RDD ao PCC

Ministério Público pede regime diferenciado para o PCC

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17 de janeiro de 2006, 19h18

O Ministério Público de São Paulo apresentou ao Juiz de Execuções Criminais da Capital pedido de inclusão em regime disciplinar diferenciado do preso Júlio César Guedes de Moraes, o Julinho Carambola, um suposto líder da facção criminosa PCC — Primeiro Comando da Capital.

A medida faz parte de uma ação do Ministério Público para levar ao Regime Disciplinar Diferenciado os líderes do PCC acusados de promover ataques contra policiais em todo o estado de São Paulo. “As lideranças do PCC cresceram, se alastraram, e o MP vê nesse regime uma forma eficaz de controlar os ataques”, disse à revista Consultor Jurídico o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Pinho.

Julinho Carambola cumpre pena na Penitenciária de Presidente Bernardes. Segundo o MP, na mesma penitenciária cumprem pena outros cinco presos que também fariam parte do comando do PCC. O grupo seria o mentor e o principal objetivo da tentativa de resgate de presos da Penitenciária de Presidente Bernardes ocorrida no dia 9 de janeiro.

“A apuração dos fatos permite concluir que o arquitetado plano tinha por objetivo resgatar, dentre outro, o preso acima mencionado, que faz parte da influente e poderosa facção criminosa conhecida por Primeiro Comando da Capital – P.C.C., não sendo esta a primeira manobra neste sentido.”, diz o MP, no pedido levado ao Juiz das Execuções Criminais que teve acesso a interceptações telefônicas feitas pela polícia paulista.

Ao fundamentar o pedido de regime diferenciado para os líderes criminosos, o MP cita também a atuação do PCC no interior das prisões: “Como é sabido, o poder da referida organização criminosa é de tal vulto que os demais sentenciados, na sua maioria sem qualquer ligação com grandes grupos criminosos, são coagidos a tomar parte ou ajudar os líderes de facções sob pena de ter decretado a morte, caso neguem colaboração ou delatem os planos de fuga e seus perpetradores.”

Leia a íntegra do requerimento

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Vara das Execuções Criminais da Capital.

Os Promotores de Justiça infra-assinados, no uso de suas atribuições legais, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, requerer, nos termos do artigo 52, parágrafo 1o. da Lei no. 7.210/84, alterada pela Lei no. 10.792/03, a inclusão do sentenciado JULIO CÉSAR GUEDES DE MORAES, vulgo “JULINHO CARAMBOLA”, RG. 26.070.970-0, matrícula no. 085.066-0, em regime disciplinar diferenciado, no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, pelos motivos que seguem:

O reeducando encontra-se cumprindo pena privativa de liberdade na Penitenciária de Presidente Bernardes, nesta região do Estado, juntamente com os reeducandos Marco Willians Herbas Camacho, José Carlos Rabelo (Pateta) ; David Stocker Ulhoa Maluf (Magaiver) e Roberto Soriano (Betinho Tiriça) .

No dia 9 de janeiro p.p,, precisamente na madrugada, por volta das 04h00, houve uma ousada tentativa de resgate dos sentenciados mencionados.

Segundo a anexa cópia do relatório circunstanciado, cujo original será juntado posteriormente, do Diretor da Penitenciária de Presidente Bernardes, por volta das 04:00 horas, um veículo identificado como sendo da marca Chevrolet, modelo Meriva, passando pela rodovia vicinal de acesso ao Distrito de Nova Pátria e à referida unidade prisional, começou a disparar rajadas de metralhadora contra a muralha lateral esquerda do centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes (localizada ao lado da penitenciária), visando concretizar possível resgate de presos.

Agindo de acordo com as orientações recebidas para atuar no cargo, visando evitar a iminente fuga, o Agente de Escolta e Vigilância Penitenciária, escalado na Torre I da Penitenciária de Pres. Bernardes, acionou a sirene de alarme, momento em que os sentenciados, habitantes do Terceiro raio habitacional, como que já preparados para o incidente começaram a jogar algumas roupas para fora das celas, através das janelas, com o possível objetivo de desviar a atenção do que realmente ocorria no lado externo.

Ato contínuo, as torres de vigilância foram reforçadas com vários Agentes de Escolta e Vigilância e a Polícia Militar acionada, sendo que de imediato desencadeou-se uma operação de perseguição aos criminosos, por meio da força policial, que culminou com a apreensão de seis envolvidos, vários veículos (ao todo seis), dentre eles aqueles que atacaram a muralha, bem como farto armamento pesado, a saber: vários rifles, dois mísseis com suas respectivas bases de lançamento, metralhadoras, uma pistola, vários rádios usados para “copiar” a freqüência de comunicação da polícia e mais de 350 cartuchos de munição.

