) o próprio decurso do prazo balizado pelo Conselho Superior do Ministério Público; a.2) a ilegitimidade ministerial para condução direta de investigações criminais;

b) segundo, que não se discute questão de fato e nem de direito, gravitando as alegações da Impetrante tão-somente em torno da objetivamente delineada Resolução 001/2001 do Conselho Superior do Ministério Público, à qual deveria ser observada na diretiva temporal;

c) terceiro, que os documentos que demonstram o excesso de prazo são unicamente os que delimitam a instauração do caderno investigativo e a própria oitiva da Impetrante, sem encerramento do procedimento persecutório até o presente momento – é inconteste o fato do excesso de prazo.

Portanto, deixamos a questão da legitimidade ministerial para a condução inquisitiva penal para a cognição de mérito da presente ação mandamental.

Todavia, já adiantando a discussão meritória do atual mandamus, é possível prospectar do próprio Colendo Tribunal de Justiça de Mato Grosso – TJMT – a forte corrente jurisprudencial que ampara a pretensão da Impetrante. Quanto às invectivas acusatórias já na fase investigativa, temos conosco a inteligência da unanimidade do TJMT, no aresto que resultou da ADIN 102, sob a Relatoria da respeitada Desembargadora SHELMA LOMBARDI DE KATO:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – ASSOCIAÇÃO MATO-GROSSENSE DE DELEGADOS DE POLÍCIA – RESOLUÇÃO DO ÓRGÃO DE CÚPULA MINISTERIAL DO ESTADO DE MATO GROSSO INSTITUINDO O “GRUPO DE ATUAÇÃO ESPECIALIZADO NO COMBATE AO CRIME ORGANIZADO: GAECO” – ATRIBUIÇÕES CONFERIDAS PELA CARTA POLÍTICA ESTADUAL, NA ESFERA DA CRFB, AOS DELEGADOS DE POLÍCIA INVASIVAMENTE COMETIDAS PELA RESOLUÇÃO A PROMOTORES DE JUSTIÇA – OBJETIVO NOBILITANTE COM RESULTADOS POSITIVOS – INCONSTITUCIONALIDADE, CONTUDO, MANIFESTA DA RESOLUÇÃO Nº 09/99 DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA – AÇÃO PROCEDENTE. À luz do que dispõe a Carta Política do Estado de Mato Grosso, apurar infrações penais e sua autoria, empreender diligências de investigação, através de inquéritos, é atribuição policial. Ao MP cabe o controle externo da atividade policial, podendo requisitar à autoridade policial a competente instauração de inquérito, a ser presidido por Delegado de Polícia, podendo acompanhá-lo e produzir provas, jamais substituí-lo.”


Portanto, o antigo Pleno do TJMT já pacificou a matéria em sua hermenêutica, conforme se vê no julgado do controle abstrato de constitucionalidade que se junta ao final. Ressalte-se que a polêmica sobre a possibilidade ou não da investigação penal ministerial foi sepultada por todos os 20 Desembargadores presentes àquela histórica sessão.

No entender do Prof. Dr. GERALDO PRADO em sua festejada obra ‘Sistema Acusatório’, Ed. Lúmen Juris, “os parâmetros de legalidade na investigação criminal são sempre bem definidos e em praticamente todos os ordenamentos jurídicos que seguem a linha do brasileiro há uma instituição, a rigor o Ministério Público, encarregada de fiscalizar os atos de investigação. Em vista dessa opção legislativa, o Ministério Público não pode investigar diretamente, prescindindo da polícia sem atentar contra o princípio republicano do controle”. (págs. 153/154).

Pontue-se, por fim, que nem ao GAECO/MT – Grupo de Atuação e Combate ao Crime Organizado – aquela investigação foi deslocada, permanecendo na 14ª e 21ª Promotorias de Justiça, conforme certidão passada pela Procuradoria Geral de Justiça, o que não só configura a inconstitucionalidade da persecução, como a própria ilegalidade na condição de investigação direta criminal.

Como se posiciona o TJMT? O TJMT já analisou o mesmo tema num pretérito recente, com contornos idênticos ao caso ora versado. Quanto à questão do prazo para o encerramento do inquérito civil público de 90 dias, prorrogáveis por mais 30 dias, mediante expressa autorização, posicionou-se este respeitado Sodalício Estadual em duas oportunidades, só no segundo semestre de 2005.

Excelência, pinçamos dos arestos do TJMT casos que guardam nítida identidade com a causa em tela. Portanto, à unanimidade do Colegiado, já restaram pacificas as balizas temporais para o encerramento do inquérito civil, donde se dará o arquivamento, ultrapassada a diretiva da Resolução 001/2001/CSMP. Outra não pode ser a conclusão, ao estudar os arestos adiante transcritos.

