Atraso no pagamento

Faculdade não pode cancelar matrícula por atraso no pagamento

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18 de janeiro de 2006, 10h39

Universidade não pode cancelar matrícula de aluno, durante o período letivo, por falta de pagamento da mensalidade. O entendimento é do ministro Edson Vidigal, presidente do Superior Tribunal de Justiça. Vidigal concedeu liminar à estudante Pauline Veronez, da Universidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

A formatura da estudante está marcada para 4 de fevereiro deste ano. O ministro aplicou ao caso o artigo 6º da Lei 9.870/99. Segundo o texto, “são proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os artigos 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias”.

Este entendimento é pacífico no STJ. No julgamento mais recente, a ministra Eliana Calmon, da 2ª Turma, considerou que a instituição de ensino não pode aplicar sanções administrativas ou pedagógicas, como impedir o estudante de assistir as aulas, entregar trabalhos escolares e fazer as provas. A universidade pode deixar de renovar a matrícula se o atraso no pagamento for superior a 90 dias, mas nunca impedir o aluno de continuar a cursar a escola no meio do ano letivo.

Matriculada no penúltimo semestre do curso de Administração, a estudante atrasou o pagamento de duas mensalidades referentes ao mês de janeiro e fevereiro de 2005, devido a problemas financeiros. Por causa disso, a universidade cancelou a matrícula da aluna.

Mesmo assim, a estudante cursou o semestre. Depois, entrou com pedido de Mandado de Segurança, negado pela primeira instância e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Inconformada, a aluna recorreu ao STJ com pedido de Medida Cautelar.

Alegou que a demora na concessão da liminar poderia trazer danos de difícil reparação, já que está com a data da formatura marcada. Também afirmou que o fato de a estudante concluir o curso juntamente com a turma com a qual ingressou na universidade não causaria prejuízo à instituição de ensino.

A estudante também sustentou que em nenhum momento deixou de pagar as mensalidades, mas apenas atrasou o pagamento. Por isso, não poderia ser impedida de concluir o curso. O ministro Edson Vidigal concedeu a liminar. “Parecem-me relevantes e adequados os fundamentos norteadores da fumaça do bom direito e do perigo da demora demonstrados na inicial e na documentação juntada aos autos”, considerou.

Leia a íntegra da decisão

MEDIDA CAUTELAR Nº 11.052 – SC (2006/0006803-9)

REQUERENTE: PAULINE VERONEZ

ADVOGADO: FELIPE LISBOA CAPELLA E OUTRO

REQUERIDO: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

DECISÃO

Vistos, etc.

Medida Cautelar apresentada por Pauline Veronez, buscando atribuir efeito suspensivo a Recurso Especial, ainda sujeito a Juízo de admissibilidade na origem.

Matriculada no penúltimo semestre do curso de Administração, deixou de adimplir, devido a problemas financeiros, decorrentes do desemprego de seus pais, as mensalidades vencidas em 31/01/2005 e 28/02/2005. A Universidade do Vale do Itajaí (SC), então, cancelou a matrícula da aluna que, mesmo assim, cursou o referido semestre, fazendo as provas e trabalhos referentes ao período letivo.

Com vistas à revisão de ato de cancelamento da matrícula, por inadimplência, impetrou o Mandado de Segurança nº 2005.72.08.002017-7/SC, tendo sido denegada a segurança pelo Juízo de 1º Grau.

Contra esta decisão, interpôs Apelação, com provimento negado por Acórdão do TRF/4ª Região (fls. 116-118). Daí providenciou Recurso Especial, ao qual pretende conferir efeito suspensivo mediante esta Cautelar.

Registra que o STJ já pacificou orientação acerca da impossibilidade de cancelamento de matrícula, durante o período letivo, por falta de pagamento de mensalidade, nos termos da Lei nº 9.870/99, art. 6º, evidenciando a fumaça do bom direito.

Defende o periculum in mora com o argumento de que a demora na concessão da liminar poderá lhe trazer danos de difícil reparação, informando que a formatura de sua turma se realizará no dia 04/02/2006, conforme consta no convite de formatura, juntado à fl. 15.

Por outro lado, assevera que não haverá qualquer prejuízo à Instituição de ensino, permitindo que a aluna conclua o curso juntamente com a turma com a qual ingressou na Universidade, tendo em vista que assistiu às aulas e possui carga horária necessária para a conclusão do semestre, na forma que a Instituição exige. Em momento algum, garante, negou-se a pagar mensalidade, tendo apenas atrasado as duas primeiras mensalidades do semestre letivo, não podendo, por isso, ser impedida de concluir o curso, prejuízo este de difícil reparação.

Decido.

Tenho defendido que, já interposto o Recurso Especial, mesmo que ainda não admitido, é possível o deferimento de Medida Cautelar, ainda que liminarmente, para conferir-lhe efeito suspensivo, como forma de valorizar a efetividade da função jurisdicional.

Isto porque, tendo aquela natureza constitucional, somente será garantida em sua inteireza quando estiver também assegurada a utilidade da decisão que vier a ser proferida. Além disso, não se pode deixar de observar o mandamento constitucional de que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário qualquer ameaça de lesão a um direito” (CF, art. 5º, XXXV).

É essencial, entretanto, que se apresente com excepcional nitidez a plausibilidade do direito invocado, bem como a prova de que a demora na sua apreciação torne inócua a pretensão.

Em um primeiro exame em sede de cognição sumária, próprio dessa fase procedimental, e voltado para o poder geral de cautela que me é conferido, parecem-me relevantes e adequados os fundamentos norteadores da fumaça do bom direito e do perigo da demora demonstrados na inicial e na documentação juntada aos autos.

Observa-se que as razões do Recurso Especial parecem ter provável êxito, seja por inexistirem dúvidas quanto à juridicidade da pretensão referente à impossibilidade de cancelamento de matrícula por inadimplência, no decurso do período letivo, nos termos da Lei nº 9.870/99, art. 6º, seja porque a tese defendida pela requerente harmoniza-se com o entendimento pacífico deste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o inadimplemento do pagamento das prestações escolares pelos alunos não pode gerar a aplicação de penalidades pedagógicas, assim como a suspensão de provas ou retenção de documentos escolares (MC 9.147, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 09/11/04; Resp 640.666, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 18/10/04; e Resp 311.405, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 27/04/04, dentre inúmeros outros).

Acrescente-se, ainda, que o perigo da demora da tutela jurisdicional se apresenta inconteste, diante da urgente necessidade de medida acautelatória para se evitar o perecimento do direito, tendo em vista que a realização da formatura da turma a que pertence a requerente está marcada para se realizar no dia 04/02/2006. Neste caso, como a requerente está terminando o curso superior de Administração, poder-se-ia concluir pela incidência da denominada Teoria do Fato Consumado.

Assim, presentes e bem demonstrados os pressupostos necessários ao que se requer, concedo a liminar para conferir efeito suspensivo ao Recurso Especial, referente ao Mandado de Segurança nº 2005.72.08.002017-7/SC, nos termos do pedido, “ad referendum” posterior do Relator a quem couber o julgamento da presente medida cautelar, até ulterior pronunciamento deste Superior Tribunal.

Cite-se a requerida para, querendo, apresentar contestação, no prazo legal.

Oficie-se, dando ciência do inteiro teor desta decisão, ao Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e ao Juízo da 2ª Vara Federal de Itajaí (SC).

Ao término desse período, sejam os autos remetidos ao Ministro Relator.

Publique-se.

Brasília (DF), 16 de janeiro de 2006.

MINISTRO EDSON VIDIGAL

Presidente

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