A apuração dos fatos permite concluir que o arquitetado plano tinha por objetivo resgatar, dentre outro, o preso acima mencionado, que faz parte da influente e poderosa facção criminosa conhecida por , Primeiro Comando da Capital – P.C.C., não sendo esta a primeira manobra neste sentido.


Prova disso é que, conforme constatado pela direção da referida unidade prisional, a cela onde o mesmo se encontrava, já estava com suas grades serradas de modo a facilitar o acesso dos fugitivos aos veículos empregados na tentativa de fuga.

A ação, arquitetada pelo crime organizado, contou com a ajuda externa de quase uma dúzia de integrantes da facção e agregados, bem como com um sistema de comunicação paralelo, mantido através de duas dezenas de aparelhos celulares que foram posteriormente apreendidos no interior da aludida unidade prisional.

Frise-se, outrossim, que tais fatos foram objeto de interceptações telefônicas, concretizadas com base em permissão judicial pelo DEIC da capital, através do qual apurou-se assim o efetivo envolvimento dos requeridos nos delitos, conforme relatório em anexo, destacando, do bem elaborado documento policial, os seguintes aspectos:

“… Esta Unidade, em 2000, foi incumbida de investigar a facção criminosa PCC…

… Diversas investidas desta Unidade, representadas por persecuções encerradas nos inquéritos policiais apontaram todos os líderes da organização Marcos Willians Herbas Camacho, Júlio César Guedes de Moraes, David Stockler Ulhoa Maluf…

… a arrecadação e contabilização de valores do tráfico de entorpecentes e contribuições de familiares de presos, a fim de adquirir armas, explosivos e munições de altíssimo potencial ofensivo, bem como automóveis e comunicadores que seriam disponibilizados em invasões de presídios, para possibilitar a fuga dos sentenciados ali encarcerados…

… arrecadação ilícita mensal de aproximados R$ 700.000,00…

… Concluímos, com base nos dados obtidos junto a estas interceptações, que as tentativas de ataques feitas nas penitenciárias de Santo André, Mauá e Assis, foram custeadas pela arrecadação do PCC, atualmente administrada por “JOTA” e outros, vide apreensão de explosivos caseiros, com as mesmas características dos constritos em Presidente Bernardes…

… As investidas da organização não se limitaram as práticas criminosas acima delineadas. Recentemente, verificamos que “JOTA”, “SEU JÔ” e “PEDRÃO” planejaram e obtiveram recursos para um trabalho que, posteriormente, soubemos tratar-se da invasão do presídio de Presidente Bernardes. Esta tentativa desencadeada no último final de semana, foi insistentemente noticiada pela imprensa (fls. 49/135)…

… Na tarde de sábado, no dia 07 de janeiro último, fomos surpreendidos por interlocuções de “JOTA”, afirmando que o automóvel apreendido em Santa Cruz do Rio Pardo (fls. 136/142), e o seu condutor e acompanhante estavam presos naquele Município porque a polícia havia encontrado armas ocultadas no automóvel. O JOTA acrescentou, em Presidente Prudente, que retornaria para Mauá, pois o condutor da GM/Montana poderia tê-lo denunciado e, portanto, estava exposto a uma virtual ação policial. Destarte, tratou, de voltar para Mauá em companhia de outras pessoas ainda não identificadas, já que 05 (cinco) outros criminosos foram encarregados de substituí-los para a uma missão na região de Presidente Prudente (fls. 65, 66, 67 e 68).

… Recuperamos o áudio anteriormente gravado e constatamos que o mesmo “JOTA” dias antes havia deslocado-se para Prudente com um caminhão, ocasião em que foi retido e liberado em Posto Policial na região de Ourinhos/SP (fls. 63 e 64). Outras conversas sobre o assunto, bem como sobre a concentração de integrantes do PCC na região de Presidente Prudente e a conseqüente apreensão de armas mencionadas (fls. 136/142), fizeram concluir que os indigitados planejavam executar um ataque à Penitenciária de Presidente Bernardes, onde achava-se abrigado o líder do PCC: Marco William Herbas Camacho (Marcola) e demais integrantes da organização…