A primeira citação digna de nota, amolda-se com perfeição ao caso ora exposto. O Exmo. Sr. Desembargador ANTÔNIO BITAR FILHO relatou o MS 9557/2005, em 11 de agosto de 2005, onde concedia a ordem de segurança nesses termos:

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA – AUTORIDADE PÚBLICA CONVOCADA PARA DEPOR PERANTE PROMOTORIA DE JUSTIÇA – PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO INSTAURADO EM 2000 – INVESTIGAÇÕES DESENVOLVIDAS – PERÍCIA REALIZADA – EXTRAPOLAÇÃO DE PRAZO – DENÚCIA ANÔNIMA – CONSTRANGIMENTO CARACTERIZADO – ORDEM CONCEDIDA. Se o procedimento administrativo foi instaurado pelo Ministério Público no ano de 200 e não concluído no prazo fixado pela Resolução 01/2001, do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, afigura-se ilegal a convocação do impetrante para depor, especialmente por não ter sido o referido prazo prorrogado de acordo com a lei, tampouco surgido fato novo que justifique a dita convocação.

(…)

Ainda que contasse do mandamus parecer ministerial pela denegação, o ilustre Relator Des. BITAR FILHO afastou-se do combate do Ministério Público que alegava questões outras (economicidade, falta de pessoal, razoabilidade etc), e enfrentou a matéria de frente em seu paradigmático voto:

(…)

Não se pode perder de vista, também, que o procedimento administrativo foi instaurado em agosto de 2000 e deveria ter sido concluído em 90 dias, nos exatos termos do que dispõe o art. 9º da Resolução 01/2001, do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, o qual fixa esse tempo para o encerramento das investigações. É verdade que esse prazo poderá ser prorrogado, se devidamente justificado, e isso não ocorreu no caso dos autos.

Assim, fato inegável é que as investigações estão com prazo expirado desde o dia 05 de novembro de 2000 e ainda assim o procedimento se arrasta e o titular da Promotoria por onde ele tramita prativa ato ilegal ao convocar o impetrante para depor.

Mesmo o sempre judicioso Desembargador Dr. PAULO DA CUNHA, em seu voto, divergindo do fundamento de apoio da ordem que girava em torno da denúncia anônima, concedeu a ordem, apontando sobretudo a Resolução 001/2001/CSMP:

Não endosso o voto do Desembargador Relator, porque as ouvidorias podem colher denúncias e proceder a investigação. A meu sentir, o fato de ser denúncia anônima não tem relevância alguma. Todavia, como disse o Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, sim, mas pelo prazo e o prazo já excedeu em muito.

Por que sustenta dessa forma o TJMT?

Porque, antes de tudo, está a incolumidade do cidadão. Mais recentemente, o MS 41217/2005, formalizado em 10/10/2005, sob a Relatoria do aguerrido Des. MANOEL ORNELLAS DE ALMEIDA, logrou êxito liminar ao mandar trancar dezenas de inquéritos instaurados em desfavor do Impetrante. Vejamos a inteligência do eminente pretor maiorino:


O objetivo da impetração é obter ordem para evitar a prática de qualquer ato constritivo a direito individual por força dos procedimentos administrativos (tais e tais), instaurados a pedido do primeiro impetrado.

(…)

É evidente que ninguém poderá ficar submetido, ad eternum às investigações de qualquer órgão no sistema jurídico pátrio. O próprio inquérito policial previsto no Código de Processo Penal estipula prazos para a conclusão de investigação criminal em caso de réu preso e mesmo de réu solto. O direito de viver sem admoestações é tão sagrado que o próprio órgão, ao qual pertencem as autoridades coatoras, baixou uma Resolução fixando tempo de duração dos processos, só falta cumpri-la.

(…)

Nessa esteira de raciocínio essa Corte concedeu ordem no MS 9557/2005 do qual foi relator o eminente Des. Antônio Bitar Filho. No mesmo diapasão ele, liminarmente, outorgou a medida para evitar procedimento infindável de processo da mesma natureza, produzindo atos coercitivos contra o paciente. Diante do exposto, CONCEDO LIMINARMENTE A ORDEM PLEITEADA PARA DETERMINAR QUE OS RESPECTIVOS PROCESSOS, OBJETO DA IMPETRAÇÃO, SEJAM IMEDIATAMENTE TRANCADOS, em relação ao impetrante.

(…)

Estamos com o entendimento do TJMT – não pode prolongar-se no tempo sofrimento que abala a moral da Impetrante, em descompasso com os próprios prazos fixados pelo MPE. E o amparo inabalável que este mesmo Egrégio Pretório tem se arrimado a conceder unanimemente tais ordens inspira-se todos em pilar constitucional fundamental, estampado no art. 5º, LXXVIII da Carta de 1988:

Art 5º (…), CF:

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Desde a edição da Carta Cidadã, a doutrina consagrou estudo ao “direito do acusado ao término das investigações em prazo razoável”, como uma das inalienáveis garantias do cidadão brasileiro. Leciona, nessa esteira, o jurisconsulto Prof. Dr. ANTÔNIO SCARANCE FERNANDES, em sua brilhante obra ‘Processo Penal Constitucional’, Ed. RT, ao indicar no Cap. 09: “estritamente ligada à garantia ao procedimento adequado, está a garantia do prazo às partes. (…) fala-se, finalmente, em garantia do término da persecução penal em prazo razoável, como garantia implícita da Constituição Federal, e, ainda, como garantia de direito com status constitucional porque inserida na Convenção Americana sobre Direitos Humanos de San José de Costa Rica (art. 8º, I)”.

