Créditos de carbono

Primeiro mundo terá de pagar caro por ativos ambientais

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11 de dezembro de 2006, 6h00

Conversar sobre o tempo, mudanças e tragédias climáticas deixou de ser um passatempo de britânicos, para se tornar prioridade na televisão, jornais, universidades e mundo dos negócios. Cresce a conscientização de que alguma coisa muito séria (o aquecimento global) afeta mais e mais a vida das pessoas físicas comuns e empresas, com enchentes, incêndios, desmatamento, temperaturas extremas em todo lugar e fora de hora (furacão em Santa Catarina?).

Esta simples intuição, indo até o estudo aprofundado do tema por cientistas e empresários, começa a movimentar os agentes sócio-político-econômicos.

Alguns “ongueiros do bem” sonham com a volta da humanidade a um mundo pastoral, orgânico, perto da natureza, numa marcha a ré radical da industrialização que provocou a irresponsável emissão de gases do efeito estufa. Algo que talvez nem o MST ou a Via Campesina sonhem.

No outro extremo, capitalistas selvagens poderiam se aproveitar do aquecimento e construir muitas fábricas de protetor solar, guarda-sóis, etc. Pior que isto, somente organizar um consórcio de carros bomba em Bagdá.

Seja como for, e brincadeiras à parte, a verdade nua e crua é que o chamado primeiro mundo (ou hemisfério norte) ficou rico com sua rápida industrialização, vendendo seus produtos poluidores e aquecedores por todo o globo, energizado por combustíveis fósseis, para alegria das hoje chamadas petroditaduras (Venezuela, seu mais recente e entusiasmado membro).

Tanta, tamanha e tão rápida agressão à natureza produziu este fenômeno, o aquecimento, que tem a característica de ser global, ou seja, a emissão de gases por um carro em Nova Iorque ou Austrália, irá diretamente para a atmosfera indistintamente de origem.

Se nada for feito, ou seja, se a queima de combustíveis fósseis não diminuir drasticamente, se tecnologias menos agressivas não surgirem, se as pessoas e empresas não mudarem seu comportamento, este simpático planeta em muito pouco tempo se tornará uma sauna amplamente inabitável e desagradável, com conseqüências na saúde, economia, política e outras áreas da vida.

Neste cenário, a ONU teve a iniciativa de reunir os países para debater o tema, chegando ao chamado Protocolo de Kyoto, onde os países industrializados e que aderiram à convenção, se obrigaram a reduzir emissões, com metas objetivas graduais.

Como fazer isto?

Modernizando suas fábricas, exigindo maior controle na emissão de gases e muita informação e educação para toda a sociedade.

O processo é muito caro e leva tempo, então o Brasil sugeriu e aprovou a criação do chamado MDL — Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, onde os países pobres e emergentes realizam projetos de captura de gases, por exemplo, em aterros sanitários, petroquímicas ou biodigestores de esterco animal, reflorestamento e outras maneiras.

Este trabalho é quantificado (toneladas de CO2 equivalente), auditado e formalizado na emissão de CERs — Certificados de Redução de Emissão, que podem ser vendidos ao primeiro mundo, para acertar sua contabilidade e obrigações ambientais.

É muito importante enfatizar, antes de mais nada, que o primeiro mundo concordou com isto tudo (e o governo federal americano, leia-se Bush, ainda nem aderiu a Kyoto, mas muitos estados americanos o estão fazendo direta ou indiretamente) somente por uma razão egoísta de auto-sobrevivência. Tenham certeza de que, se o aquecimento global afetasse somente africanos, asiáticos ou latino-americanos, o mundo rico estaria indiferente a tudo.

Agora, se o primeiro mundo causou o aquecimento e ficou rico rapidamente, como compensar os pobres que não tiveram a mesma oportunidade histórica e falta de escrúpulos, ou seja, a mesma vantagem hipócrita?

A resposta é fácil: o primeiro mundo terá que pagar e caro pelos ativos ambientais ainda disponíveis nos segundo, terceiro e outros mundos, ou seja, florestas, água, fauna, energia renovável e solar e por aí vai.

Quando dizem que a “Amazônia é o pulmão do mundo e precisa ser internacionalizada” (!), argumentemos que o petróleo também é hoje a maior fonte de energia do mundo, que não pode viver sem ele. Ora, o petróleo não é nem jamais será internacionalizado para o bem da humanidade, e, sim, fonte de riquezas para petroditaduras e as maiores multinacionais de energia.

Admite-se hoje nas maiores universidades do mundo que aquecimento global é o maior problema da humanidade (planejamento familiar a seu lado) e a moeda certificado de carbono deverá valer mais que ouro (aliás, para que serve o ouro, vai salvar o globo?).

O Brasil tem posição privilegiada nesta história e não pode perder a janela do tempo, vítima de burocracia, romantismo, falta de visão e coragem para enfrentar os donos do dinheiro e do Poder.

Temos os ativos ambientais, a racionalidade e a experiência que faltam a um Evo Morales ou Chavez, certamente figuras incendiárias e de curto prazo, que não podem servir de modelo para alguém aspirante a uma civilização sustentável.

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