… Imediatamente, naquele mesmo sábado, comunicamos a polícia local sobre a presença de membros da facção na Cidade de Presidente Prudente e imediações, com armas e munições, preparando-se para um aprovável ação violenta, tendente a libertar o líder “Marcola” e outros. Acrescentamos que havia uma probabilidade muito grande que o evento fosse desencadeado na Segunda Feira subseqüente, pois desta forma, os familiares dos detentos não seriam expostos a sacrifício;…

… De fato, na madrugada de Segunda Feira, diversas pessoas desconhecidas, fortemente armadas, investiram contra a muralha do Complexo Penitenciário de Bernardes, efetuando disparos com fuzis. Porém, foram rechaçados pela reação dos agentes penitenciários e policiais militares que haviam se preparados para eventual ação criminosa em seus postos de trabalho (fls. 143/184)…

… Alguns membros da organização acabaram cercados e presos, automóveis foram apreendidos e, como era esperado, fuzis e explosivos foram encontrados em poder do grupo que tentou invadir a Penitenciária de Bernardes. Todos os objetos apreendidos encontram-se relacionados na cópia dos documentos que segue em anexo (fls. 162, 172 e 173)…

… Imediatamente os membros da facção encarregados de oferecer a estrutura logística para o ataque, tomaram conhecimento do resultado indesejado da ação delituosa e providenciaram transporte para alguns integrantes do grupo que homiziavam-se em matagal próximo do sítio do evento. Mencionaram também que um dos parceiros, “PARRILA”, havia sido preso e achava-se custodiado em uma das delegacias de polícia da região. De fato, esta interlocução coincide com a verdade, pois conforme pudemos inferir dos documentos de fls. 91, 92, 93, 94, 172 e 173, NILSON DE LIMA PARRILA foi preso portando arma, nas imediações do local onde se deram os fatos…

… PAULO, o “PEDRÃO”, manteve uma conversa extensa com “MORINGA” sobre o assunto, tornando claro o envolvimento de todos na ação delituosa aqui narrada (fls. 122/135);…

… Em determinado momento, “PEDRÃO” admite para um desconhecido que um dos alvos da fuga de preso pretendida seria MARCO WILLIAN HERBAS CAMACHO (Marcola – fls. 114 e 115). Convém ressaltar que “PEDRÃO” foi um dos arquitetos do malfadado plano que resultou nas prisões e apreensões referidas, portanto tinha conhecimento sobre os detalhes que cercavam o resgate que preparou…

… os interlocutores censurados lamentaram em uma interlocução, que “pirulitos” das grades já estavam cerradas e que teria sido uma “pena” que a ação não havia atingido o sucesso pretendido. Verificando o documento fornecido pela Secretaria da Administração Penitenciária, pudemos inferir que as celas de número 104, 125, 126, 127, 129, 132 e 165, tiveram suas grades cerradas e adredemente preparadas para possibilitar a fuga dos presos ali encarcerados, dentre eles JOSÉ CARLOS RABELO, o “Pateta”, AILTON DE SOUZA, o “Itinha”, MARCO WILLIAN HERBAS CAMACHO, o “Marcola”, DAVID STOCKLER ULHOA MALUF, o “Magaiver”, MARCIO ALARIO ESTEVES, o “Turim”, ROBERTO SORIANO, o “Tiriça”, MÁRCIO HENRIQUE EVARISTO, o “Nenê Coqueirão”, DANIEL VINICIUS CANONICO, o “Canoni”, JÚLIO CESAR GUEDES DE MORAES, o “Julinho Carambola”…

… o conjunto dos documentos aqui acostados, somadas às gravações, cujas transcrições seguem em anexo, fizeram-nos concluir que JOÃO INÁCIO GOMES, o “JOTA”, PAULO FREIRE DA SILVA, o “Pedrão”, GEOVANI LOPES FERREIRA, o “Seu Jô”, associaram-se à NELTON RODRIGUES DA SILVA, o “Canuto”, NILSON DE LIMA PARRILLA, o “Nenê Parrilla”, EDILAINE FEITOSA VIEIRA, RENATA RAMOS DE OLIVEIRA e dezenas de outras pessoas ainda não identificadas, em unidade de propósito, com o objetivo de perpetrarem crimes de tráfico de entorpecentes, lavagem de dinheiro, que culminaram na arrecadação de valores aptos a custear a operação desencadeada para a facilitação violenta das fugas dos líderes do “Partido”, dentre eles o “Marcola”, que se achava encarcerado na cela violada de número 126, em Presidente Bernardes. É evidente que tal ação era destinada a abrir caminho para os sentenciados integrantes do Primeiro Comando da Capital, encarcerados em Presidente Bernardes, que se achavam recolhidos nas celas 104, 125, 126, 127, 129, 132 e 165 (identificados no parágrafo anterior) cujas grades haviam sido clandestinamente destruídas. Não podemos conceber que membros libertos da facção colocar-se-iam em risco de morte, expondo o patrimônio da organização em ousada ação criminosa para promover a fuga … (fls. 190/193), que nenhuma importância representam para o PCC, com certeza, aqueles detentos confessaram a violação das grades com o objetivo único de eximirem os demais habitantes das celas, estes sim, reconhecidos líderes da organização, da responsabilidade pela co-autoria dos crimes praticados no exterior do Presídio. Outrossim, em conversa já mencionada, um dos organizadores da ação tentada em Presidente Prudente, admite sem qualquer reverberação, que o resgate era dirigido para “Marcola” (fls. 114 e 115)…”