Outro ilustrado jurista que hodiernamente se bate pelo direito ao prazo razoável para a conclusão de qualquer tipo de persecução é o notável Prof. Dr. ROGÉRIO LAURIA TUCCI que em seu livro ‘Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro’, Ed. RT, leciona com propriedade: “afigura-se, com efeito, de todo inaceitável a delonga na finalização do processo de conhecimento, com a ultrapassagem do tempo necessário à consecução de sua finalidade, qual seja a de definição da relação jurídica estabelecida entre o ser humano, membro da comunidade, enredado na persecutio criminis, e o Estado: o imputado tem, realmente, direito ao pronto solucionamento do conflito de interesses de alta relevância social que os respectivos autos retratam, pelo órgão jurisdicional competente (…). Realmente, tendo-se na devida conta as graves conseqüências psicológicas (no plano subjetivo), sociais (no objetivo), processuais e até mesmo pecuniárias, resultantes da persecução penal para o indivíduo nela envolvido, imperiosa torna-se a agilização do respectivo procedimento, a fim de que elas, tanto quanto possível, se minimizem, pela sua conclusão num prazo razoável”.

Se assim é, pensamos nós que, com mais razão, assiste ao cidadão insurgir-se contra a prorrogação indefinida de investigações secretas contra si! O Prof. Dr. FAUZI HASSAN CHOUKR, um dos maiores especialistas no Direito Processual Penal e direito comparado, mormente quando de trate de investigações preliminares, em sua obra definitiva ‘Garantias Constitucionais da Investigação Criminal’, Ed. Lúmen Júris, afirma com todas as letras: “do ponto de vista técnico, a constitucionalização dos limites cronológicos para o fim do procedimento investigativo, também é amplamente justificável a existência de uma baliza temporal, na medida em que os elementos de informação, sobretudo os testemunhais pessoais ou subjetivos, ou seja, aqueles cujo tempo de vida útil é por demais curto, podem ser empregados com toda a eficácia na hipótese de ajuizamento da ação penal”. E encerra o Capítulo VI de seu livro da seguinte forma: “posta a baliza temporal, o titular da ação penal deve ser instado a manifestar-se, para propor a ação ou arquivar o feito. Caso não esteja apto nem para uma coisa, nem para outra, a inoperância deve ser sancionada com a impossibilidade de utilização daquele acervo informativo (como no modelo italiano e, por vias tortas, no nosso também)”.

O constrangimento ilegal por que passa a Impetrante é periculum in mora suficiente a ser apreciado em sede sumaríssima para a análise da medida liminar perseguida. Uma vez denunciada pelo Ministério Público Estadual, tendo sido rejeitada a exordial acusatória, mas com o nome pessoal e profissional achincalhado na mídia matogrossense, e agora indefinidamente investigada por um procedimento escondido, secreto, oculto e sem prazo para findar-se, é mais que fundamentada a urgência do pleito.

De outro lado, a incidência da própria Resolução 001/2001/CSMP regularmente publicada à qual deveriam subordinar-se os Impetrados, somando-se à fotocópia do termo inicial de instauração do inquérito civil público por meio da Portaria 034/2005, constituem pletora probante a espelhar o fumus boni juris, requisito necessário a lograr a concessão da ordem.

Observem-se os documentos juntados- a) Portaria 034/2005; b) Notificações e Intimações; c) Certidões Diversas; d) Decisões do TJMT em casos idênticos. Em nosso sentir, cristalinamente está configurada a pretensão investigativa criminal do Ministério Público, por meio dos Promotores Impetrados. De outra sorte, os prazos estão solidamente configurados e os inquéritos e outros procedimentos pormenorizadamente listados.

Assim sendo, Excelência, diante da própria regulamentação ministerial superior olvidada noutros procedimentos preparatórios e mais particularmente nesse caso, requer-se:

a) A concessão da medida liminar para suspender o curso das investigações criminais no seio do procedimento preparatório civil conduzido pelos Impetrados, abstendo-se de qualquer medida constritiva em desfavor da Impetrante como notificações, intimações, inquirições ou outra providência administrativa;

b) A concessão da ordem no mérito para trancar o procedimento preparatório com base no excesso de prazo, em descumprimento do art. 9º Resolução 001/2001/CSMP;

c) A concessão da ordem no mérito para trancar o procedimento preparatório com base na ilegalidade e inconstitucionalidade da condução de investigações criminais diretamente pelo Ministério Público.

Termos em que Pede e Espera Deferimento.

Cuiabá, 23 de janeiro de 2006.

EDUARDO MAHON

OAB/MT 6363

FÁBIO GASPARELO

OAB/MT 9800

ULISSES RABANEDA

OAB/MT 8948

FRANCISCO ANIS FAIAD

OAB/MT 3520

FABRINA ELY GOUVEA

OAB/MT 6638

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