Defensores x dativos

CNJ analisa verba da Defensoria e da Assistência Judiciária

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13 de fevereiro de 2006, 16h54

A última sessão do Conselho Nacional de Justiça trouxe à tona um dos grandes problemas do sistema judiciário brasileiro – a implantação das Defensorias Públicas nos estados. Um dos principais problemas apontados no voto (PP 131) da conselheira Ruth Carvalho é a disparidade entre os orçamentos previsto para a Defensoria Pública da União e a verba prevista pelo Judiciário federal para se pagar os advogados dativos.

Advogados dativos são aqueles nomeados pelo juiz quando a parte não tem quem o represente em juízo. De acordo com a Constituição, cabe à Defensoria Pública esse papel, entre outros, no caso dos hipossuficientes – pessoas desprovidas de condições de ir a juízo sem prejuízo do sustento familiar.

“Analisando a questão sob o ponto de vista do alegado prejuízo que a designação de defensores dativos pela Justiça Federal causa à estruturação da Defensoria Pública da União (que há quatro anos não conta com a criação de qualquer cargo) o CNJ concluiu, por maioria, que a deficiência de estrutura da Defensoria Pública da União não decorre da existência do Programa de Assistência Jurídica da Justiça Federal, mas sim da falta de vontade política, até porque, tal programa, se não representa o ideal, concorre para facilitar o acesso à Justiça. A sua desativação, antes de ensejar o aumento de cargos e tornar suficiente a estrutura da Defensoria Pública da União, aumentaria o caos retratado pelo requerente, visto que esse Órgão, por certo, não absorveria a demanda”, apontou a conselheira.

De fato, sem os dativos, a situação seria de caos na Justiça Federal. Para esse universo, existem apenas 106 defensores públicos. A insuficiência numérica, de cargos de apoio e o reduzido orçamento levou, inclusive, a Defensoria Pública da União a limitar sua atuação às varas previdenciárias, cíveis comum da Justiça Federal, Juizados Especiais Criminais Federais e Justiça Militar da União.

“Assim como a jurisdição, os serviços da Defensoria Pública não podem ser delegados. São considerados pela Constituição serviços essenciais. Como não estão sendo implantados de forma adequada, criou-se um simulacro de assistência jurídica”, critica o defensor público-geral, Eduardo Flores Vieira.

O defensor-geral, nomeado ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, acredita que, desde a promulgação da Constituição de 1988, faltou uma política de Estado adequada para a instituição.

“Existem cerca de seis mil e quinhentos cargos voltados para a defesa do erário. E uma medida provisória deve criar mais mil e duzentos, para realizarem a cobrança da dívida ativa. Há pessoal para cobrar tributos ferozmente, mas para defender o cidadão carente não existe”, desabafa.

Segundo Vieira, gasta-se mais com a utilização de advogados dativos do que com os defensores. Porém, um fato mais grave se dá porque os dativos são indicados por juízes, levando a um comprometimento da imparcialidade.

A crítica do defensor público-geral é reforçada pelo presidente da Anadep — Associação Nacional dos Defensores Públicos. “A lei complementar 80 de 94 regulamentou o artigo 134 da Constituição da República. Ela criou a Defensoria Pública da União e deu diretrizes para que os estados, no prazo de 180 dias, criassem as defensorias. Em alguns lugares a coisa ocorreu. Em outros, não”, explica o presidente da Anadep, Leopoldo Portela. “Em meu estado. Minas Gerais, por exemplo, a implantação ocorreu apenas em 2003”.

Portela também acredita que a falta de vontade política esteja na raiz do problema, apesar de elogiar a atuação do governo federal. A Anadep ajudou a elaborar um anteprojeto, enviado ao Congresso Nacional, para que as defensorias passem a receber, obrigatoriamente, o valor de 2% do orçamento dos estados, assim como já ocorre com o Ministério Público. Para isso, pretendem inserir a obrigatoriedade na Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

Além disso, acompanham a tramitação de uma proposta de Emenda Constitucional, de autoria do deputado Roberto Freire (PPS-PE), na qual se modificariam as atribuições, garantias, vedações e outras questões ligadas à defensoria. Na verdade, com a mudança na Constituição, a equiparação entre a Defensoria e o Ministério Público, já realizada em lei complementar, teria status constitucional.

Apesar do discurso dos defensores, o presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogado do Brasil, Luiz Flávio Borges D’Urso não aceita a crítica de que os convênios da OAB com o Judiciário para a prestação da assistência jurídica sejam inconstitucionais.

“A antiga Procuradoria da Assistência Judiciária e agora a Defensoria Pública não são suficientes para atender a demanda de todos os carentes. Por mais que o estado mobilize, é impossível realizar o atendimento apenas com pessoal interno. A alternativa são os convênios. Em 2005, o convênio atendeu um milhão de pessoas”, contabiliza D’Urso.

O representante da Ordem ainda aponta que na defensoria paulista haverá 450 cargos, em comparação com os 47 mil advogados inscritos nos convênios em todo o estado de São Paulo. “E não são apenas os cargos. Haveria necessidade de se capilarizar – isso tem custos. Temos 216 subseções. Ou seja, nós já temos essa capilaridade. Para a cidadania é ótimo, para o estado também. O custo é infinitamente menor”, disse.

D’Urso ainda afirmou que, hoje, advogados sobrevivem na profissão graças ao convênio. E, sobre a inconstitucionalidade da situação, atacou: “Criar mecanismos para atender pessoas carentes é justamente viabilizar o comando constitucional”.

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