A ação policial, bem como o sistema de informação dos vários órgãos de inteligência do Governo do Estado, culminou por frustrar planejado e audacioso resgate do aludido preso que, mesmo detido, continua a comandar ilícitos penais como se estivesse em liberdade, o que revela a sua acentuada periculosidade.


Neste passo, vale reproduzir recente decisão prolatada por r. Juiz Corregedor do DECRIM, em procedimento destinado para a internação no regime disciplinar diferenciado, juntamente com a de Marcos Willians Herbas Camacho, a saber: “do quadro fático descrito e da documentação carreada emergem fundadas razões para a adoção de providência de natureza cautelar que, em suma, determinam a manutenção dos presos no estabelecimento em que se encontram recolhidos…Prova testemunhal licitamente colhida e que ressona por completo nas informações que vêm sendo colhidas nos vários procedimentos investigatórios ainda em curso estão a indicar que os três presos aqui nominados impõem, incrivelmente, ordens múltiplas para a prática de atentados contra Instituições Governamentais incumbidas de promoverem a segurança e a paz do cidadão brasileiro…Não há, pois, exemplo mais grave de ato criminoso que se enquadre tão bem na hipótese de sujeição de risco para a ordem e a segurança da sociedade…, (documento em anexo).

Registre-se, ainda, que o reeducando esteve internado em regime disciplinar diferenciado em outras oportunidades, registrando em seu prontuário, práticas de faltas disciplinares, envolvimento com entradas de armas em presídios, atentados contra delegacias e postos policiais, respondendo por diversos crimes de roubos, tráfico e homicídios, incluindo o perpetrado contra o Juiz de Direito Dr. Antonio José Machado Dias.

Como é sabido, o poder da referida organização criminosa é de tal vulto que os demais sentenciados, na sua maioria sem qualquer ligação com grandes grupos criminosos, são coagidos a tomar parte ou ajudar os líderes de facções sob pena de ter decretado a morte, caso neguem colaboração ou delatem os planos de fuga e seus perpetradores.

Assim, além do evidente perigo que apresentam à ordem publica, causam danos irreversíveis, reprimindo aqueles que querem cumprir suas penas, que por sua vez reintegram-se ao meio social e, por vezes, tem que assumir, sob ameaça, a autoria de ilícitos praticados por estas lideranças.

Tal fato leva a concluir que a manutenção do referido sentenciado em estabelecimento prisional comum além de não obstaculizar a sua atuação criminal ensejaria no desnecessário risco de presenciarmos nova e temerária ação armada de resgate, tornando de todo recomendável a sua internação em RDD – Regime Disciplinar Diferenciado, mesmo porque sua permanência em presídio comum representa gravíssimo atentado à ordem e segurança dos aludidos estabelecimentos prisionais, bem como da comunidade onde está situada a penitenciária.

Aliás, a alteração legislativa visando à instituição do RDD – Regime Disciplinar Diferenciado deveu-se justamente à evolução do crime organizado e à presença de criminosos de acentuada periculosidade nos presídios, como as citadas lideranças, que agem nas unidades prisionais com absoluto controle paralelo da massa carcerária.

Ante o exposto, requer-se a decretação de internação cautelar pelo prazo de sessenta dias, autorizando-se a permanência no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, pois evidente a presença do “periculum in mora” motivador da medida, até o julgamento definitivo, com a determinação Judicial de inclusão do reeducando em regime disciplinar diferenciado, nos moldes do disposto no artigo 52, parágrafo 1o. da lei 7.210/84, alterada pela lei no. 10.792/03, pelo prazo de um sexto de sua pena privativa de liberdade.

São Paulo, 16 de janeiro de 2006.

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